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Série-Estudos

versión impresa ISSN 1414-5138versión On-line ISSN 2318-1982

Sér.-Estud. vol.26 no.58 Campo Grande set./dic 2021  Epub 28-Feb-2022

https://doi.org/10.20435/serie-estudos.v26i58.1590 

Dossiê: Currículo, resistência e criação com as artes

Os pássaros nunca retornam aos fios da mesma maneira: uma problematização para o currículo e a formação docente a partir do signo da música

Birds never return to the wires in the same way: a problematization for the curriculum and teacher training from the sign of music

Los pájaros nunca vuelven a los hilos de la misma manera: una problematización para el currículo y la formación docente desde el signo de la música

Nilcéa Elias Rodrigues Moreira1 
http://orcid.org/0000-0002-8609-9595

Jaqueline Magalhães Brum2 
http://orcid.org/0000-0001-5528-1098

Juliana Paoliello Sánchez Lobos3 
http://orcid.org/0000-0002-6820-2245

Rosane Maria Muñoz4 
http://orcid.org/0000-0002-1456-155X

1Secretaria de Educação de Serra, Serra, Espírito Santo, Brasil.

2Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Vitória, Espírito Santo, Brasil.

3Secretaria Municipal de Educação de Serra, Serra, Espírito Santo, Brasil.

4Secretaria de Educação de Vitória, Vitória, Espírito Santo, Brasil.


Resumo

Este artigo faz parte de uma pesquisa mais ampla realizada com professores participantes do Curso de Especialização “Matemática na Prática”, ofertado pela Secretaria de Educação a Distância da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Busca, por meio da música, compor com o currículo uma potência afirmativa. Problematiza as experiências aprendentes, criativas e inventivas que ocorrem em ambientes de formação a distância de professores ofertadas pela Universidade Aberta do Brasil (UAB). Tem a cartografia como inspiração metodológica, apostando em redes de conversações cujos registros foram produzidos no desenrolar das conversas, engendrando-as com a problemática da investigação. Utiliza o conceito de ritornelo criado e/ou deslocado por Deleuze e Deleuze e Guattari, o qual ajudou a pensar a formação docente a distância como espaço de criação e de aprendizagens agenciadas pelo afeto, e não apenas pela prescrição, pelo engessamento e pelo template. Busca articular a perspectiva das redes de conversações ampliadas para as redes de conectividades virtuais como produtoras de encontros, conversas, afetos/afecções de alegria e conhecimento. Conclui que a força da formação docente a distância pode ser espaço potente de criação, encontros e aprendizagens inventivas.

Palavras-chave: educação a distância; formação docente; aprendizagem inventiva; redes de conversações; signos artísticos

Abstract

This article is part of a broader survey carried out with teachers participating in the Specialization Course “Mathematics in Practice”, offered by the Federal University of Espírito Santo (UFES) Department of Distance Education. It seeks, through music, to compose an affirmative power with the curriculum. It problematizes the learning, creative, and inventive experiences that take place in distance learning environments for teachers offered by the Open University of Brazil (UAB). Cartography is a methodological inspiration, betting on conversation networks whose records were produced in the course of conversations, engendering them with the issue of research. It uses the concept of refrain created and/or displaced by Deleuze and Deleuze and Guattari, which helped to think of distance teaching training as a space for creation and learning guided by affection, and not just by prescription, plastering and the template. It seeks to articulate the perspective of extended conversation networks to virtual connectivity networks as producers of encounters, conversations, affections/affections of joy and knowledge. It concludes that the strength of distance teaching training can be a powerful space for creation, encounters and inventive learning.

Keywords: distance education; teacher training; inventive learning; conversation networks; artistic signs

Resumen

Este artículo es parte de una investigación más amplia realizada con profesores participantes del Curso de Especialización “Matemáticas en la Práctica”, impartido por el Departamento de Educación a Distancia de la Universidad Federal de Espírito Santo (UFES). Busca, a través de la música, componer un poder afirmativo con el currículo. Problematiza las experiencias de aprendizaje, creativas e inventivas que tienen lugar en los entornos de aprendizaje a distancia para los docentes que ofrece la Universidad Abierta de Brasil (UAB). La cartografia es una inspiración metodológica, apostando por las redes de conversación cuyos registros se produjeron en el transcurso de las conversaciones, engendrando ellos con el tema de la investigación. Utiliza el concepto de estribillo creado y/o desplazado por Deleuze y Deleuze y Guattari, que ayudó a pensar en la formación a distancia como un espacio de creación y aprendizaje guiado por el afecto, y no solo por la prescripción, el enlucido y la plantilla. Se busca articular la perspectiva de las redes de conversación extendidas a las redes de conectividad virtual como productoras de encuentros, conversaciones, afectos/afecciones de alegria y conocimiento. Concluye que la fuerza de la formación de la ensehanza a distancia puede ser un espacio poderoso para la creación, el encuentro y el aprendizaje inventivo.

Palabras clave: educación a distancia; formación de profesores; aprendizaje inventivo; redes de conversación; signos artísticos

1 INTRODUÇÃO

Este artigo é o recorte de uma pesquisa maior desenvolvida com professores cursistas do Curso de Especialização “Matemática na Prática”, promovido pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), e busca, por meio da música, compor com o currículo uma potência afirmativa. Para tal, iniciamos nossa problematização trazendo para a conversa o vídeo intitulado “Birdsonthewires” – em português, “Pássaros nos fios”5. Em uma situação cotidiana, lendo o jornal pela manhã, Jarbas Agnelli se deparou com a imagem dos pássaros nos fios elétricos. Recortou a foto e decidiu fazer uma música, definindo as notas a partir da posição dos pássaros nos fios. A interpretação da posição das aves na pauta-fio ou fio-pauta gerou uma melodia, descoberta ao piano.

Em entrevista, Agnelli (FRANÇA, 2009) comenta sobre o envio da música composta com os pássaros para o fotógrafo que havia registrado a imagem das aves nos fios. Ele relata que Paulo Pinto6 agradeceu, enviando-lhe a foto inteira, com mais dois ou três pássaros de cada lado dos fios (pois a imagem enviada para a publicação no jornal teria sido cortada). Agnelli, então, voltou ao piano e compôs com mais aqueles acordes representados pelos pássaros que retornaram para a imagem. Seria a mesma música ampliada? Seria outra música?

