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Série-Estudos

versión impresa ISSN 1414-5138versión On-line ISSN 2318-1982

Sér.-Estud. vol.27 no.61 Campo Grande set./dic 2022  Epub 16-Feb-2023

https://doi.org/10.20435/serieestudos.v27i61.1706 

Artigos

Pedagogia do erotismo no currículo bareback: a transgressão às normas do uso do preservativo nos vídeos pornôs

Pedagogy of eroticism in the bareback curriculum: the transgression of the norms of condom use in porn videos

Pedagogía del erotismo en el currículo bareback: la transgresión de las normas de uso del condón en los videos pornográficos

Danilo A. de Oliveira1 
http://orcid.org/0000-0003-3222-3172

Shirlei Rezende Sales2 
http://orcid.org/0000-0003-4446-9508

1Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Codó, Maranhão, Brasil

2Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil


Resumo

Considerando a dimensão educacional dos filmes pornôs, descrevemos e analisamos, neste texto, a pedagogia do erotismo na perspectiva pós-crítica curricular. Compreendemos que currículo não se restringe às disciplinas escolares, mas se constitui em diferentes espaços e artefatos culturais. A metodologia utilizada na investigação que subsidia este artigo articulou elementos da netnografia e análise do discurso de inspiração foucaultiana. Na produção de informações, nomeamos um conjunto heterogêneo de ditos, vídeos e imagens publicados no ciberespaço de currículo bareback. Nosso foco de análise aqui é um conjunto de vídeos pornôs. O argumento desenvolvido é o de que os vídeos pornôs divulgados nesse currículo têm uma função de divulgar o bareback como uma prática transgressiva dos valores socialmente sancionados sobre o uso do preservativo nas relações sexuais entre homens. Incita-se a violação à norma do uso compulsório da camisinha, contribuindo, assim, para tornar a prática bareback objeto de desejo, por meio do estímulo de fantasias eróticas específicas.

Palavras-chave: currículo; vídeos pornôs; preservativo

Abstract

Considering the educational dimension of porn films, we describe and analyze, in this text, the pedagogy of eroticism in the post-critical curriculum perspective. We understand that the curriculum is not restricted to school subjects, but is constituted in different spaces and cultural artifacts. The methodology used in the investigation that supports this article articulated elements of netnography and Foucauldian-inspired discourse analysis. In the production of information, we name a heterogeneous set of sayings, videos and images published in the cyberspace of bareback curriculum. Our analysis focus here is a set of porn videos. The argument developed is that the porn videos released in this curriculum have a function of publicizing bareback as a transgressive practice of socially sanctioned values about the use of condoms in sexual relations between men. Violation of the norm of compulsory condom use is encouraged, thus contributing to making the bareback practice an object of desire, through the stimulation of specific erotic fantasies.

Keywords: curriculum; porn videos; condom

Resumen

Considerando la dimensión educativa de las películas pornográficas, describimos y analizamos, en este texto, la pedagogía del erotismo en una perspectiva curricular poscrítica. Entendemos que el currículo no se restringe a las materias escolares, sino que se constituye en diferentes espacios y artefactos culturales. La metodología utilizada en la investigación que sustenta este artículo articuló elementos de netnografía y análisis del discurso de inspiración foucaultiana. En la producción de información, nombramos un conjunto heterogéneo de dichos, videos e imágenes publicados en el ciberespacio curricular a pelo. Nuestro enfoque de análisis aquí es un conjunto de videos porno. El argumento desarrollado es que los videos porno divulgados en este currículo tienen una función de publicitar el bareback como una práctica transgresora de los valores socialmente sancionados sobre el uso del preservativo en las relaciones sexuales entre hombres. Se fomenta la transgresión de la norma de uso obligatorio del preservativo, contribuyendo así a hacer de la práctica bareback un objeto de deseo, a través de la estimulación de fantasías eróticas específicas.

Palabras clave: currículo; vídeos porno; condón

1 INTRODUÇÃO

Campos de estudos, de teorias e de ativismos se desenvolveram nos últimos anos voltados para discussão dos efeitos de poder da/na pornografia. É possível dizer que os campos teóricos e discursivos que buscam problematizá-la são múltiplos, não coerentes, havendo assim uma disputa em torno dos significados da pornografia na contemporaneidade (OLIVEIRA, 2013).

