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Revista Brasileira de História da Educação

versão impressa ISSN 1519-5902versão On-line ISSN 2238-0094

Rev. Bras. Hist. Educ vol.22  Maringá  2022  Epub 01-Maio-2022

https://doi.org/10.4025/rbhe.v22.2022.e219 

Dossiê

A educação de populações indígenas em Moçambique: do Período Colonial ao início da Era Pós-Independência

La educación de las poblaciones indígenas en Mozambique: desde el Período Colonial hasta el inicio de la Era Posterior a la Independencia

Názia Anita Cardoso Nhongo Bavo1  * 
http://orcid.org/0000-0002-9057-9575

Orquídea Coelho2 
http://orcid.org/0000-0001-7819-7956

1Universidade Eduardo Mondlane, Maputo, Moçambique.

2Universidade do Porto, Porto, Portugal.


Resumo:

A história da educação de populações indígenas em Moçambique foi marcada pela ação colonizadora de Portugal, desde o século XV até a sua independência nacional, em 1975. Com este trabalho, pretendemos apresentar e problematizar os principais marcos desse processo, no recorte temporal de 150 anos, compreendido entre 1834, em pleno Período Colonial, e 1984, no início da Era Pós-Independência. Este contributo para a compreensão da história da educação de nativos moçambicanos resulta de parte de um estudo doutoral desenvolvido no contexto das políticas educativas, realizado através de uma abordagem qualitativa com recurso ao método bibliográfico com base em fontes documentais. A interpretação dos dados assinala um conjunto de práticas colonizadoras de discriminação, marginalização e imposição de uma língua, bem como de clivagem e criação de um fosso entre as populações indígenas e os filhos dos colonizadores. A estas classes sociais estavam destinados regimes educativos diferenciados e penalizadores para os nativos, pois aqueles visavam a reproduzir e a perpetuar o sistema de dominação colonial, sobretudo por meio da sua orientação para a produção de mão de obra. Constatamos também que algumas destas marcas do passado se mantiveram na Era Pós-Independência como herança de uma certa cultura educacional com a qual o povo moçambicano se debate para alcançar os seus desígnios.

Palavras-chave: história da educação; populações indígenas; Moçambique; período colonial; pós-independência

Resumen:

La historia de la educación de las poblaciones indígenas en Mozambique estuvo marcada por la acción colonizadora de Portugal, desde el siglo XV, hasta su independencia nacional en 1975. Este trabajo pretende presentar y problematizar los principales hitos de este proceso, en el lapso de 150 años, desde 1834, durante el Período Colonial, hasta 1984, al inicio de la Era Post-Independencia. Esta contribución a la comprensión de la historia de la educación de los nativos de Mozambique resulta de una parte de un estudio de doctorado desarrollado en el contexto de las políticas educativas, realizado a través de un enfoque cualitativo utilizando el método bibliográfico basado en fuentes documentales. La interpretación de los datos nos lleva a señalar un conjunto de prácticas colonizadoras de discriminación, marginación e imposición de una lengua, así como de escisión y creación de una brecha entre las poblaciones indígenas y los hijos de los colonizadores. A estas clases sociales se les asignaron regímenes educativos diferenciados y penalizadores para los nativos, ya que pretendían reproducir y perpetuar el sistema de dominación colonial, principalmente a través de su orientación hacia la producción de mano de obra. También encontramos que algunas de estas marcas del pasado permanecieron en la época posterior a la independencia como herencia de una determinada cultura educativa con la que el pueblo mozambiqueño lucha por conseguir sus designios.

Palabras clave: historia de la educación; poblaciones indígenas; Mozambique; período colonial; post-independencia

Abstract:

The history of education of indigenous populations in Mozambique was marked by the colonizing action of Portugal, since the fifteenth century, until its national independence in 1975. This work intends to present and problematize the main landmarks of this process, in the time span of 150 years, from 1834, during the Colonial Period, to 1984, at the beginning of the Post-Independence Era. This contribution to the understanding of the history of education of Mozambican natives results from part of a doctoral study developed in the context of educational policies, carried out through a qualitative approach using the bibliographical method based on documentary sources. The interpretation of the data leads us to point out a set of colonising practices of discrimination, marginalisation and imposition of a language, as well as of cleavage and creation of a gap between the indigenous populations and the children of the colonisers. These social classes were assigned differentiated and penalizing educational regimes for the natives, since they aimed at reproducing and perpetuating the system of colonial domination, mainly through its orientation towards the production of labour. We also found that some of these marks of the past remained in the Post-Independence Era as an inheritance of a certain educational culture with which the Mozambican people struggle to achieve their designs.

Keywords: history of education; indigenous populations; Mozambique; colonial period; post-independence

Introdução

O nosso interesse sobre o passado educacional moçambicano nos levou a estudar este assunto numa perspectiva histórica. Este contributo para a compreensão da história da educação de nativos moçambicanos resulta de parte de um estudo doutoral desenvolvido no contexto das políticas educativas, realizado através de uma abordagem qualitativa com recurso ao método bibliográfico baseado em fontes documentais (Amado, 2014).

Contextualizando o tema do presente trabalho, importa esclarecer que Moçambique se encontrou sob a administração colonial de Portugal desde o século XV até os anos setenta e cinco do século XX. No entanto, somente no final do século XIX, a administração colonial se tornou efetiva em resultado das diretrizes da Conferência de Berlim (1884/85), da qual falaremos adiante.

Tal como aconteceu em muitos outros contextos africanos coloniais, nas primeiras fases da colonização, a educação e o letramento das populações locais em Moçambique estiveram inteiramente entregues a missionários, em especial a missionários católicos. Esse processo decorria de forma arbitrária e sem o controle do poder colonial. O objetivo era o de doutrinar as populações indígenas, incutir-lhes os valores da religião e da cultura dominante, estabelecendo também relações de poder e de dominação. A História ensina-nos que estes processos complexos de aculturação e de imposição de uma cultura hegemônica tendem também a aniquilar as culturas e as línguas locais, precisamente como forma política de exercício do poder.

Desse modo, iremos abordar mais detalhadamente este tema, a partir do qual focaremos a participação desigual das populações indígenas no que respeita ao direito à educação e ao processo de escolarização e letramento.

Educação no período colonial

No contexto moçambicano não se pode separar a educação missionária da educação colonial. A colonização moçambicana é um fenômeno do século XX, e é a partir desse período que um esforço sistemático de educação é feito. Os acordos entre o governo colonial e a Igreja Católica, durante a fase mais intensiva e profícua da educação no tempo colonial, provam que a separação entre a educação colonial e uma educação missionária não é pertinente. De fato, o governo colonial confia “[…] a educação indígena à igreja, ao mesmo tempo que subordina a educação aos interesses do nacionalismo colonial” (Ngoenha, 2000, p. 43).

De acordo com Ngoenha (2000), o processo de criação de instituições educativas tem lugar com a queda dos últimos reinos africanos que datam no fim do século XIX. É a partir do último quartel do século XIX que se assiste a uma intensificação significativa de viagens de exploração no interior do continente africano. Com interesses econômicos em África, vários países europeus, incluindo Portugal, tencionaram ocupar efetivamente as zonas costeiras de Angola e Moçambique, na busca de matéria-prima e mão de obra barata. Portugal, depois de ter extinto as ordens religiosas eclesiásticas, encontrava-se incapaz de responder às exigências do acordo da Conferência de Berlim (1884/85), e teve que ver as suas colônias cristianizadas e, portanto, ocupadas por concorrentes estrangeiros. Sem alternativas, e com receio de perder todas as suas colônias, Portugal concedeu subsídios a algumas missões. Desse modo, desconfiado das missões católicas, o governo português instaurou uma política instrumentalista cujos objetivos missionários não se subordinavam à política colonial portuguesa.

Apesar do esforço levado a cabo pelos educadores missionários, este frágil tecido educativo começou a deteriorar-se. Este processo foi acentuado quando o Marquês de Pombal, nos meados do século XVIII, expulsou os jesuítas e atingiu o seu ápice com o decreto de Joaquim António de Aguiar, de 1834, que extinguiu as ordens religiosas. A partir de então, o Estado substituiu a Igreja na missão educativa. Para se ocupar da educação, o Estado liberal criou as ordens seculares, os leigos, a quem é confiada a educação apesar da sua má preparação (Ngoenha, 2000).

Com a aceleração política do último quartel do século XIX e com as exigências internacionais da ocupação efetiva e da liberdade religiosa, associadas aos imperativos internos da nacionalização dos índígenas, o sistema de educação demonstrou-se ulteriormente fraco e inadequado. Na sequência disso, a partir de 1911, com a proclamação da República Portuguesa, a Igreja foi separada do Estado, e os católicos passaram a se beneficiar ainda menos do apoio oficial. No seu lugar, o Estado criou, em 1913, as missões civilizadoras, com o intuito de as responsabilizar na educação dos nativos. Ainda assim, existia um grupo que acreditava na instrumentalização da Igreja, sobretudo, na desnacionalização das missões protestantes. Em 1919, com a promulgação de medidas legislativas, o governo português fiscalizou as missões estrangeiras, obrigando-as a submeter os seus estatutos à aprovação dos governos ultramarinos. Nos últimos anos da República parlamentar, em 1922, as missões católicas passaram a ser consideradas civilizadoras.

