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Série-Estudos

versión impresa ISSN 1414-5138versión On-line ISSN 2318-1982

Sér.-Estud. vol.26 no.56 Campo Grande ene./apr 2021  Epub 22-Jul-2021

https://doi.org/10.20435/serie-estudos.v26i56.1416 

Artigos

Implicações da implementação do Programa Mais Alfabetização: reflexões a partir da gestão escolar

Implications of implementation of the More Literacy Program: reflections from school management

Implicaciones de la aplicación del Programa Más Alfabetización: reflexiones de la gestión escolar

Juliana Pedroso Bruns1 
http://orcid.org/000-002-9310-1892

Camila da Cunha Nunes1 
http://orcid.org/000-001-9056-1853

1Centro Universitário de Brusque (UNIFEBE), Brusque, Santa Catarina, Brasil.


Resumo:

O Programa Mais Alfabetização, proposto pelo Ministério da Educação, tem o objetivo de fortalecer e amparar técnica e financeiramente as unidades escolares no processo de alfabetização de estudantes matriculados nos dois primeiros anos do ensino fundamental. Nessa perspectiva, esta pesquisa objetiva analisar a percepção de gestores das escolas municipais de uma cidade do Vale do Itajaí (SC), sobre a implementação do Programa Mais Alfabetização (PMALFA). Para tal, foi realizada uma pesquisa qualitativa de caráter descritivo. Foram entrevistados dez gestores que atuam no Ensino Fundamental, em dez escolas municipais. Para os gestores, parece bem evidente que são vários os desafios encontrados diante do desenvolvimento do programa. Entre eles, destacam-se os de cunho econômico, técnicos e administrativos, perpassando pela formação de professores; aplicação de provas com os alunos em processo inicial de alfabetização e a continuidade das políticas públicas, que, com frequência, passam por mudanças em nosso país. Contudo, apesar dos desafios, é notório e almeja-se que o programa se prolongue e se efetive por mais tempo que os programas anteriormente existentes. Mais do que nunca, é tempo de (re)pensar e de (re)organizar as políticas públicas no Brasil, especialmente às destinadas ao processo de alfabetização.

Palavras-chave: Programa Mais Alfabetização; políticas públicas; avaliação

Abstract:

The More Literacy Program, proposed by the Ministry of Education, aims to strengthen and support technically and financially school units in the literacy process of students enrolled in the first two years of elementary school. In this perspective, this research aims to analyze the perception of managers of municipal schools in a city in the Vale do Itajaí (SC) about the implementation of the More Literacy Program (PMALFA). To this end, qualitative research of a descriptive character was carried out. Ten managers who work in elementary education in ten municipal schools were interviewed. For the managers, it seems quite evident that there are several challenges faced in the program development. Among them, those of an economic, technical, and administrative nature stand out, including teacher training, application of tests with students in the initial literacy process, and the continuity of public policies, which often go through changes in our country. However, despite the challenges, it is notorious and it is hoped that the program will be extended and implemented for longer than the previously existing programs. More than ever, it is time to (re)think and (re)organize public policies in Brazil, especially those aimed at the literacy process.

Keywords: More Literacy Program; public policy; evaluation

Resumen:

El Programa Más Alfabetización propuesto por el Ministerio de Educación tiene como objetivo fortalecer y apoyar las unidades escolares técnica y económicamente en el proceso de alfabetización de los estudiantes matriculados en los primeros dos años de la escuela primaria. En esta perspectiva, esta investigación tiene como objetivo analizar la percepción de los gerentes de las escuelas municipales en una ciudad del Vale do Itajaí (SC), acerca de la implementación del Programa Más Alfabetización (PMALFA). Para ello, se realizó una investigación cualitativa de carácter descriptivo. Se entrevistó a diez gerentes que trabajan en educación primaria en diez escuelas municipales. Para los gerentes, parece bastante evidente que se enfrentan varios desafíos en el desarrollo del programa. Entre ellos, destacan los de carácter económico, técnico y administrativo, incluida la formación del profesorado, aplicación de pruebas con estudiantes en el proceso inicial de alfabetización y la continuidad de políticas públicas, que, a menudo, sufren cambios en nuestro país. Sin embargo, a pesar de los desafíos, es notorio y se espera que el programa se extienda e se implemente por más tiempo que los programas existentes anteriormente. Más que nunca, es hora de (re)pensar y (re)organizar las políticas públicas en Brasil, especialmente las destinadas al proceso de alfabetización.

Palabras clave: Programa Más Alfabetización; políticas públicas; evaluación

1 INTRODUÇÃO

Na área da educação, muitas discussões têm permeado a temática da alfabetização, especialmente após a promulgação da Lei 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, dispondo a respeito do tempo de permanência de nove anos no ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 seis anos de idade (BRASIL, 2006). Em consonância com essa alteração, as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica (Res. n. 4, de 13/07/2010) determinaram que os três primeiros anos do ensino fundamental fossem organizados como um ciclo básico de alfabetização (GOMES, 2013). Entretanto, com aprovação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), os professores passaram a ter a responsabilidade de alfabetizar até o 2º ano do Ensino Fundamental. “Embora [...] a criança esteja cercada e participe de diferentes práticas letradas, é nos anos iniciais (1º e 2º anos) do Ensino Fundamental que se espera que ela se alfabetize. Isso significa que a alfabetização deve ser o foco da ação pedagógica” (BRASIL, 2017a).

