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História da Educação

versión impresa ISSN 1414-3518versión On-line ISSN 2236-3459

Hist. Educ. vol.27  Santa Maria  2023  Epub 31-Oct-2023

https://doi.org/10.1590/2236-3459/118756 

Artigo

O CENTRO DE RECURSOS HUMANOS JOÃO PINHEIRO E A IMPLANTAÇÃO DO CURRÍCULO DE 1º GRAU*

EL CENTRO DE RECURSOS HUMANOS JOÃO PINHEIRO Y LA IMPLANTACIÓN DEL CURRÍCULO DE 1er GRADO

THE JOÃO PINHEIRO HUMAN RESOURCES CENTER AND THE IMPLEMENTATION OF ELEMENTARY AND MIDDLE SCHOOL CURRICULUM

LE CENTRE DES RESSOURCES HUMAINES JOÃO PINHEIRO ET LA MISE EN ŒUVRE DU PROGRAMME D’ÉTUDES DU PRIMAIRE

Juliana Miranda Filgueiras1 
http://orcid.org/0000-0002-8430-6810

11Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Departamento de História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (FAFICH), Belo Horizonte, MG, Brasil.


Resumo

O artigo apresenta a análise dos relatórios produzidos pelo Centro de Recursos Humanos João Pinheiro (CRHJP), que atuou na assessoria técnica aos estados brasileiros para a implantação da Lei n. 5.692/71, com ênfase no apoio para a construção dos currículos das escolas de 1º grau. O CRHJP integrava o Departamento de Ensino Fundamental do MEC e deveria colaborar com as equipes técnicas estaduais no trabalho de elaboração e execução de seus planos para implantação da reforma do ensino. A partir das proposições de Michel de Certeau, foram analisadas as estratégias para normatização da reforma, mas também as táticas, resistências e conflitos que ocorreram no processo de sua efetivação. Os resultados permitiram identificar uma tentativa de homogeneizar o processo de implantação da reforma e de institucionalização da escola de 1º grau. Por outro lado, os relatórios possibilitaram apreender também as resistências e problemas enfrentados pelas Equipes de Currículo estaduais.

Palavras-chave: CRHJP; lei n. 5.692/71; currículo; 1º grau

Resumen

El artículo presenta el análisis de los informes producidos por el Centro de Recursos Humanos João Pinheiro (CRHJP), que actuó en la asesoría técnica a las provincias brasileñas para la implantación de la Ley n. 5.692/71, con énfasis en el apoyo para la construcción de los currículos de las escuelas de 1er grado. El CRHJP integraba el Departamento de Enseñanza Fundamental del MEC (Ministerio de la Educación) y debería colaborar con los equipos técnicos estaduales en el trabajo de elaboración y ejecución de sus planes para implantación de la reforma de la enseñanza. A partir de las proposiciones de Michel De Certeau, se analizaron las estrategias para estandarización de la reforma, pero también las tácticas, las resistencias y conflictos que ocurrieron en el proceso de su concreción. Los resultados permitieron identificar un intento de homogeneizar el proceso de implantación de la reforma y de institucionalización de la escuela de 1er grado. Por otro lado, los informes posibilitaron aprehender también las resistencias y problemas enfrentados por los Equipos de Currículo estaduales.

Palabras clave: CRHJP; ley n. 5.692/71; currículo; 1er grado

Abstract

The article analyzes the reports produced by the João Pinheiro Human Resources Center (CRHJP), which acted as a technical consultant for Brazilian states during the implementation of Law no 5.692/71, focusing on the support given to create elementary and middle school curricula. The CRHJP was part of the Department of Elementary and Middle School Education of MEC and should collaborate with the technical personnel from the states to create and implement their educational reform plans. Grounded on the propositions of Michel De Certeau, we analyzed the strategies to regulate the reform, but also the tactics, the resistances and conflicts that took place during its enactment. The results allowed us to identify an attempt to homogenize the process to implement the reform and the institutionalization of elementary and middle school. On the other hand, the reports also allow us to grasp the resistances and problems faced by State Curriculum personnel.

Keywords: CRHJP; law n. 5.692/71; curriculum; elementary and middle school

Résumé

L’article présente l’analyse des rapports produits par le Centre des ressources humaines João Pinheiro (CRHJP), qui a travaillé dans le conseil technique aux États brésiliens pour la mise en œuvre de la loi n ° 5 692/71, en mettant l’accent sur le soutien à la construction des programmes des écoles primaires. Le CRHJP faisait partie du Département de l’enseignement élémentaire du MEC et devrait collaborer avec les équipes techniques des États dans le travail d’élaboration et d’exécution de leurs plans pour la mise en place de la réforme de l’éducation. Sur la base des propositions de Michel De Certeau, les stratégies de normalisation de la réforme ont été, mais aussi la tactique, les résistances et les conflitsqui se sont produitsdans le processos de leur entrée em vigueur. Les résultats ont permis d’identifier une tentative d’homogénéisation du processus de mise en œuvre de la réforme et de l’institutionnalisation de l’école primaire. D’autre part, les rapports ont également permis d’appréhender les résistances et les problèmes rencontrés par les équipes chargées des programmes dans les états.

Mots-clés: CRHJP; loi n° 5 692/71; programme d’études; primaire

A reforma estabelecida pela Lei n. 5.692/71, durante o regime militar, modificou significativamente a estrutura da educação escolar brasileira que existia até o começo dos anos 1970, ao estabelecer a criação das escolas de 1º e 2º Graus. Os currículos dessas novas instituições também foram alterados, a partir da reorganização dos saberes em áreas de estudo, matérias e disciplinas, de acordo com cada etapa do processo de escolarização.

A implantação da reforma foi direcionada aos estados, que deveriam reestruturar as escolas existentes, criar novos estabelecimentos, elaborar seus currículos e preparar os professores. Para concretizar esse processo, alguns órgãos foram mobilizados pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC). Entre eles estava o Centro de Recursos Humanos João Pinheiro (CRHJP), antigo Centro Regional de Pesquisas Educacional de Minas Gerais, que integrava o recém criado Departamento de Ensino Fundamental (DEF), encarregado de colaborar com as equipes técnicas estaduais no trabalho de elaboração e execução de seus planos para implantação da Lei n. 5.692/71.

Este artigo apresenta a análise de parte das ações do Centro de Recursos Humanos João Pinheiro para a efetivação da reestruturação do sistema educacional nos anos 1970, com ênfase na assessoria para implantação e implementação dos currículos das escolas de 1º Grau1. Cabe destacar que a documentação produzida pelo CRHJP trata-se de um material ainda não explorado, de um órgão pouco conhecido, que atuou na assessoria técnica aos estados brasileiros. O acervo do CRHJP está localizado na Biblioteca Bartolomeu Campos de Queirós, pertencente à “Escola de Formação e Desenvolvimento Profissional de Educadores de Minas Gerais”, órgão da Secretaria de Estado de Educação (SEE/MG).

As fontes deste órgão específico, que possibilitaram examinar o movimento de concretização das políticas para a educação aprovadas após 1971, foram pesquisadas a partir das contribuições de Michael de Certeau, com ênfase nos conceitos de estratégias e táticas2, buscando voltar o olhar para as “maneiras de fazer” (CERTEAU, 1994) inscritas nas ações dos agentes que pretendiam, a partir da institucionalização do ensino de 1º Grau, modificar os modelos pedagógicos das escolas primárias e secundárias, com o objetivo de construir novas culturas escolares em um outro modelo educacional3.

Para tanto, foram analisadas as estratégias para normatização e implantação da reforma empreendidas pela assessoria do CRHJP, mas também as táticas, as resistências e conflitos que ocorreram no processo de sua efetivação e que evidenciaram os modos de apropriação dos diferentes sujeitos envolvidos na reconfiguração e adaptação das normas estabelecidas. Com base em Marta Maria Chagas de Carvalho (2011 4), este artigo procurou entender as negociações entre as regulamentações impostas pela reforma instituída nos anos 1970 e as práticas dos “agentes mediadores” no processo de sua institucionalização.