Com o decreto de João de Belo de 13 de Outubro de 1926, o Estatuto das Missões Católicas Portuguesas da África e Timor extinguiu as missões laicas e depositou confiança nas missões católicas para toda a tarefa de educação no Ultramar Português. Na realidade, o Acordo Missionário de 1940 (Concordata) e o Estatuto Missionário de 1941 foram uma simples resolução de detalhes que dependia de um entendimento entre o governo e as autoridades eclesiásticas. Em obediência aos diplomas antes mencionados, o ensino dos índígenas foi totalmente confiado ao pessoal missionário e aos seus auxiliares.

De uma forma geral, a evolução política do ensino em África, segundo Belchior (1965), caracterizava-se por sua divisão em três períodos distintos: o primeiro período, dos descobrimentos à extinção das ordens religiosas (1834), no qual o Estado confia à Igreja toda a responsabilidade sobre os problemas do ensino e da educação, sendo os educadores todos ou quase todos sacerdotes, e o espírito que anima superiormente toda a obra educativa é o espírito católico. No segundo período, de 1834 a 1926, ano da extinção das missões laicas, também denominadas de missões civilizadoras, o Estado substituiu-se à Igreja na missão educativa, com indivíduos laicos e padres seculares como educadores, e o pensamento que imprime a orientação política do ensino é o pensamento laico. O terceiro período é marcado pelo Estatuto Orgânico das Missões Católicas Portuguesas da África e de Timor (Decreto de 13 de Outubro de 1926 apud Belchior, 1965). Neste período, o Estado e Igreja colaboram estreitamente na administração de todos os graus e tipos de ensino dividindo, contudo, os setores em que se desenvolvem ações, porque às missões católicas portuguesas é confiado todo o ensino, especialmente destinado aos indígenas. A característica deste ensino, segundo Belchior (1965, p. 5-13), é “[…] a feição nacionalista e prática […]”, sendo obrigatório, nas escolas, “[…] o uso e o ensino da língua portuguesa”. Exige-se que os professores tenham nacionalidade portuguesa, ainda que sejam de origem africana.

Vale lembrar que, a partir de 1834, com a extinção das ordens religiosas católicas e com o processo de expulsão dos frades de Moçambique, as missões católicas passaram por um período de crise na sua relação com o Estado português, colonizador, criando um vazio educativo. Durante este período da crise, que perdurou até os anos 1920-22, o ensino esteve quase exclusivamente entregue às missões protestantes, às escolas islâmicas e às missões laicas, estas chamadas de missões civilizadoras (Belchoir, 1965). Estabeleceram-se, então, em Moçambique, diversas missões protestantes que funcionavam fora do controle do governo, ensinando sem programas oficialmente aprovados e transmitindo conhecimentos em línguas estrangeiras. Durante o processo de implantação da República Portuguesa (1911), existiam, além das missões católicas portuguesas, as missões protestantes e escolas islâmicas (Belchoir, 1965), cada uma com um tipo de ensino próprio.

Essas missões de natureza laica decorriam do artigo 5° do Ato Geral da Conferência de Berlim (1884/85) que estabelecia e garantia o livre e público exercício de todos os cultos e do direito de organizar missões pertencentes a qualquer religião, nos territórios dependentes dos estados que participaram daquela reunião internacional1. Segundo Basílio (2010), nessa conferência,

[...] as potências europeias outorgaram-se o direito e a legitimidade da colonização e delinearam as fronteiras territoriais de cada colónia. Com a divisão da África, a dominação colonial transformou-se em ocupação oficial militar, ou seja, em submissão total dos estados existentes à dominação colonial. Como resultado, a partir de 1885, o Estado Português declara-se juridicamente metrópole de Moçambique (Basílio, 2010, p. 40).

O decreto de 22 de Novembro de 1913 oficializava apenas a situação existente e criava “[…] missões civilizadoras, imprimindo ao ensino o pensamento laico” (Mazula, 1995, p. 255).

Na sua proposta de periodização da história da educação colonial, Mazula (1995) refere que a educação colonial inicia-se em 1926 com o Decreto de 13 de Outubro (Estatuto Orgânico das Missões Católicas Portuguesas da África e Timor), o qual, tal como já mencionamos, extinguia as missões laicas ou missões civilizadoras, revigorando a intervenção das missões católicas.

Alguns anos mais tarde, concretamente em 1930, a administração colonial implementa uma profunda modificação do sistema educacional, com vista à obtenção de um controle mais direto sobre a educação da população negra com o objetivo de “[…] criar um sistema capaz de habilitar o indígena para o seu papel específico de trabalhador barato na economia colonial moçambicana” (Mazula, 1995, p. 46). A partir deste momento, dá-se a separação entre o ensino dos brancos e o ensino dos negros, e a legislação impede o ensino das línguas moçambicanas, exceto como recurso para o ensino da religião, prerrogativa dada no último quartel do século XIX. O ensino torna-se, dessa forma, obrigatório, e há um aumento no número de missões e igrejas católicas, por oposição à diminuição e mesmo discriminação da presença de outras religiões. O ensino passa, nessa altura, a ser dividido entre ensino elementar (para os brancos e assimilados) e ensino rudimentar (ou ‘indígena’). O primeiro era composto por 4 classes que se dividem em dois graus (o 1º, da 1ª à 3ª classe e o 2º correspondente à 4ª classe), dando depois acesso ao curso geral (1º ao 5º ano) e complementar (6º e 7º ano) do ensino liceal. O ensino rudimentar era composto por 3 classes, que correspondiam à 2ª classe do ensino elementar e davam acesso ao Ensino Profissional Indígena que, por sua vez, correspondia às Escolas Profissionais (para o sexo feminino) e às Escolas de Artes e Ofícios (para o sexo masculino), ou ao Ensino Normal Indígena, oferecido em Escolas de Habilitação de Professores Indígenas (onde eram formados professores ‘indígenas’ para o ensino rudimentar). De uma forma geral, o ensino encontrava-se num processo de reforma, dadas as circunstâncias histórico-econômicas da época.

Em 1940, a administração colonial, em estreita ligação com a Igreja Católica, assinou com a Santa Sé uma Concordata, como nos referimos anteriormente, e o ensino rRudimentar passou a ser controlado pela Igreja (Mazula, 1995). Em algumas situações, esta instituição manteve uma estreita ligação com os elementos mais repressivos do sistema colonial, como os trabalhos forçados, as culturas obrigatórias, a expropriação de terras aos camponeses e a mão de obra mal paga ou forçada (Gómez, 1999). Pretendia-se, segundo este autor, civilizar e assimilar a “[…] camada rude africana […]” ao serviço dos interesses econômicos e políticos do sistema (Gómez, 1999, p. 347). Os alunos do ensino rudimentar eram obrigados a trabalhos forçados, como forma de pagamento da instrução recebida. Tratava-se de preparar agricultores rurais e artífices que respondessem às necessidades econômicas da colónia. A ‘assimilação’, por seu turno, funcionava nesta época como um instrumento de consolidação do poder colonial e como justificação do caráter racista da política e das instituições coloniais.

Através do Decreto-Lei nº 31.207, do dia 5 de abril de 1941, assina-se o Estatuto Missionário, que regulamentava as missões (Mazula, 1995). O artigo 2° do Estatuto estabelecia que as missões católicas portuguesas eram consideradas instituições de utilidade imperial e de sentido eminentemente civilizador. No seu artigo 66 prevalecia que o ensino, especialmente destinado aos ‘indígenas’, deveria ser inteiramente confiado ao pessoal missionário e aos auxiliares. Estabelecia, ainda, o uso da língua ‘indígena’ somente no ensino da religião (artigo 69). A Concordata não só discriminava escolas para os indígenas e europeus (artigo 15) como também tolerava o uso da língua ‘indígena’ no ensino da religião católica (artigo 16). A Lei do Indigenato estabelecia que o ensino devia ser difundido por meio da língua portuguesa, mas podia ser autorizado o uso de idiomas nativos como instrumento do ensino (artigo 6).

O objetivo principal da educação, nesta fase da colonização, era a “[…] civilização dos indígenas” (Mazula, 1995, p. 47), principalmente por meio da propagação da fé cristã e dos valores e práticas europeus. A tolerância da língua indígena surgia como uma estratégia e um instrumento para exercer e reforçar o processo de colonização e de imposição territorial da língua portuguesa.

Logo após a assinatura da Concordata, a administração colonial estabeleceu a estrutura de ensino seguindo o modelo de organização do ensino ministrado por entidades religiosas. No ano de 1941, a administração portuguesa dividiu o ensino em ‘indígena’ e ‘oficial’.

O ensino oficial era destinado aos filhos dos colonos ou assimilados, o outro, indígena, era engenhosamente articulado à estrutura do sistema de dominação em todos os seus aspetos. O ensino indígena (designado também ensino primário rudimentar) tinha por fim elevar gradualmente da ‘vida selvagem’ à ‘vida civilizada’ dos povos cultos a população autóctone das províncias ultramarinas, enquanto o ensino oficial (designado também ensino primário elementar para os não indígenas), visava dar à criança os instrumentos fundamentais de todo o saber e as bases de uma cultura geral, preparando-a para a vida social (Mazula, 1995, p. 80, grifo do autor).