Disputando esses significados, estão os estudos de Mowlabocus, Harbottle e Witzel (2013, p. 530, tradução nossa)3, os quais afirmam que “a pornografia é mais do que apenas material para masturbação”. Os autores chegam a essa conclusão a partir de uma longa pesquisa com grupo focal composto por homens gays, no qual, em relação à pornografia, “o entendimento mais comum era sua dimensão educacional percebida, oferecendo instruções e experiências sobre práticas sexuais masculinas gays” (p. 527, tradução nossa).

A qualidade educativa ou pedagógica dos filmes pornôs pode ser conferida também, na atualidade, pelas respostas dos seus próprios consumidores. Em pesquisa realizada entre janeiro de 2016 e julho de 2017, pelo QUANTAS Pesquisas e Estudos de Mercado, a pedido do canal a cabo Sexy Hot, foi perguntado “Por que o público consome pornô?”. Entre os principais motivadores listados pela pesquisa, está “ver e aprender situações e posições” (MURARO, 2018, s.p.). Desse modo, entende-se que “a pornografia gay serve a uma diversidade de funções (entretenimento, educação, validação, identificação)” (MOWLABOCUS, 2015, p. 55, grifo nosso). Entendemos que essa diversidade de funções também é encontrada nos vídeos pornôs aqui analisados.

Esses materiais têm uma característica em comum: todos eles são vídeos da prática sexual bareback. O bareback é uma prática sexual intencional, própria de homens que têm relações sexuais com outros homens (HSH) 4, de não usar preservativos durante o sexo com parceiros ocasionais e/ou anônimos, constituindo-se como uma prática de premeditação e erotização do sexo anal sem camisinha (DEAN, 2009; HAIG, 2006). A prática acabou ganhando novos adeptos e tornando-se uma comunidade e uma cultura (DEAN, 2009). Imbricada com o ciberespaço, passou a contar “com seus próprios sites, pornografia e códigos”, provocando “profundas transformações culturais” (p. 2).

Considerando, pois, essas características, e tomando-as como provocações, entendemos que a prática bareback se inscreve no presente como pedagogia cultural que se constitui na perspectiva da pesquisa5, que subsidia este artigo, como um currículo que ensina e produz uma variedade de saberes sobre nós mesmos, sobre os outros. Exatamente pelas características discutidas por Dean (2009) e a compreensão de currículo que mobilizamos, o bareback deixa de ser compreendido apenas como uma prática sexual. Há no bareback um modo de vida atrelado a saberes e demandas por modos de condução da conduta específicos. Nesse sentido, para pesquisar o bareback, acionamos uma concepção pós-crítica de currículo, conforme descrevemos a seguir.

O currículo “já há algum tempo vem sendo conceitualizado como uma ‘prática cultural’” (PARAÍSO, 2010, p. 29). Esse modo de conceituar currículo trouxe implicações não só para as maneiras como entendemos currículo, mas também como pesquisamos sobre currículos. Passamos, então, a compreender que currículo não se restringe apenas a disciplinas ou a um conjunto sistematizado de conhecimentos escolares, isso porque outras instâncias culturais mais amplas ensinam saberes, prescrevem condutas, divulgam valores e, portanto, têm um currículo (SILVA, 2020; PARAÍSO, 2010). Dito de outro modo, Marlucy Paraíso (2010, p. 37) afirma que “um currículo tem sua existência não somente nas políticas curriculares, nas escolas, nas faculdades de educação ou nas universidades”. Materializando-se, pois, segundo a autora, em diferentes espaços e artefatos, como, por exemplo, bibliotecas, museus, mídia, brincadeiras, literatura, cinema, música, internet etc. Currículo é, portanto, “um artefato envolvido em relações de poder de diferentes tipos que apresenta um conjunto de saberes para serem ensinados a alguém que se deseja transformar, modificar, subjetivar, governar” (p. 50). Assim, passou-se a pesquisar a existência e o funcionamento dos currículos culturais não escolares em diferentes espaços. Atentando-se para o caráter construído, para a dimensão de artefato cultural, para as relações de poder-saber e para o investimento em determinados tipos de sujeitos neles presentes, buscando-se “colocar em questão o que está sendo ensinado pelos diferentes currículos existentes” (p. 30).

