Coletânea organizada por Gladys Mary Ghizoni Teive1. A obra em questão busca, por meio da trajetória do professor João dos Santos Areão, um ‘bandeirante paulista do ensino’, saldar a dívida dos historiadores da educação no que se refere ao fenômeno da Historiografia Brasileira conhecido como ‘Bandeirismo Paulista do Ensino’2, entre 1912 e 1950, em Santa Catarina.
A obra foi organizada em seis capítulos e cada capítulo foi escrito por autores distintos, conta ainda com prefácio escrito por Maria Teresa Santos Cunha, apresentação escrita pela organizadora e ao final foi disponibilizado um anexo com excertos da memória de João dos Santos Areão relacionado a sua experiência como diretor dos grupos escolares: Jerônimo Coelho, Vidal Ramos, Hercílio Luiz, e como inspetor escolar.
Destacamos a priori, a abordagem na qual a coletânea se insere, que foi convencionada a denominar de ego-história3 e o reconhecimento das fontes como ego- documento4. E a posteriori que a coletânea oferece diferentes pontos de vista acerca da atuação do professor Areão, no Estado de Santa Catarina, em diversos momentos.
Definida estas questões, o primeiro capítulo intitulado ‘Como no tempo das bandeiras: a primeira expedição do Professor Areão em Santa Catarina’, Gladys Mary Ghizoni Teive analisa a primeira expedição do professor no Estado, recém-formado na Escola Normal de São Paulo, na direção do primeiro grupo escolar de Laguna o ‘Jerônimo Coelho’.
Tem como fio condutor de análise as memórias do professor cruzada com outras fontes documentais e evidencia os desafios diários de um diretor - cargo novo na década de 1910 - no sentido de colocar em prática os postulados da pedagogia moderna e em ser o pioneiro na implantação da primeira escola complementar do Estado.
No capítulo II, intitulado ‘Um educador no Batalhão da Esperança: João dos Santos Areão e a Escola de Escoteiros de Laguna’, Luiz de Souza Romero Sanson5 discute as práticas sociais do escotismo e a produção de discursos jornalísticos acerca das atividades, relacionadas às experiências públicas e aos debates dos campos político e educacional da Primeira República brasileira. A escola é analisada em suas três fases: 1917-1919; 1924-1930 e 1939-1960, com ênfase no período em que foi dirigida pelo professor Areão.
Em ‘Direção do Grupo Escolar Vidal Ramos de Lages: a segunda expedição do Professor Areão em Santa Catarina (1917-1918)’, capítulo III, Norberto Dallabrida6 faz uma reflexão sobre a segunda expedição do professor Areão no Estado, quando convidado a dirigir o Grupo Escolar Vidal Ramos, e da imersão do professor na vida social da elite dirigente de Lages, com sua participação na Orquestra dos Amadores da Arte, no Tiro de Guerra, na Sociedade Literária e Recreativa, na Maçonaria e na Escola de Escoteiros.
O quarto capítulo intitulado ‘João do Santos Areão fala às semanas: os temas da nacionalização do ensino’, Ticiane Bombassaro Marassi7 analisa a performance de Areão nas ‘Semanas Educacionais’ (1930) do Departamento de Educação, um tipo de formação continuada a professores das redes de ensino, relacionada à nacionalização do ensino nos postulados da Escola Nova e na política de assistência a imigrantes estrangeiros.
No capítulo V ‘Contribuições do professor Areão para a construção de sensibilidades nacionalistas através do canto orfeônico’, Tânia Regina da Rocha Unglab8 aborda a atuação do professor como organizador e sistematizador do Canto Orfeônico em prol da nacionalização do ensino em Santa Catarina entre os anos 1930 e 1940. Ancorada na abordagem da história cultural, analisa relatórios, Diário Oficial, partituras e documentos cedidos por entrevistados.
E o último capítulo ‘Partitura política: o caso de João dos Santos Areão e a nacionalização em Santa Catarina’, Marcelo Téo9 analisa a atuação do professor Areão como responsável pela prática do canto orfeônico nas instituições de ensino de Santa Catarina, especificamente os pontos de contato e de distanciamento entre o projeto de regência do coro social nacional e o contexto catarinense, relacionando a música, o ensino e o campo político na Era Vargas - Estado Novo.
O resultado mostra uma coletânea criteriosa, densa, instigante, de leitura agradável e de relevância para a historiografia da educação brasileira. Destaca-se o cuidado com que a questão metodológica é colocada e a qualidade da narrativa na perspectiva peculiar de cada autor aliando teoria e empiria.
A obra traz as facetas da trajetória educacional de um vanguardista da educação catarinense e coloca em evidência a importância da preservação de documentos, quase sempre destinados ao fogo e/ou lixo, mas que se constituem para o historiador como um patrimônio documental na pesquisa histórica. Tecer os fios da memória do professor Areão permitiu ao pesquisador compreender um passado constituído naquele presente e ao leitor apreender saberes, crenças, valores e práticas de um educador e parte da história da educação de Santa Catarina.