Em outras palavras, o Estado português instituiu um sistema educativo puramente discriminatório. O ensino ‘indígena’, dirigido aos africanos, visava a reproduzir e a perpetuar o sistema de dominação colonial. De outro lado, funcionava o ensino ‘oficial’, que tinha por propósito inculcar nos alunos o conceito de Portugal como pátria-mãe e nação intercontinental. Toda “[…] a educação dos filhos dos portugueses foi garantida por padres, alguns professores, particulares, em escolas regimentais, etc.” (Castiano, Nguenha, & Berthoud, 2005, p. 13). O ensino ‘oficial’ tinha como objetivo geral a preparação de uma elite educada que pudesse servir os interesses do Estado português, sobretudo em matéria de administração dos territórios ultramarinos (Chimbutane, 2015). Em contrapartida, o ensino ‘rudimentar’ pretendia equipar as populações locais com conhecimentos rudimentares e valores portugueses, valores esses que consistiam na civilização e na nacionalização dos indígenas por meio do ensino da língua portuguesa (Dias, 2002). A Igreja Católica, a quem se tinha dado a responsabilidade de educar os indígenas, cristianizando-os, foi vista com desconfiança pelo poder colonial e pela própria hierarquia da igreja portuguesa, pois, segundo estes, não se pregava a fé cristã identificada com os ideais imperiais portugueses. Os missionários protestantes eram acusados de desnacionalizar o nativo, isto é, desaportuguesar os africanos. Na verdade, este ensino, na visão dos portugueses, estava preocupado com a submissão dos africanos e nunca com o seu desenvolvimento cultural e científico. À minoria africana assimilada era reservada uma série de direitos e privilégios, muitas vezes incertos, correspondentes teoricamente à cidadania portuguesa. O objetivo desta política, no entanto, era continuar a manter o indígena separado, marginalizado, para melhor o controlar e o utilizar como mão de obra barata.

A administração colonial, como se pode perceber, advogou uma separação cada vez mais acentuada entre o ensino das crianças ‘indígenas’ e o das ‘civilizadas’. Em termos estruturais, este ensino para os ‘indígenas’ ou “[…] africanos não civilizados” (Gómez, 1999, p. 60) estava estruturado da seguinte forma: a) primeiro nível, ensino rudimentar, que compreendia a iniciação de 1ª e 2ª classes; b) segundo nível, ensino primário, que compreendia 3ª e 4ª classes, e a admissão, que consistia na preparação para ingressar no ensino secundário; os poucos alunos que conseguiam terminar o ensino primário podiam ingressar no ensino secundário, sendo este admitido no c) terceiro nível, no ensino profissional indígena, no ensino normal ou nos seminários. Estes alunos só podiam ingressar na escola2 com sete anos de idade, estando, a princípio, comprometida a sua continuidade escolar nas classes avançadas. O ensino para os ‘civilizados’ ou “[…] europeus e assimilados” (Gómez, 1999, p. 62) estava organizado em três níveis, nomeadamente i) primeiro nível, dividido em ensino primário com cinco classes, sendo a última acrescida em 1962; ii) segundo nível, composto pelo ensino liceal, subdividido em três outros níveis: 1º ciclo, de dois anos (ensino preparatório), o 2º ciclo, de três anos (ensino secundário) e o 3º ciclo, de dois anos (ensino pré-universitário), e iii) o terceiro nível, que compunha o ensino superior das universidades3 portuguesas.

No âmbito pedagógico, o sistema de ensino para os indígenas designou-se ‘rudimentar’ e, para as crianças civilizadas, ‘oficial’. Os dois currículos, segundo Basílio (2010), objetivavam inculcar nos moçambicanos uma identidade estrangeiro-portuguesa. No subsistema ‘rudimentar’, especificamente no primeiro ano do ensino de iniciação/adaptação (mais tarde denominado pré-primário), o aluno devia aprender os rudimentos da fala e leitura da língua portuguesa. No segundo e terceiro anos (chamados de 1ª e 2ª classes), deviam aprender a leitura, a escrita e a aritmética, bem como a e também história de Portugal, o país colonizador. O conteúdo dos livros escolares focava apenas a cultura portuguesa, ignorando a história e a geografia africanas, como podemos verificar em Zimbico (2016)

O currículo (de 1930) da Escola de Habilitação de Professores Indígenas (EHPI) do Alvor continha as seguintes disciplinas: língua portuguesa, aritmética, sistema métrico, geometria e geografia geral, cosmografia de portugal, história da civilização, história de portugal e educação cívica, física e química, ciências naturais, higiene, agricultura, desenho, trabalhos manuais, educação física, música, pedagogia, metodologia e práticas pedagógicas (Zimbico, 2016, p. 134-135).

Analisando essa estruturação curricular, podemos concluir que Moçambique apresentava-se como parte de Portugal, sendo que o povo da colônia não tinha autodeterminação, e eram desconsiderados a sua cultura, costumes e história. Outrossim, estas disciplinas valorizavam a prática e o saber-fazer, denunciando objetivos imediatamente práticos do ponto de vista da empregabilidade dos graduados desse sistema de ensino.

O subsistema ‘oficial’ pautava-se pelos princípios do ensino metropolitano. Nas duas primeiras classes, os alunos aprendiam as “[…] primeiras letras” (Gómez, 1999, p. 63) e, nas duas últimas, aprendiam conteúdos das disciplinas de geografia e história de Portugal. Os currículos eram absolutamente distintos em termos de conteúdos, objetivos e políticas. O currículo destinado aos ‘indígenas’ contemplava, ainda, temas centrados no trabalho manual. As competências definidas para esse currículo visavam à formação para o trabalho, contrapondo-se ao currículo ‘oficial’, relegando para último plano a formação para a cidadania e a socialização dos valores culturais locais (Basílio, 2010).

Dez anos depois do Acordo Missionário (1940) ter sido assinado, no qual a administração colonial conferia plenos poderes à Igreja Católica no ensino, o currículo mudou. As disciplinas lecionadas consistiram em comportamento, religião cristã, português, aritmética e geometria, história, ciências, geografia, desenho, literatura e pedagogia. A introdução da nova disciplina - religião cristã - reforçava a tripla tarefa da Igreja Católica em ‘civilizar e nacionalizar, cristianizar e instruir os indígenas’. Um outro aspecto a destacar é que o currículo de 1949/50 passou a ser relativamente pobre, em termos de conteúdos, porque deixou de ter disciplinas como sistema métrico, física e química e metodologia e práticas pedagógicas. Comparando o currículo de 1949 com o de 1930, observamos que houve algumas alterações, mas a sua estrutura basilar manteve-se, fato que indiciou um certo nível de conformidade do sistema de ensino com os objetivos a que a formação de professores se propôs neste horizonte temporal. Por outro lado, o número de disciplinas era cada vez mais reduzido, o que, à primeira impressão, podia parecer um elemento facilitador.

À luz da Portaria nº 8392, de 31 de Maio de 1950, à semelhança do Ato Colonial de 1930, a educação colonial segregava a população negra nativa, inculcando valores que reforçavam os objetivos da dominação. O Ato Colonial de 1930 consagrava a posição privilegiada da Igreja Católica nos territórios ultramarinos em relação a outras confissões religiosas, recebendo do governo português todo o apoio material necessário para o desempenho das suas funções, que consistiam em evangelizar e civilizar dentro dos parâmetros definidos pelo Império Português. O programa missionário católico estava regulamentado pela Constituição portuguesa, isto é, pelo Acordo Missionário de 1940 e pelo Estatuto Missionário de 1941. Tanto o Acordo Missionário como o Estatuto Missionário detalhavam os princípios e fundamentos da ação da igreja definidos pela Concordata de 1940. A Concordata, por seu turno, sancionava e reconhecia o império colonial português, ao mesmo tempo que estabelecia, no seu artigo 27, que as dioceses e circunscrições missionárias seriam subsidiadas pelo Estado. O artigo 15 do Acordo Missionário atribuía liberdade às missões católicas para exercerem as formas de atividade que lhes eram próprias, nomeadamente a de fundar e dirigir escolas para indígenas e europeus (Gómez, 1999).

As escolas rudimentares, criadas para os indígenas, eram precárias e orientadas para a produção de mão de obra para assegurar o empreendimento colonial. Por sua vez, diferente do ensino ‘indígena’, o ensino ‘elementar’ estava organizado e destinado aos filhos da elite colonial.

O ensino elementar é obrigatório para todos os portugueses, não-indígenas, física e mentalmente sãos, na idade escolar, e destina-se a habilitá-los a ler, escrever e contar, a compreender os factos mais simples da vida ambiente e a exercer as virtudes morais e cívicas, dentro dum vivo amor a Portugal (Ministério do Ultramar, 1950, art. 28).

Como se pode depreender da portaria acima referida, as autoridades coloniais portuguesas orientaram o ensino de acordo com as necessidades e os objectivos do processo de colonização. Já Gómez (1999) indicava que, nas escolas, todos os graus e ramos de ensino eram ministrados desde noções, conhecimentos que contribuíam para o desenvolvimento da mentalidade colonial, até a colaboração imperial. Segundo Chimbutane (2015, p. 45), isto mostra até que ponto o ensino rudimentar, quando comparado com o oficial, “[…]era menos ambicioso no que se refere ao tipo de cidadão que se pretendia forjar”. O aluno saído do ensino rudimentar “[…] devia saber apenas o mínimo para poder empregar-se e comportar-se de forma condigna na sociedade, o que incluía ser um homem dócil e submisso ante o poder colonial” (Chimbutane, 2015, p. 45).