Neste contexto, não basta alfabetizar na perspectiva de apropriar‐se do sistema de escrita alfabético e ortográfico, é imprescindível apropriar‐se também de capacidades que permitam a leitura e escrita de maneira apropriada, nas diversas situações em que se fazem os usos, identificando os diferentes gêneros e tipos de textos, nos diversos suportes, com díspares materiais e interlocutores (ARAÚJO; REIS, 2014). Para tanto, torna‐se necessário que o professor compreenda, inicialmente, a importância de alfabetizar na perspectiva do letramento e, assim, alfabetizar em tais contextos, pois “o indivíduo que está inserido em práticas de letramento é parte integrante da sociedade, compreendendo e vivenciando as práticas de linguagem que estão a sua volta” (HEINIG, 2010, p. 517). Atualmente, a alfabetização precária dos alunos é apontada como uma das demandas determinantes a serem encaradas para melhorar a qualidade da educação. Em especial, porque carências graves em leitura, escrita e operações matemáticas básicas tendem a se agravar ao longo da vida escolar, em que esses conhecimentos são imperiosos para seguir aprendendo e progredindo. As dificuldades tendem a se tornar cada vez mais amplas e a alimentar as taxas futuras de repetência e evasão. Essa é uma grande perda social, principalmente para os alunos provenientes de famílias com menor desenvolvimento socioeconômico (GOMES, 2013).

Em 2018, os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) demonstraram que a porcentagem de analfabetismo da população com 15 anos ou mais de idade no Brasil despencou de 7,2% em 2016 para 7,0% em 2017, mas não alcançou o índice de 6,5% estipulado, ainda para 2015, pelo Plano Nacional de Educação (PNE) (IBGE, 2018).

Diante deste cenário educacional, tem-se buscado a qualidade do ensino no país e, pensando nisso, foi implementado o Programa Mais Alfabetização (PMA), proposto pelo Ministério da Educação (MEC) por meio da Portaria n. 142, de 22 de fevereiro de 2018, o qual tem o objetivo de fortalecer e amparar técnica e financeiramente as unidades escolares no processo de alfabetização de estudantes matriculados nos dois primeiros anos do ensino fundamental. Desse modo, almeja-se analisar a percepção de gestores das escolas municipais de uma cidade do Vale do Itajaí (SC), sobre a implementação do PMA.

2 O PROGRAMA MAIS ALFABETIZAÇÃO (PMA)

O PMA visa combater os baixos índices registrados pela Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA), pois eles “[...] apontam para uma quantidade significativa de crianças nos níveis insuficientes de alfabetização (leitura, escrita e matemática) [...]” (BRASIL, 2018b).

Dadas as estatísticas que o Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e a ANA demonstram, o PMA objetiva tornar mais eficiente o processo de alfabetização, nos componentes curriculares de língua portuguesa e matemática, para os alunos matriculados no 1º e no 2º ano do ensino fundamental, além de amortizar e prevenir o abandono precoce da escola (BRASIL, 2018b). Tais avaliações ocorrem no Brasil desde 1990 e permitem o desenvolvimento de políticas públicas a partir da realidade encontrada, propondo-se a contribuir com o avanço do ensino e a qualidade da educação (BRASIL, 2017b).

Com a implementação do PMA, espera-se que os alunos possam aprimorar seus conhecimentos e, consequentemente, obter melhores resultados nas avaliações. Conforme a Resolução n. 7, de 22 de março de 2018, e o inciso I do artigo 32 da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), o MEC expõe que o desenvolvimento da capacidade de aprender deve ter como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo, afirmando que:

[...] a responsabilidade pela alfabetização das crianças deve ser acolhida por docentes, gestores, secretarias de educação e instituições formadoras como um imperativo ético indispensável à construção de uma educação efetivamente democrática e socialmente justa; Que o estudante, para ser considerado alfabetizado, deve compreender o funcionamento do sistema alfabético de escrita, construir autonomia de leitura e se apropriar de estratégias de compreensão e de produção de textos; Que o estudante, para ser considerado alfabetizado em matemática, deve aprender a raciocinar, representar, comunicar, argumentar, resolver problemas em diferentes contextos, utilizando conceitos, procedimentos e fatos matematicamente. (BRASIL, 2018a).

De acordo com Brasil (2018b), o PMA está sendo implementado nas turmas correspondentes nas unidades escolares públicas, por meio de união institucional entre o MEC e as secretarias de educação estaduais, com a colaboração das redes de ensino e com apoio técnico e financeiro federal. Juntos, cultivam esforços para suplantar os desafios expostos na alfabetização dos estudantes no país.

O apoio técnico oferecido às escolas é realizado por meio da seleção de um assistente de alfabetização, sob a responsabilidade das secretarias de educação, por um período de cinco ou dez horas semanais, para cada turma de 1º e 2º anos. O assistente selecionado deve auxiliar o trabalho do professor alfabetizador, segundo seu planejamento, para fins de obtenção de competências de leitura, escrita e matemática por parte dos alunos. Os profissionais dispõem, ainda, de avaliações diagnósticas e formativas, disponibilizadas no sistema de monitoramento, a serem aplicadas aos estudantes em períodos especiais, com a finalidade de monitorar o desenvolvimento da aprendizagem nos dois primeiros anos do ensino fundamental (BRASIL, 2018a). Já o apoio financeiro às escolas ocorre por meio da cobertura de despesas de custeio via Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE). Conforme exposto na Resolução n. 7, de 22 de março de 2018, no artigo 3º, “O Programa será executado em período de seis meses no exercício de 2018 e em período de oito meses nos exercícios subsequentes” (BRASIL, 2018b).