Ao materializar-se no ciberespaço, a cultura bareback acaba por divulgar e produzir significados sobre o abandono do preservativo em termos específicos, mobilizando uma outra narrativa que luta para se constituir como verdade. Narrativa que entra em disputa com aquilo que é prevalentemente ensinado em outros espaços sobre saúde, prevenção e prazer sexual. Considerando, portanto, esse aspecto e as compreensões supracitadas de currículo, argumentamos que a cultura bareback se constitui como um currículo. Dada a profusão de material encontrado no ciberespaço, fizemos um recorte para a pesquisa que subsidia este artigo. Nomeamos, assim, um conjunto de ditos heterogêneos localizados no ciberespaço, especificamente em um blog e três perfis do Twitter6, como currículo bareback.

Para esta pesquisa, metodologicamente7, articulamos elementos e procedimentos da netnografia – metodologia derivada da etnografia para investigar o ciberespaço (SALES, 2010) – e análise do discurso de inspiração foucaultiana – metodologia para produção de informações e análise das práticas discursivas. A netnografia foi utilizada para análise da cibercultura, para pesquisar como se dá o imbricamento da cultura bareback com a cultura do ciberespaço. Articulada à análise do discurso de inspiração foucaultiana, foi possível selecionar o blog e os perfis que fizeram parte da pesquisa, para, em seguida, produzir as informações e análises na perspectiva curricular.

Dada a ampla divulgação no currículo bareback dos vídeos pornôs e com base na perspectiva à qual esta pesquisa se vincula, consideramos que a pornografia é mais uma das tecnologias do presente para produção do sujeito, do sexo e da sexualidade. Compreendemos tecnologia como meios “inventados para governar o ser humano, para moldar ou orientar a conduta nas direções desejadas” (ROSE, 2001, p. 37). As tecnologias, de acordo com Rose (p. 31), são “montagens híbridas de saberes, instrumentos, pessoas, sistemas de julgamentos, edifícios e espaços, orientados, no nível programático, por certos pressupostos e objetivos sobre os seres humanos”. Argumentamos, pois, que, compondo essas montagens híbridas, há duas pedagogias específicas (da masculinização e do erotismo8) engendradas pela pornografia, que é aqui entendida como tecnologia. Por considerar que as tecnologias funcionam a partir da “articulação de certas técnicas” (FOUCAULT, 1993, p. 206), mostramos que, ao funcionar compondo uma tecnologia, essas pedagogias também acionam determinadas técnicas que atuam regulando, organizando e divulgando modos de condução da conduta em relação à prática sexual bareback. Desse modo, as técnicas podem ser compreendidas como “procedimentos de poder” que são “inventados, aperfeiçoados e se desenvolvem sem cessar” (FOUCAULT, 2006, p. 189). Dada essa conjuntura, concordamos com Dean quando ele afirma que temos, na contemponeidade, “intimidades mediadas”, de maneira que não podemos dizer que existe sexo cru, principalmente hoje, “quando imagens eróticas e discursos da sexualidade saturam as culturas contemporêas”, assim “não pode haver experiência sexual que permaneça não mediada pelas concepções sociais do que o sexo é ou deveria ser” (DEAN, 2015, p. 224).

Ao afirmar que, no currículo bareback, são disparadas duas pedagogias, estamos compreendendo pedagogia, a partir da perspectiva cunhada por Guacira Louro (2015) em seu texto, “Pedagogias da sexualidade”. Assim, tomamos pedagogia como práticas, linguagens, estratégias e táticas que ensinam algo e incidem na produção de verdades e sujeitos. A partir dessa compreensão, a autora afirma que “múltiplas instâncias sociais” “exercitam uma pedagogia da sexualidade” (p. 25).

