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Série-Estudos

versão impressa ISSN 1414-5138versão On-line ISSN 2318-1982

Sér.-Estud. vol.27 no.59 Campo Grande jan./abr 2022  Epub 30-Maio-2022

https://doi.org/10.20435/sserie-estudos.v27i59.1615 

Dossiê: “Que didática para a escola de hoje?”

As pesquisas sobre a sala de aula no campo da Didática: as temáticas de pesquisa nos artigos científicos

Research on the classroom in the field of Didactics: research themes in scientific articles

Investigaciones sobre el aula en el campo de la Didáctica: temas de investigación en artículos científicos

Giovanna Ofretorio de Oliveira Martin Franchi1 
http://orcid.org/0000-0002-0266-9053

Márcia de Souza Hobold1 
http://orcid.org/0000-0002-4179-608X

1Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, Santa Catarina, Brasil.


Resumo

A presente pesquisa teve por objetivo apresentar um panorama das produções sobre a temática sala de aula na área da Didática a partir dos resumos, bem como indicar as temáticas abordadas por meio dos eixos temáticos baseados na teoria de Campos da Didática em Longarezi e Puentes (2015; 2017). A pesquisa foi desenvolvida por meio da abordagem qualitativa e caracterizou-se como do tipo estado do conhecimento. A pesquisa desenvolveu a coleta de dados na perspectiva da análise documental (CELLARD, 2005) e análise e interpretação dos dados, por meio da análise de conteúdo de Bardin (2011). Norteou este trabalho a questão sobre a configuração das pesquisas no campo da Didática no que concerne à temática sala de aula. Para tal, foram analisados sessenta e seis resumos dos artigos científicos, pertencentes ao campo científico da Didática, divulgados no período de 2008 a 2018. A análise indicou que a sala de aula pode ser compreendida como lugar de pesquisa quando considerada como objeto e espaço de pesquisa e quando levado em conta o contexto (ambiente) em que se pode desenvolver a ação de pesquisa. Entre os resumos analisados que apresentaram a temática sala de aula por meio do termo homônimo, quarenta e oito (ou 73%) foram classificados na categoria sala de aula como espaço de pesquisa, distribuídos entre os eixos temáticos Investigativo, Profissional e Disciplinar, com ênfase no eixo Investigativo. Na categoria sala de aula como lugar de pesquisa, foram classificados doze (ou 19%) resumos, distribuídos entre os eixos Investigativo e Profissional.

Palavras-chave: Didática; sala de aula; campos e dimensões da Didática

Abstract

This research aimed to present an overview of the productions on the classroom theme in Didactics from the abstracts, as well as to identify the themes addressed through the thematic axes based on the theory of Didactic Fields in Longarezi and Puentes (2015; 2017). The research was developed through a qualitative approach and was characterized as knowledgeable. The research collected data from the perspective of document analysis (CELLARD, 2005) and analysis and interpretation of data through Bardin’s (2011) content analysis. This work was guided by research in the field of Didactics concerning the classroom theme. To this end, sixty-six abstracts of scientific articles belonging to the scientific field of Didactics, published in the period 2008 to 2018, were analyzed. The analysis indicated that the classroom can be understood as a place of research when considered as an object and space of research, and when considered as a context (environment) in which the research action can be developed. Among the abstracts analyzed that presented the classroom theme using the homonymous term, forty-eight (or 73%) were classified in the classroom category as a research space, distributed among the Investigative, Professional, and Disciplinary axes, with emphasis on the Investigative axis. In the classroom category as research place, twelve (19%) abstracts were classified, distributed between the Investigative and Professional axes.

Keywords: Didactics; classroom; fields and dimensions of Didactics

Resumen

Esta investigación tuvo como objetivo presentar un panorama de producciones sobre el tema del aula en el área de Didáctica, así como señalar los temas abordados a través de los ejes temáticos basados en la teoría de Campos de la Didactica en Longarezi y Puentes (2015; 2017). Se desarrolló una investigación a través de un enfoque cualitativo y se caracterizó como el tipo estado de conocimiento. La investigación desarrolló la recolección de datos desde la perspectiva del análisis de documentos (CELLARD, 2005) y el análisis e interpretación de datos a través del análisis de contenido de Bardin (2011). Este trabajo estuvo guiado por la pregunta sobre la configuración de la investigación en el campo científico de la Didáctica con respecto a la temática del aula. Para ello, se analizaron sesenta y seis resúmenes de artículos científicos pertenecientes al campo de la Didáctica, publicados en el período 2008 a 2018. El análisis indicó que el aula puede entenderse como un lugar de investigación cuando se considera como un objeto y espacio de investigación y cuando se considera como un contexto (entorno) en el que se puede desarrollar la acción investigadora. De los resúmenes analizados que presentaron la temática de aula, utilizando el término homónimo, cuarenta y ocho (o el 73%) fueron clasificados en la categoría de aula como un espacio de investigación, distribuidos entre los ejes temáticos Investigativo, Profesional y Disciplinario, con énfasis en el eje Investigativo. En la categoría de aula como lugar de investigación, se clasificaron doce (19%) resúmenes, distribuidos entre los ejes Investigativo y Profesional.