Ainda sobre o monitoramento do programa, o MEC firmou parceria com o Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (CAEd/UFJF) para a construção do sistema. O monitoramento é parte fundamental do ciclo de uma política pública, lançando informações frequentes sobre o seu desempenho. O sistema possibilita o acompanhamento do programa em cada escola e rede de ensino em tempo real, além de auxiliar a tomada de decisão pelos gestores (BRASIL, 2018a).

Os gestores das escolas que aderiram ao PMA ficaram encarregados de orientar, amparar e acompanhar, com prioridade, o trabalho do professor alfabetizador e do assistente de alfabetização, participando da seleção do assistente, priorizando a qualidade técnica; acompanhando o progresso da aprendizagem dos alunos de 1º ano e 2º ano do ensino fundamental regular; lançando e atualizando os dados de efetivação do programa no sistema de acompanhamento e monitoramento específico; e participando das estratégias de formação no âmbito do programa (BRASIL, 2008a).

Além disso, de acordo com Brasil (2008b), os educadores das escolas que aderiram ao programa receberam Capacitação de Desenvolvimento Profissional do Mais Alfabetização, a qual pode ser realizada pela Internet, mediante inscrição na plataforma on-line. A capacitação foi dirigida a professores alfabetizadores, assistentes, coordenadores pedagógicos e diretores das escolas. Tal capacitação foi elaborada pelo CaEd/UFJF.

O objetivo da capacitação é preparar os profissionais que trabalham com alfabetização para avaliar o resultado das ações desse processo, a construir planos de ação e fazer um trabalho de reflexão sobre o tema. Mais de 49 mil escolas públicas do ensino fundamental, com 3,6 milhões de alunos de todos os estados brasileiros e do Distrito Federal, aderiram ao PMA. (BRASIL, 2008b).

Além da Capacitação on-line, o MEC promoveu uma formação presencial, na cidade do Rio de Janeiro, para os 53 coordenadores estaduais do programa. Eles tiveram a possibilidade de analisar os resultados das avaliações do programa, delinear ações pedagógicas e, especialmente, replicar ações de formação em seus estados. Também, a formação tratou sobre a avaliação diagnóstica intermediária, que representa a segunda etapa de avaliação do desenvolvimento e aprendizado dos alunos em termos de alfabetização, com o intuito de melhorar o desempenho do programa (BRASIL, 2008b).

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Realizou-se uma pesquisa qualitativa de caráter descritivo. De modo a se aproximar da realidade estudada, utilizou-se da técnica de entrevista semiestrutura e do recurso da gravação. Foram entrevistados dez gestores de dez escolas da rede municipal de uma cidade do Vale do Itajaí no Estado de Santa Catarina. Todos os materiais obtidos foram considerados, pois são ricos em descrições de situações e acontecimentos, incluindo transcrições de depoimentos.

De acordo com Duarte (2004), entrevistas são essenciais quando se deseja mapear práticas, crenças, valores e sistemas classificatórios de universos sociais específicos, mais ou menos bem demarcados, em que as subversões e contradições não estejam visivelmente explicitadas, pois, se forem bem realizadas, elas comportarão ao pesquisador fazer uma espécie de submersão, indo a fundo, coletando vestígios dos modos como cada um daqueles participantes entende e significa sua realidade e erguendo informações consistentes que lhe permitam descrever e abranger a lógica que preside as relações que se instituem.

As entrevistas foram realizadas nos meses de agosto e setembro de 2018; posteriormente, foram transcritas e analisadas de forma qualitativa. Registra-se que a pesquisa está resguardada eticamente sob o Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) número 93534818.1.000.5636, concedido após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário de Brusque (UNIFEBE).

4 ANÁLISE DOS RESULTADOS

Para análise dos resultados, partiu-se de entrevistas semiestruturadas realizadas com os gestores, as quais foram transcritas fielmente, garantindo, assim, maior veracidade das informações coletadas. No transcorrer da análise dos resultados, grifaremos pontos relevantes de seus relatos e, em alguns momentos, será utilizado itálico para dialogar com os entrevistados. Para referirem-se aos gestores, serão utilizadas as seguintes letras e números para distingui-los: G1, G2, G3, G4, G5, G6, G7, G8, G9 e G10.

Quando questionados sobre a importância do PMA e seus impactos para a escola e a aprendizagem dos alunos, o G1 e o G9 relatam que, antes desse programa, havia o Mais Educação, o qual era direcionado às escolas que tinham o índice mais baixo na qualidade de ensino (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica [IDEB]), obtido por meio da Prova Brasil, e que, ao atingir a nota, a escola acabava por perder o recurso disponibilizado pelo Mais Educação. O Programa Mais Educação organiza-se como estratégia do MEC para inferência da construção da agenda de educação integral nas redes estaduais e municipais de ensino, a qual expande o período escolar nas escolas públicas para, no mínimo, sete horas diárias, por meio de atividades optativas, como: acompanhamento pedagógico; esporte e lazer; cultura e artes; cultura digital; investigação no campo das ciências da natureza e educação econômica (BRASIL, 200?c). Também, recebe apoio financeiro nas unidades escolares por meio da cobertura de despesas de custeio (BRASIL, 2018a).