2 PEDAGOGIA DO EROTISMO NOS VÍDEOS PORNÔS

Que efeitos se pretende produzir quando, em uma variedade de imagens no currículo bareback, exibem-se, incessantemente, com foco, paus sem preservativo entrando em bundas e cus, espermas sendo expelidos de ânus e sendo engolidos por bocas no sexo entre homens? Traçamos essa pergunta mais geral para iniciar a discussão do que chamamos, neste texto, de pedagogia do erotismo no currículo bareback. Antes disso, utilizamos os recursos de um plano aberto da câmera, isto é, ampliamos a perspectiva da visualização de uma cena para depois aproximar, para, em uma visão panorâmica, mostrar como o erotismo pode ser entendido como correlato à transgressão, constituindo aqui o bareback, no âmbito da sexualidade, uma prática transgressiva.

Focando na pornografia no currículo bareback, o argumento desenvolvido aqui é o de que os vídeos pornôs divulgados nesse currículo têm a função de divulgar o bareback como uma prática transgressiva dos valores socialmente sancionados sobre o uso do preservativo nas relações sexuais entre homens. Incita-se a violação à norma do uso compulsório da camisinha, contribuindo, assim, para tornar a prática bareback objeto de desejo, por meio do estímulo de fantasias eróticas específicas.

Aparecem, no currículo bareback, “desejos de transgressão situados no campo do prazer” (FRANÇA, 2013, p. 66). Isso parece demonstrar que, assim como sugerido nas reflexões de Adriana Piscitelli (2009, p. 18), “a transgressão está vinculada à recusa a normatividade”. No entanto, esse modo de entender transgressão se amplia, podendo ser compreendido aqui também a partir da elaboração de Gregori (2012, p. 2): “transgressão não como mera violação das normas, mas como expressões perturbadoras enquanto prazeres dissidentes ou perigosos que possibilitam aos agentes novos tipos de relações”. Trata-se de uma relação não somente com os/as parceiros/as, mas consigo mesmos/as e com os discursos. A transgressão será entendida aqui como elemento-chave para compreensão do que estamos chamando de erotismo.

Isso porque o erotismo, para Bataille (2017, p. 42), é “uma dissolução das formas constituídas, [...] dessas formas da vida social, regular”, de modo que, no erotismo, a vida é “colocada em questão [...] perturbada, desordenada ao máximo” (p. 42). Para o autor, “o erotismo nasceu do interdito, vive do interdito” (p. 325). Nesse sentido, a ausência de interdito compromete a própria compreensão de erotismo cunhado por ele, ou seja, aquele “que implica a violação”. Em outras palavras, “a experiência erótica é antes de tudo uma violação das normas sociais que regulam a sexualidade” (LEITE JUNIOR, 2009, p. 530). Desse modo, tomamos essas compreensões para analisar a transgressão incitada no currículo bareback como uma experiência erótica que acontece, pois, inscrita como transgressão. Os vídeos pornôs bareback divulgam práticas específicas que rompem com convenções predominantemente difundidas de aceitabilidade e normalidade no que diz respeito ao uso do preservativo nas práticas sexuais. Nessa perspectiva, podemos compreender que “se parte do apelo do sexo gay consiste em sua transgressão”, então, “o bareback pode ser considerado uma estratégia para reinscrever o erotismo na esfera da transgressão” (DEAN, 2008, p. 82).

Ao mobilizar um certo modo de exibição dos vídeos pornôs bareback em conjunto com os ditos que os apresentam nesse currículo, a pedagogia do erotismo emerge contestando o regime normativo da prevenção com camisinha, incitando a transgressão a essas normas, quando mostra o que “é mais gostoso”, “é um tesão”, “é bom demais” associado a “gozar dentro”, ao sexo “sem camisinha”9, o que, de algum modo, está vinculado aos riscos inerentes a essa transgressão. A pedagogia do erotismo opera, dessa forma, incitando HSH a uma experiência transgressiva.

Portanto, tornam-se visíveis as complexas relações de poder que constituem o currículo bareback que se dão, sobretudo, no embate com o discurso da prevenção que prioriza, institui e prescreve a obrigatoriedade da camisinha em todas as relações sexuais, o que, de alguma maneira, mostra que, também nesse currículo, “as hierarquias, as normas e proibições formam o repertório para o erotismo, a partir de todo um esforço de transgressão” (GREGORI, 2014, p. 50). Esse modo de relação com a norma engendrado na pedagogia do erotismo endossa a compreensão de que “risco, diferença, transgressão e prazer são termos articulados nas relações eróticas” (p. 50). Destacamos, a seguir, no jogo de aproximação da câmera, combinando planos diversos para detalhar narrativas importantes, a descrição de uma das cenas dos vídeos pornôs divulgados nesse currículo para explorar a pedagogia do erotismo como transgressão e seus modos de atuação no currículo bareback:

