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Revista Brasileira de História da Educação

versão impressa ISSN 1519-5902versão On-line ISSN 2238-0094

Rev. Bras. Hist. Educ vol.20  Maringá  2020  Epub 01-Abr-2020

https://doi.org/10.4025/rbhe.v20.2020.e114 

ARTIGO ORIGINAL

Educação, civilização, entretenimento: o Tivoli - um parque de diversão no Rio de Janeiro do século XIX (1846-1848)

Education, civilization, entertainment: the Tivoli - an amusement park in Rio de Janeiro in the 19th century (1846-1848)

Educación, civilización, entretenimiento: el Tivoli - un parque de diversión en Rio de Janeiro del siglo XIX (1846-1848)

Victor Andrade de Melo1  * 
http://orcid.org/0000-0002-1983-1475

1Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.


RESUMO

Resumo: Este artigo tem por objetivo discutir a experiência do Tivoli - as ações dos proprietários e a repercussão de suas iniciativas, com ênfase no que tange aos posicionamentos relativos aos comportamentos públicos, interpretados a partir de uma dupla dimensão: educação para e pelo entretenimento. Trata-se de um dos pioneiros parques de diversão do Rio de Janeiro. Inaugurado em 1846, ocupou um espaço notável na cidade, uma expressão do conjunto de mudanças que marcou a sociedade fluminense em meados do século XIX. Como fontes, optou-se pelo uso de jornais. O intuito da investigação é lançar um olhar distinto para o cotidiano citadino, reconhecendo a relevância das vivências de diversão. Sugere-se que são significativas as instâncias de educação, interessantes temas de pesquisa histórica.

Palavras-chave: história; lazer, modernização social; modernidade

ABSTRACT

Abstract: This article aimed to discuss the experience of Tivoli - the actions of the owners and the repercussions of their initiatives, with emphasis on the positions regarding public behaviour, interpreted from a double dimension: education for and through entertainment. It was one of the pioneers of amusement parks in Rio de Janeiro. Inaugurated in 1846, it occupied a remarkable space in the city, an expression of the set of changes that marked the society of the State of Rio de Janeiro in the 19th century. As sources, we opted for the use of newspapers. The purpose of the investigation is to take a different look at the daily life of the city, recognizing the relevance of the experiences of fun. It is suggested that there are significant instances of education; interesting historical research topics.

Keywords: history; leisure; social modernization; modernity

RESUMEN

Resumen: Este artículo tiene el objetivo de discutir la experiencia de Tivoli - las acciones de los propietarios y la repercusión de sus iniciativas, con énfasis a lo que se refiere a los posicionamientos relativos a los comportamientos públicos, interpretados desde una doble dimensión: educación para y por el entretenimiento. Se trata de uno de los pioneros parques de diversiones de Rio de Janeiro-Brasil. Inaugurado en 1846, ocupó un espacio notable en la ciudad, una expresión del conjunto de cambios que marcaron la sociedad fluminense a mediados del siglo XIX. Como fuentes, optamos por el uso de periódicos. El propósito de la investigación es tener una mirada diferente al cotidiano de la ciudad, reconociendo la relevancia de las experiencias de diversión. Se sugiere que son significativas las instancias de educación, interesantes temas de investigación histórica.

Palabras clave: historia; ocio; modernización social; modernidad

Introdução

Durante mais de duas décadas, entre 1972 e 1995, um parque de diversão foi presença marcante no cotidiano dos cariocas: o Tivoli, instalado à beira da lagoa Rodrigo de Freitas, onde atualmente se encontra o parque dos Patins. O nome fazia referência a um dos primeiros estabelecimentos mundiais dessa natureza, o Tivoli Gardens, inaugurado em 1843, na cidade de Copenhagen, até os dias de hoje em funcionamento.

Investimento de um antigo empresário do entretenimento, Orlando Orfei, proprietário de um famoso circo que levava seu nome1, tinha como rival o parque Shangai, fundado nos anos 1910, a princípio itinerante, desde o final da década de 1960 estabelecido no bairro da Penha, onde se encontra até hoje, um dos mais antigos do Brasil em funcionamento. O Tivoli, todavia, era mais famoso e prestigiado pela população e imprensa, especialmente nos anos 1980, deixando registros na história do Rio de Janeiro.

De fato, muitos parques de diversão deixaram marcas na memória citadina. Assim como ocorreu com o Tivoli, ficaram famosos o Moulin Rouge e a Maison Moderne, ambos de propriedade de Paschoal Segreto2, estabelecimentos que, nos anos iniciais do século XX, foram expressões de um momento em que a região Central do Rio de Janeiro se configurou como uma área notável de lazer e consumo em função das reformas urbanas lideradas por Pereira Passos e Paulo de Frontin3.

Ainda que pouco estudados academicamente, parques de diversão4 são um tema relevante por serem uma expressão dos diferentes momentos das cidades, inclusive no que tange à adoção de comportamentos para o bem portar-se na cena urbana, à valorização de certas noções de beleza, elegância, etiqueta. Ao seu redor, percebe-se a incidência de parâmetros materiais e simbólicos de cada tempo, relacionados à maior ou menor possibilidade de exibição pública e busca de atividades estimulantes, com destaque para a experiência das sensações de vertigem e velocidade (Weber, 1988; Singer, 2001). Questões de gênero e choques com as restrições de natureza religiosa são ocorrências que em diversos cenários cercaram o funcionamento desses estabelecimentos.

Assim como ocorreu em muitos países, no decorrer do século XIX, vários parques de diversão foram criados no Rio de Janeiro. Isso se deu pari passu com a melhor conformação de um mercado de entretenimentos, processo que se relacionou a um conjunto de mudanças do cenário nacional que incidiram diretamente no cotidiano da capital e principal cidade do Brasil, inclusive no que tange a melhorias da infraestrutura urbana. Como sugeriu um cronista, em 1847: “Os divertimentos públicos multiplicam-se, porque o trabalho já é muito, e preciso é dar descanso ao corpo, entretendo a imaginação” (O Mercantil, 1847, p. 3)5.

Em meados da centúria, um maior dinamismo na política e na economia se articularam com a mais intensa difusão de certas intenções culturais - a noção de que o país deveria se ‘civilizar’ a partir da adesão a um conjunto de ideias e comportamentos oriundos do continente europeu, lidos a partir das especificidades nacionais. O Rio de Janeiro se tornou um palco de experiências de modernização (Schwarcz, 1998). Uma das decorrências foi o crescimento e a diversificação dos divertimentos, que se aproveitaram e incentivaram a maior vitalidade da cena pública: bailes e sociedades dançantes, circos, teatros, esportes, clubes recreativos e musicais, jogos diversos (Karls & Melo, 2018).

Nesse cenário, em abril de 1846, a Francisco York & Companhia solicitou à câmara municipal uma licença para instalar um tivoli6 no mesmo terreno do já existente Conservatório de Dança e Música7, localizado numa chácara alugada, situada na rua do Conde (atual Visconde do Rio Branco), de frente para o Campo da Aclamação (Campo de Santana)8. O intuito era organizar bailes e “[...] estabelecer diversos jogos, tendo lugar esses divertimentos das três horas da tarde até a meia noite naqueles dias que lhe convier” (Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, 1832-1869, p. 73). De pronto, deixou-se claro que seriam “[...] proibidos não só jogos de cartas, como outros quaisquer de parada a dinheiro”9. A princípio, pensava-se em oferecer ao público as seguintes diversões: “Disparamento de Flecha, Tiro de Pistola, Dominó, Xadrez, Damas, Galé, Tonô, Pato de Chumbo, Carros Aéreos, Malha, Bola Alemã, dita Italiana, dita Espanhola, dita Russa e Jogos Chineses”.