Assim, o artigo apresenta o Centro de Recursos Humanos João Pinheiro e sua atuação na implantação e implementação da Lei n. 5.692/71, com destaque para a execução do Subprojeto de apoio técnico à implantação e implementação do currículo do ensino de 1º grau, que buscou assessorar as Secretarias Estaduais de Educação e Cultura (SECs) na reformulação de suas propostas curriculares.

DO CRPE-MG AO CRHJP E A LEI N. 5.692/71

Embora o CRHJP tenha recebido esse nome nos anos 1970, sua criação ocorreu entre 1955 e 1956, quando Anísio Teixeira, diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (Inep), instituiu, com apoio da Unesco, o Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais e os Centros Regionais de Pesquisas Educacionais (CRPEs). Estes órgãos tinham como objetivo desenvolver estudos e levantamentos “das condições econômicas, sociais, políticas e culturais de cada região; além de estudos e projetos mais especificamente voltados para o processo ensino-aprendizagem” (XAVIER, 1999, p. 82). De acordo com Maria do Carmo Xavier (2008), a proposta dos CRPEs era aproximar as universidades e as Secretarias de Estado de Educação, com a finalidade de promover uma parceria nas pesquisas desenvolvidas, para que fosse possível conhecer os problemas educacionais das diferentes regiões do país e elaborar “uma política nacional de educação, harmonizada com as demandas regionais e comprometida com a superação do atraso e a consolidação da ordem democrática” (p. 235).

Conforme Xavier (2008, p. 231), em Minas Gerais, o CRPE tinha como finalidade “produzir estudos e pesquisas sobre a realidade regional e assim contribuir no processo de renovação das políticas públicas de educação”. Os estudos abordavam as “condições culturais e escolares” e as “tendências de desenvolvimento socioeconômico relacionadas à educação em Minas Gerais” (BRASIL, MEC/IRHJP, 1989, p. 15). O Centro também desenvolveria investigações sobre temas relacionados à formação e aperfeiçoamento do magistério, organizaria cursos de treinamento de professores - das escolas Primária, Secundária e Normal - e demais especialistas da educação básica, produziria materiais de ensino (BRASIL, MEC/IRHJP, 1989, p. 16) e desenvolveria “demonstrações práticas de novos métodos e técnicas de ensino, de forma a tornar o magistério menos empírico e mais científico” (XAVIER, 2007, p. 125).

Nos anos 1970 o órgão foi convertido em Centro de Recursos Humanos João Pinheiro, após sua desvinculação do Inep e transferência para o Departamento de Ensino Fundamental do MEC, quando passou a colaborar para a implantação da reforma educacional instituída pela Lei n. 5.692/71. Em 1983, o CRHJP foi novamente renomeado como Instituto de Recursos Humanos João Pinheiro ao ser incorporado à Fundação de Assistência ao Estudante (BRASIL, MEC/IRHJP, 1989, p. 16-18). Atualmente seu acervo documental foi transferido para a Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais5 e está constituído por documentos com diferentes características - ofícios, pareceres, relatórios técnicos, relatórios de cursos, de seminários, atas de reuniões, normas, revistas pedagógicas etc. -, produzidos pelo CRHJP, pelas Secretarias Estaduais de Educação e pelo MEC, organizados em projetos. O “Projeto n. 17/04” trada especificamente da Lei n. 5.692/71 e possui cerca de 80 caixas, que abarcam as atividades desenvolvidas para a implantação da reforma do ensino em todo território nacional.

As escolas de 1º e 2º Graus, criadas a partir da Lei n. 5.692/71, possuíam características distintas das instituições existentes até então. O 1o grau, que integrou o Primário e o Ginásio, tornou obrigatório o ensino de oito anos. Já o 2o Grau, que transformou o antigo Colégio em escola profissionalizante, pretendia resolver os conflitos em torno dos diferentes projetos para o Ensino Secundário debatidos nas décadas anteriores (TOLEDO, 2017, p. 179). A aprovação da LDB n. 4.024, em 1961, procurou atender parte dos projetos e reinvindicações da população, contudo, o Primário e Secundário permaneceram separados pelo exame de admissão6. A unificação desses níveis de ensino ocorreu somente com a Lei n. 5.692/71 e a criação da escola de 1o Grau que, para ser implantada, demandou das Secretarias Estaduais de Educação uma série de reestruturações dos estabelecimentos existentes, mas também de criação de novas escolas.

Os currículos dessas instituições também deveriam ser modificados, por meio da reorganização dos saberes escolares definidos pelo Parecer n. 853/71, que fixou o núcleo-comum para os currículos do ensino de 1.º e 2.º Graus. Os saberes passaram a ser constituídos em matérias7, atividades, áreas de estudo e disciplinas (MARTINS, 2003). Com uma função distinta do Secundário, a escola de 1o Grau deveria favorecer a homogeneização dos estudantes, a partir de uma “base comum de comportamentos, que refletiam os ideais, valores e exigências da sociedade” (NAGLE, apudTOLEDO, 2017, p. 184). Por outro lado, como destaca Maria Rita de Almeida Toledo (2017, p. 186), o 2o Grau teria a função de terminalidade, com ênfase nas diferentes habilitações profissionais, se distanciando do ensino superior e “da responsabilidade de ser a ‘ponte’ que deveria levar os estudantes formados a esse grau de ensino”. Os estados precisariam, portanto, atuar em três frentes: garantir à toda a população em idade escolar acesso ao ensino de 1º Grau; organizar os novos currículos; e preparar os profissionais da educação para essa grande mudança, com destaque para a formação dos professores.

Por já possuir uma longa tradição de pesquisas educacionais e de formação do magistério, o CRHJP assumiu a responsabilidade de auxiliar os estados na execução do acompanhamento da implantação e implementação da Lei n. 5.692/71 e do ensino de 1º Grau, segundo uma publicação de 1989, que apresentava a trajetória institucional do Centro (BRASIL, 1989, p. 17). Conforme o documento, para tal fim, o Centro estabeleceu ações de assessoria e assistência técnica aos Sistemas Públicos de Ensino, que deveria auxiliar “na escolha e utilização de estratégias e instrumentos destinados ao tratamento adequado de aspectos referentes à supervisão de ensino, reformulação de currículo e política de melhoria de recursos humanos” (BRASIL, 1989, p. 17). A colaboração com as equipes técnicas estaduais visava estruturar o “trabalho, organização e funcionamento do ensino” e a “elaboração e execução de seus planos de ação” (BRASIL, 1989, p. 17). Com a criação da Secretaria de Ensino de 1º e 2º Graus (SEPS), em 1978, o Centro passou a integrar esse órgão, mantendo sua função de assessoramento às Unidades Federadas para implementação e implantação das metas do II Plano Setorial de Educação e Cultura (BRASIL, 1989, p. 17). O CRHJP teria, assim, um papel significativo como órgão do MEC, para a efetivação da reforma educacional durante a ditadura militar, ao atuar para a consolidação das escolas de 1º Grau, por meio da assessoria para a reorganização da inspeção e supervisão de ensino, a reformulação dos currículos, a implementação de novas metodologias e a formação de professores.

O documento do CRHJP denominado “Assistência Técnica” (s/d) informava sobre a atuação do órgão no apoio técnico aos estados ao longo dos anos 1970, na oferta de “suprimentos às várias equipes dos sistemas de ensino, de modo a colaborar no equacionamento e solução de problemas e na procura de melhores modalidades de execução dos serviços educacionais na área do 1º grau” (BRASIL, s/d, p. 1). Os assessores do Centro atuariam para solucionar os problemas na execução da implantação do ensino de 1º Grau. Segundo o mesmo documento, a assistência seria realizada por meio de:

Técnicos e consultores do DEF que atuariam junto a órgãos, departamentos, serviços e técnicos integrantes das estruturas dos vários sistemas de ensino; Publicações e materiais elaborados pelo DEF; Indicações bibliográficas; Cursos, seminários, encontros e simpósios; Orientações para estudos específicos ligados as necessidades decorrentes do trabalho desenvolvidos pelos sistemas de ensino; Consultores técnicos em assuntos específicos. (BRASIL, s/d, p. 2).