Palabras clave: D idáctica; aula; campos y dimensiones de la Didáctica

1 INTRODUÇÃO

A Didática como campo, em Libâneo (2008; 2013) e Longarezi e Puentes (2015; 2017), define-se como o principal ramo de estudos da Pedagogia, área que investiga os fundamentos, as condições e os modos de realização da instrução de ensino. Esse campo, por sua vez, dialoga com diferentes temáticas que se ­relacionam com o ensino, como os objetivos, as metodologias e as questões mais abrangentes, dentre elas, a relação do ensino com a Educação, com os ambientes institucionais etc.

Nesse contexto de diálogo do campo da Didática com as demais temáticas, a sala de aula apresenta-se como abordagem relevante de estudo nas produções pertencentes ao âmbito da Didática. Para além disso, percebe-se que pesquisar a sala de aula preenche lacuna existente na área da Educação de pesquisas que tratem especificamente sobre essa temática, considerando-a como espaço e lugar de pesquisa.

Libâneo e Freitas (2017, p. 49) indicam que “a escola continua sendo espaço específico e próprio da formação humana intencional e sistematizada”. Compreendemos, assim, que a sala de aula constitui, pois, o microespaço pertencente ao macroespaço da escola, em que as vivências, as interações entre os sujeitos e o lugar onde o objeto de estudo do campo da Didática - o ensino em situação e seus processos didáticos - se desenvolvem.

Ressaltamos que, ao se falar sobre sala de aula, é possível relacioná-la diretamente à temática aula, considerando, muitas vezes, os termos (sala de aula e aula) como sinônimos. Todavia, indicamos que neste estudo os termos em questão não foram considerados sinônimos. Nesse sentido, partiu-se do pressuposto de que tanto as temáticas citadas quanto os termos se interrelacionam no ambiente escolar e têm significado e relevâncias singulares, por isso julgou-se necessário a definição de ambos os termos neste estudo.

Para Libâneo (2013, p. 196), a aula constitui-se na “forma didática básica de organização do processo de ensino”, significa dizer “todas as formas didáticas organizadas e dirigidas direta ou indiretamente pelo professor”, com o intuito de “realizar o ensino e a aprendizagem”. É, pois, “toda situação didática na qual se põem objetivos, conhecimentos, problemas, desafios, com fins instrutivos e formativos”. A aula pode, ainda, ser considerada de maneira singular ou em conjunto. Esta última se caracteriza por ser “um trabalho contínuo do professor, estruturado no plano de ensino e nos planos de aula”. Desse modo, a aula configura-se como a materialização da ação didático-pedagógica, da prática pedagógica, podendo ser desenvolvida em qualquer ambiente e espaço físico da escola.

A sala de aula, por sua vez, é um ambiente institucional onde a aula se desenvolve, constituindo-se, portanto, como um ambiente determinado. Não se trata, porém, de qualquer ambiente da escola, mas um específico, que tem características (número de carteiras, posicionamento da mesa do professor etc.) e objetivos próprios. Em Marin (2005), compreendemos que a sala de aula é o ambiente de trabalho do professor, tem relevância na formação inicial e continuada e tem a própria realidade. É o ambiente onde se desenvolve a atividade docente. Em Garrido (2006), a sala de aula é compreendida como um ambiente de tensão, tanto de acolhimento quanto de não acolhimento, e nele se proporcionam diálogo e reflexão. Assim, é no contexto da sala de aula que ocorre a tarefa de ensinar um saber elaborado, em que há a tessitura das interações professor-aluno-conhecimento.

A sala de aula também constitui em si um ambiente no qual se desenvolve o currículo formal, prescrito e oculto (SACRISTÁN, 2000), que perpassa e é perpassado pelas questões inerentes ao currículo, à Didática etc. Dialogando com Marin (2005), a sala de aula apresenta-se como ambiente com um todo que o compõe, e, nesse sentido, valorizar os processos inerentes a esse ambiente requer voltar o olhar para os problemas da realidade escolar.

Em Oliveira (1995), a sala de aula constituiu o ambiente no qual ocorre a expressão nuclear do ensino - a aula. Em Libâneo (2013, p. 197), compreende-se a relevância em “valorizar a sala de aula como meio educativo”.

Ao considerar o ensino e seus processos (PIMENTA, 2013; CANDAU, 2000; 2014; LIBÂNEO, 2008; 2013) como objeto central de estudo da Didática enquanto campo, a temática sala de aula se relaciona de maneira intrínseca a esse campo. No que tange aos estudos de Longarezi e Puentes (2015; 2017), compreendemos que as produções cuja temática versaram sobre a sala de aula poderiam ser caracterizadas segundo os Campos e Dimensões da Didática apresentados pelos respectivos autores.

Os termos espaço e lugar são comumente presentes no campo das pesquisas que tratam sobre formação de professores na Educação Superior. O sentido dos termos foi utilizado para compreendermos os contextos em que a temática sala de aula, representada pelo termo homônimo, apresentava-se na produção textual dos resumos de artigos científicos.

Em Cunha (2010), o lugar representa a ocupação do espaço pelas pessoas, preenchido não de maneira desordenada, mas sim a partir de significados atribuídos que legitimam sua condição e ocupação. Cunha e Cavalcanti (2008), Cunha (2008; 2010) e Martin-Franchi (2017, p. 57) nos auxiliam, especialmente essa última autora, ressaltando que o “entendimento sobre os termos não diz respeito somente ao seu significado gramatical e vocabular, mas essa compreensão encaminha para reflexões importantes”, ou seja, “envolvem os significados e imbricações dos termos nas estruturas sociais de poder. É a dimensão humana que pode transformar o espaço em lugar”. A autora se refere à constituição de sentido em relação ao estágio docente na pós-graduação. Complementa, ainda, que o estágio docente na pós-graduação “se constitui como lugar quando atribuímos sentido aos espaços, reconhecendo sua legitimidade para localizar ações, expectativas, esperanças e possibilidades” (MARTIN-FRANCHI, 2017, p. 57).