Conforme expõe Brasil (2008c), as atividades no Programa Mais Educação tiveram início em 2008, com a participação de 1.380 escolas, em 55 municípios nos 26 estados e no Distrito Federal, atendendo 386 mil estudantes. Em 2011, aderiram ao programa 14.995 escolas, com 3.067.644 estudantes, a partir dos consequentes critérios: escolas estaduais ou municipais com baixo IDEB que foram contempladas com o PDE/Escola 2009; escolas situadas em locais de v­ulnerabilidade social; e escolas localizadas em cidades com população igual ou superior a 18.844 habitantes. No entanto parece que alguns aspectos não estão muito claros para alguns G, conforme G1:

O Programa Mais Educação era pra quem estava com o IDEB mais baixo, pra ajudar com o recurso. Aí, nós tínhamos o programa, atingimos a meta e somos punidos, porque aí não recebemos mais! [...]. Então, tem umas incoerências assim no governo, e aí eles acabam criando... como criaram agora esse programa, o Mais Alfabetização. Simplesmente, sem orientar, sem nada, é um trabalho voluntário, com pessoas que nem sempre têm habilidade com essa questão da alfabetização e que vêm pra sala de aula, pra auxiliar as professoras, com cinco horas semanais... que resultado dará isso? Quer dizer, ninguém questionou, ninguém perguntou...será que isso é importante? O voluntário ganha um valor tão baixo, que não estimula, e aí troca o tempo inteiro, pois tem pessoas que começam, que trabalham um mês e depois saem... aí que vínculo que cria? [...]. E assim, a continuidade desses programas que não existe? Então assim, temos um grande desafio nesse país, que realmente precisa ser feito políticas públicas de educação que se iniciem e vão a longo prazo, que não fique com cortes, pois esse governo cria esse programa, aí entra outro e cria outro programa, aí o programa que tinha não serve mais! Mal orientado, mal planejado, e aí até que ponto isso vai ter um resultado positivo? (G1, grifos nossos).

Percebe-se que há uma discrepância entre o que se espera dos programas e o que de fato vem ocorrendo na realidade escolar. Há um grande desafio em se propor políticas públicas que permaneçam por um tempo maior, possibilitando a qualidade do processo educacional aos estudantes. Há também outros desafios a serem superados, com relação ao investimento disponibilizado para esses profissionais que se deslocam de suas residências por um valor considerado, nas palavras de G1, como um “trabalho voluntário”. Consequentemente, muitos adentram no programa e acabam desistindo pela questão financeira.

O G9 também evidencia sua preocupação com esses profissionais que chegam às escolas e que trabalham “voluntariamente”, pois apenas recebem uma ajuda de custo para a permanência no programa. Conforme relatado:

[...] é um dinheiro bem baixo. Cada profissional que trabalha com uma turma... por exemplo, [...] com carga horária de 4h por segunda, ele ganha 150,00 mensal, então é um jeito também de não estimular o profissional pra estar trabalhando com o atendimento especializado, com essas crianças, não é? É um recurso que eles deveriam estar aumentando esse pagamento, não é? [...] ela deveria estar recebendo um valor expressivo pra estar ajudando ela, porque a gente sabe que, hoje, 150 reais não é nada, não é? [...] hoje a minha professora do Programa Mais Educação, ela ganha 900 mensal com seis turmas, é um valor baixo pra uma pessoa que já é formada em Pedagogia, tem pós-graduação, e o problema desse programa é que eles só exigem o ensino médio! [...] só que para exigir também o ensino superior eles deveriam estar ressarcindo mais essas pessoas, estar valorizando mais [...]. (G9, grifos nossos)

Ademais, o G9 informa que só continua com o Programa Mais Educação em sua escola por possuir ainda o dinheiro do PDDE, que, de acordo com ele, vai até novembro, porque diminuiu a quantidade turmas, ano passado eram quatro, consegui colocar pra três, três turmas de manhã e três de tarde, ficando seis turmas, mas pra continuar mais tempo, pra ter mais um tempo. Nossos recursos vão até novembro (G9, grifos nossos). Além disso, considera-se importante pontuar que, quando afirma que um dos requisitos para o profissional se inscrever no programa é o “ensino médio”, novamente há uma discrepância nas políticas públicas direcionadas à educação, pois como pessoas que não têm formação adequada poderão auxiliar de forma eficaz os professores alfabetizadores? É importante realizarmos essa reflexão ao pensarmos em uma educação de qualidade. Conforme Nóvoa (2009, p. 21), “[...] nada será conseguido se não alterarem as condições existentes nas escolas e as políticas públicas em relação aos professores. É inútil apelar à reflexão se não houver uma organização das escolas que a facilite”. Ademais, contrapõe o que é sinalizado, que o ideal é que seja um profissional voluntário com experiência em alfabetização, mas que é preciso levar em consideração as diferentes realidades em nosso país. Em função disso, o assistente pode ser desde o professor formado até o estudante do curso Pedagogia ou de Magistério em nível médio, em formação (BRASIL, 2008a). Corroborando com Gatti (apudRIGOLON, 2007),

Planos excelentes neste país têm fracassado porque não há pessoas com qualificação mínima para bem executá-los. [...] Não adianta criar cursos desta ou daquela natureza, com esta ou aquela estrutura, falar em insumos para a educação, se não se pergunta nenhuma vez quem serão as pessoas, os professores que responderão por esta formação e em que condições farão isso. (GATTI, 1995, p. 3 apudRIGOLON, p. 13, 2007)

O G9 expõe ainda outras dificuldades que a escola teve de superar para aderir ao PMA, vejamos:

Na realidade, assim, eu achei muito “em cima do laço”, tivemos apenas uma semana pra estar fazendo isso, tivemos poucas informações, não sabíamos sobre o Programa Mais Alfabetização, não teve nenhum curso sobre o programa, então ele veio pra ser aplicado assim muito em cima da hora, aí até dia tal a gente precisava aplicar essas provas, então fica complicado pra gente, pra gente estar preparando esses alunos também, porque, além disso, temos toda uma organização na escola, tem eventos, época de certificado do ponto, questões administrativas de todo o mês... então, tivemos que dar uma parada em tudo, pra tentar ver isso o mais breve possível, pra não perder o recurso! (G9, grifos nossos).