Dois homens brancos, filmados de costas por uma terceira pessoa, provavelmente um outro homem, já que também participa da cena com sussurros, audíveis expressões de prazer com respiração ofegante que vai se intensificando como se estivesse prestes a gozar e risadas num tom de voz masculino, de forma que podemos perceber que o prazer também está neste que filma. A cena se inicia com os dois corpos separados, sendo que o homem passivo está imóvel, de quatro e usando as duas mãos para separar as nádegas, numa preparação para receber o pau do ativo, que está se masturbando num movimento frenético, demonstrando que está buscando chegar ao ponto de ejaculação. Enquanto isso, a terceira pessoa movimenta a câmera, dando foco na masturbação e na preparação do ânus para ser penetrado. O foco é bem fechado, recortando os corpos dos dois apenas nessas partes, ou seja, cu e pau. Em nenhum momento aparecem os rostos dos homens. No entanto, os sussurros, gemidos, expressões e risadas demonstram prazer e êxtase. A penetração ocorre quando o homem ativo se aproxima do gozo, revelando que a intenção é exatamente essa de gozar dentro sem camisinha, mostrando para o espectador. O movimento frenético que já ocorria na masturbação se intensifica quando o pau é introduzido e vai diminuindo na proporção inversa dos gemidos, demonstrando que chegou ao clímax que é o gozo. O foco permanece por trás dos dois, fechado na penetração, que, pouco a pouco, vai parando até ser concluída com a retirada do pau e, assim, revelando o gozo. Os dois corpos se distanciam novamente, terminando a cena com o foco no cu do passivo com esperma saindo do ânus. Não é possível perceber se o homem passivo da relação também chegou ao gozo, visto que o foco da ação está no ativo e o gozo dentro do ânus sem camisinha (Vídeo Único [VU], 0seg a 47 segundos).

A cena de 47 segundos destacada é um recorte específico de uma penetração sem preservativo. Não há um interesse em mostrar como esses homens chegaram até o momento da relação, como chegaram a se excitar, por exemplo. Nessa cena, o “foco é bem fechado, recortando os corpos dos dois em apenas essas partes, ou seja, cu e pau”. Ao conferir esse foco para filmagem, sem maiores preocupações com uma narrativa linear, apenas o sexo na pele e a sensação de prazer presente entre os envolvidos, intensifica-se, na tela do espectador, o aspecto transgressivo da prática em cena. À medida que os segundos vão passando, vão sendo fornecidos elementos que permitem conferir a qualidade erótica da prática, ou seja, sua particularidade de violação dos valores sancionados do uso obrigatório do preservativo nas relações sexuais. Visualizando as nádegas do passivo abertas e prontas para receber o pau do ativo, poderíamos esperar que esse pau já estivesse usando camisinha, mas o ativo se masturba freneticamente sem usar o preservativo, demonstrando que está em busca de chegar ao ponto da ejaculação, para, então, penetrar o parceiro. A penetração acontece de modo rápido seguida do gozo. Na finalização dessa cena, com o ânus expelindo esperma, evidencia-se que houve a troca de fluido seminal e, portanto, o rompimento com a norma do uso compulsório da camisinha prescrita pelo discurso da prevenção.

Em outras cenas e vídeos pornôs no currículo bareback, esse foco é recorrente. Desse modo, percebemos que um conjunto de vídeos pornôs nesse currículo tem uma característica específica: consiste na reprodução e reiteração de um certo ângulo, um certo foco de filmagem, para mostrar a prática bareback. Com isso, o que vai ganhando centralidade e proeminência é a relação que se pode estabelecer entre a prática e as convenções espraiadas e divulgadas sobre prevenção nas relações sexuais. Assim, a pedagogia do erotismo vai ganhando contornos e modos de funcionamento específicos, entrando, pois, em disputa sobre os modos considerados corretos, autorizados e possíveis de se ter relações sexuais. Para ativar essa pedagogia no currículo bareback, recorre-se a duas técnicas: (1) técnica de foco e enquadramento na penetração e/ou partes íntimas dos envolvidos nas relações sexuais, já possível de ser notada no vídeo descrito anteriormente, e (2) técnica de reiteração ou repetição das imagens de sexo sem preservativo. Destacamos a seguir alguns trechos dos vídeos para explorar essa afirmação:

A segunda cena se assemelha com a primeira. Também há o foco da cena bem fechado nas partes dos corpos como cu e pau, de dois homens brancos (VU, 49 seg.).