Dialogando analogamente com o sentido de espaço e lugar de formação, consideramos que a sala de aula poderia ser compreendida tanto como um espaço de pesquisa quanto como um lugar de pesquisa. Partimos do pressuposto de que o que definiria a sala de aula como espaço ou lugar de pesquisa seria perpassado, necessariamente, pelo objeto de pesquisa que as produções científicas tratassem. Ou seja, se os conhecimentos e saberes pertencentes à dinâmica da sala de aula constituíssem o objeto de pesquisa das produções científicas, poderia, então, ser atribuída à sala de aula a definição de lugar de pesquisa. Isto é, seria atribuída à sala de aula o sentido de objeto de pesquisa, cujas questões da sala de aula constituíssem a centralidade na pesquisa científica.

As definições das categorias sala de aula como lugar de pesquisa e sala de aula como espaço de pesquisa apresentadas foram embasadas teoricamente a partir dos estudos de Cunha (2008; 2010). Desse modo, indicamos a relação entre os conceitos de espaço e lugar relacionados à formação acadêmica, ou seja, o espaço acadêmico compreendido tanto como espaço de formação quanto como lugar de formação.

Se o objeto tratado na pesquisa se referisse indiretamente à sala de aula, ou seja, se ela se constituísse apenas como ambiente no qual fosse possível observar determinado fenômeno, seria considerada, pois, como um espaço físico determinado. Nesse espaço, compreendido como ambiente, poderiam ser observadas e analisadas ações que não se relacionassem diretamente ao ambiente da sala de aula. Ou seja, a partir da sala de aula como espaço físico, desenvolver uma determinada atividade com o objetivo de analisar o ensino específico de um determinado conhecimento. Nesse sentido, a sala de aula poderia ser compreendida como espaço de pesquisa, como um ambiente propício, onde o objeto de estudo seria observado e analisado, sem entrar nas questões que caracterizariam a sala de aula como ambiente escolar determinado, com questões próprias.

Conforme o contexto apresentado, o presente estudo constitui-se em uma pesquisa do tipo estado do conhecimento, que versou sobre os resumos de produções científicas em formato de artigos produzidos na área da Didática e publicados no período de 2008 a 2018. A análise dos resumos visou dar um panorama das produções sobre a temática sala de aula na área da Didática. Convém ressaltar que analisar apenas os resumos consistiu em uma opção metodológica, mesmo sabendo que essa escolha poderia sofrer possíveis críticas e apresentar fragilidades. Por se tratar de escolha, portanto, requer do pesquisador a consideração de limites e fragilidades que o estudo pode apresentar. Desse modo, a intenção foi de constituir um panorama, por meio de um levantamento ampliado, do que se tem pesquisado sobre a sala de aula. Para além disso, configurou-se como uma análise da temática sala de aula a partir de um recorte específico em um conjunto mais amplo de dados provenientes de tese de doutoramento. O recorte temporal considerou o período de 2008 a 2018 definido a partir do interstício de dez anos de produção científica na área e do ingresso da pesquisadora no doutoramento, em 2018. Este estudo teve por objetivo indicar em quais eixos da Didática as produções sobre a temática sala de aula se inserem, a partir dos resumos, bem como os sentidos atribuídos à sala de aula nessas produções (espaço ou lugar de pesquisa).

A seguir, descrevemos, em Metodologia e Desenvolvimento, as questões relacionadas aos artigos científicos que apresentaram o vocábulo sala de aula em seu título, resumo, palavra-chave; os temas abordados nas produções científicas e a sua categorização por eixos; e, ainda, a classificação e análise do vocábulo sala de aula em relação ao contexto das pesquisas. Em Considerações Finais, indicamos as contribuições da pesquisa para as questões sobre a área.

2 METODOLOGIA, APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS

A pesquisa, de abordagem qualitativa, configurou-se como estudo de caráter bibliográfico, do tipo estado do conhecimento, e apresentou como centralidade apenas um tipo de documento, o resumo dos artigos científicos. O estado do conhecimento é definido por Romanowski e Ens (2006, p. 38) como “o estudo que aborda apenas um setor das publicações sobre o tema estudado”. Em relação à pesquisa do tipo estado do conhecimento, baseamo-nos, de maneira análoga, nas orientações dos referidos autores quanto aos procedimentos necessários para a realização de uma pesquisa desse tipo (ROMANOWSKI; ENS, 2006; ROMANOWSKI, 2002).

Severino (2007) auxiliou na compreensão da estrutura, do objetivo e da relevância de um resumo em um trabalho científico. É importante, segundo o autor, que o resumo contenha determinados itens, entre eles o “objeto tratado, os objetivos visados, as referências teóricas de apoio, os procedimentos metodológicos adotados e as conclusões/resultados a que se chegou ao texto” (SEVERINO, 2007, p. 209).