O trabalho do CRHJP incluía a assessoria técnica, mas também produção de material bibliográfico, organização de diferentes tipos de eventos e orientações de estudo aos sistemas de ensino.

Uma das primeiras atividades do CRHJP se constituiu no Projeto de Acompanhamento da Implantação e Implementação da lei n. 5.692/71 - Ensino de 1º grau, criado pela Portaria Ministerial n. 312-BSB, de 7 de junho de 1973, e que contava com quatro subprojetos: Melhoria dos Serviços de Supervisão dos Sistemas de Ensino; Recursos Humanos; Legislação e Normas; e Apoio técnico à implantação e implementação do currículo do ensino de 1º grau.

As finalidades de cada subprojeto foram descritas na apresentação geral do Projeto. Desse modo, o subprojeto Legislação e Normas possuía três objetivos centrais: manter o DEF/CRHJP informado sobre os “instrumentos legais regulamentadores da implantação da reforma”; assessorar e produzir subsídios para “ajustar a assistência técnica às normas da Lei n. 5.692/71 e dos instrumentos legais emanados dos Conselhos de Educação”; e subsidiar o Conselho Federal de Educação “com resultados de estudos da documentação normativa dos sistemas de ensino da Unidades Federadas” (BRASIL, 1974, p. 2).

O objetivo do subprojeto Melhoria dos Serviços de Supervisão dos Sistemas de Ensino era “prestar assistência técnicas às Secretarias de Educação para organização ou reorganização do Sistema de Supervisão”, por meio da elaboração de diagnósticos sobre a situação da supervisão do ensino de 1º Grau nos diferentes estados e de estudos sobre a construção de um novo modelo de supervisão. Também realizaria treinamento, em serviço, dos profissionais envolvidos.

O subprojeto Recursos Humanos teria a função de colaborar com os Sistemas de Ensino na melhoria dos recursos humanos para o ensino de 1º Grau. Para tanto, realizaria um grande levantamento sobre a situação dos recursos humanos no ensino de 1º Grau nas Unidades Federadas, incluindo o nível de formação dos professores. A partir dos dados coletados, entre outras atividades, colaboraria para a reestruturação dos cursos de formação de professores e organizaria treinamentos de responsáveis nas Secretarias de Educação pelos Programas de Recursos Humanos.

Por fim, o subprojeto de Apoio técnico à implantação e implementação do currículo do ensino de 1º grau deveria fornecer assistência e assessoramento às equipes estaduais na reformulação das propostas curriculares, já iniciadas em 1972 pela “Comissão Nacional de Currículo - DEF/MEC (BRASIL, 1974, p. 1). Após a aprovação da reforma, todos os Sistemas de Ensino brasileiros precisaram criar suas Equipes de Currículo para reestruturar os programas curriculares.

O acervo do CRHJP possui uma grande quantidade de relatórios da assistência técnico-pedagógica oferecida às unidades federadas para elaboração dos currículos do ensino de 1º Grau. Esses documentos abarcam o acompanhamento e assistência para construção das propostas curriculares, propostas de desenvolvimento de novas metodologias e encontros com coordenadores das equipes de currículo e de supervisão. Foram selecionadas fontes que especificam o que era o subprojeto de Apoio técnico à implantação e implementação do currículo do ensino de 1º grau, as principais estratégias estabelecidas para sua realização e os relatórios das atividades executadas pelos técnicos do CRHJP nas unidades federadas, que evidenciaram as ações desenvolvidas, possíveis resistências, conflitos e dificuldades.

O SUBPROJETO DE APOIO TÉCNICO À IMPLANTAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DO CURRÍCULO DO ENSINO DE 1º GRAU

Um documento produzido pelo CRHJP em 1974, descrevia as ações previstas no projeto de acompanhamento da reforma e indicava que os técnicos do Centro dariam ênfase ao “treinamento e aperfeiçoamento, em serviço, das Equipes de Currículo, a fim de assegurar-lhes eficácia no desempenho de responsabilidades” (BRASIL, 1974, p. 1). Para tal, seriam realizados “estudos, encontros, seminários e assessoramento e/ou assistência técnica” em relação a uma série de aspectos, entre eles o Núcleo Comum do currículo de Formação Geral, o núcleo de Formação Especial, a elaboração dos currículos plenos, o acompanhamento, controle e avaliação das propostas curriculares, os critérios de seleção de livros didáticos e materiais de ensino e os critérios de especificações de construções escolares (BRASIL 1974, p. 1).

De acordo com o documento, os territórios de Rondônia e Roraima já recebiam assessoria desde a fase inicial, ainda em 1971. Nos estados do Acre, Amapá, Mato Grosso, Espirito Santo, Piauí e Sergipe, o trabalho realizado visava uma complementação ou revisão das propostas curriculares. Nos demais estados, em razão do trabalho desenvolvido até dezembro de 1973, esperava-se o cumprimento total das metas estabelecidas no Subprojeto. As equipes técnicas atuariam sobretudo no desenvolvimento do conteúdo, nas estratégias de ação e tecnologia educacional, buscando melhorar o Ensino de 1º grau no país (BRASIL, 1974, p. 1).

O objetivo geral da assistência era subsidiar os Sistemas de Ensino em suas decisões, escolhas e estratégias para preparação dos “recursos humanos envolvidos especialmente nos trabalhos de currículo do Ensino de 1º Grau” (BRASIL, 1974, p. 2). Entre os objetivos específicos destacavam-se as ações dos técnicos do CRHJP em contribuir para a melhoria da produtividade das equipes estaduais, sugerir alternativas para a elaboração ou reelaboração das propostas curriculares de acordo com a Lei n. 5.692/71, estabelecer diretrizes para a implantação e/ou implementação do currículo, realizar estudos específicos sobre currículo em escolas-laboratórios e elaborar documentos sobre currículo para subsidiar a eficiência do trabalho das equipes estaduais (BRASIL, 1974, p. 2).

Para o ano de 1974, o CRHJP teria a função de elaborar dois documentos-subsídios sobre o Núcleo Comum e a Formação Especial do currículo, prestar assistência técnica às vinte e sete unidades da Federação na reformulação, acompanhamento, controle e avaliação das propostas curriculares e também organizar quatro encontros nacionais para treinamento, em serviço, dos vinte e sete coordenadores das equipes de currículo e cinquenta especialistas em conteúdos de Estudos Sociais e Comunicação e Expressão (BRASIL, 1974, p. 2).

Percebe-se que as ações previstas para os assessores do CRHJP estavam voltadas para subsidiar os trabalhos desenvolvidos pelas Secretarias de Educação e suas equipes de currículo, tanto na orientação para melhorar a sua produtividade, como no auxílio à elaboração dos currículos e demais documentos correlatos.

A equipe técnica responsável pelo Subprojeto de Apoio técnico à implantação e implementação do currículo do ensino de 1º grau estava composta pelos seguintes membros:

Gerente do projeto: Francisca Alba Teixeira Gerente do subprojeto: Marina Couto Assistentes técnicos do subprojeto: Aciléia Carvalho, Bartolomeu Campos Queiróz, Celmar de Fátima Botelho, Helena Lopes, Maria Carolina do Couto Maluf, Maria Helena da Rocha, Maria José Berutti, Maria do Rosário Costa, Nilda Ribas Diniz, Ruth dos Santos Staduto, Teresinha Deusdará, Terezinha Nardelli Cambraia e Wanda Knupfer de Paiva (BRASIL, 1974)

Os assistentes técnicos e adjuntos deveriam elaborar relatórios mensais, parciais e final, registrar as atividades desenvolvidas, descrever os resultados da assistência prestada e realizar experimentações curriculares em escolas-laboratórios (BRASIL, 1974, p. 6). Por fim, os consultores especialistas nos conteúdos do Núcleo Comum dos componentes curriculares deveriam assessorar a elaboração dos documentos, mas também acompanhar e avaliar os trabalhos (BRASIL, 1974, p. 7). Nesse sentido, o CRHJP atuaria também como uma espécie de inspeção do MEC aos estados.