Apostamos nos fluxos do processo de desterritorialização com os pássaros fora da foto que, ao reterritorializarem na partitura, evocaram modos outros de criação que ultrapassariam a inserção de notas ou acordes em uma peça musical. Esse retorno dos pássaros, entretanto, não foi para o mesmo território, para a mesma música, pois a intensidade das mudanças é constante. Quando Agnelli retorna para o piano para compor com os novos pássaros, linhas de fuga foram produzidas, variando, improvisando, como em uma experimentação, em um fluxo de agenciamentos coletivos que faz variar.

O Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) usado na EAD pode ser compreendido como um ambiente estático para interação entre emissor e receptor. Todavia, a experiência da canção produzida com os pássaros nos move no sentido de problematizá-lo como a pauta-fio, sendo um espaço híbrido que perpassa diferentes nuances, para além de postagem de tarefas, envio de informações sobre prazos e andamento do curso. Quantas notas compostas em ritmos provisórios (experiências na formação docente) a partir de uma revoada ou mesmo de um movimento estático (diferentes modos de aprender) poderiam afetar os percursos formativos, em meio à partitura/“partidura” (prescrições)?

Para as problematizações propostas, contamos com intercessores teóricos como Deleuze e Guattari (1997), trabalhando, sobretudo, nessa escrita, com os conceitos de ritornelo, suas territorializações, desterritorializações e reterritoriali-zações para nos referirmos à música; corpos, afecções e afetos para nos referirmos aos agenciamentos.

2 BUSCANDO AGENCIAMENTOS

No conceito clássico da teoria musical, o termo ritornelo se refere aos modos de retornos: à introdução, aos temas, refrãos, às estrofes, seções ou a toda a música. A partir do deslocamento do termo clássico promovido por Deleuze e Guattari (1997), compreendemos que os ritornelos agenciam territórios não somente musicais, mas é na música que eles são desterritorializados e reterritorializados.

Aprendemos com esses filósofos que os ritornelos têm diversos motivos: a alegria, a angústia, o medo, o amor, o trabalho, a marcha, o território... Mas eles são, sobretudo, o conteúdo da música; “[...] e a maneira pela qual ela se apropria do ritornelo torna-o cada vez mais sóbrio em algumas notas, para levá-lo numa linha criadora com isso enriquecida, da qual não se vê nem a origem, nem o fim [...]” (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p. 90).

O ritornelo traça um território: territorializar, desterritorializar, reterritoria-lizar. Esses movimentos de forças incessantes o compõem e, por isso, ajudam-nos a pensar os agenciamentos territoriais produzidos nos movimentos formativos: os agenciamentos territorializados estão sempre ali (plano de curso, mapa e dinâmica das disciplinas, roteiros e normas), coexistindo com noções outras, desterrito-rializantes, de encontros que ocorrem para além do AVA Moodle, de produções de artigos e publicações a partir das vivências no curso e de uma intensa rede de afetos se constituindo na docência por vir, a qual, de forma interdependente, se reterritorializa (redes de conversas nos fóruns, nos espaços dos polos, nas escolas). Não se trata de fases nem etapas, mas da coexistência de movimentos que afetam e são afetados nos encontros de ideias, docências, conteúdos, em conexões, em redes. Isso porque

[...] o território não é separável de certos coeficientes de desterritorializa-ção, avaliáveis em cada caso, que fazem variar as relações de cada função territorializada com o território, mas também as relações do território com cada agenciamento desterritorializado. (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p. 120).

A arte, ainda na esteira de Deleuze e Guattari (1997), ajuda-nos a compreender o território como efeito: efeito da própria arte. Na experiência dos pássaros nos fios, a partitura e o forte viés prescritivo da música podem ser considerados como placa ou cartaz. Isso nos ajuda a pensar como a prescrição é uma marca constituinte dos ambientes de formação docente. As prescrições parecem mover-se no sentido da busca pela garantia da qualidade da oferta dos cursos. Nessa direção, os documentos legais trazem uma gama de orientações, tendo, sistematicamente, o(a) professor(a)/aluno(a) do curso como o centro. Baseando-se em tal perspectiva, os “Referenciais de qualidade para educação superior a distância” (BRASIL, 2007, p. 12), publicados pelo MEC, orientam que o projeto político e pedagógico a ser elaborado pelas instituições de ensino superior (IES) contenham os seguintes aspectos:

  • descrever como vai se dar a interação entre estudantes, tutores e professores ao longo do curso, em especial, o modelo de tutoria;

  • quantificar o número de professores/hora disponíveis para os atendimentos requeridos pelos estudantes e quantificar a relação tutor/estudantes;

  • descrever o sistema de orientação e acompanhamento dos estudantes, garantindo que tenham sua evolução e dificuldades regularmente monitoradas, que recebam respostas rápidas às suas dúvidas, bem como incentivos e orientações quanto ao seu progresso nos estudos;

  • assegurar flexibilidade no atendimento ao estudante, oferecendo horários ampliados para o atendimento tutorial;

  • valer-se de modalidades comunicacionais síncronas e assíncronas, como videoconferências, chats na internet, [...] telefones [...], visando a promover a interação em tempo real entre docentes, tutores e estudantes;

  • facilitar a interação entre estudantes, por meio de atividades coletivas, presenciais ou via ambientes de aprendizagem adequadamente desenhados e implementados para o curso, que incentivem a comunicação entre colegas.

Esses pontos evidenciam que, em um curso a distância, o estudante deveria ser o centro do processo educacional, e a interação, apoiada em adequado sistema de tutoria e ambiente computacional especialmente implementado para atendimento às suas necessidades. As forças expressivas agem nesse territórioformação demarcando o rosto, a marca, a placa7 metodológica e curricular, como modos que buscam capturar forças outras que se movem pela multiplicidade de corpos nas aprendizagens docentes. Esses movimentos variáveis ou constantes que as qualidades expressivas mantêm umas com as outras se movem para a noção não mais de placas, “[...] mas motivos e contrapontos que exprimem a relação do território com impulsos interiores ou circunstâncias exteriores, mesmo que estes não estejam dados. Não mais assinaturas, mas um estilo” (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p. 110).