Alguns dias depois, José Antônio de Menezes Braziel, fiscal da Freguesia de Santana, considerando o disposto no Código de Posturas, informou à câmara que “[...] indo eu examinar o estabelecimento dos Suplicantes, vi que todos os seus jogos me pareciam inocentes, e de muito entretenimento, e que por isso os Suplicantes estão nas circunstâncias de obter a licença que pedem” (Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, 1832-1869, p. 72).

Assim sendo, Félix Martins, notório médico e vereador responsável pela emissão das licenças para estabelecimentos, foi informado que poderia autorizar a abertura do empreendimento. Em poucas semanas, se inaugurou um dos pioneiros parques de diversão do Rio de Janeiro, denominado Tivoli.

Partindo da constatação de que o estabelecimento ocupou um espaço notável na cidade, uma expressão do conjunto de mudanças que marcou a sociedade fluminense em meados do século XIX10, momento importante no forjar material e simbólico da nação (Chalhoub, 2012), este estudo tem por objetivo discutir a experiência do Tivoli, as ações dos proprietários e a repercussão de suas iniciativas, nos seus quase dois anos de funcionamento (de 1846 a 1848, quando mudou de nome e perfil).

Neste artigo, dá-se ênfase no que tange aos posicionamentos relativos aos comportamentos públicos, interpretados a partir de uma dupla dimensão: educação para e pelo entretenimento. Todos deveriam aprender a se portar nos espaços de diversão, na mesma medida em que esses espaços difundiam novas formas de se portar. Dialogamos com a ideia de Silva (2009, p. 17):

[...] apontar para as potenciais contribuições que a visibilidade ocasionada pela esfera pública poderia trazer para o projeto de difusão de atitudes modernas pela população implica atentar para um aspecto primordial: um arranjo circunstancial de acontecimentos cotidianos que, de algum modo, se encarregaria de distribuir os enredos, atribuir e delimitar a importância de cada papel aos habitantes.

Esse autor, tratando do Rio de Janeiro da década de 1920, percebe que uma das dimensões importantes do processo civilizatório, de educação para a adoção de comportamentos julgados modernos, se manifestou ao redor dos entretenimentos, tanto no que tange a sua melhor estruturação quanto no tocante ao estabelecimento de regras rígidas para frequência nos espaços. Segundo seu olhar, “[...] se é possível mencionar o caráter lúdico dessas repartições, não se deve desconsiderar, também, seu caráter educativo, já que nesses espaços havia tanto a oportunidade de brincar e se distrair quanto de aprender a brincar e a se distrair” (Silva, 2009, p. 53).

Sendo mais explícito e esclarecedor, Silva sugere que os espaços de entretenimento são laboratórios sociais nos quais há iniciativas de inculcar hábitos, gerando oportunidades para aprender regras do cotidiano numa cidade que distende seus costumes.

Sublinhar o caráter educativo desses estabelecimentos de diversão alude, de início, ao conjunto de regras que, estrategicamente disposto, objetivava organizar os comportamentos dos frequentadores (formas de entrar, permissões e restrições de circulação, agentes de fiscalização etc.). Mas não só isso. A dimensão educativa também estava presente nas circunstâncias de aprendizagem que não dependiam exclusivamente da atuação direta de mecanismos de controle, pois, da convivência de pessoas em um espaço delimitado, mesmo que estivessem ali para se divertir, certo número de acordos tácitos de sociabilidade passava a ser disposto, cumprido e introjetado (Silva, 2009, p. 53).

Vale a pena também ter em conta a ideia sugerida por Melo (2010, p. 6) a partir do diálogo com E. P. Thompson. Para o autor, é importante considerar os espaços de lazer como fóruns de disputa, nos quais se manifestam iniciativas de enquadramento e controle, mas também de “[...] subjetivação, ressignificação, resistência quando um grupo de indivíduos compartilha um conjunto de posicionamentos contrários a determinado vetor de poder”.

Para alcance do objetivo, como fontes, optou-se pelo uso de jornais. Dois motivos levaram a tal escolha: a carência de outros documentos sobre o Tivoli11; a busca de entender o debate público entabulado ao seu redor. Para análise/intepretação, tivemos em conta o perfil dos periódicos quando se tratou de ponto de vista, sem com isso considerar que havia consonância total dos posicionamentos com as propostas editoriais, até mesmo porque uma parte eram cartas de leitores. Foram também utilizados anúncios do estabelecimento publicados nos mais diversos veículos.

O intuito da investigação foi lançar um olhar distinto para o cotidiano citadino, reconhecendo a importância dos momentos de diversão, aparentemente fortuitos, mas profundamente articulados com os aspectos sociais, políticos, culturais e econômicos do seu tempo. Tais ocasiões são expressões dos limites, distensões e tensões que marcam a experiência pública de um tempo. Sugere-se, como já argumentado, que são significativas instâncias de educação.

Um entretenimento civilizado

Como vimos na introdução, em meados do século XIX, foi crescendo em certos setores da sociedade fluminense a valorização dos divertimentos públicos. Quando o Tivoli foi inaugurado, esse processo ainda dava passos iniciais. Mesmo assim, a denominação não era desconhecida na cidade, sendo encarada como sinônimo de entretenimento.

Além de haver, na época, um conhecido ‘jogo de tivoli’ - não conseguimos saber do que se tratava, aparentemente era uma diversão de tabuleiro -, em 1833, à beira da lagoa Rodrigo de Freitas, foi fundado o Hotel do Tivoli, que se apresentava como uma ‘casa de pasto e hospedaria’ onde se podia passar ‘dias agradáveis’ em função da oferta de “[...] diferentes jogos decentes, como bilhar, bagatela, gamão, xadrez, dama, etc., e um bom piano” (Jornal do Comércio, 1833, p. 4)12.

O anúncio foi publicado em português, francês e inglês, deixando claro que se esperava também atrair os estrangeiros que crescentemente se instalavam na cidade, processo que se iniciara com a chegada da família real portuguesa (1808) e se acentuara depois da independência nacional (1822). Tinha-se em conta um novo perfil de frequentador, aquele que procurava uma hospedagem não só por necessidade de abrigo, mas também como opção de diversão e descanso, à busca de uma quebra de rotina.

Rapidamente, o hotel aperfeiçoou sua oferta de comodidades: comidas e bebidas de qualidade, quartos confortáveis, boa estrutura de diversão integrada à natureza exuberante que o cercava. Não sabemos a causa de ter sido leiloado já em 1834, mas a nova empresa que o adquiriu, liderada por Antonio Henriques Fabrão13, manteve os mesmos princípios, articulando o oferecimento de bem-estar e entretenimento (Jornal do Comércio, 1834). O empresário, contudo, adoeceu e veio a falecer, ocasionando o fim do estabelecimento.