A atuação dos técnicos do CRHJP nas questões relativas ao Currículo envolveu a organização de seminários nos estados que discutiram a organização do Núcleo Comum - o desenvolvimento das matérias de Comunicação e Expressão, Estudos Sociais e Educação Artística no ensino de 1º grau -, e a produção de documentos que tratavam do “Desenvolvimento de Novas Metodologias Aplicáveis ao Ensino de 1º grau” (BRASIL, 1974, p. 7). Os relatórios finais das primeiras assessorias prestadas, no auxílio, acompanhamento e treinamento das equipes de currículo e na construção das propostas curriculares permitiram conhecer algumas estratégias, procedimentos adotados pelo CRHJP e pelas Secretarias de Educação, mas também os conflitos, resistências, dificuldades e especificidades regionais.

Os relatórios do CRHJP: as ações nos estados

Os relatórios produzidos para o Subprojeto de Apoio técnico à implantação e implementação do currículo do ensino de 1º grau apresentam informações das atividades executadas pelo CRHJP e pelas Secretarias de Educação, de junho de 1973 a março de 1975. Para este artigo foram selecionados os relatórios do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Alagoas, Acre, Goiás, Guanabara, Maranhão e de Fernando de Noronha, pois apresentaram maior detalhamento das atividades desenvolvidas e possibilitaram apreender os primeiros caminhos delineados pelas equipes de currículo, as estratégias para elaboração e implantação dos currículos, mas também as dificuldades, conflitos e resistências locais.

No Rio Grande do Sul, a Secretaria de Educação contou com a assessoria das técnicas do CRHJP Therezinha Deusdará e Nilda Ribas Diniz. O primeiro relatório, de julho de 1973, destacava a importância do trabalho conjunto da SEC/RS e das universidades da região no preparo de recursos humanos necessários à implantação do currículo. Até aquele ano, a assessoria do CRHJP se voltava para a organização de leituras e discussões que subsidiassem a elaboração dos currículos, a análise das propostas curriculares desenvolvidas e o acompanhamento de sua execução.

O segundo relatório, de 1975, descrevia a estrutura e equipe montada pela SEC/RS para a implantação do novo currículo das escolas de 1º Grau. A Equipe de Currículo contava com 35 membros que possuíam formação em nível superior, muitos com pós-graduação em Educação e estava vinculada ao Núcleo de Pesquisa e Orientação do Departamento de Educação Fundamental, que abarcava ainda o Laboratório de Currículo, a Equipe de Supervisão e a Equipe de Avaliação. Nessa estrutura, o Laboratório de Currículo estava responsável pela elaboração do projeto Desenvolvimento de nova metodologia aplicáveis ao ensino de 1º grau e a Reformulação do Currículo para o Ensino de 1º grau (BRASIL, RS, 1975, p. 4). No relatório, a assessora destacava a adequada instalação da Equipe de Currículo em “duas salas bem montadas no 5º andar da Secretaria” e a qualidade do seu trabalho “com reuniões gerais por semana, e reuniões dos subgrupos sempre que se fazia necessário” (BRASIL, RS, 1975, p. 1).

As atividades de assessoria desenvolvidas pelas técnicas do CRHJP incluíram encontros e reuniões para análise e discussão dos planos de trabalho da Equipe de Currículo, discussões teóricas para a construção do Laboratório de Currículo, a adequação do cronograma da equipe com as atividades estabelecidas pelo Departamento de Educação Fundamental do MEC e a sistemática para a elaboração do currículo pleno. Suas ações focaram também no desenvolvimento do Projeto ACA - acompanhamento e avaliação da execução do currículo -, nas discussões sobre a alfabetização na 1ª série do 1º Grau, na elaboração de diretrizes para a educação no meio rural e na elaboração de diretrizes para obter respostas dos professores sobre o novo currículo em implantação (BRASIL, RS, 1975, p. 2).

Dentre os resultados alcançados, o relatório indicava a efetiva elaboração das diretrizes curriculares para os diversos âmbitos do ensino de 1º Grau, para a área de Iniciação à Técnica, no meio rural e para o ensino Supletivo. Também foram elaboradas as diretrizes curriculares para o ensino de 2º Grau, para o Jardim de Infância e para os Programas de Saúde. A Equipe de Currículo teria realizado, ainda, análises de livros didáticos, organizado a programação de cursos de treinamento e aperfeiçoamento de recursos humanos, desenvolvido estudos sobre sondagens de aptidões, além de montar modelos de escola de 2º Grau e elaborar um modelo para avaliação dos resultados do processo de ensino-aprendizagem (BRASIL, RS, 1975, p. 3). No item Conclusões a assessora expunha uma avaliação positiva das atividades desenvolvidas pela Equipe de Currículo do Rio Grande do Sul, que teria realizado “um trabalho sério e de alto nível”, pois todos os envolvidos trabalhavam com entusiasmo nas tarefas e se empenhavam em produzir do modo “mais científico possível” (BRASIL, RS, 1975, p. 5).

Os relatórios das assessoras do CRHJP no Rio Grande do Sul descreviam uma estrutura bem preparada pela SEC/RS para a implantação do currículo de 1º Grau e ações consideradas efetivas para o êxito dos trabalhos da Equipe de Currículo. O número de membros da Equipe e a estrutura da Secretaria eram considerados fatores que colaboravam para o êxito dos trabalhos de desenvolvimentos.

A Equipe de Currículo do Rio de Janeiro contou com assessoria de Helena Lopes. O relatório de 1975 apresentava uma descrição do inicio das atividades, em abril de 1972, e a formação da equipe que contava, inicialmente, com treze membros além da coordenação. Parte dos integrantes possuía formação universitária em Pedagogia, Matemática, Ciências e Letras, alguns ainda cursavam Pedagogia e um não possuía formação em nível superior. Segundo a assessora do CRHJP, os técnicos de horário integral eram os que realmente constituíam a equipe de currículo. Os demais eram especialistas de áreas e estavam na comissão para “dar suporte à parte de conteúdo da Proposta Curricular” (BRASIL, RJ, 1975, p. 1). Isso influenciaria a efetividade dos trabalhos em desenvolvimento.

Ao descrever a situação encontrada em 1973 na SEC/RJ, a assessora informava que a proposta curricular estava pronta, o Serviço de Supervisão do Estado estava organizado e havia sido criado o Centro de Treinamento do Rio de Janeiro (CETRERJ) para preparação dos professores. A Equipe do Currículo possuía diversas tarefas, entre elas: treinar os professores, elaborar artigos que seriam guias para uso das propostas curriculares; elaborar um documento de orientação para o acompanhamento e avaliação da proposta curricular; elaborar a parte diversificada do currículo; avaliar o projeto de currículo para o ensino de 1º Grau; elaborar a proposta curricular para a 5ª série da zona rural; elaborar as especificações para os livros didáticos.

Em Alagoas, o relatório de assistência técnica foi produzido pela assessora Wanda Knupfer de Paiva. O documento comunicava que a Equipe de Currículo, criada em agosto de 1972, era composta por quatro membros com curso superior em Pedagogia. Em 1975, a Equipe foi ampliada para dez membros, com integrantes que possuíam formação em Letras, especialização em Currículo, Supervisão, Orientação Educacional e em Avaliação.