A quarta cena também apresenta dois homens brancos, filmados por uma terceira pessoa, visto que a câmera está posicionada atrás dos homens e se movimentando para os lados, para baixo e para cima, sem perder o foco na penetração sem preservativo (VU, 2 min. 24 seg.).

O foco é bem fechado, com ênfase na penetração sem preservativo e no movimento do ativo (VU, 3 min. 17 seg.).

A cena é iniciada com a câmera parada, com o foco fechado e pegando o ângulo em que temos visão de trás dos dois [homens], evidenciando a penetração sem preservativo. É possível visualizar as pernas do ativo e o passivo de costas e sentado no pau do ativo. As mãos do ativo o tempo todo mexem e massageiam as nádegas do passivo (VU, 3 min. 56 seg.).

Principalmente na montagem do vídeo pornô bareback que constitui o Grupo 1, há um investimento em cenas similares a essas descritas. Nessa montagem, há uma sequência de 39 cenas cuja totalidade soma 31 minutos e 3 segundos de duração, com foco sempre na penetração sem preservativo, mostrando especificamente o pau entrando no cu, ejaculação, espermas sendo expelidos de dentro do corpo dos homens passivos e sendo engolidos. Ou seja, tornam-se visíveis, nessas cenas, reiteradamente, modos de conduções da conduta transgressivos. A partir das técnicas acionadas, a pedagogia do erotismo entra em cena, colocando em prática significados específicos que possibilitam aos indivíduos novos tipos de relações com a prescrição do uso obrigatório do preservativo:

O foco permanece por trás dos dois [homens], fechado na penetração, que, pouco a pouco, vai parando até ser concluída com a retirada do pau e, assim, revelando o esperma (VU, 0-47 seg.).

Após penetrar, o movimento do corpo se intensifica até ir diminuindo, seguido de sons de sussurros, gemidos e resfôlegos de prazer, demonstrando o ativo ter chegado, finalmente, ao gozo que é, confirmado, com a retirada lenta do pau e, então, a saída de esperma. O homem ativo continua filmando com o foco no ânus do passivo que continua expulsando o líquido de dentro do seu corpo (VU, 49 seg.).

Em determinado momento, o passivo se afasta, deixando um espaço entre o sofá e a barriga para pegar o seu próprio pau e se masturbar enquanto mantém o movimento do ânus de entrar e sair do pau do homem ativo. Diferente das outras cenas até aqui, o passivo busca o gozo. No entanto, quando o ativo chega ao gozo, ele retira o pau, permitindo que o esperma seja expulso do ânus do passivo e encerra a ação, mesmo que o passivo não tenha chegado ao gozo (VU, 4 min. 47 seg.).

Com esse deslocamento e volta do foco na penetração, o espectador visualiza o gozo escorrendo pelo ânus do passivo ainda com a penetração em curso (VU, 6 min. 17 seg.).

Em duas ocasiões, o ativo retira o pau e o introduz novamente, evidenciando a falta de camisinha e demonstrando que já havia chegado ao gozo. Tanto na primeira vez quanto na segunda em que esse movimento acontece, o pau é introduzido novamente, independentemente de já ter chegado ao gozo, causando um escorrimento do líquido pelo corpo do homem passivo (VU, 8 min. 29 seg.).

Por último, aparece um rapaz branco e magro andando de quatro pela casa com esperma escorrendo pela boca (A1, 0-5 min. 6 seg.).

Nesse momento, ele parece sentir muito prazer, pois coloca o rosto para cima deixando a boca entreaberta, fechando os olhos e gemendo um pouco até gozar na boca do outro, que começa a engolir todo o esperma que sai abundantemente do pau do parceiro (A3, 40 seg.).