Assim, era suficiente que os nativos se iniciassem na língua portuguesa e nos rudimentos da leitura, escrita e aritmética, como se pode ler no artigo 16 do Acordo Missionário de 1940: “[…] nas escolas indígenas missionárias é obrigatório o ensino da língua portuguesa, ficando plenamente livre, em harmonia com os princípios da Igreja, o uso das línguas indígena no ensino da religião católica” (Hastings, 1974, p. 107).

Nesta filosofia civilizadora, é notório que a Língua Portuguesa foi definida como língua de ensino, quer nas escolas oficiais, quer nas rudimentares, ao passo que as línguas locais eram usadas apenas na instrução religiosa. Importa aqui destacar que o uso da língua portuguesa como língua de ensino trouxe consequências negativas no que se refere ao desempenho dos alunos moçambicanos na escola. Estes, apesar de não dominarem o português, eram obrigados a aprender e a ser avaliados nessa língua, pondo de parte e mesmo excluindo em absoluto as suas línguas maternas, as línguas indígenas. Até 1940, os programas de ensino para africanos, europeus e asiáticos, assimilados, filhos de europeus, eram realizados pelo Departamento de Educação e Instrução da respetiva colônia. Os exames eram produzidos pelo Estado português e os diplomas eram atribuídos unicamente pelo diretor da educação. De 1940 a 1960, a Igreja Católica encarregou-se de elaborar os programas, exames e diplomas, bem como de formar professores especificamente para o ensino indígena.

A partir de 1960, a elaboração dos programas ficou sob responsabilidade do Ministério da Educação de Lisboa. Segundo Gómez (1999, p. 57), esta mudança deveu-se ao facto de Portugal ter declarado “[…] províncias ultramarinas […]” todas as suas possessões ultramarinas. Desde essa altura, as escolas missionárias passaram a ser supervisadas pelos inspetores da repartição territorial de Instrução Pública.

Como consequência dessas medidas, Moçambique apresentava a taxa mais baixa de analfabetismo comparativamente aos outros países africanos na época. O acesso à educação oficial era tão seletivo que só um número insignificante de crianças em idade escolar era efetivamente abrangido. O Quadro 1 que se segue apresenta os resultados do sistema de educação colonial referente aos anos de 1955 a 1959:

Quadro 1. Alunos africanos em Moçambique, 1955-1959. 

Ano Adaptação Elementar Secundário
Matrícula Finalistas 3º ano Matrícula Matrícula
a) b) c)
1955 240.813 5.027 3.729 10 116 105
1956 292.199 5.626 4.034 10 139 94
1957 344.027 5.860 4.468 20 185 102
1958 370.013 8.158 5.197 34 183 166
1959 391.134 9.486 5.397 41 301 169
Total 1.638.134 34.057 22.825 115 924 636

Fonte: Duffy (1962) apud Gómez (1999, p. 67).

Até os anos de 1959, a população total moçambicana era de aproximadamente 5 milhões e 500 mil habitantes. Os alunos inscritos no ensino de adaptação em cada um dos anos representavam apenas 6,55% da população. Todavia, se compararmos o total de alunos inscritos no ensino de adaptação e dos finalistas durante os cinco anos, podemos verificar que estes últimos representavam apenas 2,07% dos inscritos. Por outro lado, dos 34 mil e 57 finalistas do ensino de adaptação só 22 mil e 825 (67,01%) conseguiu matricular-se no ensino elementar. Dos 22 mil e 825 alunos matriculados no ensino elementar, apenas 7,33% conseguiu ingressar no ensino secundário, distribuídos da seguinte forma: 55,16% no ensino técnico (coluna b)), 37,97% no seminário (coluna c)) e apenas 6, 86% no ensino oficial (coluna a)).

De acordo com Chimbutane (2015), esta situação viria a mudar ligeiramente a partir de meados dos anos de 1960, graças a um conjunto de acontecimentos eminentemente sócio-políticos, como:

i) a abolição do chamado Estatuto de Indígena, em 1961, que estendeu o estatuto de cidadão português a toda a população nativa; ii) a pressão internacional sobre o caráter opressivo e discriminatório da política colonial, incluindo na sua vertente educacional; e iii) a intensificação das lutas de libertação, não só em Moçambique, como também noutras colónias portuguesas (Chimbutane, 2015, p. 46).

A conjugação destes fatores levou a algumas mudanças positivas no sistema educativo colonial, nomeadamente a expansão da rede escolar, o aumento das taxas de ingresso, a autorização de uso das línguas locais como instrumentos auxiliares no ensino da língua portuguesa ao nível primário, a africanização4 do currículo e a uniformização do ensino e seu alinhamento com o ensino metropolitano (Mazula, 1995; Gómez, 1999; Chimbutane, 2015).

Um aspeto que não deve ser negligenciado é o papel desempenhado pelas missões religiosas, particularmente as da Igreja Católica no ensino em África. A este propósito, Mondlane (1975), o qual é produto do ensino de uma dessas missões, reconhece o seu papel, justificando nos seguintes termos:

Toda a responsabilidade de educar o povo africano foi entregue à Igreja Católica, apesar do fato de a esmagadora maioria dos africanos não ser cristão. E a isto acresce o encargo de preparar aqueles africanos que pudessem se tornar assimilados à cultura portuguesa. Os portugueses acreditavam que há mais probabilidade de um africano se tornar um português completo se ele for católico (Mondlane, 1975, p. 70).

No entanto, Mondlane (1975) reconheceu que, apesar do esforço empreendido pelas missões protestantes no ensino dos africanos, as autoridades coloniais desconfiaram dos missionários protestantes, considerando que estes vinculavam, no seio da população, mensagens de desnacionalização dos nativos, e esta desconfiança era extensiva aos missionários estrangeiros da Igreja Católica. O que se constatou, em todo o sistema de ensino colonial português em África, foi o seu caráter discriminatório, ao admitir a separação dos chamados ‘indígenas’ do resto dos grupos sociais formados pelos europeus, asiáticos, ‘não indígenas’ ou ‘assimilados’5. Um outro aspeto não menos importante foi o fato de as autoridades coloniais não terem conseguido, durante todo o período da colonização, estender uma rede escolar abrangente, limitando-se apenas aos poucos centros urbanos que existiam na altura e à pouca população, na sua maioria de origem europeia.

Em outras palavras, e como refere Gómez (1999), a educação para os africanos consagrava e legitimava, na sua estrutura e nos seus objetivos e conteúdos, a desigualdade e a discriminação econômica, política e social da população africana. O ensino visava à submissão dos africanos e nunca ao seu desenvolvimento cultural ou científico. No que se refere ao ensino de crianças e jovens negros menos desigual, este só começou a ser discutido de fato pela Administração Colonial na década de 1950/60, período em que houve grandes controvérsias de ordem social, econômica e histórica, em muitos países, incluindo Moçambique. No âmbito internacional, registou-se a luta pelos direitos de igualdade social das pessoas com e sem deficiência, o que culminou com a Declaração Universal dos Direitos do Homem da Nações Unidas ONU (1948). Assim, e em consequência desse e de outros fatores sociais e políticos, surgiu, em Moçambique, o movimento de luta armada de libertação nacional, em 1962.

De uma forma geral, e como afirmamos anteriormente, a dominação colonial caracterizou-se por uma discriminação e um etnocentrismo no que se refere ao tratamento dos moçambicanos nativos. Estes foram obrigados a adaptar-se ao modelo ocidental da educação colonial, pois eram considerados bárbaros, marginais, sem identidade, sem cultura. Neste período, privilegiou-se os interesses do país colonizador e promoveu-se um sistema de ensino desigual e excludente para os negros. A escola colonial sempre separou os alunos da sua origem e realidade, levando-os a desprezarem os valores africanos e a assumir os valores do colonizador. Como diz Gómez (1999), a educação colonial foi concebida e praticada para alienar os jovens moçambicanos, o que contribuiu, em grande medida, para despoletar o sentimento de revolta e a consciência de que era possível lutar pela superação do colonialismo português. É na esteira desse sentimento que se formou a Frente de Libertação de Moçambique, a qual desencadeou a luta de libertação nacional.

O sistema de educação nas zonas libertadas

Após a formação da Frente de Libertação de Moçambique [FRELIMO] em 1962, na vizinha Tanzânia, seguiu-se uma intensa fase de preparação da luta de libertação nacional que viria a iniciar dois anos mais tarde. Para Mazula (1995), a FRELIMO simbolizava, por um lado, o culminar de um processo de resistências seculares do povo moçambicano contra o colonialismo português e, por outro lado, marcava o ínicio de novos desafios e novas contradições que levariam à construção e consolidação da unidade nacional e da edificação de um Estado-Nação. A educação moçambicana surgiu no interior desse processo, tentando diferenciar-se dos parâmetros sócios-políticos e culturais da educação colonial.