Segundo a assessora, em junho de 1973, a Equipe de Currículo já havia realizado algumas atividades, como a elaboração do currículo de 1º Grau, apresentando seus objetivos e as atividades das matérias de Comunicação e Expressão, Estudos Sociais e Ciências até a 3ª série. Em 1975 estava em fase de impressão o currículo de 4ª a 8ª série. A Equipe criou um Boletim Informativo, com o objetivo de explicar e divulgar a Lei n. 5.692/71, noticiar as ações para sua implantação, além de publicizar material de orientação aos professores com “instrução sobre avaliação, aprovação, recuperação, diário de classe, ficha de observação, boletim do aluno e ficha de auto-avaliação” (BRASIL, AL, 1975, p. 2). O relatório expunha ainda que estava em andamento um curso para supervisores, que pretendia difundir a proposta curricular. Além disso, a Equipe de Currículo era responsável pelo acompanhamento da execução do currículo nas 1ª e 5ª séries, por meio de “visitas às escolas, reuniões com o pessoal envolvido e análise de questionários e relatórios” (BRASIL, AL, 1975, p. 2).

A assistência prestada pela assessora do CRHJP em Alagoas incluiu a realização de encontros com o Secretario da Educação, chefes de Departamentos e Serviços, a Equipe de Currículo e de Supervisão, além de visitas às escolas de 1º Grau. O tópico Resultados apresentava as atividades desenvolvidas até 1975: elaboração do currículo Pleno; plano de difusão e implementação da proposta curricular; proposta curricular para a Formação Especial; programação e execução de treinamento de pessoal para conhecimento do novo currículo; orientações para avaliação da aprendizagem e para a recuperação; elaboração de anteprojeto para currículo de Línguas Estrangeiras; projeto de difusão e implementação da proposta curricular de Educação Artística; Sistemática para orientação de Ensino Religioso etc.

O estado do Acre contou com a assessora Maria do Rosário Costa. Segundo o documento, em 1972, a Equipe de Currículo era formada por quatro membros com formação de nível médio e que cursavam o ensino superior. Já em 1975, eram cinco membros formados em Letras, Matemática, Orientação Educacional, Administração e Inspeção. A assessora do CRHJP realizou com a Equipe de Currículo planejamentos para a proposta curricular geral do estado e teria contribuído na reorganização dos componentes curriculares, por meio de indicações bibliográficas, especialmente para Matemática e Língua Portuguesa. As atividades realizadas incluíram a elaboração do Plano de implantação da reforma, a elaboração da proposta curricular de Educação Geral e Formação Especial, a produção de orientações sobre avaliação e recuperação e a divulgação da proposta curricular por meio de cursos de treinamento e atualização de professores de 1ª a 5ª séries.

Em Fernando de Noronha a assessora Ruth dos Santos Staduto relatou a assistência prestada, que abrangeu reuniões com a Chefe do Departamento de Educação e Cultura e com a Supervisora de Ensino para tratar de orientações para a implementação, acompanhamento, controle e avaliação do currículo, para a elaboração de diretrizes para a avaliação da aprendizagem e o assessoramento na elaboração de diretrizes para o curso de treinamento de professores. Em 1973, para a elaboração do currículo pleno, foram contratados especialistas vinculados à Secretaria de Educação de Pernambuco. Fernando de Noronha possuía uma unidade integrada de 1º grau com 444 alunos. As atividades desenvolvidas, como em outros lugares, envolveram a elaboração de orientações para estudo do currículo, elaboração de fichas para acompanhamento e controle de sua execução e acompanhamento dos professores. Também foi dada atenção ao planejamento do trabalho dos coordenadores e às orientações para a execução do programa de Educação Artística.

A assessoria de Fernando de Noronha destacava a necessidade de assistência aos estudantes, sobretudo no acompanhamento da alfabetização. Em 1975 estava em fase de elaboração um projeto de recuperação para os alunos da 1ª série. Em suas conclusões, reforçava o cuidado com os professores do pré-1º Grau e da 1ª série do 1º Grau em relação à preparação para o processo de alfabetização. Já os professores de 4ª a 8ª série precisavam de “orientações relativa à abordagem metodológica dos conteúdos específicos por áreas de estudo” (BRASIL, FN, 1975, p. 3). O relatório evidenciava a preocupação com questões relacionadas ao ensino e aprendizagem das crianças, principalmente no início do processo de alfabetização.

Maria José Berutti elaborou o relatório de Goiás. Segundo a assessora, a Equipe de Currículo estava vinculada à Coordenação de Planejamento Educacional do Estado e era constituída, inicialmente, por dez membros, com formação superior e trabalhando em regime de 33 horas semanais, sob coordenação de um educador com mestrado em Currículo. Os demais membros possuíam formação universitária em diferentes áreas - Matemática, Física, Sociologia, Letras, História Natural, Geografia, Pedagogia, Orientação Educacional, Ciências Sociais e Direito.

Os guias curriculares foram elaborados por equipe compostas por professores da Universidade Federal de Goiás, sob coordenação da Equipe de Currículo, que estava responsável por definir a forma de sua implantação, controle e avaliação. A Equipe também deveria realizar o treinamento dos professores e elaborar material didático adequado à implantação. Para subsidiar as discussões sobre os novos currículos, a Equipe de Currículo teria produzido uma série de materiais que abordavam desde questões teóricas sobre currículo, até perspectivas metodológicas sobre a aprendizagem na sala de aula, a integração entre a escola e comunidade e os princípios de avaliação dos alunos e do currículo. Como em Fernando de Noronha, havia uma preocupação com a preparação dos professores de 1ª série e diretores escolares dos municípios sede das superintendências de ensino, com ênfase nos professores e técnicos das escolas-piloto de Goiânia, procurando orientá-los para a seleção do conteúdo curricular.

Até o ano de 1975, a assessora relatava a elaboração pela SEC/GO do Estatuto do Magistério e a organização de bibliotecas especializadas em currículo. Também foram realizados encontros entre a Equipe de Supervisão e a Equipe de Currículo, com o objetivo de organizar planos de trabalho conjuntos, e encontros com as equipes de Planejamento e de Arquitetura, para tratar das especificações das escolas de 1º Grau. A Equipe de Currículo havia finalizado o Plano de Ensino Geral, as metodologias para o Programa de Saúde, os princípios gerais de avaliação dos alunos, o guia curricular de Educação Física, as especificações para seleção dos livros didáticos e os critérios para seleção e organização dos conteúdos curriculares. As propostas curriculares estavam sendo testadas em trinta escolas nos municípios de Goiânia, Palmeiras, Goiás, Inhumas, Morrinhos, Anápolis, Itaberaí e Campinas.

O relatório do Maranhão, elaborado pela assessora Maria Carolina do Couto Maluf, destacava a realidade inicial da Equipe de Currículo constituída, em junho de 1972, de 16 membros que foram reduzidos, em julho de 1973, para cindo membros, quatro com regime de trabalho integral e uma pessoa com regime de 20 horas semanais. Três possuíam formação superior em Pedagogia e Letras e dois cursavam Pedagogia. A equipe integrava a Unidade Técnico-Pedagógica, órgão da Assessoria Técnica da Secretaria de Educação.

A primeira ação da Equipe tratou da elaboração da proposta curricular, intitulada Diretrizes Gerais do Currículo de 1º grau, que abrangia as matérias do Núcleo Comum, da Educação Moral e Cívica e Educação Física. Em seguida, foram realizados treinamentos dos professores, supervisores e diretores das escolas selecionadas para implantação do novo currículo, além de estudos para elaboração do anteprojeto de acompanhamento do currículo e “das normas para avaliação do rendimento escolar” (BRASIL, MA, 1975, p. 2). A assessora que acompanhou as ações do estado do Maranhão destacava um levantamento realizado sobre as “dificuldades que os professores sentiam na operacionalização das Diretrizes Gerais” (BRASIL, MA, 1975, p. 3) e a elaboração, a partir desse levantamento, de orientações às escolas para preparação de seus currículos plenos e para avaliação da aprendizagem. Existiam, ainda, preocupações com as especificações dos Prédios Escolares e com a seleção dos livros didáticos e materiais de ensino.

