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Revista Brasileira de História da Educação

versión impresa ISSN 1519-5902versión On-line ISSN 2238-0094

Rev. Bras. Hist. Educ vol.21  Maringá  2021  Epub 17-Nov-2020

https://doi.org/10.4025/rbhe.v21.2021.e141 

Artigo Original

Álbum Ilustrado da Comarca de Rio Preto (1927-1929): vitrine e epifania da educação paulista

El Álbum Ilustrado del Distrito de Río Preto (1927-1929): escaparate y epifanía de la educación en el Estado de São Paulo

Vinicius Silva1  * 
http://orcid.org/0000-0002-5449-2181

Raquel Discini de Campos1 
http://orcid.org/0000-0001-5031-3054

1Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG, Brasil.


Resumo:

No presente artigo, objetivou-se perscrutar as representações de educação difundidas na extensão dos 479 textos e das 1.935 iconografias que integram as 1.093 laudas do Álbum Ilustrado da Comarca de Rio Preto (1927-1929). Para tanto, com base nos princípios da História Cultural e da Análise do Discurso, examinou-se o processo social de produção deste artefato e a materialidade das grafias de cunho educacional que o compõem. Assim, averiguou-se um esforço de exaltação verbo-visual da instrução popular e oficial como indício de progresso, em uma diligência enunciativa que fixou o objeto tipográfico investigado como suporte e, a um só tempo, como a encarnação dos projetos civilizatórios e educativos que seus artífices buscaram participar.

Palavras-chave: história da educação; imprensa; cultura imagética; escola pública

Resumen:

En este artículo, el objetivo era examinar las representaciones de la educación difundidas en la extensión de los 479 textos yde las 1935 iconografías que integran las 1093 páginas del Álbum Ilustrado da Comarca de Rio Preto (1927-1929). Con este fin, basado em los principios de la Historia Cultural y el Análisis del Discurso, se examinó el proceso social de producción de este artefacto y la materialidad de grafías de carácter educativo que lo componen. Tan, se encontró un esfuerzo de exaltación verbo-visual de la instrucción popular y oficial como síntoma de progreso, en una diligencia enunciativa que fijó el objeto tipográfico investigado como soporte y, al mismo tiempo, como la encarnación de los proyectos civilizatorios y educativos que sus autores buscaron participar.

Palabras clave: historia de la educación; prensa; cultura de imágenes; escuela pública

Abstract:

The objective of the present paper was to examine the representations of education disseminated in the extension of 479 texts and 1935 iconographies that integrate the 1093 pages of the Álbum Ilustrado da Comarca de Rio Preto (1927-1929). For that, based on the principles of Cultural History and Discourse Analysis, we carried out an examination of the social process of production of this artifact and the materiality of the spellings of educational nature that compose it. Thus, an effort of verbal-visual exaltation of popular and official instruction as sign of progress was verified, in an enunciative diligence that fixed the typographical object investigated as support and, at one time, as the incarnation of the civilizing and educational projects that their artificers sought to participate in.

Keywords: history of education; press; imagetic culture; public school.

Introdução

Nunes e Carvalho (2005), ao analisarem a situação da pesquisa em História da Educação no Brasil, elencaram a História Cultural, sobretudo a balizada pelos pressupostos teóricos de Roger Chartier (2002), como uma das principais tendências que provocaram renovação na prática historiográfica em tal campo de estudos. Segundo estas autoras, as mudanças ocorridas nas fontes, nos objetos, nas teorias e nas metodologias da historiografia, tanto na geral, quanto na educacional, tangenciam a visibilidade da historicidade de cada um desses eixos, decorrendo-se, assim, em perscrutações que vão do significante ao significado, do veículo à mensagem, e desta aos grupos sociais que se apropriaram do seu uso. À vista disto, corroborando as preconizações de Certeau (2011), trata-se de uma mobilização interpretativa em prol da compreensão das possibilidades e das limitações que as práticas de modelos socioculturais possuem no seu próprio processo enunciativo.

De acordo com Prost (2014), esta ênfase na historicidade coincidiu com e foi potencializada pelas transformações ocorridas no interior da linguística, em que os paradigmas estruturalistas passaram a ser questionados por estudiosos que consideravam toda uma tessitura social que antecedida, materializava-se e excedia as marcas sígnicas do enunciado. Com base nas perquirições de Orlandi (2003, 2005) e Fiorin (2006, 2008), fica-se evidente que os expoentes desta ressignificação analítica são os filósofos Michel Pêcheux (2006, 2009) e Mikhail Bakhtin (2006, 2011), que, apesar de suas particularidades de pensamento, comungavam da ideia do primado da dialogicidade da enunciação. Destarte, para estes dois últimos autores citados, cada enunciado é apenas uma dimensão de um fio do discurso, uma vez que as suas condições de produção estão em diálogo com outros discursos já existentes ou conjecturados a partir dele, os quais, por sua vez, são constituídos em um contexto sociocultural.

Neste sentido, as investigações que estão direcionadas ao alinhamento com este quadro teórico, no âmbito da história da educação, abarcam o aspecto educacional para além das suas correspondências com o saber e o espaço de sua realização formal, na medida em que estes são considerados, em tal, como um desdobramento de determinado modelo de sociedade e cultura. Como indicativos desse panorama, estão as diligências de Campos (2015, 2017), nas quais a educação é apreendida sob o seu domínio não formal e informal, por meio do exame das práticas da imprensa ilustrada paulista da primeira metade do século XX, especialmente daquelas que foram encarnadas em álbuns ilustrados. Estas obras tipográficas, conforme foi apontado por Carvalho e Lima (2008), caracterizam-se por terem uma narrativa engendrada por textos visuais fotográficos, cujas iconografias de cidades e temas citadinos assumiam, dentre outros objetivos, uma função pedagógica de familiarização com a ordem social urbana pretendida pelos seus artífices.

Assim, fundamentando-se no aporte conceitual da história cultural e da análise do discurso pós-estruturalista, significa considerar que os objetos-fontes de avaliações em história da educação são elementos que compuseram um cenário enunciativo de um grupo social, em um tempo e em um espaço relativamente delimitados. Paralelamente, reputa-se que a própria materialidade deles contém outros itens de tal cena, os quais, tracejados pelas mais diversas grafias, constituíram-se como um dos indissociáveis responsáveis pelos efeitos de sentido propiciados, à época de suas concepções, pelo todo da concretude linguística. Portanto, fica-se sugerido que o entendimento dos ditos objetos-fontes se ampara na percepção da conjuntura social de seus itinerários de produção, circulação e recepção, bem como na das suas existências tangíveis e das suas finalidades, individuais e coletivas, subjetivas e objetivas, elucubrando-se as relações de poder que cingiram cada uma das suas etapas de realização.