Não se trata de negar ou classificar como irrelevantes as prescrições, já que elas acontecem em qualquer modalidade de ensino, mas de considerar que, mesmo nos fluxos em segmentaridades duras, emergem movimentos outros, na fissura, na brecha...

Na composição da peça musical, Agnelli e os pássaros (FRANÇA, 2009), em linhas desterritorializantes, assumiram o controle dos aspectos mais territorializa-dos, agenciados a partir da foto: uma imagem cotidiana que talvez se confundisse com a paisagem.

Quantas pessoas, das centenas de milhares que compraram o mesmo jornal, viram naquela foto uma partitura? Provavelmente, milhares. E quantas dessas pessoas eram músicos? Provavelmente, centenas. Será que fui o único a ir ao piano com a foto recortada nas mãos? Espero que não. (FRANÇA, 2009, s.p.).

Os possíveis experienciados por Agnelli ajudam-nos a mover o pensamento e problematizar sobre esse controle dos aspectos mais territorializados (padrões, templates, hábitos etc.) e ampliar para experiências outras de formação docente na modalidade a distância.

3 PENSANDO NAS MODULAÇÕES

A pesquisa foi realizada junto ao curso de especialização lato sensu na modalidade de Educação a Distância, para professores de Matemática, carinhosamente chamada de “Matemática na Prática”, e teve como sujeitos da pesquisa cursistas, tutores, professores etc.

Apostamos na cartografia e nas redes de conversações como metodologia de pesquisa. Na contribuição de Rolnik (1989, p. 15), a cartografia pode ser reconhecida “[...] como um desenho que acompanha e se faz ao mesmo tempo em que os movimentos de transformação da paisagem”, ultrapassando, assim, a noção de mapa.

Para a rede de conversações, utilizamos recursos virtuais como Webconferências (disponível no AVA do Curso), Sala de Aula Google; também conversas presenciais nos Polos da Universidade Aberta do Brasil em quatro municípios do Espírito Santo: Vitória, Alegre, São Mateus e Nova Venécia, envolvendo cursistas, tutores(as), coordenadores de Polo, coordenadores do curso e coordenadores do Programa de Formação. Ademais, cartografamos os enunciados discursivos produzidos nos fóruns e atividades, propostos no ambiente virtual do Curso “Matemática na Prática”.

Na cartografia dos enunciados inscritos em diferentes espaços pesquisados, notamos que as redes de conversa se compõem como na música produzida por Agnelli a partir da fotografia dos pássaros: como um arranjo muito provisório, que, talvez, não se repita, mesmo que os pássaros se mantenham na mesma posição nos fios, pois os ritmos e as durações das notas poderiam receber outra interpretação. No entanto, nos encontros agenciados, que, a princípio, não traziam o compasso, a duração/tempo, o ritmo se afirmou pelo próprio encontro e pela produção inventiva, da diferença na repetição.

O enunciado destacado a seguir foi produzido a partir do relato referente aos usos dos jogos de discos na aprendizagem da matemática, os quais vale destacar que foram tema de um módulo proposto no currículo do curso, visando a ampliar as experiências de aprendizagem da disciplina para além das práticas tradicionais, que, por vezes, produzem pouco sentido para os estudantes. Notamos que o conteúdo trabalhado no curso e experienciado pela cursista em escolas da Educação Básica afeta sua prática pedagógica como professora:

[na experiência] percebi a importância em trazer jogos para o ambiente escolar, tornando-se uma constante em minha prática pedagógica, melhorando consideravelmente o aprendizado dos educandos no processo de ensino aprendizagem da matemática, especialmente na compressão na regras de sinais do conjunto dos números inteiros. Esse método proporcionou em minhas aulas situações mais prazerosas e criativas para o desenvolvimento dos conteúdos, conseguindo grandes resultados de ensino. (Cursista 1, relato sobre os Jogos de Discos – AVA).

Por vezes, a formação docente é como a música dos pássaros no retorno ao piano: “[...] o acorde que inicia não é o mesmo que termina, por mais que seja o mesmo, possui tensões diferentes” (TRINDADE, 2017); já não estamos nos mesmos territórios quando retornamos ao tema, ao debate no fórum, à produção de uma wiki, ao chat, às redes de conversas e aos encontros.

Nessa perspectiva, quando a cursista relata que, a partir da experiência, a prática com os jogos de discos passou a se presentificar em seu cotidiano com os estudantes, arriscamos afirmar que essa constância pode assumir diferentes intensidades, pois os estudantes, a própria cursista, a escola, o curso não mais são/serão os mesmos. É como no ritornelo, no qual o que volta é a potência; não é voltar, no sentido linear, de repetição, àquilo que é dado, pois, como observa Ferraz (2018, p. 46), pensar em ritornelo é: “[...] Reencontrar um tema, reencontrar um elemento sem necessidade de apelar para uma memória comparativa; sem necessidade de chamar um catálogo sonoro numa semiótica mal digerida”.

A fala a seguir, transcrita do fórum sobre EAD e TIC, apresenta uma problematização que compõe com essas conceituações. Ao apresentar os movimentos inscritos na constituição de uma pedagogia on-line, reverbera forças que coexistem no território da formação docente (ou seja, o AVA), as quais, ao mesmo tempo que se apresentam como placa, marca, de uma natureza fixa, expandem para a criação, experimentação.

Hoje, esta mos fazendo histórias, criando, experimentando e corrigindo neste campo desafiador de constituição de uma pedagogia on-line, gue exige gue profissionais e cidadãos sejam capazes de trabalhar em grupo, interagindo em eguipes reais ou virtuais. (Cursista 24, atividade EAD e a Matemática).

Pensar o AVA como território em que as paisagens melódicas e os personagens rítmicos se expandem para além da pintura muda na tabuleta é compor com os possíveis da formação docente, que, no território AVA, se articulam com outros territórios, em uma dinâmica cuja única previsão é a multiplicidade.