Nesta pesquisa, o resumo dos artigos científicos constituiu-se como material a partir da noção de gênero do discurso em Bakhtin (1997) e da noção do suporte material em Chartier (1990; 1996). A leitura de cada resumo foi realizada de maneira singular, considerando-o a partir dos elementos que o constituem (conteúdo temático, estilo verbal e estrutura composicional) (FERREIRA, 2002). Também foram considerados na análise dos dados os elementos que integram um resumo, quais sejam: título, palavra-chave, bem como a própria escrita do resumo.

Em relação à análise documental (BOGDAN; BICKLEN, 1997; CELLARD, 2008), os dados coletados, para além de caracterizados e analisados na perspectiva da análise de conteúdo (BARDIN, 2011), foram embasados pelas perspectivas teóricas do ensino, sua multirreferencialidade (ARDOINO, 1992; 1998) e multidimensionalidade (PIMENTA; FRANCO, 2018), além dos eixos temáticos com base nos Campos da Didática enquanto campo, por meio de Longarezzi e Puentes (2015; 2017). Esses últimos nos direcionaram para compreender as produções científicas na Didática sobre a temática sala de aula presentes no conjunto dos resumos analisados.

O presente estudo valeu-se da análise temática de Bardin (2011). Já Franco (2008, p. 36) nos indica que o tema constitui “uma asserção sobre determinado assunto, pode ser uma simples sentença (sujeito e predicado), um conjunto delas ou um parágrafo”. Nesse aspecto, consiste em como “uma questão temática incorpora, com maior ou menor intensidade, o aspecto pessoal atribuído pelo respondente acerca do significado de uma palavra e/ou sobre as conotações atribuídas a um conceito”. Envolve, pois, “não apenas componentes racionais, mas também, ideológicos, afetivos e emocionais”.

Ressaltamos que os dados analisados neste estudo são oriundos de um corpus de estudos coletados a partir da busca por meio do descritor Didática. Ou seja, é possível inferir que, para se chegar aos dados analisados neste artigo, foram feitas duas etapas de coleta de dados. A primeira etapa de coleta consistiu no uso do descritor Didática, seguida da etapa de filtragem, utilizando o termo sala de aula.

O levantamento dos resumos das produções científicas no formato de artigos científicos foi efetuado na base de dados da Scientific Electronic Library Online (SciELO), biblioteca eletrônica que abrange uma coleção selecionada de periódicos científicos brasileiros e se apresenta como meio conceituado, tanto de divulgação de produções científicas quanto de pesquisa no meio acadêmico.

Os dados coletados foram categorizados a partir de Longarezi e Puentes (2015; 2017). Os autores indicam que a Didática enquanto campo conceitual se define por meios dos Campos e Dimensões, quais sejam: Campos Disciplinar, Investigativo e Profissional; e Dimensões dos Fundamentos, Condições Internas, Condições Externas e Modos.

Neste estudo, consideramos teoricamente o conceito de Campos da Didática para embasar a análise teórica e as definições das categorias de análise no tratamento dos dados. As categorias foram denominadas eixos, significando que os eixos de análise reuniram em si produções que trataram de temáticas semelhantes aos Campos Disciplinar, Investigativo e Profissional da Didática enquanto campos. A escolha por denominar as categorias de “eixos” em vez de Campos se deu pelo fato de que os eixos apresentam outras definições para além das definições de Campos apresentados pelos respectivos autores.

Os eixos temáticos de análise foram definidos como 1) Eixo Disciplinar, 2) Eixo Investigativo e 3) Eixo Profissional. O Eixo Disciplinar foi definido como o eixo que abrange os trabalhos voltados às questões relativas ao desenvolvimento das disciplinas no âmbito curricular e acadêmico. O Eixo Investigativo foi definido como o eixo que envolve os trabalhos que tratam das questões relacionadas ao estudo do ensino e da aprendizagem, da relação entre ambos os processos e da relação desses com a prática docente. O Eixo Profissional foi definido como eixo que reúne os trabalhos que trataram da formação e profissionalização para a docência.

Em síntese, a análise dos dados versou em identificar: 1) os artigos científicos que apresentaram o vocábulo sala de aula em seu título, resumo, palavra-chave; 2) os temas abordados nas produções científicas e a categorização por eixos; e 3) a classificação e análise do vocábulo “sala de aula” em relação ao contexto das pesquisas. A seguir, abordamos cada etapa indicada.

No primeiro momento de análise de dados, intitulado os artigos científicos que apresentaram o vocábulo sala de aula em seu título, resumo, palavra-chave, a análise foi desenvolvida por meio do seguinte caminho metodológico: no cômputo de quatrocentos e vinte (420) artigos científicos reportados por meio do descritor “Didática”, publicados no período de 2008 a 2018, efetuou-se a busca pelo termo “sala de aula”. Foram localizados sessenta e seis (66) resumos de trabalhos que continham, em sua escrita (título, resumo e/ou palavra-chave), o termo explicitamente citado.

Na pesquisa e análise dos dados, o termo sala de aula constituiu tema e palavra-chave (vocábulo) de pesquisa. Ou seja, versou sobre a temática sala de aula (tema), e os documentos que compuseram o corpus do estudo foram coletados por meio da palavra-chave sala de aula. Desta forma, o corpus da pesquisa foi composto pelos resumos que continham o termo sala de aula de forma explícita, tanto no corpo do texto quanto nos demais itens componentes do artigo, como título e palavra-chave.