O relatório da Guanabara foi elaborado pela assessora Helena Lopes. Segundo o documento, a Equipe de Currículo fora constituída em agosto de 1972 por apenas dois membros. Em 1973 passou para nove membros, que possuíam cursos superior nas especialidades de Comunicação e Expressão, Matemática, Ciências Físicas e Biológicas, Estudos Sociais, em Formação Especial e Licenciados em Pedagogia. A Equipe seria responsável pela elaboração do currículo do 1º Grau e do Ensino Supletivo.

Até 1973 estava em fase final a produção dos subsídios para a elaboração do currículo pleno. O treinamento dos professores para utilização dos subsídios ainda não havia começado, pois aguardavam a divulgação oficial do documento. Os programas referentes à Educação Artística e Educação Física e o projeto de acompanhamento, controle e avaliação da proposta curricular haviam sido elaborados. A Equipe de Currículo estava encarregada, ainda, de produzir um documento com diretrizes para a correção dos problemas identificados na implantação e implementação dos novos currículos de ensino de 1º Grau. A equipe levantava dados para montar um projeto sobre alfabetização, considerado o “ponto de estrangulamento do fluxo”, em razão da alta taxa de reprovados nas classes de alfabetização e de 1ª série (BRASIL, GB, 1975, p. 4).

A análise dos relatórios evidenciou alguns procedimentos na atuação do CRHJP e na dinâmica das Secretarias de Educação, que buscavam estabelecer uma sistemática no processo de implantação da reforma curricular nos estados. Todas as SECs precisaram constituir suas Equipes de Currículo, que foram descritas pelas assessorias do CRHJP, incluindo a quantidade e formação de seus membros e os regimes de trabalho. Os relatórios descreviam detalhes da assistência prestada aos estados e os resultados alcançados até o ano de 1975.

De modo geral, os trabalhos das assessoras do CRHJP seguiam uma mesma estrutura, fornecer subsídios teóricos para elaboração dos currículos, colaborar na produção propriamente dos programas para o 1º Grau, na elaboração de orientações para acompanhamento e avaliação da execução do currículo, no treinamento dos professores, com ênfase nos docentes de 1ª e 5ª séries. Forneciam orientações sobre as formas de avaliações e recuperação, além de colaborar na elaboração de propostas metodológicas para as matérias de Ciências, Comunicação e Expressão, Estudos Sociais, Educação Artística, Língua Estrangeira e Educação Física. Havia, ainda, uma preocupação, em alguns estados, com a especificidade da educação no meio rural e com a elaboração de projetos de alfabetização nas classes de 1ª série. Além das questões propriamente curriculares, os relatórios expuseram a atuação de algumas Secretarias Estaduais de Educação na análise dos livros didáticos e no planejamento dos prédios para as escolas de 1º Grau.

Os relatórios do CRHJP: as dificuldades e resistências

Embora existisse um encaminhamento padrão para a implantação e implementação dos currículos nos estados, os relatórios das assessorias do CRHJP permitiram apreender os problemas, conflitos e resistências no processo de construção e execução dos currículos para as escolas de 1º Grau.

No Rio de Janeiro a assessora do CRHJP informava que, mesmo com a proposta curricular pronta, os exemplares não haviam sido distribuídos em quantidade suficiente, o que levava ao seu desconhecimento pela maioria dos professores. Durante as nove visitas realizadas, a assessora descrevia alguns problemas, como a dificuldade de definição da posição da Equipe de Currículo dentro da estrutura da SEC/RJ, que necessitava de maior suporte para realizar todo o trabalho programado, por causa do acúmulo de tarefas dos seus membros, sobretudo com os cursos do CETRERJ.

Existiam ainda conflitos que envolviam a coordenação da Equipe de Currículo. Em novembro de 1973, a coordenadora foi substituída, pois sua participação foi considerada insuficiente. Em 1975, foram relatados problemas com um membro da equipe de currículo que não queria assumir os trabalhos da coordenação após chegar de San Diego (BRASIL, RJ, 1975). A assessora descrevia também desentendimentos com o Serviço de Supervisão:

As duas equipes, de Currículo e de Supervisão, estavam empenhadas num trabalho entrosado. Para a efetivação desse objetivo, várias reuniões, envolvendo todo o pessoal foram realizadas. Ao grupo de supervisão caberia o acompanhamento da proposta curricular nos 7 municípios. Alguns princípios foram estabelecidos: 1) os planos das duas equipes seriam elaborados conjuntamente; 2) todo o material elaborado, antes de divulgado, seria analisado pelas duas equipes. Apesar de todos os esforços, por motivos que realmente não consegui detectar, não houve a integração planejada. O trabalho vai prosseguindo, mas não como era esperado. Os materiais divulgados não estão em sintonia com a proposta curricular e a consequência é certo desanimo do grupo (BRASIL, RJ, 1975, p. 3).

Percebe-se no relato destacado que deveria existir um trabalho conjunto entre as Equipes de Currículo e de Supervisão. Contudo, a falta desse entrosamento havia gerado diferenças entre a proposta elaborada e o material divulgado aos professores e escolas.

Outro aspecto importante destacado no relatório era a dificuldade no treinamento dos professores:

O professor convocado para receber o treinamento nem sempre era aquele que iria atuar nos municípios da implantação. O número de professores treinados era significativo mas, não tinha significação para as necessidades do Estado. Outro fato constatado: uma mesma professora era convocada para idêntico tipo de curso, mais de uma vez. Tentando solucionar esse problema, procuramos a Senhora Chefe do Departamento de Ensino Fundamental, Dr. Wanda Fernandes. Ela prometeu tomar providencias, mas ponderou o seguinte: nem sempre o professor convocado está disponível para participar de cursos; assim sendo, o Departamento abre a possibilidade aos que estão disponíveis. Ela ainda ressaltou o fato econômico: o curso é realizado em Niterói e a bolsa concedida não é suficiente para cobrir as despesas de hospedagem e alimentação; assim, eles preferem não atender à convocação. Para a efetivação do treinamento tentou-se realizá-lo por meio de cursos intensivos nos municípios de implantação. A clientela, ainda assim, não foi atendida. Os professores, em sua maioria, eram substitutos e sua presença nas escolas o inicio dos trabalhos não era garantida (BRASIL, RJ, 1975, p. 4).

O relatório indicava um problema importante, pois além da questão financeira, os cursos ofertados não alcançavam efetivamente os professores que estariam nas escolas para a implementação da reforma. Tal fato, junto com as dificuldades de divulgação da proposta curricular, poderia levar à execução ineficiente do novo currículo.

Em Alagoas, o relatório do CRHJP possuía um tópico denominado Dificuldades encontradas. Nesse item, a assessora apontava uma série de problemas, que abrangiam desde o número reduzido da equipe, a ausência de pessoal com habilitação ou qualificação em avaliação, pesquisa e currículo, o desprestígio da Equipe de Currículo junto à Secretaria dos Negócios da Educação e Cultura (SENEC), até a carência de ambiente físico adequado para o desenvolvimento dos trabalhos, a ausência de pessoal de apoio e a falta de racionalização na elaboração das tarefas (BRASIL, AL, 1975, p. 2).

Por causa dos problemas relatados, a assessora solicitava um aumento do número de membros da Equipe de Currículo para a melhor organização dos trabalhos, além de ressaltar a necessidade de se definir as funções das Equipes de Currículo e de Supervisão na estrutura da SENEC, com o objetivo de dar “apoio e crédito à equipe de currículo” e realizar uma melhor integração entre elas. Como no Rio de Janeiro, questões referentes ao entrosamento entre as duas equipes eram enfatizadas. No âmbito das ações, o relatório indicava a premência de se tratar aspectos dos currículos para Artes Práticas, Língua Estrangeira, Educação Artística, disciplinas novas no currículo, que careciam de mais cuidado e de construção de um projeto de avaliação de sua efetivação.