Registradas em um encontro no fórum, as conversas destacadas a seguir parecem compor com a noção de formação docente que escapa das concepções individual, gerencial e competitiva, apontando para a importância da interação e de romper com noções únicas de aprender... Nelas, forças que compõem com a noção de disciplina, tempo e aprender ao longo da vida coexistem no espaço vivido pelos docentes em formação na rede de conversações.

[Referindo-se ao Cursista 5], você tem razão guando fala gue esta modalidade depende da interação, pois é interagindo gue vamos trocando ideias, conhecimentos, e vamos enriguecendo e aprimorando nossas práticas docentes. O EaD é exatamente isso: estamos longe fisicamente e, ao mesmo tempo, presente. E as TIC’s estão aí, nos proporcionando esses momentos de compartilhamento. (Cursista 6, fórum O que é EAD?).

Re: Cursista 5, muito importante sua colocação. Disciplina, organização do tempo e um ambiente virtual de aprendizagem gue propicia interação do aluno com o grupo. (Cursista 7, fórum O que é EAD?).

Boa noite! Essa definição sobre o Ensino à Distância foi muito pertinente. Embora seja importante profissional capacitado para o ensino, eu entendo gue a maior dificuldade de os alunos terem sucesso para transformar as informações em aprendizado é a própria organização do tempo e dedicação para buscar aprimorar as informações em outras fontes de pesguisa, pois fomos educados com o ensino assistido em sala de aula. Como toda mudança, gera resistência e, mesmo guando não há resistência, é necessário adaptação. Então, para guem nunca participou de EAD, é hora de começar a se educar para obter sucesso. Eu estou me educando, embora o gue para mim é uma grande novidade, para muitos, já tem siso uma grande ferramenta de estudo. Que possamos ter sucesso nessa nova etapa. (Cursista 8, fórum O que é EAD?).

Re: Ei, Cursista 5! Concordo com você guando diz gue precisamos ter disciplina e organização na realização do curso EaD. Também acredito gue, com o avanço das tecnologias, poderá aumentar a procura por cursos EaD, pois as pessoas estão, a cada dia mais, sem tempo de realizar um curso presencial, por muito vezes não ter oportunidade ao acesso as universidades ou pela distância/local. Desse modo, a Educação a distância vem concretizando muitos desejos de profissionais/estudantes em se capacitar. Com isso, esperemos gue, com o passar do tempo, as tecnologias avancem, trazendo novas possibilidades, afins de favorecer na comunicação/interação, para um melhor aprendizado do aluno (Cursista 9, fórum O que é EAD?).

Tais falas também apresentam a relação de forças que compõem o território de formação docente (AVA) na coexistência de agenciamentos que se movem para a interação e coletividade, como também põem ênfase na regulação do tempo, no esforço individual e na comparação com o ensino presencial. Apostamos, porém, que as forças da criação, como as produzidas pelo professor A, ao se referir à composição do trabalho de conclusão do curso, engendram-se em movimentos coletivos em que a produção do TCC seria compartilhada entre os cursistas, contando com a contribuição do grupo nesse movimento.

Eu acredito gue poderíamos pensar em, talvez, dividir a produção do TCC em tarefas menores e compartilhar entre todos os alunos. Cada um fica responsável por revisar a tarefa de um colega, como se fosse o orientador. Acredito que pode ser um movimento interessante e que possa afetar os cursistas de forma mais ampla. (Professor A, Webconferência I).

Os movimentos territorializantes de projetos, neste caso, o Programa UAB, configuram-se como um alinhamento de formatos e prescrições que devem contemplar todos os polos e cursos. “Compreendemos que essas marcas territorializantes se desenvolvem em motivos e contrapontos, reorganizam as funções, reagrupam as forças. Mas, com isso, o território já desencadeia algo que irá ultrapassá-lo” (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p. 115). Esse algo que ultrapassa pode ter a ver com diversos meios que se articulam na constituição do território/ programa. Nesses meios, ritornelos territoriais atravessam outros ritornelos, como os profissionais que atuam em um programa educacional a distância, como um cursista destacou no fragmento a seguir:

Ei, colegas! Penso que, na metodologia EAD, o aluno deve ter uma postura ativa diante do processo de ensino e de aprendizagem; ninguém pode fazer isso por ele, já que não existe a figura centralizadora do mestre. A EAD faz parte de uma cultura pós-moderna, na qual o mestre centralizador do processo foi destituído de seu lugar e, em substituição a este, criou-se uma rede de ensino e aprendizagem na qual todos os atores são fundamentais para a manutenção do processo. Integram essa rede o professor elaborador de material didático, a equipe multidisciplinar, o professor formador, o tutor e o aluno. Sendo assim, quando pensamos em metodologia EAD, devemos pensar também na metodologia de aprendizagem do aluno. (Cursista 17, Fórum EAD E as TIC; grifo nosso).

A atuação coletiva no trabalho com a formação docente a distância, articulado entre professores(as), tutores(as), coordenadores(as), além de outros profissionais, afirma o viés da relação entre os corpos e a docência no movimento de territorialização. Também no que se refere à tecnologia utilizada, o viés coletivo deve ser considerado, como alerta a Cursista 11.

Os estudantes de cursos à distância são levados a utilizar um conjunto de serviços e mídias digitais, em ferramentas apresentadas no material fornecido – como, no nosso curso, a ferramenta Moodle –, para nos dar assistência no processo de aprendizagem e nos beneficiar no decorrer de todo o curso (Cursista 11, atividade EAD e a Matemática).

O aprendizado da matemática se favorece de tal modalidade, com a infinita fonte de pesquisa que é oferecida pela WWW, tais como vídeos, livros on-line, professores e tutores disponibilizados pelas IE’s [referindo-se às instituições educacionais]. Presente em tudo, a matemática... podemos usar em vários momentos do dia, em todas as atividades profissionais, facilitando aplicabilidade da teoria na pratica, como, por exemplo, cálculo de juros, medidas de área, capacidade, entre outros (Cursista 12, atividade EAD e a Matemática).