É possível observar, ainda, a falta de informações sobre o programa; conforme exposto, veio muito “em cima do laço”. Ou seja, a escola teve novamente de reorganizar-se para conseguir adequar-se às normas do programa, a fim de não perder o recurso.

Já G2 relata que sua escola não aderiu ao PMA por ter apenas “65 alunos frequentando a escola do 1º ao 5º ano”. Contudo, conforme G3 e G7, a escola em que gestam aderiu ao PMA, e expõem que:

No Programa Mais Alfabetização, os alunos fizeram uma avaliação e agora eles têm outra pra fazer. Assim, eu acho importante isso e eu sempre falo para os alunos que tudo que nós fizermos é importante para o currículo da gente, mesmo que a gente esteja fazendo no ensino fundamental! Eu sempre digo para eles: gente, eu não posso dizer que vai mudar, que não haverá mais notas, que vocês não irão mais fazer provas, porque o nosso sistema ainda é de notas. Nós até tentamos fazer estratégias diferentes, mas na vida, lá fora eles vão cobrar vocês ainda, pela nota, pela prova, então assim, a gente bate, na teoria a gente consegue dizer que eles não são avaliados, não são vistos, a gente cria estratégias pra fazer de forma diferente as avaliações, mas ainda é a nota. Tudo entra-se por causa da nota. (G3, grifos nossos).

Agora, a gente tem o Mais Alfabetização, então o Mais Alfabetização, são aplicadas provas nos 1ºs e 2ºs anos e são feitas três provas no ano, a inicial já foi feita, agora estamos fazendo a segunda e no final do ano tem a terceira pra gente ver o rendimento dos alunos... até pelo projeto também, que tem um monitor na sala que está auxiliando, e vem uma verba do MEC, então a gente está agora nessa segunda avaliação do Mais Alfabetização que o que nós temos. Pra gestão, é a impressão dessas provas que agora ficou pra escola, então tem que ter um jogo de cintura, aqui temos oito turmas de 1º e 2º ano, então, imagina: são três etapas de provas, cada prova tem mais ou menos 10 páginas, então dá um volume muito grande de cópias, então, querendo ou não a escola já trabalha com um valor limitado, então pra gestão é esse desafio! Para a coordenação é o tempo, pois são muitas turmas, então ela tem que parar o trabalho às vezes de gestão, de acompanhamento, de pais... então, agora na entrega de notas, nós temos a segunda avaliação do Mais Alfabetização, então, tem que parar essas atividades e a coordenadora tem que ir nessas oito turmas pra aplicar, então isso tem alguns dias pra aplicar. Nas escolas menores isso é um pouco mais tranquilo, [...] Então, tem todo esse trabalho, tem a correção, tem que lançar o gabarito no site, então ela tem que orientar os professores, então essa é a parte difícil pra gente, a logística. (G7, grifos nossos).

A questão abordada acima por G3 demonstra uma preocupação muito imbricada ainda no ambiente escolar e que permeia o sistema educacional brasileiro, o conceito de avaliação traduzido em nota, na qual essa define o estudante como um número. Gatti (2003) afirma que a importância atribuída pelos professores às provas na determinação da avaliação dos estudantes é muito conhecida por estes. Em geral, uma ampla ansiedade é produzida na preparação para uma prova, na sua realização e na discussão dos resultados em sala de aula. Tudo isto intervém na realização do estudante e na sua aprendizagem. Muitos professores orgulham-se do grau de dificuldade em suas provas e não julgam que produziram uma boa prova se muitos tiraram nota alta. Do outro lado, temos os professores que tornam suas provas tão simples que não requerem do estudante nenhum comportamento de empenho pessoal para realizá-las. Na primeira situação, desenvolve-se nos alunos um grau de aflição, de frustração ou um sentimento de iniquidade que intervém negativamente em seu processo de aprendizagem. No segundo, criam-se condições de indolência e de nenhum comprometimento para aprender, muitas vezes acompanhadas de sentimentos relativos ao desprendimento do professor pelos estudantes e pelo seu trabalho. Brasil (2013, p. 50-1) atenta para uma análise com relação às avaliações que merece atenção:

[...] os resultados das avaliações precisam ser alvo de reflexões profundas, para além de dados estatísticos e de divulgação de índices, a fim de que possam produzir ações de intervenção para a solução de problemas a­pontados: assim, que se repense a necessidade de tantas avaliações, todas muito similares; que se estabeleça um cronograma que, entre uma avaliação e outra, em função dos resultados, permita aos sistemas de ensino em seus diferentes níveis, às escolas e aos professores propor ações focadas na solução dos problemas levantados: atualmente, não temos tempo de analisar os resultados de uma avaliação e já estamos realizando outra, como se acreditássemos que, de tanto colocar o termômetro na água fria, ela subirá de temperatura; e que os resultados sejam analisados de forma profunda e não apenas na forma de índices. (BRASIL, p. 50-1, 2013)