Um novo Hotel Tivoli surgiu em 1838, propriedade do belga Constant Bary14, dessa vez no Caminho Novo de Botafogo (atual rua Marquês de Abrantes). No anúncio, além do conforto das instalações e a qualidade das refeições, destacou-se que eram disponibilizadas “[...] salas separadas para qualquer partida” (Jornal do Comércio, 1838, p. 4)15. Seguiu o intuito de ser também um espaço de divertimento.

Na verdade, a cidade já dispunha de espaços públicos de entretenimentos desde o século XVIII, quando se destacavam, além de cafés e bilhares (Algranti, 2011), as casas que ofereciam o jogo da bola, bem como as touradas organizadas em situações festivas, algo que seguiu usual nos anos iniciais do século XIX, especialmente as que tiveram lugar no Campo de Santana (Melo, 2013).

Já no imediato pós-independência, destacaram-se os circos (Silva, 2007; Peres & Melo, 2014) e, a partir da transição dos anos 1830 -1840, as sociedades dançantes (Melo, 2014; Melo, 2016). Tanto no período colonial quanto no pós-colonial, o teatro ocupou lugar de importância, especialmente a Ópera Nova (Cavalcanti, 2004) e o Real Teatro São João, criado em 1813, depois renomeado para São Pedro de Alcântara (Dias, 2012).

Assim sendo, os proprietários do Tivoli contavam com o fato de que a população já conhecia e demonstrava disposição para frequentar espaços públicos de diversão. Havia também mais dinheiro circulando (Paula, 2012) e novos estratos sociais em delineamento (Popinigis, 2007), ocorrências fundamentais no que tange à manutenção das iniciativas do mercado de entretenimento.

Quem eram os protagonistas da iniciativa? Como vimos, um dos proprietários era o italiano Francisco York, um coreógrafo e bailarino que ficou famoso por suas atuações nos teatros, bem como por ser mestre de dança. Foi também um dos donos de uma arena de touradas situada na rua do Lavradio, ativa entre os anos de 1847 e 1852. Perceba-se como o personagem articulava várias funções/esferas: o mundo docente, o cenário do espetáculo, o papel de empreendedor.

Perfil semelhante tinha outro proprietário, José De-Vecchy, também bailarino, coreógrafo e mestre de dança renomado. Artista que atuou com frequência nos teatros da cidade, chegou a receber o título de ‘Cavalheiro da Imperial Ordem da Rosa’ por ter sido professor da família imperial. Mais ainda, notabilizou-se como empresário teatral, levando peças para vários Estados brasileiros, bem como trazendo companhias europeias para no país se apresentarem.

Havia ainda um terceiro sócio, o português naturalizado João Luiz Pimenta, proprietário de uma fábrica de velas localizada na Rua da Prainha. Seu envolvimento com a iniciativa parece mais curioso. Talvez tenha vislumbrado uma oportunidade de investir algum capital ou ser mais aceito na sociedade fluminense. Ficou mais diretamente responsável pela administração financeira do Tivoli.

Em 1847, Pimenta se desligou da empresa. Em seu lugar na sociedade entrou Antônio José Godinho, militar de origem portuguesa que desempenhou algumas funções importantes na Corte, associado de York na arena de touradas da rua do Lavradio. Tornou-se um conhecido empresário de entretenimentos.

O Campo de Santana (na época denominado Campo ou praça da Aclamação), local onde se situava o Tivoli, era, desde o período colonial, um dos mais importantes logradouros do Rio de Janeiro (Segawa, 1996) (Mapa 1). No século XIX, destacou-se por ser o centro administrativo da cidade, bem como palco de notáveis celebrações públicas.

Na verdade, no Campo de Santana se cruzavam os mundos dos negócios, da política, do entretenimento. Entre as instalações de diversão que por lá se construíram, podemos destacar uma arena que acolheu, em 1818, eventos comemorativos da família real portuguesa e, posteriormente, exibições da Companhia Inglesa de Cavalinhos, uma das primeiras a aportar no Rio de Janeiro, liderada pelo britânico Guilherme Southby (Peres & Melo, 2014). Desde o século XVIII, era lugar de muitas festividades, inclusive as importantes festas do divino (Abreu, 1999). Vale ainda considerar que se encontrava na Freguesia de Santana, a mais populosa da cidade nos anos 1840 (Pinto, 2007).

Fonte: Guia e Plano da cidade do Rio de Janeiro (1858).

Mapa 1.  Área do Centro do Rio de Janeiro onde se encontrava o Tivoli. 

Em laranja se destaca o local do Tivoli. Em vermelho, o Campo de Santana/Campo da Aclamação. Em verde, a praça da Constituição (atual praça Tiradentes). Em azul, o Passeio Público. Em lilás, o Largo do Paço (atual Praça XV). O Tivoli funcionava aos domingos e feriados, de 16h às 24h.

Tinha-se em conta que nesses dias havia maior possibilidade de atrair público, num momento em que a jornada de trabalho não estava ainda regulamentada (Popinigis, 2007). Não conseguimos nenhuma evidência explícita, mas é possível também que o horário tivesse em conta os serviços religiosos tradicionalmente realizados nos domingos de manhã. Vale lembrar que outras diversões tiveram que enfrentar conflitos dessa natureza (Peres & Melo, 2014). De outro lado, algumas categorias de trabalhadores usaram o argumento para não trabalharem nos dias santos (Popinigis, 2007).

A entrada custava 1$000 com direito a usufruto de todas atrações, pagando-se somente a parte o arco e flecha, tiro de pistola, jogo do chinês e cavalinho. Instituiu-se também uma assinatura: 25 bilhetes por 16$000 (Jornal do Comércio, 1846a). A ideia veiculada é que se poderia ter diversão múltipla por um custo razoável: Peres e Melo (2014) já identificaram que esse se tratava de um valor de ingresso usual nos divertimentos oferecidos em meados do século XIX.

Nos jardins sempre cuidados, arborizados e iluminados, sinais de que os proprietários buscavam apresentar o Tivoli como um espaço moderno e civilizado, havia espaços para diversões diversas e um pavilhão no meio do terreno, que servia como salão de bailes. Os frequentadores poderiam caminhar ou descansar; assistir a apresentações musicais, dramatúrgicas ou coreográficas16; dançar e participar de jogos populares à época: da bola (alemão e americano), tonô, galé, xadrez, dama, gamão, dominó, cavalinhos, pato de chumbo, senquilho, chinês, arco e flecha, tiro de pistola, entre outros. Eram usuais exibições de fogos de artifício. Para atender o público, havia também um “[...] botequim com bebidas e manjares” (Jornal do Comércio, 1846b, p. 4).

Os empresários apostaram que a dinâmica do espaço atrairia bom público, ávido pelas novidades. Em seus anúncios, procuravam apresentar detalhadamente o estabelecimento, traçar um mapa das atrações, enfatizando o que consideravam pontos positivos: beleza, conforto e diversidade de entretenimentos. Sugeriam que o Tivoli era um contributo e um sinal de progresso da sociedade fluminense.

É possível perceber que público esperavam receber os empresários. Não desejavam apenas os mais ricos, membros das elites. Esses também eram aguardados, mas tinha-se em conta atrair pessoas de estratos médios que já melhor se delineavam na cidade, um processo que, de fato, se iniciara no século XVIII e ficaria mais explícito na segunda metade do século XIX (Popinigs, 2007).