Consideramos que a temática sala de aula poderia se apresentar na escrita dos resumos das pesquisas de maneira explícita ou implícita. Explícita quando o vocábulo sala de aula fosse literalmente empregado para compor o texto. Por exemplo, no trecho a seguir, retirado de um resumo pertencente ao corpus de pesquisa, qual seja: [...] comparando esse procedimento com o conceito de metodologia dialética de construção de conhecimento em sala de aula, e apresenta uma breve análise de um planejamento de uma seqüência didática. (grifo nosso). No trecho destacado de um resumo de artigo científico, o vocábulo sala de aula se apresenta de maneira explícita em sua escrita, ou seja, foi utilizado o vocábulo sala de aula em sua redação.

A temática sala de aula poderia se apresentar, também, de maneira implícita, ou seja, poderia ser identificada em especificamente utilizar o vocábulo propriamente dito. Por exemplo, trazemos parte de um resumo para elucidar: Este artigo apresenta resultados do trabalho com o gênero textual Exposição Oral (EO) em uma turma da modalidade EJA - Ensino Médio de uma escola pública da cidade de Caxias do Sul. O propósito deste trabalho é auxiliar estudantes a ampliar seu repertório de gêneros de textos orais e subsidiar os professores a elaborar um trabalho didático-pedagógico sistematizado, seqüência didática (SD), para a apropriação do gênero exposição oral. A primeira parte do trecho destacado indica que a atividade proposta foi desenvolvida no ambiente escolar, em uma turma de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Ou seja, não está especificado que a atividade foi desenvolvida na sala de aula. Todavia, é possível inferir que a atividade ocorreu em ambiente escolar, embora os autores não tenham especificado o local. Não há o uso do vocábulo sala de aula de maneira explícita. Pela ausência de identificação na escrita por parte dos autores do resumo de que outro ambiente tenha sido utilizado para a atividade que não a sala de aula, como o pátio, a biblioteca, a sala de leitura etc., pressupõe-se que o ambiente escolar foi a sala de aula, em uma aula de Língua Portuguesa. Ou seja, a temática da sala de aula foi apresentada implicitamente na escrita do resumo.

No segundo momento de análise dos dados, intitulada Os temas abordados nas produções científicas e a categorização por eixos, foi realizada a análise das temáticas constantes nas produções, tanto por meio da leitura dos títulos quanto da redação do resumo dos artigos. No que tange ao título como base para a definição da análise, encontrou-se respaldo teórico em Prada e Silva (2017, p. 62), quando indicam que o título, “em uma produção, é a síntese de seu conteúdo. É o título que anuncia ao leitor o assunto que contém ou será desenvolvido”. Significa dizer que o título perfaz uma ação válida e condizente com a pesquisa proposta. As temáticas abordadas foram categorizadas nos Eixos Temáticos Disciplinar, Investigativo e Profissional.

Os sessenta e seis (66) resumos de artigos científicos que continham o vocábulo sala de aula foram categorizados em: quarenta e dois (42), ou seja, 63,6% das produções científicas, apresentaram temáticas no Eixo Investigativo; vinte e três (23), ou 34,8%, no Eixo Profissional; e uma (1), ou 1,6%, no Eixo Disciplinar.

O Eixo Investigativo, com quarenta e duas (42) produções científicas, ou 63,6%, apresentou quatro (4) categorias de análise definidas a posteriori, quais sejam: Ensino, Metodologias, Sala de aula e Conhecimento específico.

Na categoria Ensino, foram classificadas vinte e cinco (25) produções científicas, ou 37,9%. As temáticas foram relacionadas ao processo de ensino e aprendizagem, bem como ao ensino em relação às áreas específicas do saber, como o Ensino de Física, Matemática, Química, Gramática, Geografia, História, Ensino de Ciências etc. É interessante observar, nessa categoria, a predominância das temáticas relacionadas à área de Exatas, especificamente Ensino de Física.

Na categoria Conhecimento específico, foram classificadas onze (11), ou 16,7%, produções científicas nas temáticas: Alfabetização Científica em Sala de Aula; Cinema e Educação; Confluências Filosóficas e Pedagógicas; Divulgação Científica em Sala de Aula; Educação Ambiental; Semântica; Teoria Crítica e Didática; Teoria e Metodologia de Pesquisa de Livros Didáticos; Investigação Científica; Mestrado Profissional e Pesquisa em Educação.

Na categoria Metodologias, foram classificadas três (3), ou seja, 4,5% das produções científicas abordando as seguintes temáticas: Estratégia de Ensino; Ensino com Base em Resolução de Problemas; Uso de Tecnologia em Sala de Aula.

Na categoria Sala de aula, foram categorizadas três (3), ou 4,5%, das produções científicas abordando as seguintes temáticas: Cenários Cotidianos de Sala de Aula e Sala de Aula.

No Eixo Investigativo, a análise dos dados indicou a predominância de temas relacionados ao ensino sobre o conhecimento específico em determinadas áreas. Desse modo, podemos inferir, a partir de Longarezi e Puentes (2017; 2015), que há predominância em pesquisas que versam sobre aspectos fundamentais do ensino, cujo conjunto de saberes, conhecimentos, teorias, tendências, paradigmas, ideias, pensamentos etc. explica ou embasa as ações didáticas, direta ou indiretamente. A análise indicou, também, que a categoria Metodologia e a categoria Sala de aula, no Eixo Investigativo, estão presentes em número reduzido de produções científicas.