Diante deste contexto de proposição de diferentes olhares científicos e historiográficos para as múltiplas manifestações educacionais e educativas, o corrente artigo foi idealizado e estruturado, tendo, como o seu objeto-fonte, o Album Illustrado da Comarca de Rio Preto (1927-1929)1. Ressalta-se que esta definição analítica se pautou nas considerações que Campos (2015) teceu acerca dele, pelas quais se verificou que a força com que a dimensão palpável desse impresso exerceu no imaginário social de grupos da região Noroeste paulista estava atrelada a um projeto civilizatório que aclamava a escolarização. Logo, ao ponderar-se sobre as perscrutações de Souza (2000) e Abdala (2013), presume-se que o enfoque ao elencado artefato contribui para a ampliação da compreensão de uma peculiar época brasileira, na qual certos círculos letrados catalogavam a fotografia e a educação como, respectivamente, identificadora e causa do progresso societário.

Por isto, o tema da vigente produção textual incidiu em torno das representações de educação transmitidas pela obra tipográfica investigada, a fim de que, ao estremá-las em sua conjuntura e tangibilidade, o entendimento fosse conduzido à função social de seu suporte. Consequentemente, a apreensão partiu do Álbum como um fio de discursos que circulavam ao tempo de sua confecção, em que as estratégias enunciativas escolhidas por seus organizadores se articulavam às expectativas de correspondências apetecidas ao dispositivo cultural e às próprias identidades cidadãs. Em virtude deste discernimento, a exposição dos resultados da pesquisa empreendida percorrerá a ordem da enunciação de vertente histórico-material, isto é, do externo ao interno, do contexto ao enunciado, o qual retorna ao externo, retorna ao seu cenário discursivo, sem fechar, contudo, a respectiva cadeia enunciativa.

A discursividade da imprensa imagética brasileira

Segundo Maia (2007) e Martins (2013), os primórdios da imprensa imagética do Brasil, apesar de estarem tecidos contíguos ao incipiente momento de advento da imprensa neste país, ainda em tempos de regime monárquico, planearam-se em um ambiente de densas vias de disseminação informacional, faladas e manuscritas, já existentes na sociedade. De acordo com Mendes e Moreira (2007) e Cohen (2013), o início de tal subdivisão da imprensa é precisado e marcado pela produção e circulação de impressos de caricaturas litografadas, que, sem se desvencilharem de questões políticas, foram projetados para alcançar um público, letrado e não letrado, por intermédio do humor e da fruição visual. Para esta compreensão, a aurora da imprensa ilustrada brasileira corresponde à época em que os discursos linguísticos dos objetos tipográficos passaram a ser arquitetados com a e pela presença notável de recursos litográficos, a qual exercia, no seu atinente enunciado, uma tarefa narrativa própria, e não de ornamentação.

Em contrapartida a este entendimento, Ramos (2009) associa o exórdio da imprensa ilustrada do Brasil ao uso, corriqueiramente descrito como decorativo, de diminutas xilogravuras, rudimentares e sem assinaturas de autoria, no cabeçalho de periódicos que antecederam, nesta nação, os impressos que veicularam as possibilidades da litografia. Este pesquisador demonstra, por meio de estudos realizados sobre a imagem impressa da primeira metade do século XIX, que as xilografias, conquanto ao seu parco refinamento técnico, não satisfaziam apenas o adornamento do canal em que eram reproduzidas e difundidas, já que cumpriam, aliadas a palavras congêneres, o programa ideológico de tal suporte. Desse modo, para esta perspectiva, o surgimento da imprensa ilustrada brasileira coincide com o período em que o sentido do discurso jornalístico começou a ser traçado na e pela relação, dialógica e contraditória, entre leitor, leitura, lugar, tempo, códigos linguísticos e visuais, signo e formas tipográficas elencadas pelo autor e decididas pelo editor.

Considerando-se isso, as ponderações que Ramos (2009) estabelece sobre a imprensa imagética, principalmente no que tange à mensagem oriunda da união indissociável dos elementos viso-ornamentais com o texto escrito, entram em convergência com o que Brait (2011, 2013) denomina de verbo-visualidade. Conforme o pensamento desta autora, a dimensão verbo-visual de um enunciado caracteriza-se como o plano de expressão material estruturado no sincretismo das duas linguagens, a verbal e a visual, as quais, coligidas e encadeadas na criação ou na edição de um impresso, tornam-se agentes constitutivos da produção do sentido discursivo. Assim sendo, a conciliação das teses defendidas pelos dois últimos autores citados indica que a verbo-visualidade é o aspecto definidor da imprensa ilustrada, cujos distintos arranjos do texto escrito e do texto visual interferem na composição, na temática e no estilo das obras tipográficas onde estão materializados.

Dentre os produtos de imprensa que só existem na forma ilustrada, estão os álbuns de temáticas citadinas, que provêm, como Pereira (2010) apontou, da realização de eventos político-comerciais, nos quais, ao serem apresentados os avanços civilizatórios logrados, eram visados investimentos de várias espécies, em diversos setores. No Brasil, de acordo com Barbuy (1996), a produção de objetos para circular nestas reuniões antecedia e sucedia a realização destas, sendo que, aos álbuns ilustrados, eram reservadas as funções de corporificar aquilo que não poderia estar presente, como os melhoramentos de saneamento, bem como, posteriormente, armazenar-se o que aconteceu em tais. Do ponto de vista da ordem de confecção dessas obras imagéticas, era seguida uma tendência de correspondência ao crescimento espacial, em que, primeiro, eram construídos álbuns de municípios, ou de um conjunto de pequenos distritos, e, depois, de Estados federativos, até alcançar-se, finalmente, a elaboração de um álbum nacional.

Logo, o percurso dos acontecimentos que levaram estes artefatos imagéticos a serem produzidos, enquanto coletividade, denota um funcionamento comunicacional e social de seus discursos centrado no diálogo que mantêm entre si e, também, com outras vozes que os precederam e que, por e para eles, foram conjecturadas a sucederem-lhes. Esta noção de primórdio dialógico como forma particular de composição de enunciados, em que a instituição e a operação real da linguagem se ancoram na exterioridade, cujo sentido é resultante da relação com seus interlocutores, é trabalhada por Pêcheux (2006, 2009), pela grafia de interdiscurso, e por Bakthin (2006, 2011), pelo dialogismo. Por decorrência, os álbuns ilustrados moldam-se como discursos concretos, sendo, cada um deles, o elo de uma multifacetada cadeia enunciativa, na qual, por meio da materialidade de tais, ocorre-se a transmissão e a construção recíproca de efeitos de sentido entre os sujeitos que os sistematizam e designam-nos a algo, ou a alguém, e seus específicos destinatários.