Na experiência do “Módulo Jogos de Disco”, arriscamos afirmar que as funções coordenador(a), tutor(a), professor(a), designs se diluem em intensidades que perpassam a formação do cursista e reverberam em práticas pedagógicas na escola. As enunciações a seguir se inserem nessas linhas de forças:

Foi possível perceber, até o presente momento nesta experiência, que é de grande importância trabalhar de forma diferenciada. É notório a atenção que os alunos dão para algo novo, o que foi muito positivo para sala de aula e a relação entre professor e aluno [...] É de relevância notar que a metodologia de ensino ainda está muito tradicional e que encontramos muitos problemas e desafios na inserção dos jogos matemáticos na sala de aula. Porém, a causa é nobre. Os jogos matemáticos estão à disposição de todos, inclusive dos alunos, que possuem o domínio sobre as novas tecnologias e as usam no seu cotidiano. E seu uso tornaria a aula de matemática muito atraente. (Cursista 3, relato sobre os Jogos de Discos – AVA).

A experiência foi válida, pois o jogo superou nossas expectativas. Não esperávamos que fosse tão bem aceito como foi. De acordo com o relato dos professores entrevistados, o uso desta ferramenta tornou a aula mais dinâmica, participativa e construtiva. Tanto alunos das séries finais do Ensino Fundamental quanto os alunos do 3º ano do Ensino Médio aceitaram bem a utilização do jogo de discos. Ao confeccionarmos e jogarmos o jogo entre nós, alunos da especialização, podemos verificar a importância dos jogos para o aluno, pois sai da rotina à qual ele está acostumado. Como todos têm um instinto de competição, [os jogos] foram feitos em grupos, para verificarmos qual teria mais acertos. Com os resultados, foram feitos cálculos para dar continuidade à aula de probabilidade, mas, no dia posterior ao da aula com jogos, muitos perguntaram se os professores não utilizariam novamente o jogo na aula, confirmando a aceitabilidade da ferramenta. (Cursista 4, relato sobre os Jogos de Discos – AVA).

Da mesma forma que os alunos, os professores também identificaram diversas contribuições para o uso de jogos nas aulas de Matemática, pois os jogos matemáticos ensinam o conteúdo deforma lúdica e, assim, os alunos não percebem que estão aprendendo enquanto jogam, além de estimular o raciocínio, [fazendo uma alusão entre a ânsia dos alunos pelo jogo com a poesia] Adélia Prado diz: “Não quero faca, nem queijo. Quero a fome”. (Cursista 5, relato sobre os Jogos de Discos – AVA).

Acredito que o ensino de matemática não deve continuar sendo feito apenas com seu método tradicional, pois os alunos não consequem aplicar os conhecimentos ensinados na escola em sua vida em sociedade. Por isso que o jogo de d isco foi tão promissor no ensino da probabilidade, pois os alunos consequiram perceber e analisar os dados e compará-lo com a realidade que estava em sua frente. Além do mais, utilizamos o jogo em sala de aula de maneira consciente e compromissada, melhorando a situação [em] que se encontra o ensino/aprendizaqem de matemática. Tornamos este fato [referindo-se à aula de matemática] mais divertido, prazeroso e dinâmico. (Cursista 6, relato sobre os Jogos de Discos – AVA).

As forças da criação, do novo agenciado às aprendizagens produzidas na experiência, ganham intensidade na medida em que a aprendizagem do curso de especialização (cursistas jogando entre si) se insere na vida escolar, em produção de afetos/afecções como as que geraram o enunciado destacado a seguir.

Foi realmente muito prazeroso para mim, professora-pesquisadora, acompanhar o desenvolvimento desta atividade com utilização desse joqo. Nem vimos a aula “passar”. Quando “nos demos conta”, o sinal sonoro indicativo do encerramento da aula soou e alquns ainda pediram para que eu permanecesse na sala. (Cursista 8, relato sobre os Jogos de Discos – AVA).

Tendo o território uma margem de decodificação que afeta o meio, simultaneamente, temos uma margem de desterritorialização que afeta esse mesmo território. Deleuze e Guattari (1997, p. 120) afirmam que esses movimentos são como uma “série de desengates”. Os desengates parecem se relacionar com esse hibridismo em que vivências experienciadas no território AVA agenciam outras tantas experiências nos territórios polos e, sobretudo, no território Escola, como reverbera este enunciado:

O desafio do trabalho do joqo dos discos estimula o estudante a realizar um trabalho investiqativo muito interessante e valoriza a criatividade e a estra-téqia na resolução do problema, unindo a abordaqem experimental (escola) à teórica (problematizada no AVA) dando mais siqnificado à aprendizaqem de probabilidade na estatística em sala de aula. (Cursista 7, relato sobre os Jogos de Discos – AVA; grifos nossos).

Como vimos nesses arranjos, forma-se um consolidado com sons específicos e também de outras “espécies”: foto, mídia impressa, mídia digital, partitura, piano, aplicativos, programas, uma multiplicidade de agenciamentos... Tudo varia a partir do agenciamento no qual essas linhas de forças estão envolvidas; o canto pleno, no caso dos pássaros nos fios, entra em relação com as organizações rítmicas e melódicas que escapam do que consideramos como específico da teoria musical tradicional e se amplia para notas “estrangeiras” ou acrescentadas.

Na fala destacada a seguir, notamos linhas de forças que fazem imobilizar (prazos e atividades, relação com a tutoria), mas que, ao mesmo tempo, permitem uma rotação (acesso à licenciatura, atuação como formadora) dando oportunidade de acesso ao curso de especialização:

Oi, professora! Tópico interessante! Sou professora de Matemática e Física, estudante de licenciatura em Física e atuei como formadora no curso Escola da Terra Capixaba pela UFES. Os cursos EaD são mais acessíveis porque nos permite participar em qualquer lugar. Porém, as vezes, nos sentimos um pouco perdida com tantos prazos e atividades, que nos parecem bem difíceis, e o tutor, as vezes, demora a responder. Mas, de modo geral, o ensino a distância é uma forma maravilhosa de fazer a educação acontecer em todos os lugares. (Cursista A, Google Class).

Os enunciados discursivos produzidos nos relatos da experiência com os jogos de discos demonstram intensidades de forças desterritorializantes permeando os movimentos formativos e a docência.