Nem todos eram bem-vindos. Se o preço de entrada apontava uma abertura para um maior espectro de público, a exigência de certas roupas e comportamentos estabelecia limites. Muitos não dispunham dessas condições materiais e simbólicas. Por vezes, explicitamente se anunciou que “[...] os criados e escravos que vierem com famílias só poderão entrar com bilhete, mas não podem estar no pavilhão” (Diário do Rio de Janeiro, 1846a, p. 4)17.

Uma questão relacionada a essas preocupações com a ‘decência’ era a maior presença de mulheres na cena pública, algo que dava seus primeiros passos, tendo as sociedades de dança como uma importante causa e consequência de mudança. A já citada valorização dessa prática naquele momento foi algo que incentivou sua maior presença social, também, todavia, ampliando o número de inquietações com esse novo trânsito pela cidade.

Embora marcado por distensões de costumes, no Tivoli havia limites de comportamento a serem aprendidos e respeitados, uma exigência que marcou fortemente todos entretenimentos públicos. Para garantir que não se tratava de um recinto de jogos de azar - as apostas eram proibidas -, mas um ambiente civilizado e digno de ser frequentado por ‘famílias e pessoas honestas’ (como usualmente se enfatizava nos anúncios), regras rigorosas deveriam ser observadas. Por exemplo, no salão, era proibido fumar, entrar de chapéu ou jaqueta, dançar com bengala. Reservava-se o direito de se retirar do estabelecimento aqueles que adotassem posturas julgadas indecentes ou inadequadas (Diário do Rio de Janeiro, 1846a).

A inauguração parece ter superado as expectativas, extrapolando mesmo a capacidade do estabelecimento. Em mais de uma ocasião, a propósito, observou-se que a chácara seria pequena para acolher “[...] o povo que ali concorre [...]”, “[...] as famílias distintas da capital [...]” que encontrariam “[...] por cômoda quantia um belo divertimento” (Jornal do Comércio, 1846c, p. 2). Os empresários, ao agradecerem publicamente a acolhida do público, não deixavam de prometer esmero para aperfeiçoar ainda mais a iniciativa. O desafio era seguir atraindo frequentadores.

Ao contrário do período colonial, quando os festejos públicos, ligados a datas religiosas ou importantes para o Estado, eram patrocinados pelo governo ou por gente de posses (Melo, 2013), com a gestação de um mercado de entretenimentos, os empresários tinham que disputar os frequentadores, condição sine qua non para a manutenção do negócio. Deve-se ter em conta que, em meados do século XIX, a população do Rio de Janeiro não era tão grande, mesmo que fosse a maior cidade brasileira: pouco mais de 265.000 habitantes, quase metade de escravos e cerca de ¼ vivendo na região suburbana (Benchimol, 1992).

Além de conforto e garantia de que era civilizado o estabelecimento, uma programação variada era uma necessidade. No Tivoli, uma das estratégias adotadas foi oferecer novos jogos, mas a principal era mesmo a apresentação de diferenciados programas artísticos. Atrações constantes foram mágicos e ilusionistas, artistas que sempre lograram grande sucesso na cidade. Êxito ainda maior tiveram as companhias de ‘ginásticos’, responsáveis por performances de força, equilíbrio, flexibilidade, habilidade com cavalos.

De fato, esses espetáculos acrobáticos eram bem conhecidos e apreciados pela população do Rio de Janeiro, num momento em que o circo era, como vimos, uma das principais atividades de entretenimento da cidade. O notório Circo Olímpico chegou a ter funções promovidas nas instalações do Tivoli, atraindo grande público.

Há que se ter em conta que, àquela altura, já se enfrentavam representações sobre a ginástica, as advindas do campo da medicina e as do mundo espetáculo. Concretamente, contudo, ambas se cruzavam e forjavam uma nova sensibilidade pública para as exibições corporais (Peres & Melo, 2014).

Os entretenimentos, mesmo que criticados por algumas lideranças intelectuais, se constituíram em importantes fóruns de difusão de novas formas de usar o corpo que estariam de acordo com a ideia de progresso do país, inclusive no tocante aos novos cuidados com a saúde, algo que começou a melhor se delinear com o crescimento de preocupações higienistas (Sampaio, 2001; Chalhoub et al., 2003).

Um leitor, a propósito, sugeriu que os ‘assaltos de armas’, disputas de esgrima, outra atração usual no Tivoli, poderiam contribuir para difundir uma prática que, a seu ver, “[...] melhor do que a dança, pode concorrer para amenizar as maneiras, dar vigor ao corpo e proporcioná-lo melhor” (Jornal do Comércio, 1846d, p. 6). Os protagonistas foram dois introdutores desse esporte no Brasil, Frederico Hoppe e Pedro Orlandini, mestres que atuavam em notórios colégios civis e militares, bem como eram proprietários de salas particulares onde ensinavam a modalidade.

Perceba-se como no âmbito do entretenimento se cruzavam várias esferas da cidade, inclusive uma, a princípio, pouco afeita ao arranjo do espetáculo público, o cenário escolar que, em geral, estabelecia uma oposição com o mundo da rua (Gondra & Schueller, 2008).

Uma das atividades que mais logrou sucesso foi o baile dos mascarados, organizado pela primeira vez em junho de 1846. No Rio de Janeiro, bailes de carnaval eram promovidos desde os anos 1820, tornando-se ainda mais notáveis na década seguinte. Clara Delmastro, cantora lírica, foi a introdutora dos eventos com máscaras na cidade (Scarinci & Abrantes Junior, 2016).

Os bailes do Tivoli, todavia, eram ‘fora de época’ (não no carnaval), bem como em espaço aberto (não num teatro, como era usual), o que exigiu dos empresários grande esforço para conseguir a autorização do governo, cioso de manter o controle sobre as atividades e os comportamentos públicos.

Num dos documentos em que se discutiu a concessão da licença, Luiz Fortunato de Brito Abreu Souza Menezes, secretário da polícia da Corte, advogado de grande renome e atuação política e jurídica (foi juiz e desembargador), sugeriu que autorizara e cooperara “[...] para que no Carnaval houvesse bailes mascarados [...] a fim de não só facilitar um divertimento ao público, mas ainda para substituir o jogo do entrudo propriamente dito, donde resultam tantos inconvenientes” (Arquivo Nacional, 1846). Todavia, ponderou que fora do carnaval esses eventos não eram adequados: “[...] os considero prejudiciais por muitas razões, abrindo o vasto campo para despesas imoderadas, violações dos Regulamentos Policiais, facilidade de perpetração de crimes, que tudo é contratado somente pelo lucro de um, ou outro particular cujas vistas vão a ganância”.

Para conseguir autorização, os empresários procuraram garantir ao máximo que os eventos seriam marcados pela decência e harmonia. Para atender as exigências governamentais e das famílias, assegurava-se que não seria ferida a ordem pública, tampouco os valores domésticos, sendo todos exortados a adotar comportamentos comedidos. Uma vez mais destacavam-se as preocupações com a participação de mulheres.

A preocupação com as posturas foi de tal ordem que os empresários fizeram circular nos jornais as ‘Instruções Policiais para os Bailes do Tivoli’, um conjunto bem rigoroso de regras que estabeleciam limites de comportamentos a serem adotados no salão, bem como de uso de fantasias e máscaras, que não poderiam ser “[...] injuriosas ao governo, a qualquer cidadão nacional ou estrangeiro ou ofensivas da moral e dos bons costumes” (Jornal do Comércio, 1846e, p. 4)18.