Portanto, a sua configuração editorial, que Carvalho e Lima (2008) distinguiram pelo seu revestimento em capa dura e pelo seu enredo com numerosas fotografias urbanas consubstanciadas em papel couché, constitui-se como vestígio da própria dialogicidade que alicerça a concernente esfera enunciativa. Este indício fica ratificado, ao cotejar-se os exames destas historiadoras com os de Park (1999) e Oliveira (2001), pois, juntos, sinalizam que a intrínseca suntuosidade palpável dos álbuns ilustrados foi usada, pelos grupos que lideraram a sua fabricação, como premissa da eminência que esses impressos possuíam ante aos já propalados almanaques. Dado isto, percebe-se, à luz dos postulados de Chartier (2014), que o que tais elites projetavam no suporte dos objetos tipográficos imagéticos estava consoante com um modelo de ator e ação de ethos civilizado, cujos caracteres se amalgamavam na aparência do eleito canal de comunicação social.

Destarte, não é inócuo verificar que as duas referidas tendências teóricas sobre as origens da imprensa imagética comungam da perspectiva de que tal segmento tipográfico ganhou centralidade no seio republicano, sobretudo nos anos de 1920, e nas plagas do Estado de São Paulo. Do ponto de vista temporal, atentando-se às reflexões de Cohen (2013), a explicação para a profusão de dispositivos ilustrados brasileiros, no decênio que se encerrou em 1929, encontra respaldo no aperfeiçoamento dos aparelhos de tipografia, no aumento do mercado editorial, e no uso diversificado que intelectuais faziam de tais. Já o protagonismo daquele espaço federativo, com base no que Campos (2015) frisou, pode ser elucidado pelas propostas esboçadas por grupos locais de maior visibilidade, que eram dirigidas para tornar a região paulista uma referência, nacional e internacional, de civilização e modernidade.

Nesta orientação, aludindo a Sodré (2004), deslinda-se que a deliberação pelos artefatos desta subdivisão da comunicação impressa ancorou-se em pretextos políticos, tendo em vista que era conveniente, à estruturação e legitimação do ideal e dos discursos republicanos em voga no Brasil da época, o emprego social de novidades técnicas. De feitio suplementar, houve o viés técnico-comercial, que, segundo Martins (2013), subjazia e sobrepujava tal modalidade de imprensa, pois, neste contexto, a perpetuação do setor jornalístico estava ligada ao aprimoramento dos aparelhos tipográficos, bem como das peças resultantes deles, o qual decorria de e fomentava novas relações de mercado. Por fim, a intencional escolha de materiais de tiragem seguiu, conforme Mason (2003) sugeriu, uma aspiração educacional iluminista, posto que a acessibilidade da linguagem sincrética de textos escritos e imagens que aqueles veiculariam potencializava a autonomia do sujeito em seu saber.

No que se reporta aos álbuns ilustrados, representantes singulares da dilucidada categoria de imprensa, os eixos políticos, comerciais e educacionais se aglutinavam nos projetos de visibilidade das exposições nacionais e internacionais que lhes davam origem, as quais Kuhlmann Jr. (2001) alcunhou de ‘grandes festas didáticas’. Para este autor, essas cerimônias foram marcadas por uma inflexão, no plano discursivo, de que a educação, sobretudo a escolar, era campo privilegiado à ampliação da modernização, além de ser apreendida como condição imprescindível à possibilidade de participação das nações que não se destacaram no consenso das revoluções técnico-científicas. À vista disto, tem-se que a discursividade dessas obras estava em diálogo com a acepção da educação como aforismo e panaceia aos obstáculos do alcance total dos princípios positivistas, cujas pretensões, de acordo com Carvalho (1989, 1997), Souza (1998) e Monarcha (2009), inseriam as terras paulistas como adágios da renovação educacional brasileira.

Nesta conjuntura, São José do Rio Preto exerceu papel emblemático, já que, em referência a Campos (2015), foram concebidos e circulados, no período de 1918 a 1929, dois álbuns ilustrados específicos sobre tal torrão paulista, além de ter sido, segundo Park (1999), o solo interiorano brasileiro que mais recebeu almanaques. Assim, dentre estes produtos tipográficos, o Álbum Ilustrado da Comarca de Rio Preto se destaca como um exemplar ímpar ao entendimento da discursividade da imprensa imagética, porquanto, com fundamentação em Valle (1994), suas páginas terem sido conduzidas a englobarem a anelada precisão da gênese da história local. Não obstante, o esquadrinhamento de seus traços particulares suscita, concomitantemente, pela via do dialogismo que sustenta e permeia a sua enunciação e o seu enunciado, concepções de educação que circulavam ao tempo de sua criação e venda, denotando-o como instrumento de construção de um panorama verbo-visual da cena pedagógica do Brasil.

Características gerais do Álbum

Segundo Arantes (2001), a produção do multitemático Álbum Ilustrado foi iniciada em 1925, em um período temporal que coincide, conforme verificado em notas veiculadas em edições do jornal rio-pretense A Noticia de 1929, com a viagem e a chegada de Abílio Augusto Abrunhosa Cavalheiro2 à sede da comarca de Rio Preto. De acordo com este mesmo autor, tal transladação foi motivada pelo fascínio que foi despertado, no imigrante lusitano, pela narrativa idílica que, à época, era propalada sobre o quinhão paulista em pauta, o qual era sintetizado como um espaço que abrigava a mais genuína selvageria e o mais irrisório desenvolvimento. Nesta diegese, o encantamento adviria da dissonância que a plaga de Rio Preto tinha para com a capital do Estado de São Paulo, insuflando uma ideia de que o progresso estava a desenrolar-se de modo desarmônico, na medida em que não alcançava as regiões circunvizinhas às então cidades brasileiras relatadas como modernas.

Nisto, o artífice português se orientou pelo prisma de empreender uma propaganda social de toda a Zona Araraquarense, unindo-se, após chegar da capital paulista, a Paulo Laurito3 e a Theodoro Demonte4, no intuito de que sujeitos residentes no rincão pudessem ajudar-lhe a divulgar, em grafias verbais e visuais, a realidade do território em foco. Para tanto, ao passo que este colaborara com os seus renomados trabalhos de fotografia e edição, os auxílios financeiros foram intermediados pelo primeiro colaborador, que, pelo patrocínio de seu pai, o comerciante Carmine Laurito, custeou as lacunas deixadas pelos pagamentos publicitários não efetuados. No entanto, as aproximações e as tensões originadas das e nas relações entabuladas por Abílio, nos momentos que precederam, intercorreram-se e sucederam ao da produção da selecionada obra tipográfica, desvelam planos individuais que ele tinha para com a efetivação desse material jornalístico.

Das conexões que antecederam a idealização do citado artefato, destacam-se as atreladas à sua amizade com o santista de pseudônimo Sylvio Floreal5, cujo marco foi a publicação da revista A Flexa, executada por ambos no início dos anos de 1920, que, por ter tido uma durabilidade curta, motivou os dois produtores a buscarem êxito no oeste brasileiro. Nesta empreitada, os confins do Mato Grosso foram o cenário de descrição e análise que Sylvio registrou no livro ilustrado que intitulou de O Brasil tragico, consubstanciado em papel cartonado, enquanto as terras do noroeste paulista foram o centro das apreensões de Abílio. Desta maneira, no afã de engrandecer-se no círculo jornalístico, desvencilhando-se do malogro da mencionada revista, o português encabeçou a fabricação do Álbum Ilustrado, porque, assim, forneceria a demonstração palpável da sua proeminência intelectual, perante, inclusive, do seu amigo, que já era notável no meio letrado.