O Eixo Profissional apresentou a categorização de vinte e três (23) produções científicas, ou 34,8%. A análise dos dados das produções científicas desse eixo indicou a necessidade de definir categorias a posteriori para a categorização dos dados, o que resultou em quatro (4) categorias: Formação de Professores, Prática Docente, Conhecimento e Saberes Docentes e Professores Formadores.

Na categoria Formação de Professores, foram classificados quatorze (14), ou 21,2%, resumos de artigos científicos. Nestes, destacaram-se os seguintes temas: Formação de Professores em Serviço/Continuada, Formação de Professores, Formação Inicial de Professores, Formação Pedagógica de Professores.

Na categoria Conhecimento e Saberes Docentes, foram classificados quatro (4) resumos, ou 6%. Os temas versaram sobre concepções de professores de Química sobre CTS, saberes disciplinares e prática de ensino, saberes e práticas dos professores.

Na categoria Prática Docente, foram classificadas três (3), ou 4,5%, produções científicas. Os temas trataram sobre prática docente e ensino em sala de aula, prática pedagógica da educação de surdos e prática pedagógica no ensino superior.

Na categoria Professores Formadores, foram classificadas duas (2) produções científicas, ou 3%, com temas voltados aos Professores Formadores.

A análise dos dados indicou a ausência de pesquisas sobre a formação e profissionalização para a docência com base nos saberes pedagógicos, relacionada diretamente às ações didáticas, tanto sobre o aspecto da sociedade, comunidade, família e organização do trabalho pedagógico quanto direcionada a ações didáticas relativas à organização do trabalho didático no ambiente educativo, espaço, tempo, recursos etc. (LONGAREZI; PUENTES, 2017).

A análise evidenciou que a maioria das produções científicas, ou seja, quarenta e três (43) - ou 65,1% -, foram categorizadas no Eixo Investigativo, com ênfase nas temáticas que se ocupam do estudo do ensino, dos processos de ensino e aprendizagem, da relação entre ambos os processos, da prática docente e da produção de conhecimento, incluindo saberes sobre Didática. (LONGAREZI; PUENTES, 2017).

No Eixo Disciplinar, foi categorizada apenas uma (1), ou 1,5%, produção científica. O referido estudo versou sobre a temática Disciplina de Didática. É interessante observar que as produções científicas que abordam a temática sala de aula apresentam número ínfimo, bem como se faz essa mesma observação quanto às pesquisas que se debruçam sobre o contexto das disciplinas curriculares no Ensino Superior em relação à sala de aula e seus contextos. A análise dos dados indicou um número elevado de pesquisas sobre a temática sala de aula voltadas ao ensino e seus contextos, porém a categoria sala de aula como temática de pesquisa nos eixos indicados, especificamente relacionada a estudos do campo da Didática, foi pouco explorada.

No terceiro momento de análise dos dados, intitulado A classificação e análise do vocábulo “sala de aula” em relação ao contexto das pesquisas, a análise versou especificamente sobre o vocábulo sala de aula presente nos resumos das produções científicas. No cômputo total de sessenta e seis (66), ou 100%, resumos de artigos científicos, o termo sala de aula esteve presente na escrita de sessenta e um (61), ou 92%. Entre esse cômputo, cinco (5), ou 8%, não apresentaram o termo sala de aula na escrita de seus resumos, estando presente no título, palavra-chave isolada ou concomitante.

A análise dos dados indicou que o uso do vocábulo sala de aula na redação dos resumos dos artigos científicos apresentava três sentidos diferentes. Por isso, foram definidas, a posteriori, três categorias em relação ao termo sala de aula, relacionadas aos sentidos atribuídos pela escrita do vocábulo e sua relação com a pesquisa desenvolvida e apresentadas por meio dos resumos. As categorias definidas foram: a) sala de aula enquanto espaço de pesquisa; b) sala de aula enquanto lugar de pesquisa; c) sala de aula enquanto objeto de pesquisa. Foi observado que a categoria sala de aula como objeto de pesquisa se apresentou concomitante à categoria sala de aula como lugar de pesquisa. Por isso, a análise considerou, em relação à sala de aula, apenas as categorias lugar de pesquisa e espaço de pesquisa.

Para ilustrar essa explanação, indicamos alguns trechos em que o termo sala de aula foi utilizado em relação às categorias espaço de pesquisa e lugar de pesquisa. As frases foram retiradas dos resumos de artigos científicos que compuseram o corpus de análise deste artigo. No trecho 1) uso desse material didático em sala de aula, a redação do texto do resumo do artigo científico faz referência à análise de um determinado material didático para ser desenvolvido em sala de aula. Isso significa que o objeto de pesquisa se constituía no uso do material didático no espaço da sala de aula. Nesse sentido, o termo sala de aula foi categorizado como espaço de pesquisa.

No trecho 2) os dados analisados reforçam nosso entendimento de que é na dinâmica da sala de aula que as professoras recriam as orientações oficiais e acadêmicas, o termo sala de aula surge no resultado da análise dos dados da pesquisa. Isto é, os dados indicaram que as orientações oficiais e acadêmicas recriadas pelas professoras ocorrem na sala de aula, mas não é algo isolado em si, está imbricado no microespaço da sala de aula, na sua dinâmica própria.