G9 relata também sobre a percepção dos professores diante do PMA e as dificuldades encontradas pelos estudantes diante da realização das provas, visto que estão em processo de alfabetização e já são incumbidos de realizar essas avaliações. Vejamos o relato:

Os professores estão bem cientes das situações, mas eles acabam achando muito em cima da hora as aplicações. As crianças fizeram a prova, tinham questões assim, que estavam bem ilustrativas, mas tinham questões que nem eles aprenderam ainda... imagina no 1º ano... porque na educação infantil, eles não são preparados pra alfabetização, então eles estão iniciando no 1º ano mesmo essa alfabetização, e aí a sorte foi que eles compreenderam mais as questões visualizando as ilustrações, porque é bem complicado assim iniciar... essas provas tinham que ser [pausa da entrevistada]. Entrou a assistente, lá no final do ano haverá outras provas, pra ver o rendimento dos alunos, ver como foi aplicado, se o projeto está tendo resultado... hoje, atualmente a gente está tendo resultados porque: a gente tem a professora da sala, temos essa assistente da alfabetização que penaque ela fica só uma vez na semana, porque seria muito bom se ela fosse ficar todos os dias na semana, seria uma ajuda muito maior. A gente tentou conciliar a assistente de alfabetização para as professoras nas turmas, nas aulas que eles mais têm com a professora regente, porque temos outros professores, e a professora assistente tem que estar ali ajudando mais no português e na matemática, ajudando mais na alfabetização, essa assistente ela é muito dedicada, então a gente tem a professora, que no estado é o professor II e aqui é o educador social, que fica com as crianças com necessidades especiais, então a gente consegue fazer essa divisão, nesses dias. (G9, grifos nossos)

Importante destacar, ainda, o fato de G9 afirmar que deveria haver mais dias disponibilizados na semana para a assistente permanecer na escola auxiliando os alunos no processo de alfabetização. Como exposto anteriormente, as cargas h­orárias variam entre dois grupos: as escolas não vulneráveis têm 5 horas semanais, e as escolas vulneráveis têm 10 horas semanais. A organização das cargas horárias de 5 horas ou de 10 horas semanais pode ser decidida com análise da autonomia pedagógica das escolas, a partir da disposição do trabalho pedagógico de cada uma, contudo essas horas devem ser adimplidas no turno regular (BRASIL, 2018a).

G7 relata outra apreensão com relação às provas: o material que a escola precisa fornecer para a impressão delas. Considerando que a escola já trabalha com recursos reduzidos, o gasto destinado à impressão das provas impacta no orçamento final. Além disso, a coordenadora pedagógica já tem um trabalho destinado à orientação com as professoras e ao atendimento de pais e alunos, conforme salientado, e, como a escola tem várias turmas de 1º e 2º ano, a aplicação das provas para cada turma demanda uma boa parte do tempo das funções da coordenadora. Além disso, após a realização das provas, conforme exposto por G7, “tem a correção, tem que lançar o gabarito no site”, então à coordenadora caberá também orientar os professores com relação ao desempenho dos estudantes.

G8, igualmente, relata sobre essa dificuldade com relação à impressão das provas:

As provas do Mais Alfabetização foi uma manhã inteira de aplicação com os alunos, outra coisa são cadernos que vêm e nós temos que imprimir, são em torno de oito páginas e nossas escolas não têm condições de ficar imprimindo oito páginas por aluno pra fazer aplicação de prova, então a gente projetava no retroprojetor e fazia o gabarito com eles, e mais ou menos íamos explicando: ó, essa é a questão número 1, qual você acha que é a correta: a, b, c... tem que esmiuçar pra eles. Esse Mais Alfabetização vem no site e a gente tem que tirar, vem várias provas no site e a gente escolhe, mas elas são mais ou menos do mesmo tamanho, tem o mesmo objetivo, o mesmo tema de aprendizagem que vai ser desenvolvido pra eles, só muda assim, as atividades, mas não muda muito não, é muito gasto pra escola. (G8, grifos nossos).

Uma das estratégias encontradas por G8 foi a projeção das provas no quadro a partir do recurso do retroprojetor; é de conhecimento que a direção e a coordenação pedagógica ficam responsáveis por “escolher” as provas disponibilizadas no site e imprimi-las aos alunos, demonstrando uma certa autonomia direcionada às escolas. Para Goldemberg (1993 apudRIGOLON, 2007), o insucesso das p­olíticas educacionais deve-se ao seu caráter utópico e, em grande parte, ao fato de terem sido adjuntas a uma política social de longa aquisição e de não estarem alicerçadas em uma concisa consciência dos obstáculos econômicos, políticos e culturais que necessitam ser encarados para a construção de um sistema educacional abrangente e de boa qualidade.

G4, quando questionado sobre o PMA em sua escola, relatou:

Nós temos o Programa Mais Alfabetização aqui na escola, nós temos o assistente de alfabetização de 1º e 2º ano, temos o acompanhamento desse assistente na 4ª e 5ª feira, mas a avaliação desse programa ainda não veio, o que eles estão preenchendo são os conteúdos, as habilidades que estão sendo desenvolvidas dentro das turmas, mas não tivemos nenhuma aplicação de provas. (G4, grifos nossos).

Já G5 e G10 expuseram sua frustração quando questionados sobre a efetivação desse programa na escola em que gestam:

Eu fiz a inscrição para o Programa Mais Alfabetização, fiz toda a parte burocrática do cadastro, mas nós não recebemos o alfabetizador, não recebemos a verba, aí como a gente não recebeu a verba, eu não pude contratar o monitor. Provavelmente vai ficar tudo para o ano que vem. (G5, grifos nossos).