Logo, a aspirada supremacia estava vinculada à materialidade do objeto adotado para concretizar os seus enunciados, uma vez que, por o álbum ilustrado se sobressair, em termos de refinamento tipográfico, quanto ao livro ilustrado, os autores daquele se punham, simbolicamente, em um nível superior ao dos deste. Diante de tal significado, a concretude do impresso se configurou como o palco de implementação do programa pessoal de seu principal agente, o que pode ser averiguado, por exemplo, com a tentativa de silenciamento da participação de Demonte, que não foi posto como seu coautor, apesar de ter feito a maioria das fotografias que a compõem. Com isto, as peculiaridades da obra que Valle (1994) associou ao fracasso de consumo dos seus exemplares, como o seu preço unitário de 150 mil-réis e as conveniências descritivas que a presença e a ausência de pagamentos impunham ao seu conteúdo, podem ser entendidas como uma recusa ao projeto e à persona do lusitano.

Dentre essas renúncias, constata-se o posicionamento do padre Joaquim Manoel Gonçalves, que, em apreciação publicada na edição de 10 de novembro de 1929 do jornal local A Notícia, indicou lacunas nas temáticas que integravam religião e educação, como nas concernentes ao Colégio Santo André6. Contudo, em análise das específicas seções, vê-se que existem lacônicas menções às instituições e aos projetos educativos fomentados pela Igreja Católica, mas a ênfase e o enaltecimento residem em torno das diligências provenientes de recursos públicos, estaduais e municipais, e do empenho particular de cidadãos que agiam em prol da sociedade. Ademais, como os grifos feitos a este último modelo de educação estão entrelaçados à presumível displicência do governo de então, compreende-se que a manifestação opinativa do eclesiástico sinaliza um dos conflitos mais salutares que cingiram a educação brasileira, qual seja o da disputa deste campo por convicções privatistas e públicas.

Portanto, as inflexões enunciativas coordenadas por Abílio estavam ancoradas nas correspondências discursivas de gênero editorial e de modalidade de imprensa que ele propôs ao artefato imagético em pauta, pelas quais poderia ser reconhecido entre aqueles que se alinhavam a um ideal republicano de ordem social urbana. Despontam-se, daqui, subsídios para o discernimento de outras recorrências assentadas no decurso das 1.093 laudas, separadas em 22 capítulos, nas quais estão abarcadas 1.935 iconografias, sendo quatro climolitografias, 25 litografias, 855 litografias ornamentais de outras imagens e de alguns textos verbais, 11 fotografias policromáticas e 1.040 fotografias monocromáticas. Por um lado, a preponderância deste último tipo pictórico citado está enleada com os proferidos mais modernos recursos técnicos disponíveis à época de sua efetuação, e, por outro, com o seu vigente atributo comprobatório da realidade estremada e da consequente existência melhorada, alçando o suporte a um dispositivo de memória.

Nestas folhas, até mesmo nas dedicadas aos quinhões menos abastados, averígua-se, em alusão a Campos (2015), um meticuloso encadeamento exercido sobre e para com os assuntos de âmbito educacional, no qual textos verbais, visuais e números se fundiam sob o manto do patriotismo ufanista. Em dada medida, esse acento se justifica no fato de que tal cadeia temática satisfazia a discursividade histórica da imprensa imagética, o que situava o seu veículo e as respectivas localidades nos trilhos da modernidade, e, em outra porção, na fundamentação que Abílio procurava nas filosofias positivistas e kardecistas. Desta forma, observa-se que essas decisões consolidaram, concomitantemente à explícita propaganda social da Zona Araraquarense, a figura do português como a de arauto das benesses da marcha do progresso regional, cujo assentamento de glorificação estava simbolizado no avantajado volume do item de tipografia que ele organizou.

À vista disso, apura-se que o delineamento das características gerais do Álbum Ilustrado da Comarca de Rio Preto passa pela e coincide com a perscrutação das linhas biográficas do sujeito que, durante quatro anos, dedicou-se a colher e a condensar, em um único documento, esparsos, escassos e múltiplos registros dos lugarejos em retratação. Essas tramas, aliás, guiam a apreensão dos fatores que encorajaram a mudança do lusitano para a capital do Estado do Rio de Janeiro, os quais plasmam no reconhecimento que o seu trabalho jornalístico sobre os ditos sertões adquiriu no contexto do regime getulista, embora muitos dos 5mil exemplares editados pela Casa Duprat-Mayença tenham ficado estagnados nas prateleiras da Casa Laurito, onde podia ser feita a sua compra. Do mesmo modo, está a primeira e única reimpressão da peça imagética, que, a partir de unidades originais que habitantes do solo interiorano paulista guardaram, foi capitaneada por Roberto do Valle, em 1979, e publicada pela empresa Comércio e Indústria Gráfica Francal, anos após a morte de Abílio.

Considerando, pois, que a referida reimpressão foi empreendida em um parque gráfico localizado na já então São José do Rio Preto, e que o intervalo de 50 anos existente entre ela e a pregressa tiragem corresponde ao período de estabilização do lusitano no jornalismo, manifesta-se que os objetivos do Álbum, declarados e não declarados, foram, em determinado grau, alcançados. Nesta mesma direção, pelo princípio do dialogismo entre modalidade de imprensa e seus atinentes produtos, assevera-se que, com o estudado objeto cultural, parcelas das perspectivas políticas, mercadológicas e educacionais que estruturavam a discursividade da imprensa imagética foram granjeadas. Por fim, pontua-se que a destacada reiteração e ressignificação da tessitura entre enunciado e enunciador demarca que as transmitidas representações verbo-visuais da educação, seu indissociável sustentáculo e tópico temático, atravessaram as narrativas da história cultivada como a ser rememorada e perpetuada.

Representações gráficas da educação

No Álbum Ilustrado da Comarca de Rio Preto, os tópicos atrelados à educação estão consubstanciados em cada uma das partes destinadas aos territórios que, entre 1925 a 1929, estavam sob a jurisdição da plaga que teve o seu nome demarcado no título da referida obra, inclusive naquelas correspondentes aos espaços de extensão diminuta e de recursos financeiros parcos. Entretanto, ao passo que, nos fragmentos específicos aos solos mais abastados, o enunciado sobre a educação ocupou particulares galerias sobre a escolarização, ele esteve envolvido, nos segmentos dos demais distritos e municípios, em subtítulos de seções da vida social e acerca dos melhoramentos promovidos e a serem feitos por todas as esferas da administração política. Mesmo assim, de forma congênere, este assunto foi manifestado com o auxílio de números, para expor ressalvas aos empreendimentos de cunho privado, tendo em vista que, conquanto indicassem uma preocupação cidadã daqueles que os urdiram, elucidavam certa inoperância de reais possibilidades ao governo público.