Segundo Mazula (1995, p. 104), a gênese das zonas libertadas aconteceu “[à] medida [que] a guerra de libertação nacional foi avançando, possibilitando o surgimento de territórios fora do controle da administração portuguesa, sendo estes ocupados pela FRELIMO”. Esses territórios passaram a ser chamados de zonas libertadas6. Entretanto, as primeiras zonas libertadas surgiram nas províncias do Niassa e de Cabo Delgado, pelo fato de se localizarem junto à fronteira da República Unida da Tanzânia. À medida que a guerra se alastrava para o sul, a FRELIMO ia libertando zonas e massificava o ensino no seio dos combatentes. As zonas libertadas deixavam de ser espaço restrito a um grupo, a uma categoria social, a uma comunidade linhageira ou aldeã, e tornava-se em espaço nacional mais aberto, não sem contradições, caminhando para relações sociais trans-étnicas e intra-raciais.

Este processo organizacional das zonas libertadas era visto por Machel (1974) numa perspetiva nacional, na qual a unidade nacional deveria transcender qualquer manifestação tribal, pensamento sintetizado em: “Morra a tribo, para que nasça a Nação” (Machel, 1974, p. 4).

Durante a Luta de Libertação Nacional, a educação era uma questão que preocupava os militantes da FRELIMO, uma vez que estes, na sua maioria, eram desprovidos de educação básica, e a guerra impunha uma mínima escolarização. Esta preocupação é manifestada por Mondlane quando afirma que

[...] as deficiências do sistema educacional português significavam que o nosso movimento tinha uma enorme falta de quadros em todos os campos. Podíamos compreender que o bom resultado da futura ação armada criaria a necessidade de gente com qualificação técnica e certo nível de educação básica. [...] Tínhamos, e temos, a tarefa de recuperar anos de diligente negligência sob o domínio português [...] (Mondlane, 1975, p. 137).

Mondlane (1975) via a educação como o único meio para desenvolver a luta e para formar cidadãos capazes de tomar consciência sobre a situação de Moçambique. Sob mesma visão, Machel (1980a) defendia a formação dos quadros para a construção de um moçambicano com novos ideais, isto é, com ideais nacionalistas, como se pode verificar:

[…] tendo em conta o caráter particularmente obscurantista do colonialismo português, impõe-se a necessidade da rápida elevação do nível de conhecimentos científicos: a educação científica e literária aparece como prioridade, uma necessidade para o desenvolvimento posterior da luta armada e da reconstrução nacional (Machel, 1980a, p. 32).

A insistência de Mondlane (1975) e Machel (1980a) na educação não só serviu para desenvolver a luta de libertação como também para reduzir o índice de analfabetismo e para criar a consciência de cidadania no seio dos moçambicanos.

A educação devia acompanhar e dar sustentação ao processo transformador de luta de libertação nacional. A luta de libertação, na perceção de Machel (1980b) não consistia apenas na libertação da terra mas também na reconquista da personalidade moçambicana e da sua cultura, bem como na criação de uma nova mentalidade. A tarefa da educação era estabelecer um combate contra o analfabetismo que, segundo Machel, era produto do colonialismo. As escolas deviam combater a superstição, o individualismo, o egoísmo, o elitismo e a ambição. No âmbito pedagógico, os professores e alunos deviam aprender uns com os outros, num clima de confiança que os permitisse valorizar os seus talentos para a reconstrução de um novo país.

De uma forma geral, a educação era considerada importante para consolidar o sentimento de identidade nacional e como um espaço de aquisição do saber técnico, visto que permitia adquirir conhecimentos para a luta e desenvolver a produção nas zonas libertadas. Segundo Gómez (1999, p. 223), “[…] a educação foi concebida como instrumento fundamental para resgatar a dignidade do povo moçambicano, a sua cultura e ao mesmo tempo dar sustentação o projeto sócio-político da FRELIMO”.

Neste processo de luta de libertação, foram criadas novas escolas, com o intuito de inculcar na população uma nova maneira de pensar e agir diferente da educação colonial. Pretendia-se, de acordo com Gómez (1999, p. 92), formar um moçambicano “[…] livre da opressão e de alienação coloniais, capaz de recuperar, individual e coletivamente, a sua história e dignidade”. A luta de libertação torna-se, assim, uma brusca ruptura, política e cultural, com o sistema colonial. Uma vez que este tinha desprezado o desenvolvimento da população nativa e truncado a sua formação para a moçambicanidade, a FRELIMO definiu a educação como a principal arma para o desenvolvimento humano. Para tal, a Frente de Libertação lançou um projeto de construção de uma grande escola para a formação do Homem Novo, tendo ela dois objetivos principais: i) contrariar os objetivos da educação colonial, concebendo a educação como o único caminho para o povo tomar o poder, e ii) encarar a escola como espaço para renovar a cultura e a história do povo moçambicano e, ainda, para construir o Estado nacional.

Detendo o poder de controle nas ‘zonas libertadas’, a FRELIMO criou milícias que se subordinavam à estrutura local do partido e aos chefes militares. Além disso, organizou escolas de alfabetização, onde os objetivos políticos se articulavam com os pedagógicos. Em função desses objetivos, nas novas escolas, a população passava a discutir questões ligadas à revolução e ao patriotismo, tentando eliminar as diferenças de oportunidades de acesso ao ensino. Dessa forma, o currículo refletia questões inerentes à revolução, à luta, à produção, à disciplina, ao patriotismo e ao espírito de fratenernidade e unidade nacional (Gómez, 1999).

Na sequência do deficiente e distorcido ensino colonial, o movimento deparou-se com a falta de quadros em todos os setores, e o futuro da ação armada ficava dependente da existência de pessoas qualificadas no nível técnico e com um grau básico de educação. A elevada taxa de analfabetismo também dificultava o despertar da consciência política da população. A FRELIMO lançou, assim, uma campanha de massificação do ensino nas zonas libertadas, articulando educação formal, alfabetização, escolarização de adultos e formação de professores. Como reflexo dessa articulação, o sistema educativo estruturava-se em educação formal, alfabetização e escolarização de adultos e formação de professores (Mazula, 1995). A educação formal, destinada a crianças e adolescentes, abrangia quatro níveis: o Pré-Primário para centros infantis, o Primário de quatro séries, o Secundário de quatro séries e o Universitário, que não chegou a funcionar. A alfabetização e a escolarização dos adultos eram destinadas aos guerrilheiros que, por sua vez, ensinavam as populações.

A FRELIMO concebeu a alfabetização como o ato de ensinar a ler e a escrever na língua portuguesa. Como se sabe, a aquisição do estatuto de não indígena ou assimilado no período colonial dependia do domínio do português (Zimbico, 2016). Esta língua tornou-se uma forma de capital social diretamente ligada aos sistemas simbólicos, ideológicos e econômicos que dominavam e controlavam a mobilidade social e relacionavam as habilidades pessoais com a estratificação social dentro da colônia. No entanto, as limitações impostas pela administração colonial, que não tinha capacidade nem vontade de alargar a classe de africanos ‘civilizados’, impediram a sua aquisição e domínio, de tal sorte que, quando se proclamou a independência de Moçambique, o português fazia parte do reportório linguístico de um grupo minoritário moçambicano. Além disso, e por questões de herança colonial que havia estabelecido uma hierarquia social das línguas, o português tornou-se língua de prestígio. Ademais, na educação, essa língua representava uma condição político-ideológica fundamental para o sucesso da luta armada. Foi, desta forma, que a FRELIMO concebeu paralelamente um programa militar e um programa educacional implementados nas zonas libertadas.

A associação da língua portuguesa com prestígio e mobilidade social não desaparece com a independência nacional, sendo reforçada pelo fato de o português ter sido envolvido em um novo quadro ideológico que o promoveu e o adotou como símbolo da unidade nacional, língua oficial e de instrução de Moçambique. No entanto, a adoção do português como língua oficial significou, em termos práticos, que, tal como no período colonial, continuasse a ser a única língua usada em eventos sociais. De fato, uma vez que as elites burocráticas e empresariais eram educadas em língua portuguesa e se comunicavam, amiúde, em línguas locais, mas exclusivamente em ambientes caseiros ou em domínios não institucionais, elas não estavam preparadas para o exercício de atividades oficiais mediante uma comunicação nestas línguas (Zimbico, 2016).

Disso depreendemos que alfabetizar os militantes da FRELIMO a partir da língua portuguesa provavelmente tenha sido a estratégia política e ideológica que se encontrou para servir os propósitos anticoloniais de reconstrução e modernização da sociedade moçambicana. Havia toda uma necessidade de se formar um Homem Novo munido de uma língua comum, já que as línguas locais não estavam preparadas para a aquisição de conhecimento em instituições oficiais. A escola deveria formar os quadros para as tarefas de ação política e armada. Ela deveria garantir a educação política, pois era necessário elevar continuamente o nível político e cultural dos militantes da FRELIMO e dos que se encontravam afetados às tarefas da reconstrução (Buendia, 1995). A FRELIMO sabia que só com a educação é que se podia tomar o poder. Segundo Gómez (1999), nessa altura, a educação tinha como finalidade fundamental apoiar a construção da unidade nacional, e não o caráter da classe da escola. Os cursos ofertados seriam abrangentes, e não separados, como no tempo colonial (Mondlane, 1975).