O relato dessa experiência de jogos de discos se faz necessária para que o educador tenha o ato de ensinar como o ato de aprender, desenvolvendo--as de diversas formas. O educador [e o] aluno deve(m) ter uma relação de troca, onde ambos irão interagir dentro da sala de aula. O educador também aprende com os alunos. Verificamos que é possível alinhar o conteúdo teórico com a prática, pois, assim, irá proporcionar uma melhor fixação do conteúdo e uma aula mais motivadora e com comprometimento dos alunos. Com essa experiência vivida em sala de aula, foi de suma importância para o meu crescimento como profissional que precisa inovar a didática de ensino. O ensino está muito além do que vemos, numa relação em que o professor fala, explica, o aluno escuta, escreve, faz a atividade e tira boas notas, mas, sim, [deve se basear] na transferência do conhecimento de ambos, é uma troca. Com a realização da atividade na prática, podemos ver que o aluno aprende, mas que o educador sai com mais experiências e, claro, com a afinidade entre ambos. O aluno adquire mais autonomia e poder de decisão no momento da execução da atividade. Muito gratificante poder participar dessa nova proposta de ensino, que está sendo uma reformulação nos métodos de ensino! (Cursista 12, relato sobre Jogos de Discos – AVA).

Para que essa aprendizagem ocorra de maneira significativa, precisamos desmistificar a visão de uma matemática linear, ou seja, de que antes de introduzir certo conteúdo em sala de aula é necessário trabalhar um conceito pré-formado. Segundo DAmbrosio (1998), “esse é o mito da linearidade, que implica uma prática educativa desinteressada e desinteressante, desinspi-rada, desnecessária, acrítica e, na maioria das vezes, equivocada”. (Cursista 13, relato sobre Jogos de Discos – AVA).

Essas forças emergem como potência, escapando às forças molares dos prazos e interações, movendo-se nesses espoçostempos e formação da Especialização Matemática na Prática... Ligações molares/moleculares que se afetam. Como afirmam Deleuze e Guattari (1997, p. 130),

[...] as forças internas intramoleculares, que conferem a um conjunto sua forma molar, podem ser de dois tipos: ou relações localizáveis, lineares, mecânicas, arborescentes, covalentes, submetidas às condições químicas de ação e reação, de reações em cadeia, ou, então, ligações não localizáveis, sobrelineares, maquínicas e não mecânicas, não covalentes, indiretas, que operam por discernimento ou discriminação estereoespecífica mais do que por encadeamento.

Em conversa com cursistas na apresentação dos TCCs, uma aluna, problematizando sobre a importância de se ter coragem para criar, teceu a seguinte fala:

O sistema nos aprisiona, mas é possível criar. Por exemplo, a aula com o Professor A, posso considerar como um bom encontro, uma “aula boa”. No estudo dos sólidos de Platão, vivemos uma interação, um barulho pedagógico que nos moveu a sair da zona de conforto: buscamos a interação com [e] entre os alunos. (Cursista 1, Webconferência II -TCC).

Qualquer que seja o tipo, ainda que com intensidades de forças diferentes, o ritornelo se move para a criação. Nas redes de conversas da Especialização em Matemática na Prática, ainda que não tenham feito parte dos espaços prescritos, o novo, o criativo, o diferente emerge, como se nota no enunciado a seguir.

Boa tarde! Durante o curso de especialização em Matemática na Prática, edição do ano de 2016, percebi que alguns trabalhos de conclusão de curso [modelo de monografia] tinham um grande potencial, por algumas características: tema e aula com questões de investigação bem delineadas, um razoável levantamento de pressupostos teóricos articulados ao problema e o que considerei primordial para a qualidade do trabalho, muito envolvimento do cursista com a produção dos dados em sala de aula. Com essa tríade solidificada – questão bem delineada; pressupostos teóricos articulados em nível suficiente para o texto; produção e coleta de dados bem realizada com os estudantes -, vi que valeria a pena divulqar o trabalho do cursista em periódicos especializados da Educação Matemática. Mas, em 2016, não houve tempo hábil para orqanizar essa produção e meu envolvimento em outras atividades profissionais e acadêmicas fizeram com que eu adiasse [essa tarefa] até o momento mais oportuno. No final de 2018, fiz a proposta de produção de um artiqo a partir da monoqrafia para duas cursistas do curso de especialização. Elas aceitaram com o mesmo entusiasmo com que tinham produzido o TCC. Uma delas, inclusive, recebeu o 2º luqarno Prêmio Shell de Educação pelo trabalho desenvolvido. Um trabalho desse merece divulqação nos veículos de comunicação acadêmico. Todo nosso contato e trabalho foi realizado por e-mail e Whatsapp. Já publicamos um dos trabalhos. Como a cursista nunca tinha escrito um artiqo, o primeiro passo foi a seleção das principais partes do TCC que atenderia o modelo disponibilizado pelo periódico. Eu fiz a primeira versão deste recorte. Em sequida, a cursista realizou, a meu pedido, a síntese de muitas partes que estavam lonqas e, por vezes, repetitivas. Alqumas passaqens com dados produzidos não tinham sido analisadas no TCC e o foram no artiqo. Além disso, as considerações finais foram reescritas, focalizando nos resultados e aproximação da questão de investiqação. A cursista escreve muito bem, mas esperava que levaríamos mais tempo escrevendo e com mais intervenções minhas. Dada a dedicação e entusiasmo da cursista, o tempo de produção da versão final do artiqo me surpreendeu muito. O artiqo foi publicado na revista “Sala de aula em foco”, do Ifes Vitória, no primeiro semestre de 2019. (Professor A, em e-mail para a pesquisadora).

A conversa com o Professor A aconteceu em um ambiente de rede social, a partir de seu próprio desejo de compartilhar a experiência vivenciada com a cursista. Notadamente, o movimento de criação ultrapassou o espaço do curso e se expandiu para movimentos outros, em um coletivo que reverbera em sons, como os produzidos a partir da fotografia dos pássaros nos fios.