Estes símbolos matemáticos, que, segundo Pêcheux (2006), regulamentam um universo logicamente estabilizado para os discursos, estão dispostos em algumas laudas, com o propósito de precisar a quantidade de discentes, de classes e de instituições formais de ensino, discernidos pela nomenclatura, localização, natureza e mantenedora destas. Paralelamente, os algarismos foram elencados, para apontar o montante de habitantes de cada um dos torrões que constituíam a então propaganda social da Zona Araraquarense, e para discriminar a cifra de recenseamento de suas crianças, sobrelevando-se a porção desta que não se encontrava matriculada em sequer uma das escolas. Em virtude disto, o cenário veiculado pela citada peça de tipografia estimulava a acareação da proporção entre o número de iniciativas de escolarização e o total da população das circunscritas paragens, e, a um só tempo, encorajava a melhoria das condições postas como existentes, e simbolizava a infância como o foco principal da advogada educação.

Apesar do ansiado engajamento com esta quantificação, houve algumas lacunas nas informações coletadas pelo artífice lusitano, correspondentes ao coeficiente total de residentes em certos quinhões, à tipologia e à entidade de amparo dos edifícios de ensino que não eram públicos, e à amplitude do recenseamento feito sobre os infantes em idade escolar. Em contrapartida, foram alcunhados os 103 estabelecimentos educacionais catalogados, sendo que, destes, 38 eram comandados por projetos particulares, 17 eram exclusivamente controlados pela esfera pública, e 48 não tiveram este elemento mapeado, ainda que concentrassem, em 15 salas de aula, 1.027 estudantes. Dentro destas três últimas categorias exprimidas, há 39 educandários que estão caracterizados como de funcionamento nulo, pelo fato de que, sem embargo de contarem com ambientes exclusivos à execução de trabalhos pedagógicos, não existiam ministradores de quaisquer disciplinas, e, tampouco, discentes com registros ativos.

Não obstante, frente a uma população colocada como de 32.700 seres humanos, outros 6.251 se encontravam nas vigentes escrituras escolares, dos quais 2.506 estavam distribuídos em 22 classes particulares e 3.745 eram aprendizes de 64 salas de organizações públicas, o que inteirava, com os das instituições de estrato não delimitado, 7.278 alunos. Nisto, apura-se que, apesar de o contingente de empreendimentos declaradamente privados ser maior do que o dos de prescrição governamental, estes possuíam uma quantia superior de classes e de acadêmicos, insuflando-se ponderações sobre as condições de exercício docente, embora os profissionais do magistério não tenham sido enumerados no impresso. De modo complementar a esta reflexão, inserem-se os signos concernentes ao arrolamento de 11.038 meninos e meninas em idade de já estarem no processo convencional de ensino e aprendizagem, dentre os quais 985 estavam em consonância com as requeridas estatísticas, ao passo que 10.053 endossavam a elucubração defendida na pleiteada monofonia discursiva.

Diante deste esquema, deslinda-se a sua distância do Recenseamento de 1920 (4º censo geral da população e 1º da agricultura e das industrias) (Brasil, 1926), que, sob a responsabilidade do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, foi realizado em setembro de tal ano, e publicado em 1926, pela Tipografia da Estatística. Neste documento da Diretoria Geral de Estatística, no qual os cidadãos brasileiros estão ordenados por Estados, municípios e distritos, e separados segundo o sexo, o estado civil e a nacionalidade, a população das divisões geográficas em que a gestão judicial de Rio Preto exercia a sua autoridade englobou 126.796 habitantes. No entanto, esta discrepância foi alarmada em uma nota de rodapé do Álbum, na qual o médico-chefe do Posto de Higiene de Rio Preto, Espiridião de Queiróz Lima, assinalou que houve um lapso na captura de alguns destes dados expressos no artefato, por meio do qual foram desconsideradas bases mais completas que o engenheiro da Câmara Municipal possuía.

Desta maneira, a despeito da ressalva apresentada, o sentido propalado pelo dispositivo de propaganda social convergia para as mesmas considerações que podiam ser deduzidas pelo inventário demográfico, denotando que a Alta Araraquarense fulgurava entre as áreas de maior densidade habitacional, por conta de ser um solo interiorano. No que tange à cena da educação, a notabilidade recaía sobre as edificações de instrução, dos círculos rurais e dos urbanos, porque estas, até se não estivessem providas por nenhum tipo de professor, tinham caracteres que as singularizavam e engrandeciam-nas, a ponto de torná-las reconhecíveis perto de outros imóveis. Todavia, tais propriedades pendiam a uma conotação simbólica, dado que, na seção intitulada de ‘Os grandes problemas de Rio Preto’, o seu escritor português salientou que uma das causas do progresso de Ribeirão Preto, que era o arquétipo de civilização para as circunjacências, foi a construção local de escolas normais, primárias, ginásios e liceus.

Segundo Souza (1998), o erguimento dos vistosos grupos escolares paulistas, no seio de um projeto político de cunho republicano, foi fulcral para a sedimentação memorialística acerca da identidade visual das instituições educacionais alinhadas a modernas propostas democráticas de ensino, que se guiavam pelos adágios europeus e estadunidenses. Para Carvalho (1989, 1997), tais majestosos edifícios também serviram para uma disciplinarização comportamental dos cidadãos, pois as suas implantações físicas foram feitas congruentes à alteração de todo o espaço territorial adjacente, de um jeito que se consagrasse a sua relevância para a cultura social, e mobilizasse certa postura de reverência destes sujeitos. Como instigador e decorrência desta panóplia, foram produzidos álbuns fotográficos de escolas, que, de acordo com Abdala (2013), robusteceram, pela articulação entre palavras e iconografias, a criação de um discurso e de uma imagem de seus prédios, de suas práticas e de suas personas, em uma narrativa para apreensão racional e afetiva destes suportes e teor.

Em Rio Preto, conforme estudos de Pinheiro (2004), outro componente deste exercício de normatização da população, no qual a configuração de reformas urbanas nas paisagens era um dos principais recursos pedagógicos, foi o seu Código de Posturas, promulgado no último mês de 1902, pelo intendente municipal da ocasião. Nos 233 artigos desta legislação, Emygdio de Oliveira Castro metodizou condutas adequadas e inadequadas aos moradores e aos setores de atuação em tal superfície, que estavam balizadas sob o baluarte da moral, da higiene e da produtividade, cujo descumprimento era passível de pagamento de multas ao governo, e, em algumas situações, de prisão. Neste regulamento, conquanto à ausência de alíneas explícitas às escolas, o seu difuso abarcamento está feito nos capítulos atribuídos às edificações, em que são esmiuçados o tamanho e a posição dos passadiços de transeuntes, dos jardins, dos muros, dos blocos, das portas e das janelas de quaisquer obras civis sucedidas no perímetro rio-pretense.