No que se refere à formação e educação de professores, estas eram ministradas em cursos nacionais e provinciais, cuja duração variava entre dois meses e dois anos. Os professores podiam formar-se em função das classes em que iam lecionar:

a) professores do 5° ano do liceu mais 2 anos do magistério primário para lecionar até à 4ª classe; b) professores da 4ª classe mais 4 anos de formação profissional para lecionar até à 3ª classe; c) professores cuja habilitação era 4ª classe mais um curso de duração de 2 meses para lecionar até à 2ª classe (Basílio, 2010, p. 104).

Esses professores asseguravam a educação indígena em Moçambique, embora tivessem pouca qualificação para o efeito. Quanto aos mecanismos de funcionamento das escolas criadas nas ‘zonas libertadas’, Mondlane (1975) expõe que, por falta de recursos humanos devidamente preparados, o grau de instrução ministrado nas referidas escolas não passava do rudimentar, orientado para as necessidades das crianças, tendo em conta o seu contexto cultural aliado ao contexto da luta nacional. A falta de professores devidamente formados dificultava o desenvolvimento de uma teoria educacional e obrigava à criação, nas zonas libertadas, de um tipo de escola que herdava o modelo colonialista. E como refere Gómez:

[...] nesta fase, a inadequação entre os fins e os meios não se devia, fundamentalmente, à resistência por parte dos professores em assumir um novo tipo de educação, mas à falta de conhecimento e prática nos professores, dado o seu nível de formação ser extremamente deficiente. É de salientar o esforço gigantesco que estes professores realizaram para implementar os programas educacionais durante a luta de libertação (Gómez, 1999, p. 165).

O baixo nível de formação dos professores, associado à falta de conhecimento e à inexperiência do novo tipo de ensino, privou que a educação tivesse grandes avanços no que tange ao saber, reproduzindo-se deste modo a desigualdade social (Gómez, 1999). No nosso entender, acreditamos que a adoção da língua portuguesa como meio de ensino na alfabetização podia ser considerada um entrave para o progresso do ensino nas zonas libertadas. Devido à falta de professores formados para lecionar nas escolas, a FRELIMO convocou todo o moçambicano com um mínimo de preparação literária para que se prontificasse a ensinar na alfabetização.

Um dos maiores desafios da política educacional da FRELIMO, nesta fase de luta de libertação, foi a inadequação da competência técnica com a competência política. Existia uma contradição entre o que se pretendia fazer e a capacidade da sua materialização. Tratava-se, segundo Buendia (1995, p. 351-352), da relação entre “[…] o compromisso político e a competência técnica”. Nessa relação, é difícil imaginar a eficácia do compromisso político sem a correspondente competência técnica. Apesar de todas as dificuldades e carências sentidas nesta fase de luta de libertação nacional, pela primeira vez na história da educação, conseguiu-se alfabetizar crianças e jovens fora do colonialismo, embora pese, até a altura da independência, que o nível de analfabetismo fosse de 93% (Chimbutane, 2015), de um total de 10,6 milhões de habitantes (II RGPH, 1997 apud Zimbico, 2016). Com a independência nacional, tentou-se aplicar, em todas as escolas nacionais, a experiência educacional adquirida durante a luta de libertação nacional. Perspectivava-se uma escola democrática, na qual os professores e alunos deviam aprender uns com os outros, num clima de confiança, de relações harmoniosas, em que se valorizassem os talentos com a finalidade de construir a nação.

Paralelamente ao ensino, dentre várias matérias, como a leitura, a escrita, a aritmética e o civismo, as escolas praticavam agricultura e outras atividades afins, e o ensino mais especializado era feito no Instituto Moçambicano, a funcionar em Dar-es-Salam, na República Unida da Tanzânia.

Em 1974, no processo da Assinatura dos Acordos de Lusaka7, assistiu-se à fuga massiva dos cidadãos portugueses, pela sombra da perda dos seus privilégios e pelo fato de se suspeitar o seu envolvimento com o aparato colonial, o que resultou no encerramento de muitas escolas, em razão da falta de professores. Importa referir que a fuga massiva de cidadãos portugueses, dentre eles, professores e missionários católicos, derivava de um corte transversal que a FRELIMO tinha estabelecido com a administração colonial em todos os sentidos e da implantação de uma nova administração com quadros locais. Para suprir o défice, o governo mobilizou as pessoas com 9ª, 10ª e 11ª classes concluídas e enquadrou-as nas instituições sócio-políticas do Estado. Tal estratégia serviu para o Estado eliminar todos os vestígios do colonialismo, desmontar o sistema do ensino colonial e construir novos valores, padrões e princípios voltados à moçambicanidade. O conhecimento ministrado nas escolas passou a ser uma escolha feita a partir do universo cultural moçambicano. Foi dessa forma que a FRELIMO conseguiu não só reafirmar a ideia de reafricanização dos conteúdos escolares como também assumiu o controle das instituições culturais, sociais e econômicas.

Na tentativa de evitar o caos na área da educação, a FRELIMO recrutou moçambicanos com alguma preparação acadêmica para lecionar nas escolas primárias e secundárias; nas zonas onde não existia qualquer instituição educativa, surgiram as ‘escolas do povo’, criadas e construídas pela população; a comunidade estudantil aumentava significamente, verificando a explosão escolar nos primeiros anos.

Entretanto, conforme o Ministério da Educação e Cultura [MEC] (1979, p. 8), “[…] a falta de estruturas nacionais de controlo, dinamização e apoio destas atividades e em consequência, a falta de métodos, programas, livros nacionais assim como outro material, cedo determinaram uma diminuição considerável na participação da população”.

Assim, o que podemos perceber em todo esse processo de ensino nas zonas libertadas é a necessidade de, mediante as exigências da guerra, moldar uma nova sociedade, livre dos preconceitos coloniais e capaz de compreender a necessidade da guerra, levando-a até a independência nacional. A educação era um direito para todos os cidadãos moçambicanos, independentemente da sua raça, cor, religião e língua.

O sistema de educação no período pós-independência (1975)

Proclamada a independência nacional, que era o objetivo central da luta armada de libertação nacional, a FRELIMO iniciou um programa de construção da nação moçambicana, com uma orientação socialista. Esta ideia foi claramente manifestada no Relatório do Comité Central da Frente de Libertação de Moçambique [FRELIMO] ao 3º Congresso, realizado em 1977 (p. 58), quando expressava que “[...] a Constituição da República visava a edificação das bases políticas, ideológicas, científicas e materiais da sociedade socialista”. Quanto ao setor de educação, Gómez afirma que,

[...] sintetizando a sua experiência educacional e tendo presente a sua estratégia política para o setor da educação, desenvolvida durante a luta de libertação nacional, a FRELIMO orientou o Governo de Transição para que a instrução, a educação e a cultura fossem colocadas prioritariamente ao serviço das massas oprimidas e humilhadas pelo sistema de exploração colonial e capitalista. A educação foi concebida como instrumento fundamental para resgatar a dignidade do povo moçambicano, a sua cultura e ao mesmo tempo, dar sustentação ao projeto sócio-político da FRELIMO (Gómez, 1999, p. 221).

Na verdade, a experiência vivida nas ‘zonas libertadas’, no campo da educação, será importante nesta nova fase da história de Moçambique. No que diz respeito às primeiras ações da FRELIMO e do Governo, Mazula sintetiza-as nos seguintes termos:

A intervenção da FRELIMO foi de natureza política, enquanto o Ministério da Educação e Cultura se concentrou mais na sua estruturação e na organização das Escolas. As intervenções procuravam corresponder à natureza da revolução, no sentido de processo. Havia consciência de planificar as ações de médio e longo prazo com conhecimento profundo da realidade, que se inserissem no projeto político global e ultrapassassem a dimensão do imediato. Porém, a prioridade foi responder aos desafios imediatos e mais gritantes (Mazula, 1995, p. 151).

O ensino era nacionalizado com objetivo de se criar um único sistema educacional. As nacionalizações pretendiam erradicar a possibilidade da emergência da burguesia enquanto classe e introduzir novas relações sociais de produção através da criação das empresas estatais e das cooperativas de produção (Gómez, 1999). O Estado absorvia, deste modo, ‘as escolas do povo’, e registava-se um aumento de número de efetivos escolares.

Seguindo as diretrizes revolucionárias, no mesmo ano da independência (1975), foi realizado, na cidade da Beira, o primeiro Seminário Nacional de Educação, organizado pelo Ministério de tutela. Este Seminário reuniu professores primários e secundários e quadros com experiência acumulada em matéria de educação nas zonas libertadas, tendo-se discutido, dentre outros assuntos, os mecanismos para implementação nas escolas, os princípios da ideologia da FRELIMO, assim como os métodos de organização que deviam ser seguidos. O currículo escolar deveria traduzir a nova realidade sócio-política do país. De acordo com o MEC (1980), o currículo devia eliminar todos os objetivos e conteúdos que faziam menção ao colono. As disciplinas de história e geografia foram as que mais transformações tiveram, pois estas ignoravam a existência da história e da geografia de Moçambique. O Seminário propôs novos programas de ensino, novos conteúdos, mas os métodos de ensino eram praticamente os mesmos do sistema colonial, como refere Gómez:

[…] a reforma dos conteúdos, não provocou, necessariamente, uma modificação dos métodos de ensino. […] No caso moçambicano, tendo em conta o nível de formação política e pedagógica dos professores, a alteração dos conteúdos não provocou uma mudança na relação professor-aluno nem foram superados métodos autoritários herdados da escola velha (Gómez, 1999, p. 239).