Tratava-se de uma determinação da secretaria de polícia da Corte. Os empresários, contudo, foram além e publicaram outra série de rígidos procedimentos a serem controlados por fiscais do estabelecimento, tudo a fim de “[...] conservar-se a decência e boa ordem” (Diário do Rio de Janeiro, 1846b, p. 4).

O resultado não poderia ter sido melhor para o Tivoli. Além da grande presença de público, muitos foram os elogios à organização e aos bons modos dos frequentadores. Os nomes de York e De-Vecchi foram exaltados, considerados como exemplos de empresários que não se prestavam à charlatanice, mas a dar contribuições para o progresso da sociedade fluminense. Tornaram-se ainda mais celebrados quando organizaram um festejo para comemorar o aniversário de Pedro II, ocasião que contou com a participação de alguns influentes membros do governo, entre os quais ministros (Jornal do Comércio, 1846g, p. 2)19.

Com tanta ligação com a dança - em função da origem profissional dos empresários, da programação do Tivoli, da articulação com o Conservatório e da promoção dos bailes de mascarados, não surpreende que se tenha entabulado uma aproximação com as sociedades dançantes, agremiações tão em voga naqueles meados do século (Melo, 2014, 2016).

Isso se tornou claro em outubro de 1846, quando a Sociedade Recreação Campestre foi fundada e se instalou no parque, por lá organizando suas atividades durante alguns anos. Vale destacar que era usual que essas agremiações, para além da promoção de bailes, também oferecessem aulas de dança nas quais sempre se ensinavam regras de etiqueta até mesmo em função da nova proximidade corporal entre homens e mulheres.

A despeito de todas ações, uma das dificuldades encontradas para a manutenção do estabelecimento foi a questão financeira. Mesmo com o interesse do público, que foi se reduzindo no decorrer do tempo, eram altas as despesas com o Tivoli e o Conservatório, que na prática funcionavam em conjunto. Os empresários constantemente reclamavam de não conseguir o necessário para dar sequência às iniciativas.

Uma última estratégia que adotaram para sanar o problema foi transformar o antigo pavilhão num pequeno teatro que, a princípio, acolhia apresentações dos próprios alunos do Conservatório, como já era usual na programação do Tivoli. Logo outras companhias por lá exibiram suas produções, chegando o teatro a ocupar espaço de certa importância na cidade, palco de algumas inovações dramatúrgicas (Dias, 2012).

Uma vez mais, o Tivoli foi elogiado pela imprensa, dessa vez por suas colaborações à preparação de novos artistas para a cidade. Trata-se da já citada a articulação entre estratégias de formação e o mundo do espetáculo e do entretenimento. Para um cronista, era mais um motivo para que o governo investisse e apoiasse a iniciativa de York e De-Vecchi (Jornal do Comércio, 1847b), algo que não chegou a acontecer.

A essa altura, o Tivoli quase já não mais aparecia como um estabelecimento de diversões diversas, parecendo ter mesmo assumido centralmente a identidade de um teatro. Um bom exemplo é seu anúncio da função de 9 de maio de 1847, onde se destacou a peça ‘Arthur ou depois de 16 anos’. Somente no final citou-se brevemente as atividades que antes eram o cerne de seu funcionamento: “Todos os jogos acham-se preparados e à disposição dos amadores” (Diário do Rio de Janeiro, 1847, p. 3).

Em 1848, não foi mais possível manter aberto o Tivoli em função de um conflito com a dona do terreno, D. Senhorinha de Moraes Rocha20, por falta de pagamento do aluguel. A proprietária acabou por conseguir judicialmente que fossem leiloados alguns bens de York em função das dívidas (Correio Mercantil, 1848)21. O empresário ainda tentou seguir com a iniciativa, mas teve que enfrentar outra discordância com seu sócio Antônio José Godinho. Ambos tiveram também problemas por um empréstimo tomado junto a José Martins Pena. O estabelecimento foi penhorado não só para ele como para outros credores (Arquivo Geral do Rio de Janeiro, 1848).

York não desistiu de envolver-se com o campo do entretenimento. Transferiu sua equipe de dançarinos e atores para o Salão da Floresta22, do qual se tornaria proprietário em 1854. Enquanto isso, Godinho assumiu a antiga propriedade e renomeou o estabelecimento para Paraíso, sempre, contudo, apresentado como ‘antigo Tivoli’ (Correio Mercantil, 1849), outro indício de que, mesmo com poucos anos de funcionamento, gozou de algum reconhecimento público.

Inaugurado em 1849, o Paraíso apresentou uma sensível mudança de perfil: um investimento maior nos bailes e atividades de dança e música. Reformas foram feitas para habilitar ainda mais o espaço a essa função, inclusive com o intuito de que sociedades dançantes o alugassem para promover suas atividades. A Sociedade Recreação Campestre fez a opção de manter-se por lá instalada. Outras agremiações na nova casa também organizaram eventos, como foi o caso da Sociedade Recreio dos Militares. De toda forma, o empresário não abandonou a ideia de que se articulassem iniciativas de formação com o campo do entretenimento, a seu ver uma prova de que seguia sendo um estabelecimento civilizado que poderia contribuir com o progresso da sociedade fluminense23.

Um frequentador celebrou a nova fase sem deixar de lamentar o fim do Tivoli, para ele um estabelecimento que dignificou a cidade: “[...] não sabemos porque fatalidade, toda empresa que promete algum divertimento à mocidade deste belo país, morre sempre em embrião” (Jornal do Comércio, 1849, p. 2). No seu olhar, isso ocorria pelo desinteresse do público e dos órgãos governamentais que deveriam apoiar as iniciativas.

Ao chamar a atenção para esses aspectos, tinha em conta exaltar as qualidades do novo Paraíso para que não tivesse o mesmo fim do Tivoli. De toda forma, o nome do velho parque ainda ecoaria por muitos anos.

Debates públicos

Como a sociedade fluminense encarou o Tivoli? Nos jornais, percebe-se que houve alguns posicionamentos entusiasmados, como o de um cronista que o considerou como um contributo para combater a monotonia da cidade:

Quando o povo estava, para assim dizer, ávido de divertimentos, em uma capital como esta que, a não ser o teatro, que não se pode estender a todas as massas da população, nenhum outro possui, não era possível deixar de ser bem aceita e aplaudida a abertura do Tivoli. Ao menos dissipar-se-á de algum modo a carregada nuvem de tristeza que enlutava em sua máxima parte a população que não encontrava um passatempo lícito nos dias em que se podia entregar a alguns desses folguedos que suavizam a existência (O Social, 1846, p. 4)24.

Nem todos, contudo, foram tão eufóricos. Um exemplo é a surpresa de um cronista, uma expressão de que havia certas suspeitas acerca do seu modus operandis: “[...] a sociedade que passeava e jogava no Tivoli era muito mais escolhida do que tínhamos suposto. Encontramos muitas famílias honestas e o número das senhoras era maior do que se deveria pressupor” (Jornal do Comércio, 1846h, p. 3). Perceba-se, uma vez mais, como eram fulcrais as preocupações com o comparecimento e envolvimento das mulheres com iniciativas de entretenimento público.