Assim, a força do ritornelo se dá tanto nas produções coletivas nas redes de formação quanto no vídeo/áudio da canção dos pássaros que alcançou o mundo; não é uma relação de hierarquia de experiências, mas de linhas de forças que se movem como máquinas em agenciamentos coletivos de enunciação e agenciamentos maquínicos, ou um no outro. Com os dois filósofos, podemos afirmar que o agenciamento territorial tomado pelo movimento de desterritorialização em condições naturais e artificiais dos pássaros nos fios desencadeou uma máquina. Eles explicam que “[...] é essa a diferença que queríamos propor entre máquina e agenciamento: uma máquina é como um conjunto de pontas que se inserem no agenciamento em vias de desterritorialização, para traçar suas variações e mutações” (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p. 128).

No canto dos pássaros, evidenciam-se máquinas que produzem aberturas para a criação, para os possíveis, para os coletivos, para a diferença. Essa ressonância de forças que atuam na criação e que aposta nos coletivos de enunciação parece encontrar eco nos discursos produzidos pelas cursistas, em um dos fóruns.

A educação, independente do modelo que segue, presencial, semi-presencial ou a distância, é fundamental para a formação do ser humano. O que muda, realmente, são somente conceitos ou modelos, pois, no caso da EAD, alunos e professores não estão fisicamente e geograficamente próximo o tempo todo, mas estão interligados por um mundo tecnológico, que os faz próximos virtualmente. Daí a importância do uso da TIC’s na Educação em todos os níveis, mesmo no ensino presencial, pois a tecnologia torna a aula mais atrativa e interessante, auxiliando, assim, no processo de ensino-aprendizagem. (Cursista 2, fórum O que é EAD?).

Verdade, Cursista 2, “a educação acontece independente do modelo que se segue”. Muitos associam educação a distância com um modelo que não tem interação, nem troca de aprendizado, como se o aluno fosse adquirir o conhecimento sozinho. Para isso, as ferramentas diversas das TICs existem, para facilitar nossa vida de uma forma geral e também na educação, de forma que, com o uso delas, esses conceitos de Educação a distância, educação presencial, educação semi-presencial são dispensáveis, pois todos tratam de uma educação onde a troca de conhecimento acontece com sucesso. Seja fisicamente, seja virtualmente, seja em livros, revistas, áudio-books, arquivos ou em uma boa e indispensável conversa. (Cursista 3, fórum O que é EAD?).

O trabalho coletivo foi à marca do projeto. Além da aprendizagem em matemática, outras questões também foram desenvolvidas. Todos os profissionais da educação, independente de sua área, pode apostar em atividades em grupo. (Cursista 6, relato sobre os Jogos de Discos – AVA).

A coexistência, nos percursos formativos docentes em EAD, desses processos mais duros, fortemente prescritivos e de representação com os que se movem na abertura para o novo, é problematizada neste texto, apostando, sobretudo, no que emerge das conexões, intensidades e forças na dimensão dos afetos, entendidos como “[...] as afecções do corpo pelas quais a potência de agir desse mesmo corpo é aumentada, ou diminuída, favorecida ou impedida” (DELEUZE, 2002, p. 56). Arriscamos propor que, nos encontros e agenciamentos produzidos na pauta-fio (AVA) com professores em formação, também emergem afetos/afecções que permitem criar movimentos outros de aprendizagem, tal como evidencia a fala do Professor A, destacada a seguir:

Na condição de professor, minha maior preocupação foi garantir que todos os elementos indispensáveis a produção de um TCC fossem disponibilizados aos alunos por meio de todas as ferramentas que tínhamos a disposição, como a plataforma Moodle, o correio eletrônico e o aplicativo Whatsapp, para interações que exigiram retornos mais urgentes. Percebi que, mesmo com os materiais disponibilizados acerca de metodologia da pesquisa, ética na produção acadêmica, artigos e livros sobre as temáticas de cada trabalho, ficou difícil para muitos cursistas concatenar e sintetizar as ideias em um relato de experiência bem fundamentado, coerente e coeso. Por isso, adaptei instrumentos para construção de cada etapa do TCC. Iniciamos com um questionário que me apresentasse quem era cada cursista, sua formação acadêmica, experiência profissional e relação que tinha com a Matemática e seu ensino. Algumas dessas informações acabaram aparecendo de forma sucinta no relato de experiência de alguns. Em seguida, pedi para que preenchessem uma ficha, apresentando a temática do trabalho, o que queriam investigar, que atividade queriam desenvolver na escola e como traduzir isso em objetivos e em uma questão de investigação. Nessa etapa, vi que ainda restavam dúvidas em relação ao significado de uma pesquisa acadêmica. Apareceram muitos temas sem uma questão norteadora e também muitas dificuldades para diferenciar objetivos de aula e objetivos de pesquisa. A partir dessas dificuldades diagnosticadas é que percebi a necessidade de esclarecer as dúvidas dos cursistas por outra forma além do texto. Uma aula presencial seria inviável, dada a distância do polo e agendas dos cursistas, que eram, em sua maioria, de outras profissões. Convidei a Professora B para elaborarmos um roteiro sobre tais questões diagnosticadas, facilitando a produção do TCC, e optamos pela gravação de uma vídeo-aula na Sead. Acredito que esse passo que demos além do que nos foi atribuído enquanto orientadores mostrou a importância de pensar em alternativas para superar problemas que não conseguíamos resolver com as ferramentas disponíveis. Isso demonstrou claramente para mim as potencialidades do processo de produção acadêmica, quando nos dispomos a transpor obstáculos. Essa foi a relação que fiz quando assisti ao filme “O peixe e eu”, de Babak Habibifar. O personagem do curta metragem tinha um problema para resolver e precisou adaptar a solução, de acordo com suas limitações. Na docência em EAD, temos boas ferramentas para oportunizar o conhecimento numa rede de pessoas bem maior que o ensino presencial, mas, ao mesmo tempo, a distância e a relação assíncrona no processo de ensino-aprendizagem nos impõe os seus desafios de comunicação. Inspirados no personagem de Babak Habibifar, precisamos pensar nas soluções alternativas e superar os obstáculos. (Professor A, plataforma Google Class).