No Programa Mais Alfabetização a escola teve um problema técnico da adesão ao sistema, então nós comunicamos o Governo Federal via e-mail, registramos, pois tem um canal de registro disso... [...] pois o sistema travou de uma forma que a gente não conseguiu efetivar a matrícula da escola! Então, infelizmente, a gente ficou de fora desse programa. A gente não conseguiu fazer adesão por uma questão técnica realmente do site do Governo Federal. Nós entramos em contato com o site da Secretaria da Educação, com o Ministério da Educação, e infelizmente eles não conseguiram fazer com que revogasse essa situação, e aí infelizmente nesse momento a nossa escola ficou de fora. (G10, grifos nossos).

Conforme pôde ser observado, por questões administrativas relatadas acima que, por vezes, fogem da alçada dos gestores, ambas as escolas não puderam ser beneficiadas pelo programa, mesmo após tentativas de adesão. G5, inclusive, teve seu cadastro efetivado, mas não recebeu a verba do governo e, consequentemente, não pôde contratar o assistente para dar continuidade ao programa.

G6 relata que sua escola aderiu ao PMA e que, anteriormente, era b­eneficiada também com o Programa Mais Educação. Vejamos:

Temos um programa do Governo Federal que a gente iniciou esse ano, o Mais Alfabetização; até então, era o Mais Educação. O Mais Educação na nossa escola, pelo menos desde que estou à frente, desde o ano passado, ajudou bastante! No Mais Alfabetização, temos uma monitora agora que é voluntária e que fica na sala de aula. Aqui na nossa escola temos o 1º ano de manhã e de tarde e o 2º ano à tarde, então, é uma ajuda grande, é uma ajuda válida esse programa, pois realmente essa ajuda vai fazer com que essa monitora ajude essas crianças a conseguirem ter essa evolução e alcançar essas outras crianças que estão um pouquinho com defasagem também, até pela faixa etária. Então, eu penso que é bem válido se for bem trabalhado e bem aplicado. (G6, grifos nossos).

G6 relata que o programa anterior ao Mais Alfabetização “ajudou bastante” os alunos no processo de aprendizagem e que o Mais Alfabetização será também uma “ajuda válida”, pois realmente esse assistente poderá auxiliar os alunos em processo de alfabetização, incluindo os que têm maiores dificuldades de aprendizagem.

G9 relata que já observa avanços com relação à implementação do programa Mais Alfabetização nas escolas:

Inicialmente, os alunos fizeram uma prova inicial no Mais Alfabetização, e a maioria dos alunos foi bem, aplicamos com eles. No início eles ficaram um pouco “assustados”, mas fomos fazendo com eles, corrigimos e depois passamos para o sistema. Tivemos mais de 70% de melhorias. (G9, grifos nossos).

Já G1 demonstra, mais uma vez, sua preocupação com a descontinuidade de programas e políticas públicas destinadas ao processo de alfabetização. Relata sobre o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), desenvolvido pelos governos desde 2012, com o objetivo de atender a Meta 5 do PNE: alfabetizar todas as crianças, no máximo, até o final do 3º ano do ensino fundamental. Os professores alfabetizadores e orientadores de estudos, ao aderirem ao programa, participaram de uma formação com carga horária de 180 horas. Para o gerenciamento no programa, os participantes deveriam ser cadastrados no SIMEC, que é responsável pela geração dos dados para certificação desses cursistas. A formação era destinada aos professores alfabetizadores e que atuavam na educação infantil, bem como um coordenador pedagógico por cada unidade escolar (BRASIL, 2018c). Conforme G1:

Antes tínhamos o PNAIC, que no início começou com bolsa pra professor, com todo um incentivo para o professor fazer um bom trabalho. Começou bem! Aí, depois já foi diminuindo as horas, o professor foi perdendo a bolsa, aí depois já tinha que ser no horário de trabalho, aí as escolas tinham que se virar com os alunos enquanto os professores estavam em formação. Depois, foi se desvirtuando também o programa e foi diminuindo. Primeiro ano tinha uma boa carga horária, segundo ano, uma boa parte só on-line, e aí, de repente, eles chegaram à conclusão de que o PNAIC não reduziu o índice de repetição, que o PNAIC, no início, ele via a alfabetização como tarefa do 1os, 2os e 3os anos e quando, de repente, no meio do caminho, perceberam que até o 3º ano é muito tempo, que o aluno tem que estar alfabetizado ao término do 2º ano, então assim, realmente, a gente vê essas incoerências. O programa começa com uma ideia e depois ele muda e depois ele acaba. Porque concluiu-se que não deu o resultado esperado, mas muitos professores que fizeram o programa não são professores efetivos, então, hoje eles estão com o primeiro ano, mas ano que vem eles não sabem onde estarão, pois trocam de escola. Então, isso também, pra fazer uma análise se isso deu resultado, não é tão simples com essa diversidade que a gente tem, então simplesmente acabaram como PNAIC! (G1, grifos nossos).

Importante reverberar que anterior à BNCC, os alunos tinham até o 3º ano para estarem alfabetizados, no entanto, com a sua aprovação, os professores passaram a ter a responsabilidade de alfabetizar até o 2º ano do Ensino Fundamental. De acordo com Brasil (2018a), a BNCC é um documento de referência quanto aos direitos e objetivos de aprendizagem, e prediz que o objetivo da ação pedagógica nos dois primeiros anos do Ensino Fundamental deve ser a firmação do processo de alfabetização.