Em virtude disto, não é inócuo perceber que, das 21 fotografias que foram identificadas como de temática educacional, seis são de fachadas de escolas, seis são de grupos de alunos de certa instituição de ensino, quatro são de retratos individuais de profissionais do magistério de diferentes níveis, duas são de atividades educativas, e duas são de grupos de educadores. Dentro deste conjunto, o primeiro retrato a irromper-se na linearidade da edição final do artefato foi o que contém a aparência externa e completa do primeiro grupo escolar de Rio Preto, que, como apresentado na Figura 1, está estabelecido em um recorte retangular, com paramentações de litografias em art nouveau, nos seus lados direito e esquerdo.

Fonte: Cavalheiro & Laurito (1929).

Figura 1 Primeiro Grupo Escolar de Rio Preto, construido pelo Governo Estado em 1916. 

Em tal fotografia, a captura da instituição educativa é feita pela sua diagonal, em um ângulo levemente ascensional, sem margens para qualquer ser humano, tendo, em seu primeiro plano, a presença do intrínseco jardim, com calçadas, bancos, luminárias e árvores em estágio inicial de crescimento, e, no segundo, o prédio escolar principal e os seus dois anexos. Nisto, igualmente ao que Campos (2015, 2017) observou, a técnica do fotógrafo, nesta imagem, conduz à assimilação da monumentalidade desta construção em si, que, seguindo um projeto arquitetônico neocolonial consonante às regras delimitadas no Código de Posturas de Rio Preto, continha vistosas janelas que sugeriam, em união com a higiene, a irradiação de conhecimento.

Fonte: Cavalheiro & Laurito (1929).

Figura 2 Vista geral do Grupo Escolar de Barra Dourada, á frente do qual se vêem diversos alumnos. 

O Grupo Escolar de Barra Dourada, por sua vez, foi fotografado acompanhado de uma professora e de 26 alunos, alguns em pé e outros sentados, em uma diligência, talvez, de atestar a sua característica de instituição de educação formal, já que esta sua marca não era especificada pela respectiva construção, que, singela, equiparava-se à da pharmacia vizinha. Conquanto a esta simplicidade, a imagem foi recortada em formato retangular, capturada em perspectiva diagonal à direita, com ângulo perpendicular ao seu ponto central, e três níveis compositivos, os quais manifestam que a escola estava situada no limítrofe inferior da quadra de uma rua inclinada, com outros edifícios em seus arredores. Por conta deste aspecto espacial, a Figura 2 sugere a ascendência e a importância do próprio estabelecimento de ensino, pois, ao ter este concentrado em quase integralidade do segundo plano da foto, em consequência do clique pela lateral, as demais superfícies retratísticas participam do cenário, com fins de ampliarem a visibilidade daquele.

Com estas duas imagens de temática sobre instituições escolares, constata-se um padrão na técnica de realização e na de publicação do registro iconográfico, em que, com primazia do seu prisma diagonal e ascensional, os prédios estão abarcados no segundo e maior plano da foto, de recorte retangular, dando vazão ornamental aos seus até dois outros níveis. Além disto, o retrato da Figura 1 foi adornado com litografias tipográficas, em um caráter que, na aglutinação das esferas linguísticas verbo-visuais, patenteia, aludindo à consagrada sentença de Souza (1998), a suntuosidade deste templo de civilização, que atendida as vigentes diretrizes da edificação educacional. Outrossim, a Figura 2, tal como outras três fotografias dos institutos de ensino expostas no Álbum, foi enriquecida com os sujeitos escolares, que, acomodados na posição frontal do edifício, comprovam o desígnio educativo deste, e inspiram, por conseguinte, a argumentação em torno da urgência e da primordialidade da instrução popular.

Fonte: Cavalheiro & Laurito (1929).

Figura 3 Um grupo de alumnos da Escola de Ubarana, vendo-se, de pé, á direita, a graciosa e dedicada professora do Grupo, e em segundo plano, de pé, várias pessoas de destaque da sociedade de Ubarana. 

Compartilhando desta mesma medida de fotografação e exposição no elencado objeto tipográfico, está a Figura 3, que, a partir de um recorte retangular, discentes, professora e vultos da sociedade de Ubarana posam e são capturados pela diagonal à direita do cenário, em um ângulo perpendicular ao da lente do aparelho do retratista. Formada por quatro planos, divulga-se, ao fundo, o então único empreendimento de ensino da dita localidade, e, na dianteira, crianças de diferentes idades e situações econômicas, cabendo, às com calçados, vestuários claros e o sofá central, e, às descalças, trajes escuros e a margem inferior do quadro, rentes aos pés da docente. Nisto, intensificando-se a inflexão idílica da mensagem do item pictórico, a mestra, com um livro na mão e usando um vestido escuro estampado com traços geométricos claros, encontrada no limiar do segundo e do terceiro nível da iconografia, alvitra, tal como uma santidade, o seu papel na transformação das mazelas sociais.

Fonte: Cavalheiro & Laurito (1929).

Figura 4 Um grupo de alumnos dactylographos da Escola D. Pedro II de Rio Preto vendo-se ao lado direito da machina ao centro um dos professores Snr. Enoch de Moraes e Castro. 

Consoante a este perscrutado princípio, está a Figura 4, que, em três níveis, apresenta moços estudantes de datilografia, ajeitados no plano intermediário do retrato, e, no frontal, os professores do respectivo curso, sentados com pernas e braços cruzados, ladeando o principal recurso material das atividades desenvolvidas por eles. Delimitada por um recorte retangular, a imagem foi capturada em posição central e com ângulo perpendicular, tendo, em sua impressão no Álbum, ornamentos de litografias do mesmo eixo artístico e de posicionamento das Figuras 1 e 3, e uma densidade iconográfica, resultante do matiz escuro dos trajes dos seus sujeitos, quebrada pelo forro da base da máquina. Assim, corroborada pela respectiva legenda, a foto da Figura 4 reforça elementos retratísticos presentes nas outras iconografias com sujeitos em idade escolar, mas inclui uma nova mensagem, a qual está balizada na identificação nominal do docente e na centralidade de um material pedagógico.

Fonte: Cavalheiro & Laurito (1929).

Figura 5 Alumnas da Escola de Dactylographia ‘Olivetti’ composto por um grupo de prendadas senhoritas da nossa ‘elite social’. 

Tal como analisado no artefato pictórico anterior, o cerne da Figura 5, clicada em um prisma central e perpendicular, é a máquina de datilografia, que, posta em cima da bandeira do Brasil que revestia uma mesa, está circundada por docentes e moças estudantes de tal técnica escrita, os quais se acomodaram no ateliê que serviu de cenário para outras gravuras de discentes e de professores. Mantendo a constância de fotografação de sujeitos aprendizes, a imagem possui três níveis de composição, sendo que, nos dois primeiros, situam-se tais personagens organizadas em fileiras, em que as da frente estavam sentadas, ao passo que as de trás ficaram em pé, e, no último plano, permanecia-se a iconografia paisagística de um castelo. Ademais, tem-se a demarcação das nuances mais abertas para as vestimentas femininas, e a reincidência da gama mais fechada para o vestuário masculino, da posição cruzada dos membros superiores e inferiores dos indivíduos abancados, e do semblante austero de todos, além dos itens que diferenciavam mestres de estudantes, que, neste caso, convergiam para os sapatos claros.