Por fim, a assessora sistematizava, no tópico conclusões, pontos que precisavam ser melhorados: a Equipe de Currículo da SENEC/AL era constituída por pessoas capazes e qualificadas, mas com uma estrutura de trabalho muito individual, com horários diversificados, o que levava ao desconhecimento das atividades dos colegas; era preciso fomentar a integração entre as Equipes de Currículo e Supervisão; e existia uma ausência de apoio administrativo às Equipes, mesmo após reuniões realizados com o Secretário de Educação. Assim, questões operacionais e de processo de trabalho eram considerados motivo de atenção.

O relatório do Acre expunha os problemas para a organização da Equipe do Currículo, sua dinâmica de trabalho e mesmo atrasos na complementação salarial. A assessora do CRHJP informava sobre a realização de reuniões com o Secretário de Educação para esclarecer o tipo de trabalho da Equipe de Currículo e solicitar “melhor ambiente para a atuação da mesma” (BRASIL, AC, 1975, p. 2). Segundo o descrito, apesar das tentativas de solução, o problema persistia. O desconhecimento do trabalho desenvolvido pela Equipe de Currículo recaía, por exemplo, na insuficiente participação do Acre nos encontros de formação:

No encontro do PREMEN, em 1974, sobre Ciências, estava indicado para representar o Estado um elemento que havia se negado até a fazer a leitura da proposta curricular de matemática. Expliquei ao Sr. Secretário que era assunto de interesses da EC de 1º grau. O Acre não enviou representante (BRASIL, AC, 1975, p. 2).

O documento expunha uma falta de compreensão, ou de interesse, por parte da Secretária de Educação do Acre em participar das discussões sobre a nova organização curricular estabelecida pelo MEC.

A assessora informava também sobre reuniões com a Chefe do Departamento de Ensino de 1º Grau para tratar da necessidade de um melhor ambiente de trabalho para as equipes de Currículo e de Supervisão e a dificuldade de promover um trabalho conjunto entre as Equipes de Currículo de 1º e 2º Graus.

Na descrição das dificuldades, a assessora comunicava sobre problemas financeiros que atrasavam a complementação salarial da Equipe de Currículo e afetavam a divulgação da proposta curricular - que não fora impressa até o ano de 1975 por falta de verba. Segundo o relato, a Equipe de Currículo trabalhava em uma sala improvisada, sem material adequado, contando somente com verba da Secretaria de Educação, “sem contar com verba do Estado, nem para impressão da proposta curricular, pronta desde setembro de 1974” (BRASIL, AC. 1975, p. 6). O ambiente de trabalho era considerado pouco favorável, pois a sala atendia os professores de modo geral, com muita movimentação e conversa. O barulho das máquinas datilográficas e de um mimeografo dificultavam a concentração da equipe, que era considerada pequena e sem especialistas em Ciências, Pesquisa e Avaliação.

O documento do estado do Acre foi um dos poucos que abordou a falta de condições das escolas, consideradas superlotadas para a implantação da reforma: “Não contam com número suficiente de salas de aulas para Educação Geral e nenhuma para Formação Especial” (BRASIL, AC, 1975, p. 6). A assessora informava, ainda, de deserção de professores formados.

O relatório de Goiás era outro que descrevia a ausência de entrosamento entre as equipes de Currículo e Supervisão, observação reforçada pela assessora nos encontros com o Secretário da Educação, momento em que solicitava providencias para a compatibilização dos trabalhos das duas equipes (BRASIL, GO, 1975, p. 5). A assessora comunicava que existia uma defasagem no acompanhamento e avaliação da execução do currículo e no preparo e motivação dos professores para colocar em prática as orientações curriculares: “a Equipe tem se preocupado mais com a elaboração, publicação e divulgação de documentos que vêm sendo enviados a todas as unidades federadas” (BRASIL, GO, 1975, p. 9), mas faltava “um projeto global de acompanhamento, controle e avaliação do currículo, organizado em bases científicas, cujo desenvolvimento poderia levantar dados objetivos que muito ajudaria na compreensão da problemática vigente em relação ao currículo” (BRASIL, GO, 1975, p. 7). A assessora reforçava que era preciso priorizar a elaboração e divulgação da proposta curricular, mas também o controle e análise de sua aplicação nas escolas.

As dificuldades enfrentadas pela Equipe de Currículo no Maranhão centravam-se sobretudo no acompanhamento da execução da proposta curricular, pois faltava uma infraestrutura administrativa que possibilitasse organizar o “fluxo de comunicação entre as unidades escolares e a SEC” (BRASIL, MA, 1975, p. 2). Até o ano de 1974 ainda estava em elaboração o projeto de Acompanhamento, Controle e Avaliação do Currículo, produzido com dificuldade, devido ao “problema criado pela falta de entrosamento com os setores do DEPG” (BRASIL, MA, 1975, p. 4). No item “Assistência prestada”, eram descritas as ações empreendidas para estabelecer estratégias de trabalho entre a equipe de Currículo e o Departamento de Ensino de Primeiro Grau (DEPG). Contudo, a assessoria informava pouco êxito nessa tarefa: “embora tenha havido insistência grande junto às competentes autoridades para que se promovesse união de esforços dos diferentes setores da SEC no trabalho de implantação e implementação do novo currículo, o resultado alcançado foi pequeno” (BRASIL, MA, 1975, p. 3). Os diferentes setores da Secretaria de Educação não dialogavam entre si.

Segundo o relatório, a divulgação de documentos orientadores para implantação do currículo era deficiente e havia uma má utilização da proposta curricular devido a falta de supervisão e desconhecimento da proposta curricular pelos professores (BRASIL, MA, 1975, p. 5). O Serviço de Supervisão ainda estava em fase de organização, o que prejudicava o acompanhamento das 27 escolas selecionadas para implantação no novo currículo.

Nas conclusões, a assessora elogiava o “empenho da Equipe de Currículo em cumprir as metas estabelecidas” (BRASIL, MA, 1975, p. 5) e criticava a não divulgação adequada dos documentos elaborados para implantação e implementação da proposta curricular, o que teria levado ao seu comprometimento:

O problema decorreu da falta de entrosamento entre os setores da SEC, principalmente entre Equipe de Currículo e Departamento de Ensino de 1º grau, que realizou trabalho paralelo e desentrosado (BRASIL, MA, 1975, p. 5).

O DEPG havia encaminhado às escolas um material paralelo ao oficial sobre o currículo. Novamente a assessora avigorava a falta de entrosamento dos diversos setores da Secretaria de Educação para a efetiva implementação do currículo, o que atrapalhava “todo o trabalho que se espera da Equipe de Currículo no processo de implantação do novo currículo de 1º grau” (BRASIL, MA, 1975, p. 6).

Alguns problemas também foram relatados pela assessora da Guanabara, entre eles, a falta de condições de trabalho e o não recebimento da gratificação prevista para a Equipe de Currículo. Outro problema envolvia a divulgação dos “Subsídios para a elaboração do currículo pleno”:

Na operacionalização dos cursos, o conteúdo dos “Subsídios” não era discutido e dois problemas afloraram: 1) o professorado não conhecia os subsídios; 2) como consequência, a equipe não tinha nenhuma evidencia da reação do professorado quanto ao documento que, quase em fase de impressão, seria entregue à gráfica para posterior divulgação. A fim de que o professorado tomasse conhecimento dos “Subsídios”, pelo menos em suas linhas gerais, a solução foi: a própria equipe planejar e executar um curso de treinamento (BRASIL, GB, 1975, p. 2).

O relatório informava que, embora a tentativa do curso de treinamento fosse válida, pois teria alcançado grande número de diretores e supervisores, a divulgação do documento teria ficado limitado ao curso: “os ‘Subsídios’ não chegaram, de fato, às escolas: ficaram no âmbito dos cursos, não sendo estudados, discutidos e usados pelos professores, como um todo” (BRASIL, GB, 1975, p. 2). Destacava-se, assim, o pouco conhecimento por parte dos professores da nova diretriz curricular, o que afetaria sua aplicação nas escolas.