Frente às desconfianças, alguém que assinou como “[...] amigo do progresso dos estabelecimentos” (Jornal do Comércio, 1846i, p. 1), perguntou: “E porque razão não poderia uma cidade como o Rio de Janeiro desenvolver no seu seio os germes da civilização europeia?”. Para ele, os empresários tiveram “[...] a feliz lembrança de unir o agradável ao útil, acrescentando ao seu conservatório de dança um tivoli ou jardim de recreação, segundo o sistema europeu”.

A seu ver, a iniciativa nada devia ao que existia no velho continente, uma “[...] centralização de todos os divertimentos e recreios [...], o gozo simultâneo de todos os prazeres de gêneros diferentes”. Era um estabelecimento de bom gosto e beleza, acessível para um grande número de pessoas.

Outro leitor que assinou como ‘amigo do que é bom’ - não dificilmente também uma estratégia de divulgação dos próprios empresários, enfatizou pontos de vista semelhantes, destacando a ideia de que o Tivoli não fora construído somente por interesses particulares, mas tendo em conta o “[...] benfazejo público desta capital” (Jornal do Comércio, 1846j, p. 5). Tratava-se de um ‘decente entretenimento’, marcado pelo conforto e adequação das instalações. Para ele, o fato de estar localizado no Campo de Santana facilitava o acesso ao maior número de interessados.

Os argumentos apontam a dupla dimensão que neste artigo estamos trabalhando: a experiência do Tivoli indicava a necessidade de educar o povo para os novos entretenimentos na mesma medida em que se constituía em artefato de educação para novos comportamentos públicos.

Percebe-se, de fato, o que era mobilizado pelos proprietários: não era uma mera diversão, mas inspirado naquilo que se passava no continente europeu, um contributo para o processo civilizacional da jovem nação que, desde a ascensão de Pedro II, dava passos mais seguros no sentido de forjar uma identidade e se estabelecer como ente independente.

Além das desconfianças, houve algumas críticas pontuais ao modo de funcionamento. Esse foi o caso do cronista de Sentinela da Monarquia. De pronto, reconheceu que a iniciativa foi muito aplaudida pelos periódicos. Ele próprio considerou importante oferecer à população “[...] um passatempo honesto e variadamente agradável” (Sentinela da Monarquia, 1846a, p. 4)25. Todavia, ponderou que o local do estabelecimento era muito distante, sugerindo que fosse instalado no mais central Passeio Público.

Além disso, a seu ver, a iluminação precisava ser melhorada, especialmente no pavilhão. O preço lhe parecia caro tendo em vista o tamanho das famílias. Por fim, criticou certas restrições a criados e escravos acompanhantes, que deveriam ser aceitos se adequadamente trajados: “[...] em reuniões tais, distinções de classe são odiosas”.

Em outras ocasiões, as críticas foram dirigidas ao espaço reduzido, ao excesso de filas nos jogos, à capacidade da banda de música, ao procedimento dos bailarinos, à baixa qualidade dos fogos, entre outros. Tais posicionamentos são uma expressão de uma sociedade que progressivamente tornava-se ativa. Conhecedora das alternativas de entretenimento, bem como de sua importância no que tange à manutenção das iniciativas, reivindicava com maior frequência, fazendo sua voz ecoar pelos jornais, relevante espaço de debate público.

Para fazer frente às críticas recebidas, além de mudanças possíveis na dinâmica de funcionamento, os empresários constantemente divulgavam as regras de procedimento, algumas vezes de forma muito impositiva, como vimos no caso dos bailes dos mascarados. Isso também incomodou alguns frequentadores. Um leitor que assinou como X se mostrou bastante indignado com tal ação, para ele uma tentativa infundada de dar ao Tivoli “[...] foros de Cassino Fluminense” (Sentinela da Monarquia, 1846b, p. 1)26, algo que não coadunaria com a “[...] índole do divertimento e com a liberdade que é costume e deve encontrar-se em tais lugares”. A seu olhar, “[...] à força de quererem dar importância a seu Tivoli, hão de afugentar de lá muita gente, cuja concorrência o abrilhantaria”.

Perceba-se como se negociavam intensamente os limites de ocupação da cena urbana numa sociedade em plena mudança. Entre aqueles que se posicionaram publicamente, havia acordo de que não podia haver balbúrdia, a ordem deveria ser mantida. Todavia, para alguns, dever-se-ia ser o mais rigoroso possível, enquanto, para outros, os excessos de normas maculariam os intuitos dos estabelecimentos de entretenimento. O fato é que as iniciativas de diversão, no passado como nos dias de hoje, são bastante suscetíveis a tais debates, expressão das tensões de diferentes momentos históricos.

Uma questão central que se apresentou nos debates é que não se poderia confundir os entretenimentos civilizados com certos divertimentos populares que estavam a ser perseguidos, inclusive conforme previsto nos códigos de postura (Soares, 2007)27. Havia mesmo a compreensão corrente acerca da importância de se oferecer ‘divertimentos adequados’ à população. Como sugeriu um cronista: “[...] se o povo se divertir, não se ocupará tanto em política, em intrigas, em cabalas, e já não haverá tanta desmoralização” (Jornal do Comércio, 1846k, p. 3).

Assim sendo, havia algo que sempre era enfatizado: a necessidade de educação para o bom uso dessas atividades públicas. Esse tipo de preocupação se manifestou em vários aspectos que cercavam os entretenimentos, inclusive no tocante as novas possibilidades de encontros entre homens e mulheres.

Muitas famílias seguiam não vendo com bons olhos a participação feminina em atividades públicas. Todavia, já havia avanços em algumas esferas, inclusive no âmbito das diversões, nesse caso especialmente em função da vitalidade das sociedades dançantes (Melo, 2014; Melo, 2016). De toda forma, tratava-se de um processo de educação dos comportamentos, necessário para que indivíduos de ambos os sexos compartilhassem a cena pública, longe da segurança e controle do lar. Nesse sentido, sobre a importância do Tivoli, sugeriu um leitor: “[...] quando mais não seja, serve para desenvolver a mocidade, e ensiná-la a frequentar reuniões de salão, pois muitos há que não sabem entrar em uma sala, nem como ter os braços, nem enfim que postura tomar” (Jornal do Comércio, 1846l, p. 3).

Esses debates se manifestavam intensamente no que tange aos bailes de mascarados, considerados uma alternativa adequada, à moda europeia, para substituir as práticas do entrudo que crescentemente incomodaram determinados setores da sociedade, ainda que apreciadas por muita gente (Scarinci & Abrantes Junior, 2016).

Para um cronista que assinou como Aristophanes, enquanto o entrudo era um mal para a saúde e moral, nos bailes de mascarados, “[...] pelo contrário, só se vê o faiscar elétrico do espírito, o alardear da delicada erudição literária e os namorados requebros da mocidade” (Sentinela da Monarquia, 1847, p. 4). Era clara a inspiração de certas representações acerca do que se passava na Europa nesse processo de adoção de comportamentos julgados corretos.

A despeito de encher de elogios tais bailes, o mesmo cronista ponderou que o Tivoli não era o estabelecimento mais adequado para sediá-los, críticas dirigidas ao espaço restrito e à ausência de camarotes que permitiam a famílias manterem-se mais afastadas. O periodista tinha em conta a estrutura dos teatros que ofereciam o festejo, entre os quais o celebrado Teatro São Francisco.