O termo sala de aula, nesse caso, foi categorizado como lugar de pesquisa, pois lhe foi atribuído sentido por meio da observação e da análise dos resultados. O objeto de análise inicial da pesquisa não versava sobre a sala de aula, mas sim sobre a docência das professoras e as ressignificações sobre as orientações oficiais e acadêmicas. Porém os dados evidenciaram a relevância e compreensão para além da sala de aula como ambiente escolar. Desse modo, a sala de aula passou a ser compreendida de espaço de pesquisa para lugar de pesquisa.

No trecho 3) apresenta-se uma proposta de trabalho, no campo da Didática, para os professores de ciências aplicarem em sala de aula, que se pretende inovadora, investigação com base no planejamento -design-based research (DBR)-, a proposta de trabalho constitui o objeto de pesquisa, e o termo sala de aula está relacionado à ideia de espaço de pesquisa, pois é o ambiente onde será desenvolvida a atividade de trabalho.

É importante ilustrar, e reafirmar, que partimos do pressuposto de que o termo lugar de pesquisa ou espaço de pesquisa foi tecido por meio dos sentidos atribuídos pelo sujeito-pesquisador, autor/res das pesquisas materializadas pelos resumos dos artigos científicos que compuseram o corpus de análise deste artigo, ou seja, sobre o objeto de sua pesquisa. Se o objeto de estudo foi a sala de aula, esta se configurou como lugar de pesquisa. Se o objeto de pesquisa consistiu em algo que se desenvolveu na sala de aula, ou seja, no ambiente físico da sala de aula, e esta não foi considerada o objeto de pesquisa, a sala de aula, pois, constituiu-se como espaço de pesquisa.

Ao considerar o cômputo de sessenta e seis (66), ou 100%, produções científicas, representadas por seus resumos científicos, reportados pela busca utilizando o vocábulo sala de aula, efetivamente, sessenta e uma (61) produções, ou 93%, apresentaram o vocábulo citado na redação de seus resumos. Dentre elas, quarenta e oito (48), ou 73%, resumos apresentaram o termo sala de aula, que foi categorizado como espaço de pesquisa, e doze (12), ou 19%, a sala de aula, categorizada como lugar de pesquisa. É interessante observar que em um (1), ou 1,5%, resumo, a sala de aula foi categorizada como espaço e lugar de pesquisa.

Os dados indicam que ainda se apresentam incipientes os sentidos atribuídos à sala de aula como lugar de pesquisa, nas produções científicas no campo da Didática em que foi considerado o objeto de estudo. Significa dizer que 19% das produções científicas apresentaram objeto de estudo relacionado diretamente à sala de aula no ambiente escolar e suas questões. A seguir, apresentamos os temas e os objetos de pesquisa das produções analisadas e classificadas por meio das categorizações sobre a sala de aula.

A sala de aula enquanto espaço de pesquisa: entre os quarenta e oito (48) resumos de artigos científicos classificados nesta categoria, podemos inferir que, em sua maioria, as produções que apontaram a sala de aula como espaço de pesquisa apresentaram os temas abordados categorizados no Eixo Investigativo, com trinta (30), ou 45%, resumos, o Eixo Profissional com dezessete (17), ou 26 %, resumos, e o Eixo Disciplinar com um (1), ou 1,5%. Dessa forma, a maioria dos resumos classificados na categoria sala de aula como espaço de pesquisa está relacionada à temática do estudo do ensino, dos processos de ensino e aprendizagem e à relação entre ambos os processos, especificamente no que concerne ao ensino de conhecimentos específicos, como Ensino de Física, Química etc.

A sala de aula enquanto lugar de pesquisa: os resumos de artigos científicos que integram essa categoria foram classificados em relação aos temas, tanto no Eixo Investigativo, com sete (7) resumos, quanto no Eixo Profissional, com cinco (5). Não houve, nessa categoria, resumos classificados no Eixo Disciplinar. No Eixo Investigativo, as produções apresentaram classificação nas categorias Ensino e Conhecimentos Específicos. No Eixo Profissional, entre as cinco (5) produções científicas, duas (2) foram classificadas na categoria Conhecimento e saberes docentes

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

É relevante indicar que este estudo considerou a temática sala de aula para a análise, o tratamento e a categorização dos dados. Este estudo propôs uma análise da temática sala de aula nas produções sobre Didática no período de 2008 a 2018.

Por meio da análise dos dados, especificamente no que concerne aos resumos que apresentaram em sua redação o termo sala de aula, verificou-se a necessidade de discutir sobre a própria compreensão do termo sala de aula expresso nos resumos. Isto é, iniciar uma discussão sobre a compreensão da sala de aula tanto como espaço de pesquisa quanto lugar de pesquisa, bem como a análise dessas produções na temática apresentada em relação à categorização nos eixos temáticos Investigativo, Disciplinar e Profissional.

A análise indicou que sala de aula constitui uma das temáticas inerentes ao campo da Didática, porém o número de pesquisas que se debruçam sobre a sala de aula enquanto ambiente didático e objeto de pesquisa é incipiente.

Ressaltamos, ainda, que a análise dos dados reflete a sala de aula tanto como espaço de pesquisa - se considerada apenas como o ambiente que propicia o ­desenvolvimento de pesquisas educacionais - quanto lugar de pesquisa - quando é considerado o objeto das pesquisas educacionais. Para além disso, entendemos que o sujeito pesquisador é a pessoa que confere o status de espaço ou lugar de pesquisa à sala de aula.