G1 afirma a preocupação com as políticas públicas e seus impactos para a educação no país, continua expondo suas impressões e suas implicações sobre os acontecimentos vivenciados, vejamos:

Com relação ao PNAIC, fizeram os últimos encontros ano passado. O programa já começou quase no final do ano, com pouquíssimos encontros! Então, sucatearam também esse programa, então não vai dar resultado! Aí depois, não! Então agora tem que estar alfabetizado até o 2º ano, então primeiro colocaram na cabeça dos professores que eles tinham até o 3º ano pra alfabetizar, tinha que tirar o pé do acelerador e tudo mais, aí, de repente, “opa”, acelera, porque não dá pra ser até o 3º, pois senão, não dá resultado! Aí de repente, o que aconteceu com o PNAIC: não, se não deu resultado positivo, aí o governo acabou com o PNAIC. Aí a própria BNCC ela já antecipou o período de alfabetização, ela jogou o 1º e o 2º ano pra um bloco e o terceiro já puxou pro segundo bloco. Então, isso já mostra que até o Governo, com essas mudanças todas, ele não tem um norte... então vamos ver se agora com a BNCC ele terá um norte, vamos ver se irá partir pra formação nesse sentido. Então, a gente tem passado nos últimos tempos com muitas mudanças, muita formação a distância, muita coisa que uma hora é e daqui a pouco troca, e tudo isso vai refletindo nos índices da educação. Ai a gente de repente aumenta, depois diminui. Então, a gente não sabe ainda como a gente vai caminhar nesse sentido. (G1, grifos nossos).

Espera-se realmente que, com a BNCC, as políticas públicas se efetivem e tenham uma maior continuidade. Para tal, a formação pedagógica adequada a todos os profissionais da educação é, sem dúvida, imprescindível para a continuação e afirmação de tais programas, em especial conforme exposto, destinados a promover e melhorar o processo de alfabetização dos estudantes. Conforme Rigolon (2007), os programas e cursos de formação continuada para professores alfabetizadores falecem de políticas de formação menos aligeiradas e fraturadas, que procedam de planejamentos consistentes e bem estruturados, em vez de surgirem como alternativas repentinas a problemas imediatos.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do cenário estudado, percebeu-se que há algumas dificuldades vivenciadas no cotidiano escolar para que haja a concretização dos objetivos propostos pelo PMA. Evidenciou-se que são muitos os desafios, tanto de cunho econômico quanto pelas dificuldades burocráticas enfrentadas. Outros desafios relatados são referentes à operacionalização do programa, às diferentes funções e atribuições do gestor e coordenador pedagógico, os quais, em seu dia a dia, precisam reorganizá-las para atender às demandas do programa. Além disso, é imprescindível reverberar sobre os desafios encontrados pelos estudantes ao realizarem as provas do programa, visto que se encontram no processo de alfabetização.

Contudo, apesar dos desafios, é notório e almeja-se que o programa se prolongue e se efetive por mais tempo que os programas anteriormente existentes, não permanecendo somente “enquanto durar determinada gestão”, como já foi possível observar com os programas anteriores destinados à alfabetização citados ao longo do texto, como o PNAIC e o Programa Mais Educação, anterior ao Mais Alfabetização.

O que se vislumbra é uma educação que de fato abarque as dificuldades encontradas no cotidiano escolar. Que este programa, que já vem apontando sinais positivos, possa permanecer e contribuir com o processo de alfabetização dos estudantes ingressantes no contexto da escrita e do letramento. Diante do exposto até o momento, considera-se que já é tempo de (re)pensar e de (re)organizar as políticas públicas, especialmente as destinadas ao processo de alfabetização.

REFERÊNCIAS

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Recebido: 21 de Janeiro de 2020; Aceito: 10 de Fevereiro de 2021

Juliana Pedroso Bruns: Doutoranda em Educação no Programa de Pós-Graduação da Universidade Regional de Blumenau (PPGE-FURB). Bolsista do Programa de Coordenação de Aperfeiçoamento de Nível Superior (CAPES). Integrante da Linha de Pesquisa Formação de Professores, Políticas Educacionais e Práticas Educativas e do Grupo de Pesquisa Formação de Professores e Práticas Educativas (GPFORPE). Especialista em Educação pelo Centro Universitário de Brusque (UNIFEBE), em que foi bolsista pela UNIEDU (Programa de Bolsas Universitárias de Santa Catarina (2017/2018). Mestra em Educação pela FURB. Pedagoga, licenciada pelo UNIFEBE. E-mail:julianap.bruns@gmail.com, Orcid: http://orcid.org/000-002-9310-1892

Camila da Cunha Nunes: Doutora em Desenvolvimento Regional pela Universidade Regional de Blumenau (FURB). Mestre em Educação e em Desenvolvimento Regional pela FURB. Especialista em Psicopedagogia Institucional pela Faculdade de Administração, Ciências, Educação e Letras e especialista em Docência no Ensino Superior pela Universidade Gama Filho. Graduada em Educação Física pela FURB. Atualmente, é professora titular no Centro Universitário de Brusque (UNIFEBE). Integra o Banco de Avaliadores do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (BASis) do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Líder do grupo de pesquisa LESEL − Leituras sobre Educação, Saúde, Esporte e Lazer. E-mail:camila.nunes@unifebe.edu.br, Orcid: http://orcid.org/000-001-9056-1853

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