Perceba-se como era difícil para o Tivoli competir com outros empreendimentos, ainda que, em linhas gerais, fosse muito elogiado e considerado como exemplo de divertimento civilizado, contributo e sinal de que progredia a sociedade fluminense. Entende-se, nesse sentido, os já citados problemas financeiros que enfrentou.

O Paraíso teve em conta exatamente a necessidade de ajuste financeiro, por isso investiu mais na promoção de bailes, que atraíam mais frequentadores e davam lucros maiores. Aproveitou que o Teatro São Pedro se incendiara28, reduzindo-se os espaços disponíveis para a promoção de eventos dançantes. Continuou atraindo a atenção e sendo elogiado pelas potenciais contribuições que poderia dar no sentido de ‘civilizar’ a cidade, de a ‘europeizar’. Alguns chegaram a, pelos jornais, solicitar que Godinho fizesse mais esforços no sentido de acolher maior e mais diversificado público.

A nova casa, na verdade, aproveitava e aperfeiçoava uma iniciativa do velho Tivoli, que, como vimos, durante muitos anos continuou sendo lembrado.

Considerações finais

Em 1854, surgiu nos jornais a notícia de inauguração, no mesmo Campo de Santana, de um novo Tivoli, bem semelhante ao que funcionou entre 1846 e 1848. Propriedade da Sociedade Empreendedora, tinha uma entrada bem barata (320 réis para homens, 160 para mulheres), sendo, todavia, pagos todos os jogos oferecidos (O Globo, 1854)29. Além disso, danças e fogos de artifício compunham a rotina do estabelecimento.

Assim como outros empreendimentos de entretenimento, o novo Tivoli diversificou a programação com apresentações artísticas, festas e atrações diversas. Uma das novidades que merece registro foi a oferta de um cosmorama30. Essa diversão é um elo com os parques atuais, cujo modelo começou a melhor se sistematizar na virada dos séculos XIX e XX, marcado por intenso uso da tecnologia31.

Outro diferencial interessante foi apresentar alguns jogos como exercícios físicos que fazem bem à saúde, sinal da conexão mais intensa com as preocupações com um assunto que acabou por envolver todos os espaços citadinos (Sampaio, 2001; Chalhoub et al., 2003), inclusive aqueles ligados ao entretenimento.

A Diretoria do Tivoli, conhecendo o quanto é útil para a saúde o exercício do Jogo da Bola, e do Chinquilho, recomendados com especialidade entre todos os jogos ginásticos pelos mais abalizados autores que tem escrito sobre o importante assunto de higiene pública, e penhorada, além disso, a mesma diretoria, pelo benigno acolhimento que o Tivoli tem tido a ventura de merecer do ilustrado público desta cidade, resolveu pôr estes dois jogos grátis, para mais comodidade dos amadores de tão saudável exercício (O Globo, 1855, p. 4).

Em mais de uma ocasião, registrou-se o grande público que compareceu ao Tivoli, destacando-se a grande presença feminina. A iniciativa, contudo, não fugiu ao usual, fechando as portas poucos anos depois32. Deve-se ter em conta que, a essa altura, já havia mais entretenimentos organizados, inclusive um que guardava similaridades com os parques de diversão, as fábricas de cerveja que se instalaram na rua de Matacavalos e na rua da Guarda Velha (Karls & Melo, 2018).

Esse quadro de diversificação iria se acentuar no decorrer do tempo. Cada vez mais surgiriam parques de diversão, sempre apresentando novas atrações. Houve, contudo, alguns estabelecimentos que deram origem a esse costume. O Tivoli foi um deles, um dos que deixou marcas na cidade.

Quando surgiu em 1846, ainda não era tão grande o número de diversões. A cidade ainda se recuperava do difícil período pós-independência, quando houve muitos problemas políticos e econômicos. A ascensão de Pedro II ao trono ajudou a forjar uma estabilidade importante para que passos fossem dados no sentido de consolidar a nação. Os movimentos de modernização começaram a ser entabulados mais amiúde. A nova dinâmica de entretenimento é uma decorrência e contributo a esse processo.

Não surpreende que a dança tenha sido uma das principais atrações, bem como que mestres tenham protagonizado a iniciativa. Tratava-se não só de um dos principais divertimentos à época, como o primeiro a ser organizar na forma agremiativa, gestando-se ao seu redor um mercado. Nele, usualmente, se cruzavam o âmbito do ensino e do espetáculo. O mundo do entretenimento, em vários sentidos, deve ser encarado como um espaço de educação a partir da dupla dimensão que procuramos destacar.

Como ocorria com a dança, ao redor das atividades do Tivoli houve muitas negociações e preocupações no que tange aos limites de uso público da cidade, bem como aos comportamentos a serem adotados fora das residências. Em especial, preocupava a maior presença das mulheres, algo que ‘desiquilibrava’ a economia dos desejos, desencadeando tensões quanto aos papéis que todos deveriam desempenhar na cena urbana. Em linhas gerais, dever-se-ia aprender novas posturas para que não se maculasse a ideia de civilização e progresso que marcava essas iniciativas de diversão.

O estudo do Tivoli, portanto, não é só interessante por nos permitir discutir a história da cidade a partir de uma vivência cotidiana de diversão, uma entrada de investigação tão importante quanto qualquer outra, mas também porque nos apresenta uma alternativa de perceber no cotidiano da população como se manifestavam grandes temas que diziam respeito à economia, política e cultura.

Nesse sentido, o mundo do entretenimento, também porque é uma relevante instância de formação, apresenta para a história da educação boas alternativas e perspectivas de pesquisa.

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1A família Orfei, de origem italiana, estava envolvida com o circo desde os anos 1820. Artista múltiplo, foi um dos grandes nomes do circo brasileiro e mundial na segunda metade do século XX. Morreu no ano de 2015, com 95 anos.

2A família Segreto, de origem italiana, chegou ao Brasil no final do século XIX. Investiram nos mais diversos setores do entretenimento, tendo sido, inclusive, introdutores do cinema no país. Foi notável também sua atuação e suas contribuições para o teatro brasileiro.

3Sobre as reformas urbanas, ver Sevcenko (1998). Sobre os estabelecimentos de Segreto, ver Martins (2010). Pode-se citar também um parque que, inaugurado em 1923, chegou a merecer elogios da imprensa educacional carioca (Silva, 2009). Passos e Frontin foram nomes centrais na reforma do Rio de Janeiro, o primeiro na condição de prefeito plenipotenciário, o segundo como engenheiro de obras de grande relevância.

4Consideramos parques de diversão aqueles estabelecimentos que oferecem múltiplas possibilidades de divertimento, acessíveis ao público por meio de pagamento de entradas e/ou um valor por cada atração. Sobre a história desses empreendimentos, ver Wood (2017) e Silverman (2019).

5Esse periódico antecedeu o Correio Mercantil, propondo-se a ser concorrente do Jornal do Comércio. Criado, em 1844, por Joaquim Alves Branco Muniz Barret, notório jornalista, advogado e líder político, deputado e futuramente um aguerrido abolicionista, marcou seu tempo pela amplitude de assuntos abordados, bem como pela adoção de inovações. Como outros jornais, vislumbrava contribuir para a consolidação e modernização da nação.