No cômputo de quatrocentos e vinte (420) resumos de artigos científicos que compuseram o corpus de pesquisa inicial, apenas considerando o descritor Didática e comparando o direcionamento da análise para a temática sala de aula por meio do vocábulo homônimo, o número de resumos que apresentaram, em sua redação, o termo sala de aula passa a ser sessenta e um (61), ou seja, 15% do total. Desse modo, ainda constitui um número inexpressivo quando pensamos na pesquisa da temática sala de aula na Didática como campo.

Consideramos que a temática sala de aula pode ter sido abordada de maneira indireta, sem que houvesse a citação do termo propriamente dito. Todavia, a pesquisa procura elucidar a relevância de identificar aquilo que se procura pesquisar, bem como a relevância em marcar, na escrita, a temática por meio de termo específico.

Ressalta-se, ainda, a ausência de produções no que diz respeito às condições externas das ações didáticas (LONGAREZI; PUENTES, 2015; 2017), como a sociedade, a família, as políticas educacionais, a organização do trabalho pedagógico, tanto se referindo à sala de aula enquanto espaço de pesquisa quanto lugar de pesquisa. Ainda, apresentam menor número as pesquisas que tratam do Eixo Disciplinar, no qual se incluem os trabalhos que abordam e discutem questões relativas ao desenvolvimento das disciplinas acadêmicas e seu ensino, incluindo, nesse eixo, a disciplina de Didática.

Este estudo pretendeu sinalizar que essas temáticas, quando pesquisadas, não estão sendo indicadas como pertencentes à Didática como campo, por meio do próprio termo Didática. Entre essas, a pesquisa sobre o aluno ou sobre a sala de aula são evidenciadas como temas ausentes ou com pouca expressividade.

Em relação à temática sala de aula, Rodrigues (2015) indicou, entre outros, que, além da produção científica da Didática ter priorizado a formação e a profissionalização de professores para a atuação no ensino superior, ainda são poucos os estudos que direcionam suas atenções para a sala de aula, para o contexto da organização da escola ou locais diversos. André e Cruz (2012), por exemplo, identificaram o desafio da área da Didática em relação tanto à projeção de ações pedagógicas que articulem diferentes saberes, fazeres e culturas quanto à afirmação da relação entre professor, aluno e conhecimento escolar em um contexto situado, considerando o aluno nesse contexto.

Os estudos de Longarezzi e Puentes (2015; 2017) indicam que as produções desenvolvidas nas Pós-Graduações em Educação no Brasil em relação às pesquisas e produções sobre Didática estão concentradas nos Campos Investigativo e Profissional. Ainda, que quase a totalidade do que se tem produzido sobre Didática trata dos processos de ensino-aprendizagem e das práticas pedagógicas, bem como da formação e profissionalização docente. Nesse sentido, dialogamos com os autores e percebemos que, assim como nas pesquisas e produções no âmbito da pós-graduação, o Campo Disciplinar é pouco pesquisado e que as pesquisas relacionadas ao Eixo Disciplinar na temática sala de aula também têm sido pouco exploradas.

Desse modo, o contexto da Didática enquanto disciplina acadêmica apresenta-se como um tema pouco pesquisado, seja no âmbito das pesquisas e produções na pós-graduação, seja em demandas específicas de pesquisa, como a análise específica da temática sala de aula. Esses dados dialogam com Lara (2019), que propõe um aprofundamento da questão sobre a discussão da importância da disciplina de Didática Geral e das didáticas específicas presentes nas discussões dos estudiosos da área.

Ainda, consideramos que, quando o sujeito pesquisador atribui o sentido de lugar de pesquisa à sala de aula, ou seja, esta como objeto de pesquisa a ser analisado, desenvolve-se um contexto de interesse de pesquisa, e isso poderá ampliar a busca sobre possíveis respostas às questões da temática em relação ao campo da Didática.

Ressaltamos, por fim, a importância dos estudos no campo da Didática sobre a temática sala de aula, tanto como espaço quanto como lugar de pesquisa. Assim, para além de apresentar respostas diretivas ou mesmo fechadas, este artigo pretendeu indicar os caminhos para o aprofundamento dessa temática tão cara para a área em questão. Nesse sentido, indicamos, a partir deste artigo, caminhos de investigação dessa temática no âmbito dos artigos completos, para que, sob uma análise mais pontual, outros elementos importantes possam ser indicados, de modo a potencializar a investidura de estudos que abrangem a referida temática.

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Recebido: 30 de Setembro de 2021; Aceito: 28 de Dezembro de 2021

Giovanna Ofretorio de Oliveira Martin Franchi: Doutoranda em Educação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Mestre em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Pedagoga pela Faculdade de Ciências e Letras da USP. Desenvolve pesquisas na área de Didática, Ensino Superior, Formação de professores e Ensino de Química. E-mail:gfranchi_m@yahoo.com.br, Orcid:https://orcid.org/0000-0002-0266-9053

Márcia de Souza Hobold: Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Professora de Didática do Departamento de Metodologia de Ensino e professora permanente do programa de Pós-Graduação em Educação pertencentes ao Centro de Ciências da Educação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). E-mail:mhobold@gmail.com, Orcid:https://orcid.org/0000-0002-4179-608X

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