O Seminário também propôs alterações na estrutura e no funcionamento escolar. Sobre como as escolas deviam organizar-se, Gómez (1999, p. 240) faz referência à elaboração de um documento designado ‘Organização Política e Administrativa das Escolas’ [OPAE] (1975/76 apud Gómez, 1999), instrumento que “[…] pretendia introduzir um novo ambiente, capaz de favorecer a implementação e desenvolvimento da democracia popular nas escolas”.

Este documento, segundo Mazula (1995, p. 152), “[...] definia os métodos de trabalho coletivo, métodos de direção, apontava formas de democratização e aprendizagem do exercício do poder, através de coletivos de alunos e professores e dava orientações para a Ligação Escola-Comunidade [LEC]”. O documento tinha por objetivo pôr fim ao ambiente de desorganização e de liberalismo e à instabilidade que se vivia nas escolas.

Todavia, Machel (1979, p. 17) menciona que a OPAE, como documento de orientação, “[…] nunca proporcionou às escolas os resultados esperados, em virtude de não corresponder à realidade concreta das escolas”. As escolas ainda sofriam influências ideológicas do passado colonial e tradicional da sociedade. Houve, em sequência disso, direções de escolas e professores que, em nome das exigências da OPAE, desenvolveram relações autoritárias com os alunos - ideologia colonial -, o que Machel (1979) já receava nos seus discursos. A relação professor-aluno desdobrou-se em duas linhas: uma, a mais frequente, tendia para o autoritarismo, no qual o professor se impunha ao aluno na medida em que detinha o poder de o avaliar com consequências para a passagem de classe; e outra tendia para a relação de compadrio, de compromisso tácito entre aluno e professor, em que não faltava a corrupção ética no professor e, no aluno, a falta de respeito pelo professor (Gómez, 1999).

De uma forma geral, podemos afirmar que o setor educacional sofreu, sem dúvida, mudanças significativas, embora, na prática, tais mudanças pouco se fizeram sentir. As transformações limitaram-se à modificação dos conteúdos coloniais dos programas e à introdução de formas alternativas de funcionamento quotidiano nas escolas, mas o sistema educacional continuava o mesmo herdado do sistema colonial (Gómez, 1999). Desta feita, e corroborando este autor Gómez (1999), podemos considerar que as alterações feitas pela OPAE nos novos programas de ensino, na estruturação e no funcionamento escolar foi um total fracasso que, no entender de Machel (1978, p. 4-6), desencadeou uma “[...] crise de autoridade nas escolas”.

Em 1979, a crise educativa persistia, e era nítida a dicotomia entre a filosofia de ensino defendida por Samora Machel, que visava ao progresso coletivo8 e solidário do povo moçambicano, e o sistema em vigor, que pressupunha, até nos seus métodos avaliativos9, a ‘seleção dos melhores’, fomentando, assim, as desigualdades sociais e o fracasso escolar. De acordo com Gómez,

[...] a forma como se tentou resolver o problema do fracasso escolar e se procurou a melhoria da qualidade de ensino colocou de lado a participação popular, confiando-se apenas nos aspetos de ordem técnica: aumento de tempo de formação de professores, elaboração de materiais escolares e redução do rácio aluno/professor (Gómez, 1999, p. 330).

A guerra civil, também chamada de guerra de desestabilização (1977-1992), entre o governo e a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) agudizou a crise no sistema educacional e na saúde. Escolas e hospitais foram destruídos e a população foi obrigada a migrar para zonas mais seguras (Gómez, 1999).

Em 1980, e sob orientação do 3º Congresso (1977), a FRELIMO aprovou o Plano Prospetivo Indicativo [PPI] com o objetivo de ajustar a crise educativa, econômica e, ainda, da modernização social. Este plano definia metas e idealizava grandes projetos econômicos pela indústria pesada que aceleraria a socialização do campo, criaria bases para a eliminação do subdesenvolvimento em dez anos, situando, dessa forma, o país ao nível dos países desenvolvidos. Segundo Gómez (1999), isto implicou uma adequação do sistema educacional às necessidades de formação de quadros qualificados para os diferentes setores de economia.

A FRELIMO “[…] pretendia dar o grande salto para o socialismo. Criava-se a ilusão, como possibilidade racional de o subdesenvolvimento ser vencido numa década e o sucesso da educação resultar do rápido desenvolvimento económico” (Mazula, 1995, p. 170). O PPI foi lançado na perspectiva de um desenvolvimento econômico equilibrado para todo o país. Dentro do PPI foram delineados macroprojetos industriais, como: tétil de Mocuna, Texlon da Matola, Text-África de Chimoio; fábricas de descaroçamento de algodão de Ribáue, de Cabo Delgado, do Niassa; distribuição da rede elétrica para todas as capitais provinciais e distritais. Dentre os mega-projetos, destaca-se o do sistema nacional de educação, que culminou com a reforma curricular, com a extenção da rede escolar e com a criação de centro de formação de professores.

No contexto da política de desenvolvimento, a educação deveria desempenhar um grande papel na formação para a cidadania e para o trabalho, contribuindo para a eliminação da pobreza. Isso significa que a educação ainda era uma prioridade na construção desta nova sociedade independente.

Não obstante os primeiros esforços de reformulação dos programas, dando-lhes um conteúdo de classe, da contenção de explosão escolar, da planificação da educação, a estrutura do sistema educativo permanecia inalterada no essencial, subsistindo a contradição entre o tipo de formação social do sistema antes em vigor e a sua contribuição real para o desenvolvimento global do país. Na verdade, persistiam os seguintes problemas: deficiente articulação entre os níveis de ensino, as áreas de formação e os conteúdos programáticos; a rede escolar distorcida, entre outros (Mazula, 1995).

Como resposta a estas contradições, a FRELIMO encabeçou o Ministério da Educação [MINED] para conceber um sistema de educação com características modernas, mas que buscasse responder aos novos desafios do povo moçambicano. À época, a então ministra da Educação, Graça Machel, numa reunião de balanço promovido pelo Ministério da Educação e Cultura [MEC], em 1979, propôs a elaboração de um novo Sistema Nacional de Educação [SNE], proposta esta materializada quatro anos mais tarde. De acordo com a ministra, o novo sistema educacional deveria resolver o problema de exclusão e da descontituidade entre os diferentes níveis e cursos, proporcionar a formação geral e profissional e consolidar a unidade e a identidade nacional.

Em 1981, o MINED elaborou um documento que foi apresentado na 9ª sessão da Assembleia Popular, denominado Linhas Gerais do Sistema Nacional de Educação, sendo este aprovado em 1983 pela Lei 4/83, de 23 de março. Um dos objetivos gerais desta lei consistia no direito à educação para todos, respeitando os objetivos políticos, os princípios pedagógicos e a estrutura do sistema de educação. Segundo os princípios gerais da Constituição da República... (1990, 2004), a educação é um direito que se efetiva no acesso das crianças à educação para todos, conforme atesta o Boletim da República: “[…] o sistema nacional de educação garante o acesso dos operários, dos camponeses e dos seus filhos a todos os de ensino, e permite a apropriação da ciência, da técnica e da cultura pelas classes trabalhadoras” (Moçambique, 1983, p. 13).

Perspectivava-se, com essa lei, oferecer uma educação de qualidade que combatesse os altos índices de reprovações e desitências. No entanto, e de acordo com Gómez (1999, p. 351), “[…] a materialização desse objetivo foi condicionada e limitada pela falta de professores formados e pela implantação insuficiente da rede escolar”. O Estado decretou a educação, porém não ampliou esse direito para todos. O sistema manteve a exclusão na medida em que a educação não foi obrigatória e gratuita no sentido verdadeiro do termo. As escolas cobravam taxas de matrícula anualmente, fato que impossibilitou, ao longo do tempo, a escolaridade de crianças em condições precárias. Para além dos objetivos acima citados, o SNE instituía que

[...] todo o processo de formação se desenvolvesse na base da ligação teoria-prática, condição fundamental para a compreensão da realidade, assimilação do conhecimento científico e transformação da natureza e da sociedade. Este princípio materializou-se nos conteúdos e métodos de ensino das várias disciplinas, na ligação escola-comunidade (Mazula, 1995, p. 182).

Conforme Castiano et al. (2005, p. 73), o sistema de educação permitia uma saída dos utentes para o mercado do trabalho a quatro níveis, elementar básico, médio e superior. A articulação horizontal e vertical do sistema de educação e a unidade sistêmica circunscreviam-se nos princípios pedagógicos, cujas orientações básicas eram a ligação à escola/comunidade; a concepção da escola como um fator dinamizador do desenvolvimento sócioeconômico e cultural da comunidade; a ligação entre a teoria e a prática, entre o trabalho e o estudo; a unidade dialética entre a educação científica e a educação ideológica, a partir da qual se refletia a orientação política e ideológica da FRELIMO.