6Nos jornais e na documentação, usaram-se sem grande rigorosidade as denominações Tivoli e Tivoly. Neste artigo, optamos por adotar Tivoli. O termo era utilizado como sinônimo de espaço de recreação, inspirado no fato de que a cidade italiana de mesmo nome era, desde a Antiguidade, local de veraneio dos romanos, abrigando, inclusive, muitas vilas frequentadas por poderosos, sendo a mais famosa a Vila Adriana.

7Segundo Melo (2016, p. 504): “Tendo como proprietário e mestre o italiano Francisco York, dançarino e coreógrafo dos teatros da cidade, na instituição também atuavam como professores os notáveis músicos Francisco Motta, José Joaquim dos Reis, Lino José Nunes e Alexandre Magallar. Além desses, ministrava aulas de dança outro bailarino notável, José De-Vecchy. Esse estabelecimento era aparentemente muito bem organizado, dispondo de três salas para as atividades docentes, duas destinadas às aulas e uma para descanso. Uma delas tinha saletas para apoio das classes. Além de gabinetes para professores, havia um banheiro para as senhoras e um vestiário para troca de roupas”.

8Como sugere Pinto (2007, p. 116), no decorrer do século XIX: “[...] as grandes chácaras localizadas no entorno imediato do Campo de Santana, remanescentes do processo de doação de sesmarias, por onde penetravam os mangais de São Diogo, [...], começaram a sofrer um processo de parcelamento e suas terras foram arrendadas em pequenas porções e aforadas ou subaforadas a particulares [...] que engrossavam a camada de nobres vindos de Portugal e de ricos comerciantes que buscavam uma localização intermediária entre o Paço Real e o Paço da Quinta da Boa Vista”.

9Para um debate sobre a proibição de jogos de cartas no Rio de Janeiro do século XIX, ver Soares (2007).

10Um cronista de O Mercantil (1846, p. 3) chegou a observar que Tivoli era uma nova palavra da língua portuguesa, vulgarizada em função da notoriedade do parque do Campo de Santana.

11Fizemos uso dos poucos documentos encontrados no Arquivo Geral do Rio de Janeiro.

12O Jornal do Comércio, um dos mais importantes periódicos do século XIX, foi criado, em 1827, tendo como foco a economia. No decorrer do tempo, todavia, também dedicou atenção às questões da política e da cultura, apoiando o processo de modernização da sociedade fluminense, ainda que preponderasse suas posições conservadoras.

13Não conseguimos mais informações sobre esse personagem. Se instalou a princípio em Campos. Sua mulher, com a qual tinha um filho, oferecia serviços de modista nas cidades onde se estabeleciam.

14Não há muitas informações sobre esse personagem. Chegou ao Brasil em 1837 e, provavelmente, foi mais um dos estrangeiros que veio ao Brasil à busca de bons negócios na jovem nação.

15Sobre os hotéis no Rio de Janeiro do século XIX, ver Pires (1991). Sobre a articulação desses estabelecimentos com a gastronomia, ver Karls (2017).

16Havia sempre exibições de dança, polcas e marzukas, protagonizadas por York e De-Vecchy, nas quais se apresentavam os alunos do Conservatório. Os empresários, engenhosamente, articulavam uma oportunidade de prática para seus discentes com uma propaganda de sua escola, bem como mais uma atração para seu parque. Uma vez mais, vemos se cruzarem as esferas do ensino, entretenimento e espetáculo.

17Periódico, na ocasião, marcado por uma postura governista, publicava informações de interesse da cidade, inclusive, com frequência, ligadas ao entretenimento. Editado desde 1821, nos anos 1840 investiu num perfil mais literário e noticioso, menos politicamente engajado.

18Perceba-se que, mesmo com tanto cuidado, houve uma polêmica ao redor de frequentadores que vestiram fantasias de religiosos (Jornal do Comércio, 1846f).

19Mesmo em dificuldades financeiras, York ainda promoveu um espetáculo em benefício da Imperial Sociedade Amante da Instrução (Jornal do Comércio, 1847a, p. 4). Na verdade, os empresários organizaram vários eventos beneficentes, postura que sempre também marcou as ações do Conservatório. Era mais uma maneira de demonstrarem seu cuidado e empenho no tocante ao progresso da sociedade fluminense.

20Foi uma das herdeiras do rico coronel e comendador Antônio Ferreira da Rocha, proprietário de muitas terras na cidade.

21O Correio Mercantil deu sequência a experiência de O Mercantil tendo como diferencial uma posição política mais denotada. Durou cerca de 20 anos, abrindo também espaço para publicação de peças literárias de diferentes formatos. Assim como ocorreu em outros periódicos, seus cronistas estavam atentos às mudanças em curso na sociedade fluminense, sendo críticos, mas também engajados no processo de modernização do país.

22Inaugurado em 1847, tratava-se de um espaço onde se promoviam bailes e reuniões literárias. Situado na rua da Ajuda, era propriedade da já citada Clara Delmastro.

23O Paraíso teve uma trajetória mais longa, mantendo-se aberto até meados dos anos 1850. Em 1858, no local se instalou um café cantante, o Folies Parisiennes (Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, 1832-1869).

24Jornal de breve duração, tinha como programa a contribuição para a consolidação da nação num momento em que começavam a ser superadas as crises dos anos 1830.

25Jornal polêmico, muito crítico e alinhado com os interesses dos conservadores, tinha como líder o notório Bernardo Vasconcelos, um importante personagem da primeira metade do século XIX.

26O Cassino Fluminense foi uma das mais importantes agremiações recreativas do Rio de Janeiro do século XIX. Para mais informações, ver Needell (1993).

27Perceba-se como os códigos de postura funcionavam também como agências pedagógicas, informando os usos possíveis da cidade, controlados por profissionais especificamente destinados a tal fim (Schmachtenberg, 2008).

28Não foi a primeira vez que o importante teatro pegou fogo, algo que não era incomum até a instalação de energia elétrica. Em 1851, o acidente causou grande comoção. O célebre ator João Caetano o reconstruiu, sendo de novo aberto em 1852 (Souza, 2009).

29Tratou-se de um periódico relacionado à primeira agência de notícias do Brasil, a Agência Americana Telegráfica. Sintonizados com o que ocorria no mundo, seus cronistas defendiam a modernização da sociedade fluminense.

30Um dos aparelhos percursores do cinema, o cosmorama se assemelhava a um projetor de imagens que as apresentava em movimento para quem olhasse por um visor. Desde meados da década de 1830, havia tais artefatos no Rio de Janeiro (Gonzaga, 1996; Abreu, 1999).

31Sobre a importância desses aparelhos óticos, ver Gunning (1995).

32Haveria ainda mais um Tivoli no Rio de Janeiro do século XIX, instalado na travessa do Império, posteriormente transformado em Frontão Boliche Nacional.

Recebido: 09 de Setembro de 2019; Aceito: 22 de Novembro de 2019

**Autor para correspondência. E-mail: victor.a.melo@uol.com.br

Victor Andrade de Melo é Professor Titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro, atuando nos Programas de Pós-Graduação em Educação/Faculdade de Educação e em História Comparada/Instituto de História. Coordenador do Sport: Laboratório de História do Esporte e do Lazer. Pesquisador do Laboratório de Pesquisas de Educação do Corpo (Labec). Bolsista de produtividade/CNPq e Cientista de Nosso Estado/Faperj. E-mail: victor.a.melo@uol.com.br

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