Frente a esta galeria de temática sobre sujeitos em idade escolar, detecta-se um segundo tipo de paradigma de efetivação e veiculação dos registros fotográficos de cunho educacional no Álbum, no qual, com preeminência da ótica centralizada e perpendicular, os discentes estão abrangidos nos primeiros e intermediários planos, e arranjados em fileiras sequenciais. Ademais, como a maioria destas imagens foi feita dentro de um ambiente de estúdio, o número de estudantes retratados é bem restrito, se comparado com os 7.278 alunos traçados em dados numéricos, o que encorajava a ratificação da alegação de que a quantidade de aprendizes fora das escolas era grande. Deste modo, tendo preservados o recorte retangular e a magnificência avultada pelos adornos de litografias laterais anunciados nas fotografias de instituição de ensino, as de acadêmicos apontam a inerência que há entre lugar, indivíduos, práticas, materiais e projetos políticos, nos devidos enunciados sobre a educação.

Considerações finais

De modo correlato às características e aos objetivos da imprensa imagética, está o Álbum Ilustrado da Comarca de Rio Preto, que foi idealizado pelo lusitano Abílio Augusto Abrunhosa Cavalheiro, logo que ele chegou no solo do município sede desta jurisdição, no ano de 1925, depois de decidir-se viajar com o seu amigo Sylvio Floreal, rumo ao oeste brasileiro. Presumivelmente fascinado com as divergências identificadas entre o que observou nestas plagas interioranas paulistas e o que era proliferado socialmente sobre tal região, o jornalista português encabeçou a produção da mencionada peça tipográfica, no intuito de demonstrar a realidade do elencado território, e de angariar plurais investimentos para este. Para tanto, construiu uma narrativa de conciliação de textos verbais e textos visuais, dirimindo, para esta dimensão, a técnica fotográfica, difundida como de teor comprobatório, e, para aquela, gêneros discursivos distintos, os quais, por sua vez, estavam fundamentados em algarismos que denotavam uma integridade investigativa.

Assim, o impresso imagético foi veiculado como um documento histórico, por conter a dita verdadeira origem dos perímetros rio-pretenses, e, por abranger a logicidade inerente aos números advindos de fontes idôneas, como o marco da sedimentação dos primórdios do anelado racionalismo, e do sepultamento das diegeses que pululavam sobre aquela temática. Com isto, aliado à idiossincrática prolixidade da escrita do seu organizador longroivense, este dispositivo de imprensa alcançou uma densa corporeidade, que o diferenciava ante os seus pares editoriais, os quais foram recorrentes instrumentos políticos, do âmbito governamental e privado, na busca da instauração de uma ordem social urbana. Portanto, a diligência jornalística de Abílio também estava deslindada a um aspecto simbólico, tendo em vista que, ao propalar a robustez de um item tipográfico em que ele foi participante ativo de todas as etapas, a sua imagem adquiria os mesmos contornos, garantindo-lhe certa notabilidade dentro do grupo social que integrava.

Nesta direção discursiva, o viés educacional se manifestou em duas expressões, tanto na enunciativa, ao reportar-se à memória daquele que se apresentou como o seu autor, quanto na do enunciado, por meio de uma polissemia de escritos e itens pictóricos publicados, as quais se relacionaram em uma determinação recíproca. Por um lado, esta convergência foi embasada na tentativa de constituição de um panorama monofônico, em que opiniões de indivíduos letrados eram expostas e conduzidas sob a apetecida sistematização uníssona do português, e, por outro, nos discursos circulantes à época, que inferiam que a regeneração do país passava pela instrução popular. Entretanto, a análise daquela dupla exteriorização demonstrou que a presença de outras vozes deflagrou a polifonia inerente à discursividade histórica, a qual foi escamoteada, por efeito dos esforços que o seu sujeito discursivo dispensou à verborragia, demarcando-se um simulacro de harmonia argumentativa.

Neste mesmo sentido, averiguou-se que, conquanto ao seu propalado aspecto irrefutável, as fotografias, que ocuparam a maior parte da dimensão visual da obra tipográfica analisada, tiveram um papel de construtoras de realidades, sendo auxiliadas com litografias inseridas em suas laterais, e com legendas e outros escritos de acompanhamento. Às vinhetas, coube a função de avultar o tema central da foto, discriminando esta como o arquétipo das que compartilhavam daquele, enquanto, às inscrições verbais, foi concedida a incumbência de colaborar com a leitura das gravuras, acrescentando-lhes informações que não eram passíveis de fotografação. Logo, constatou-se que as imagens foram empregadas como discursos parciais interrompidos em seu contexto, tendo, na sua própria palpabilidade, elementos que ampliaram os seus limites gerados pelos recortes aplicados pelo fotógrafo, os quais foram enfatizados pelas estratégias de composição e edição da lauda em que foram veiculados.

Destarte, compreendeu-se que o sentido da mensagem pleiteada pelos produtores de tal impresso foi imanente da aglutinação entre os plurais textos iconográficos e os alfanuméricos, resultante de uma dinâmica de democratização bem peculiar da sua circunscrição tipográfica, em que a acessibilidade leitora a um apedeuto público era aspirada pela utilização de figuras. Por conseguinte, discerniu-se que foi erigido um âmbito de enunciação em verbo-visualidade, que, transcorrente daquela unificação, caracterizou-se como o padrão discursivo do Álbum, a cumprir o triplo propósito de disseminar certa robustez técnica, efetuar uma propaganda social e familiarizar os imediatos destinatários com uma ordem societária.

Portanto, os aglomerados discursivos acerca de conteúdos educacionais denotam que, a partir das legendas e das constituições iconográficas, a própria enunciação do Álbum era de viés educativo, na medida em que estimulava a visualização e o reconhecimento dos argumentados problemas da sociedade, e salientava os caminhos comportamentais e pragmáticos de resolução. Em outras palavras, a reincidência de discursos concretos sobre a educação emerge este conteúdo como inerente à sua cena de enunciação, o que implica em seu assentamento na aplicabilidade social do objeto cultural examinado, a qual pode ser sintetizada como de atualização dos discursos que circulavam na sociedade de então, por meio de uma prática educativa visual, ética, estética e, por que não dizer, linguística. Por fim, tal artefato, como esfera de atuação política e cultural de agentes que pretendiam atuar na literal cura de um torrão doente, foi não só a vitrine de proposições de modernização da sociedade, mas se tornou a epifania verbo-visual de projetos civilizatórios que tinham a instrução popular e oficial de molde paulista como o cerne de progresso.