Esses movimentos do Professor A nos remetem a ritornelos, que nunca retornam da mesma maneira, para os mesmos fins, para o mesmo parâmetro... Quantos ritornelos podemos captar, agenciar nesse movimento incessante de territorializar e desterritorializar, ao tratarmos dos percursos formativos dos docentes na modalidade a distância como espoçotempo de invenção, ampliando-os para fora dessas durações previsíveis, e não mais convocados apenas a identificar ou reconhecer uma forma?

Quando os alunos perceberam gue a aula seria de modo grupai, demonstra[ra]m euforia e curiosidade. Todos gueriam saber gual era a atividade a ser desenvolvida. Alguns demonstraram certa indisciplina, porém, à medida gue as regras da atividade foram apresentadas e cada grupo iniciou sua tarefa, toda indisciplina transformou-se em diversão e interesse pela atividade proposta. Percebe-se, então, gue a tarefa representou um desafio para os alunos, envolvendo-os, levando-os à interação e à cooperação grupai, servindo como fonte de interação e aprendizagem. A importância de uma nova metodologia para gue os alunos conseguissem absorver o gue é probabilidade teve como propósito trazer a discussão à tona, servindo de alerta para gue o educador sempre leve em consideração as diversas formas de aprender fazendo, não tendo, com isso, o intuito de esgotar o assunto, mas provocar uma reflexão. (Cursista 13, re lato sobre os Jogos de Discos – AVA).

Territorializar, desterritorializar e reterritorializar são os movimentos do ri-tornelo. Nesta escrita, forçamo-nos a pensar sobre essas noções no território AVA. Problematizando esses movimentos, vimos que eles não são lineares e sequenciais, coexistindo em linhas de forças. Tomando a noção de desterritorialização no território de formação docente AVA, podemos indagar sobre as forças que, incessantemente, atuam nesse movimento, territorializando, tornando a aprendizagem do curso com pouca potência. Por ser parte desse jogo multifacetado de forças, a territorialização, mesmo que provisória, compõe com percursos que se engendram em pausas que não são perenes, logo, outras forças agem para a desterritorialização.

4 PARA NÃO CONCLUIR

Como salientam Deleuze e Guattari (1997, p. 92), “[...] nenhum fluxo, nenhum devir-molecular escapam de uma formação molar sem que componentes molares os acompanhem, formando passagens ou referências perceptíveis para processos imperceptíveis”. Essa coexistência de forças emerge (como vimos) nas enunciações produzidas nos encontros, ao considerarem a relevância do novo na relação com fazeres tradicionais.

Essas linhas de forças que compõem com os escapes, com a busca pelo novo na aprendizagem dos docentes em formação ao longo da especialização, bem como nas vivências com os estudantes no cotidiano da Educação Básica, também podem ser consideradas como movimentos de resistência.

Compondo com a noção de ritornelo, arriscamos afirmar que, desses modos de resistir, emergem fugas antes não previstas. Inserem-se no ritornelo ritmos que se inscrevem na produção de sentidos outros, ritmos inovativos, ressignificando a gestão e as práticas nos cursos. Na formação docente, esse imperativo de criação urge em romper com modos e melodias territoriais fechados sobre si (pacotes de formação transpostos de sistemas tidos como modelo, mapas de disciplinas que priorizam a fôrma e a forma), liberando a comunicação em um devir forças (redes de conversas que problematizem a docência, buscando romper com a perspectiva fortemente difundida em EAD, a qual preconiza a individualidade e o esforço como forças intensas que se inscrevem na formação).

O AVA é, conforme entendemos, um território onde “[...] cada homem pode se encontrar ou se perder [...] Enquanto território, é também um lugar de passagem para personagens e para as forças intensivas do ritornelo” (MARQUES, 2013, p. 28). Nesse plano, a Arte e a Filosofia compõem movimentos de retornos; não o mesmo retorno, mas o que se inscreve na diferença. Nisso, podemos entender que as forças da criação são imbricadas no ritornelo: “[...] a potência do ritornelo é uma força, uma sensação de ressonância [...] uma presença que surge e escapa, um salto para fora, um bloqueio daquilo que é o mesmo [...] De repente, ‘lemos’ ou ‘vemos’ algo antes, não lido nem visto” (p. 28).

Um dos modos como esses movimentos de forças têm se evidenciado mostra-se nas iniciativas dos cursistas em buscar, nas conversas, um artifício para ampliar e/ou romper com o engessamento causado pela força da prescrição. Nas redes de conversas virtuais, também nos polos, como dito anteriormente, ficou latente o reforço sobre a importância de padronizar os trabalhos, de alinhar os discursos entre os(as) tutores(as), entre tantas outras necessidades prescritivas. No entanto, outros modos de composição emergiram, sendo que essas brechas reverberam em potentes linhas e composições de inventividade e forças de resistência como reexistir.

6Fotógrafo do jornal Estadão e autor do registro da imagem.

7Cartaz ou placas que marcam um território e sua delimitação fixa no espaço (SANTOS, 2013, p. 282).

REFERÊNCIAS

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Recebido: 10 de Setembro de 2021; Aceito: 17 de Setembro de 2021

Nilcéa Elias Rodrigues Moreira: Doutora em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo. Gerente de Formação de Professores da Secretaria Municipal de Educação da Serra-ES. E-mail:nilcea.moreira@edu.serra.es.gov.br, Orcid:https://orcid.org/0000-0002-8609-9595

Jaqueline Magalhães Brum: Doutora em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo. Professora do Departamento de Teorias de Ensino e Práticas Educacionais da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). E-mail:jackiemagalhaesbrum@gmail.com, Orcid:http://orcid.org/0000-0001-5528-1098

Juliana Paoliello Sánchez Lobos: Doutora em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo. Gerente de Educação Infantil da Secretaria Municipal de Educação de Serra, ES. E-mail:julianapaoliello@yahoo.com.br, Orcid:https://orcid.org/0000-0002-6820-2245

Rosane Maria Muñoz: Mestre em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo. Coordenadora do Polo da Universidade Aberta do Brasil – Secretaria de Educação de Vitória, ES. E-mail:munoz.rosane@gmail.com, Orcid:https://orcid.org/0000-0002-1456-155X

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