O relatório da Guanabara também pontuava o problema de entrosamento com o grupo encarregado da supervisão, pois era preciso levar às escolas o planejamento da Secretaria de Educação. Em suas conclusões, a assessora relatava o desprestígio da Equipe de Currículo:

O trabalho na Guanabara é desafiante; a equipe muito receptiva, muito leal. Os problemas, os sucessos, os insucessos são colocados com muita clareza, muita honestidade o que facilita em muito o desempenho da Assessora. O único ponto que deve merecer atenção no prosseguimento da Assistência é o relacionado ao aspecto administrativo e ao prestígio da equipe junto aos demais órgãos da Secretaria de Educação e Cultura (BRASIL, GB, 1975, p. 4).

Tal como em outros estados, era destacada a pouca credibilidade da Equipe de Currículo, evidenciada tanto nas carências materiais para a realização das atividades de seus membros, como na divulgação do currículo elaborado.

As dificuldades descritas nos relatórios apresentados possuíam alguns pontos em comum, eram problemas que englobavam a organização das Equipes de Currículo, o número insuficiente de membros, a falta de qualificação em nível superior, o excesso de trabalho, mas também questões que envolviam a ausência de estrutura física adequadas para realizar os trabalhos e o atraso no pagamento das gratificações.

Ainda existiam questões referentes à legitimidade das Equipes de Currículo dentro da estrutura das Secretarias de Educação, demonstrados nos relatos de desprestígios e de pouca clareza sobre suas funções. No Acre a assessora precisou realizar inúmeras reuniões para explicar o trabalho da Equipe de Currículo. Outros relatórios destacavam os desentendimentos com a Equipe de Supervisão, que refletiam na dificuldade de promover um trabalho conjunto entre os dois grupos. Essa situação afetava a divulgação e acompanhamento da implementação dos currículos, seu controle e avaliação, que deveria ser realizado pelo Serviço de Supervisão. A ausência de um trabalho próximo e harmonioso com diversos setores das Secretarias de Educação também eram considerados problemas que impediam a atividades das Equipes de Currículo.

No âmbito da construção das propostas curriculares alguns estados não haviam elaborado, até o ano de 1975, orientações para algumas disciplinas e as diretrizes para a avaliação dos currículos. O relatório do Acre dava ênfase à falta de condições das escolas para implantação da reforma. Já os relatórios de Goiás, Maranhão e da Guanabara destacavam que os professores não conheciam adequadamente as propostas curriculares, em razão, entre outros motivos, da dificuldade de divulgação e de treinamento dos docentes. Nesse sentido, cabe retomar a situação do Rio de Janeiro, onde os professores que realizavam os cursos de formação não atuariam, necessariamente, nas escolas ou municípios de implantação do currículo.

Um último grupo de situações podem ser caracterizados como possíveis resistências às normas federais pelos sujeitos envolvidos com a reforma nos estados, como a falta de disposição da coordenação da Equipe de Currículo do Rio de Janeiro ou a recusa da Secretária de Educação do Acre em enviar um representante para os cursos do PREMEM.

Conclusão

O Centro de Recursos Humanos João Pinheiro exerceu um papel importante no processo de implantação da reforma educacional estabelecida pela Lei n. 5.692/71. Ao ser transferido para o Departamento de Ensino Fundamental do MEC, em 1972, tornou-se responsável pelo acompanhamento e assessoria às Secretarias Estaduais de Educação, por meio de projetos, entre eles o Projeto de acompanhamento da Implantação e Implementação da Lei n. 5.692/71 - Ensino de 1º grau. As fontes analisadas possibilitaram apreender as estratégias estabelecidas para que as Secretaria de Educação viabilizassem as diretrizes curriculares das escolas de 1º Grau.

A assessoria dos técnicos do CRHJP às Secretarias de Educação para efetivação do Subprojeto de Apoio técnico à implantação e implementação do currículo do ensino de 1º grau abarcou a assistência técnica para a elaboração e implementação dos programas curriculares, o desenvolvimento de novas metodologias, constituição de ferramentas para o acompanhamento, controle e avaliação das propostas curriculares e a organização de cursos de formação e atualização de professores. Foi possível perceber uma tentativa, por meio da assessoria do CRHJP, de padronizar o processo de implantação e implementação da reforma e de institucionalização dos currículos de 1º Grau. O Centro cumpria uma função, de certo modo, de inspeção federal para acompanhamento da consolidação da reforma.

Assim, os relatórios das assessoras do CRHJP permitiram identificar as ações dos estados a partir de 1972, que iniciaram os trabalhos por meio da estruturação das Equipes de Currículo e a organização de atividades para a elaboração dos programas curriculares. Para a organização do novo modelo de escola de 1º Grau que se pretendia instituir, era preciso elaborar o currículo, preparar os professores, acompanhar e avaliar sua execução, com atenção especialmente para o sucesso da alfabetização na 1ª série do 1º Grau.

Por outro lado, os relatórios possibilitaram apreender também as resistências e problemas enfrentados. O relatório de Fernando de Noronha indicava a preocupação com a falta de condições das escolas. Algumas Equipes de Currículo tiveram dificuldade para se legitimar no âmbito das Secretarias de Educação e se colocarem como lugar autorizado de produção de discursos e ações sobre os currículos. A falta de articulação entre as diferentes instâncias também dificultava os trabalhos, evidenciados, por exemplo, nos atritos entre as Equipes de Currículo e de Supervisão e na distância entre a elaboração dos currículos, sua divulgação e apreensão pelos professores.

Cabe problematizar, assim, como possíveis táticas de resistência as ações dos sujeitos envolvidos com a implantação da reforma, perceptíveis no desprestígio que algumas Secretarias de Educação atribuíam às Equipes de Currículo, na pouca importância conferida aos cursos do MEC, como os do PREMEM, nos conflitos entre os membros das Equipes de Currículo e de Supervisão, ou nas resistências da coordenação do Rio de Janeiro. Pequenas subversões cotidianas que dificultavam a implantação, sem questionamento, de uma reforma que pretendia alterar profundamente a estrutura educacional existente no país.

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1O artigo integra uma pesquisa mais ampla que tem por objetivo compreender a atuação do Centro de Recursos Humanos João Pinheiro na implantação da reforma do ensino pela Lei n. 5.692/71, com ênfase nas prescrições e estratégias de difusão e efetivação da reforma.

2 Michel de Certeau (1994, p. 93-94) apresenta a estratégia como “o cálculo (ou a manipulação) das relações de forças que se torna possível a partir do momento em que um sujeito de querer e poder (uma empresa, um exército, uma cidade, uma instituição científica) pode ser isolado”. Já a tática é compreendida como “ação calculada que é determinada pela ausência de um próprio”.

3Sobre o conceito de modelo ver: Hansen & Carvalho (1994) e Carvalho (2011).

4Maria Chagas de Carvalho estudou a construção de um modelo escolar paulista no começo do século XX (2000).

5A atual “Escola de Formação e Desenvolvimento Profissional de Educadores de Minas Gerais” conta com oMuseu da Escola Professora Ana Maria Casasanta Peixoto, o Museu de Ciências Naturais Leopoldo Cathoud, além da Biblioteca Bartolomeu Campos de Queirós. Localizado em: https://escoladeformacao.educacao.mg.gov.br/, acesso em: 3/1/2023.

6Provas realizadas como requisito para acesso ao ensino secundário, especificamente o Ginásio.

7As matérias eram Comunicação e Expressão, Estudos Sociais e Ciências.

*Pesquisa financiada pela Pró-reitoria de Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais, edital PRPq - 09/2019.

Recebido: 25 de Setembro de 2021; Aceito: 21 de Abril de 2023

E-mail: jufilgueiras@gmail.com

JULIANA MIRANDA FILGUEIRAS é graduada em História pela USP, com Mestrado e Doutorado em Educação pelo Programa de Estudos Pós-graduados em Educação: História, Política, Sociedade da PUC/SP. Possui Pós-Doutorado em História pela Unifesp. É Professora Adjunta na Universidade Federal de Minas Gerais.

Editora responsável:

Patrícia Weiduschadt

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