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1Com o grifo itálico, serão grafadas a nomenclatura original dada à obra, bem como algumas expressões do período em estudo. Contudo, para evitar-se a repetição da alcunha Album Illustrado da Comarca de Rio Preto (1927-1929), serão utilizadas, como equivalentes, ao longo de todo este texto, as seguintes terminologias: Álbum Ilustrado da Comarca de Rio Preto - com acento, iniciais maiúsculas, mas sem demarcação temporal e qualquer tipo de grifo; Álbum Ilustrado - com acento, iniciais maiúsculas, mas sem demarcação espaço-temporal e qualquer tipo de grifo; e, Álbum - com inicial maiúscula e sem qualquer tipo de grifo.

2Abílio Augusto Abrunhosa Cavalheiro nasceu em Longroiva, Portugal, no dia 11 de junho de 1891, onde, motivado pelo próprio contexto familiar, procurou profissionalizar-se na carreira jurídica. Todavia, em 1918, com a efervescência da política do seu país nativo, que foi acirrada com a eclosão da I Guerra Mundial e com a devassidão gerada pela gripe pneumônica, ele se dirigiu ao Brasil, e passou a exercer atividades empregatícias distintas daquelas em que estava a ser instruído. Dentre tais, foram as do setor jornalístico que se mantiveram constantes em toda a sua trajetória de vida, a qual se encerrou em 31 de dezembro de 1966. Nas terras do noroeste paulista, por exemplo, além do Álbum Ilustrado da comarca de Rio Preto, o longroivense fundou, em 1925, o Rio Preto Jornal, tendo sido redator e editor das edições deste periódico tipográfico e do Diário de Catanduva.

3Paulo Laurito nasceu em Franca, Brasil, no dia 24 de janeiro de 1898, sendo filho dos imigrantes italianos Carmine Laurito e Josephina Pezzutti. Em 1910, na companhia de seus progenitores, mudou-se, para Rio Preto, onde permaneceu até o seu falecimento, ocorrido em 25 de novembro de 1968. No ano de 1925, foi diretor e editor da revista A Phalena, de propriedade do seu pai. Depois da publicação do Álbum Ilustrado, que levou toda a sua família à falência, atuou, em 1930, como diretor do jornal local O Municipio, quando também fundou, em parceria com o ferreirense Antônio Muffa, o periódico tipográfico A Época, de tendência getulista.

4Theodoro Demonte nasceu no município paulista de São João da Bocaina, em data ainda desconhecida. Descendente direto de imigrantes italianos, é reconhecido como o primeiro cineasta de Rio Preto e como um dos primeiros fotógrafos do Estado de São Paulo a produzir retratos em tom de sépia. Em seu percurso vital, que se findou em 12 de maio de 1964, ele e seus irmãos José, Pedro e Lauro ficaram afamados pela alcunha de ‘Irmãos Demonte’, sobretudo após criarem, em 1920, a ‘Demonte Filmes e Cinematografia Progresso’, por meio da qual conseguiram o pioneirismo na arte de produzir e projetar, em tal quinhão federativo, filmes resultantes da ordenação sequencial de fotografias estáticas.

5Sylvio Floreal foi o nome fictício que Domingos Paes Alexandre atribuiu a si próprio, ao assinar crônicas, romances e outros gêneros textuais que escrevia. Nascido no ano de 1892, na Itália, ele se mudou, ainda jovem e sem a companhia de ascendentes imediatos, para o Brasil, onde residiu até 1928, quando um mal súbito pôs fim à sua vida. Apesar de não ter frequentado nem mesmo o nível elementar da instrução formal, foi um ávido leitor de obras literárias brasileiras e estrangeiras, as quais, além de servirem-lhe de inspiração compositiva, eram as suas principais companhias. Dentre as suas produções escritas, sobressai-se Ronda da meia-noite: vícios, misérias e esplendores da cidade de São Paulo, datada de 1925, em que o italiano retrata, a partir da sua observação e experiência, a vida noturna da sociedade da capital paulista dos anos de 1910 e 1920, fornecendo um espectro do que estava à margem da propalada modernização.

6O Colégio Santo André foi fundado, em São José do Rio Preto, no dia 12 de março de 1920, e constituiu-se como a terceira instituição brasileira da missão educativa da católica Congregação das Irmãs de Santo André, cujos princípios pedagógicos foram balizados em e adaptados de Santo Inácio de Loyola. No Brasil, esta comunidade apostólica, de origem belga, iniciou as suas atividades na cidade de Jaboticabal, em 1914, e no município de Araraquara, em 1916, decorrente de um convite do bispo de São Carlos, que objetivava ter, na diocese sob a sua direção, duas escolas para meninas. Nisto, na conjuntura rio-pretense, tal Colégio foi, por alguns anos, o único estabelecimento voltado exclusivamente para a formação de jovens mulheres, o que ocasionou aumento no seu número de estudantes matriculadas, e, por conseguinte, uma necessidade de prédios mais amplos e outros espaços escolares, para o desenvolvimento de suas práticas educativas. Atualmente, das seis comunidades brasileiras ainda existentes da Congregação das Irmãs de Santo André, somente as de Jaboticabal e de Rio Preto que mantêm as suas escolas em funcionamento.

15Nota: Este artigo é resultante da pesquisa O Álbum Ilustrado da Comarca de Rio Preto e a educação enunciada (1920-1929): histórias, memórias e identidades alentadas em verbo-visualidade, financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Tal investigação foi desenvolvida como desdobramento dos projetos ‘Os Álbuns Ilustrados do sertão paulista (1900-1954): produção, circulação e materialidade’ e ‘Os Álbuns Ilustrados do sertão paulista: a modernidade encarnada (1900-1930)’, subsidiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG).

Como citar este artigo: Silva, V., & Campos, R. D. Álbum Ilustrado da Comarca de Rio Preto (1927-1929): vitrine e epifania da educação paulista. (2021). Revista Brasileira de História da Educação, 20. DOI: http://dx.doi.org/10.4025/rbhe.v21.2021.e141

Recebido: 27 de Dezembro de 2019; Aceito: 02 de Junho de 2020; Publicado: 27 de Novembro de 2020

* Autor para correspondência. E-mail: silvavinicius@aol.com

Vinicius Silva é mestre em Educação, pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Membro do grupo de pesquisa ‘História da Educação Brasileira: estudos interdisciplinares’, sediado nessa instituição. E-mail: silvavinicius@aol.com https://orcid.org/0000-0002-5449-2181

Raquel Discini de Campos é docente do Programa de Pós-graduação em Educação (PPGED) e do Programa de Pós-graduação em Tecnologias, Comunicação e Educação (PPGCe). Coordenadora do Núcleo Temático de Estudos e Pesquisas em História e Historiografia da Educação e Pensamento Educacional, da Faculdade de Educação. Líder do Grupo de Pesquisas ‘História da Educação Brasileira: estudos interdisciplinares’. E-mail: raqueldiscini@uol.com.br https://orcid.org/0000-0001-5031-3054

Editor-associado responsável: José Gonçalves Gondra (UERJ) E-mail: gondra.uerj@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-0669-1661

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