Em termos de estrutura, o SNE foi organizado em cinco subsistemas que se complementam entre si, nomeadamente o subsistema de Educação Geral, de Educação de Adultos, de Educação Técnico-Profissional, de Formação de Professores e de Educação Superior. Além dos subsistemas, o sistema de educação foi estruturado em quatro níveis: primário, secundário, médio e superior. O subsistema de Educação Geral constitui o eixo central do SNE e confere a formação integral e politécnica ao cidadão moçambicano. Ele atende crianças e jovens dos seis aos nove anos de idade. Nele, o aluno desenvolve as capacidade intelectuais, físicas, culturais e manuais. Um dos seus objetivos é “[…] detetar e incentivar aptidões, habilidades e capacidades especiais nomeadamente intelectuais, técnicas, artísticas, desportivas e, ainda, proporcionar educação especial para crianças e jovens deficientes e com dificuldades de integração social” (Lei nº 4, 1983, art. 12).

No entanto, e como diz Gómez (1999), a efetivação deste objetivo foi limitada na medida em que o Estado não teve em conta as dificuldades sócioeconômicas, como a capacidade da rede escolar e a socialização do campo, pelas quais o país passava à época.

Portanto, de uma forma geral, apesar de o Sistema Nacional de Educação refletir a realidade moçambicana, ele apresentava influências provindas do sistema socialista, pois tanto na sua concepção como na sua introdução estiveram envolvidos técnicos alemães, russos e cubanos na elaboração do material didático. Por outro lado, o sistema continuava também ligado à tradição colonial não apenas pelo uso de materiais didáticos portugueses mas também pelo método de ensino, uma vez que os professores, na sua maioria, vinham da tradição colonial e eram conservadores. Um outro aspeto que verificamos foi a impermeabilidade do ensino e a centralidade na memorização. A metodologia do currículo desse sistema priorizava a comunicação e a memorização em relação à escrita, leitura e compreensão.

Considerações finais

A interpretação dos dados leva-nos a assinalar um conjunto de práticas colonizadoras de discriminação, marginalização e imposição de uma língua, bem como de clivagem e criação de um fosso entre as populações indígenas e os filhos dos colonizadores. A estas classes sociais estavam destinados regimes educativos diferenciados e penalizadores para os nativos, pois aqueles visavam a reproduzir e a perpetuar o sistema de dominação colonial, sobretudo através da sua orientação para a produção de mão de obra. Constatamos também que algumas destas marcas do passado se mantiveram na Era Pós-Independência como herança de uma certa cultura educacional com a qual o povo moçambicano se debate para alcançar os seus desígnios.

Pelo exposto, concluímos que a educação em Moçambique só começou a ser verdadeiramente debatida na década de 1930, com a presença dos portugueses. Isso não significa que, durante a Conferência de Berlim (1884/85), o interesse em educar os africanos não era objeto de preocupação. Havia interesses coloniais de toda a ordem. Contudo, apesar do enorme esforço para romper com o passado, algumas opções políticas levadas a cabo depois da independência representaram a continuidade das políticas educativas coloniais, ainda que assentes em diferentes pressupostos ideológicos. Nos dois períodos, pretendia-se atingir uma alegada uniformização nacional, entendida como o garante da integração e harmonia social. No período colonial, esta uniformização implicava a nacionalização do nativo, isto é, o esforço de o tornar português a todo o custo e aniquilar as suas línguas indígenas e a sua cultura, bem como fazendo-o pertencer a uma outra classe social, em conformidade com todos os preconceitos coloniais que foram expostos. No período Pós-Independência, a uniformização era encarada como condição necessária à constituição do Estado-Nação.

Acreditamos que as especificidades de cada período histórico abordado poderão servir de referenciais para futuros trabalhos na história e historiografia da educação das populações indígenas em Moçambique, destacando a importância que este exercício de reflexão pode assumir na formação dos profissionais da educação.

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1Este princípio foi mais tarde consignado no Ato Geral da Conferência de Bruxelas (1887) e na Convenção Anglo-Portuguesa de 1891.

2As redes escolares ainda não tinham sido expandidas para as zonas residenciais periféricas, sobretudo onde não havia europeus ou assimilados. As escolas existentes estavam muito equidistantes umas das outras, o que não permitia uma criança de sete anos percorrer muitos quilômetros. Acrescenta-se, ainda, o fato de as escolas missionárias não oferecerem, nessa altura, o último grau do ensino primário, obrigando os alunos africanos a concluírem tal grau nas escolas oficiais (Gómez, 1999, p. 60-61).

3Em Moçambique, a primeira universidade surge quase no fim do colonialismo, nos anos 1963 (Gómez, 1999).

4Segundo Gómez (1999, p. 64), a reforma educacional de 1964, pelo Decreto nº 45908/64, determinou que “[...] os conteúdos e métodos do ensino primário deviam ser adaptados às realidades locais”.

5“A distinção entre indígenas e não-indígenas foi estabelecida em 1899, com a lei colonial do trabalho preparada por António Ennes. Ela distinguia entre cidadãos com plena cidadania portuguesa vivendo sob a lei metropolitana (não-indígenas) e aqueles que estavam sob a lei africana, que eram sujeitos ao contrato de trabalho e ao xibalo (trabalho forçado). A distinção foi por várias vezes mais refinada, como, por exemplo, com a introdução da Carta Orgânica de 1933, a primeira Constituição de Moçambique. Para adquirir o estatuto de não-indígena ou assimilado (plena cidadania portuguesa), um africano tinha que preencher certos requisitos, que incluíam o conhecimento do Português, rendimento estável, nível de educação (4ª classe) e aceitação de monogamia” (Firmino, 2002, p. 225).

6“As zonas libertadas e semi-libertadas [...]” eram zonas onde “[...] a totalidade da vida das massas dependia da orientação da FRELIMO” (Machel, 1980a, p. 34).

7Trata-se do acordo assinado em 7 de setembro de 1974 entre o governo ortuguês e a FRELIMO, em Lusaka, cujo objetivo principal era o cessar-fogo, além de garantir a independência nacional ao povo moçambicano (cf: Gómez, 1999).

8“Tratava-se de um modelo em que todos (‘direção da escola, comunidade, estruturas do Partido FRELIMO’) podiam dirigir. O modelo de direção coletiva nas escolas prevaleceu até 1978, quando se redefiniram e se reestruturam as direções das escolas, com base numa conceção de ‘unidade do poder’” (Gómez, 1999, p. 333, grifo do autor).

9“O sistema de avaliação permaneceu o mesmo, o herdado do sistema colonial, com exames nacionais para todas as classes. Um sistema criado para classificar e, sobretudo, selecionar os melhores, os mais aptos, os melhor dotados, critérios cuja base teórico-filosófica está intimamente ligada às teorias psicológico-biológicas do século XIX” (Gómez, 1999, p. 330).

21Nota: Este trabalho é apoiado por fundos nacionais através da FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., no âmbito do Financiamento Plurianual do Centro de Investigação e Intervenção Educativas (CIIE) 2020-2023 (projetos com as referências UIDB/00167/2020 e UIDP/00167/2020).

25Rodadas de avaliação: R1: três convites; duas avaliações recebidas.

26Como citar este artigo: Bavo, N. A. C. N., & Coelho, O. A educação de populações indígenas em Moçambique: do Período Colonial ao início da Era Pós-Independência. (2022). Revista Brasileira de História da Educação, 22. DOI: http://dx.doi.org/10.4025/rbhe.v22.2022.e219

Recebido: 21 de Novembro de 2021; Aceito: 15 de Fevereiro de 2022; Publicado: 01 de Julho de 2022

* Autora para correspondência. E-mail:nazianhongo@gmail.com.

Názia Anita Cardoso Nhongo Bavo é Mestre em Didática do Português L2/PLE e Doutora em Ciências da Educação. Professora Auxiliar no Departamento de Línguas da Faculdade de Letras e Ciência Sociais. Diretora do curso de Licenciatura em Ensino de Português na Faculdade de Letras e Ciências Sociais da Universidade Eduardo Mondlane. Investigadora, docente e orientadora de trabalhos académicos de licenciatura no curso de Ensino de Português. Possui comunicações e artigos publicados em livros, revistas científicas nacionais e internacionais, no campo da Educação Bilingue e Educação de Surdos em Moçambique e no estrangeiro. E-mail: nazianhongo@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-9057-9575

Orquídea Coelho é Mestre e Doutora em Ciências da Educação, Professora Associada da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto, Investigadora do Centro de Investigação e Intervenção Educativas. Coordenadora da DeafCoPIn-Deaf Studies. Coordenadora de equipas portuguesas em diversos projetos Europeus. Membro da Comissão de Ética da Universidade do Porto. Exerce investigação, docência e orientação de trabalhos académicos (Mestrados, Doutoramentos, Doutoramentos Sanduíche, e Pós-Doutoramentos) no campo dos Estudos Surdos e Educação de Surdos, contando com diversas publicações e comunicações em Portugal e estrangeiro. E-mail: orquidea@fpce.up.pt https://orcid.org/0000-0001-7819-7956

Editores-associados responsáveis: Adlene Arantes E-mail: adlene.arantes@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-7007-0237

José Gonçalves Gondra E-mail: gondra.uerj@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-0669-1661

Surya Aaronovich Pombo de Barros E-mail: surya.pombo@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-7109-0264

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