A câmera volta a filmar o corredor e o primeiro homem que já estava recebendo sexo oral goza na boca do parceiro que parece engolir todo o esperma (C3, 3 min. 31 seg.).

Esses vídeos pornôs, por meio de um foco específico e reiteração ou repetição das imagens de sexo sem preservativo, parecem mostrar aquilo que predominantemente está relacionado a essa prática. Conforme destaca Ashford (2015, p. 96), “bareback é um termo que evoca imediatamente a penetração [sem preservativo]”, como “também evoca sêmen”. Evoca, portanto, a transgressão à regulação da sexualidade pelo discurso da prevenção, constituindo-se como um erotismo. Nesse modo de exibição, no currículo bareback, há também a divulgação de uma demanda que é a base para essa prática sexual: erotizar o sexo sem preservativo e a troca de sêmen entre homens. Ainda, de acordo com o autor:

É esse aspecto, a natureza acumulada dos encontros, a celebração de ‘semeadura’, ‘reprodução’ e ‘despejo de uma carga’ que são cruciais no discurso bareback. A ‘transmissão’ de fluido seminal de um parceiro para outro não apenas deposita material genético, mas serve para romper a membrana da higiene e do sexo ‘gay’ que a educação sexual homonormativa e contemporânea procura prescrever. (p. 196).

Parece que as cenas dos vídeos pornôs bareback previamente descritas podem expressar o discurso bareback do modo como é referido por Ashford (2015). Realça-se, por meio das técnicas de foco e enquadramento e da reiteração ou repetição das imagens, mobilizadas pela pedagogia do erotismo, o que talvez mais fortemente o organiza.

Percebemos que se trata de destacar e colocar em primeiro plano, dar maior visibilidade àquilo que compõe, de maneira considerável, o bareback como um discurso. Desse modo, esses vídeos se constituem como instâncias instituidoras de representações, de significados que vigoram e têm efeitos de verdade. São efeitos que não somente produzem significados, mas, no jogo de correlações de força aos quais estão inscritos, atuam também ensinando, demandando condutas e incitando práticas específicas. Os vídeos pornôs bareback integram, portanto, a pedagogia do erotismo, demarcada por técnicas que têm formas próprias de regularidade – a exibição proeminente das cenas de sexo sem preservativo – e por modos singulares de funcionamento – os focos e os enquadramentos. Esses vídeos não são apenas uma sequência de imagens, mas seu conjunto e modos de funcionamento similares, organizados e colocados à disposição no currículo bareback, constituem-se práticas pedagógicas com propriedades prescritivas que divulgam, reforçam, incitam e produzem representações sobre o erotismo em relação às prescrições do uso do preservativo.

Dessa forma, entendemos que vídeos pornôs como esses divulgados no currículo bareback se vinculam à pornografia bareback, representando, no conjunto, “uma postura diametralmente oposta à pedagogia do sexo seguro, bem como ao uso generalizado do preservativo e à não ingestão de sêmen no sexo oral, em vídeos pornôs gays desde o início da epidemia do HIV” (MORRIS; PASONEN, 2019, p. 1). O que se torna explícito aqui é exatamente um bocado de cenas de sexo sem preservativo, conforme podemos perceber, algumas com ingestão de sêmen, como pode ser visto nas últimas cenas destacadas dos vídeos A1 (5 min. 6 seg.), A3 (40 seg.) e C3 (3 min. 31 seg.). É nesse sentido que os vídeos aqui mobilizados se constituem como uma pedagogia que nomeamos como pedagogia do erotismo. Esses vídeos constituem-se de práticas que empregam técnicas específicas, produzindo o bareback como uma experiência erótica. A proposta erótica que localizamos nos vídeos, contudo, é somente entendida situando-a no presente como um efeito discursivo e histórico. Se, conforme destacado por Botti (2003, p. 29), “o olhar erótico é culturalmente aprendido”, esse olhar que se pretende constituir sobre o bareback, no currículo aqui investigado, está atrelado às condições de emergência dessa prática.

As referidas imagens divulgadas no pornô bareback podem ser mais bem compreendidas, se pensarmos que o modo como elas são usadas pode ser feito porque elas se vinculam a um pensamento mais geral que organiza a prática sexual bareback: premeditação e erotização do sexo sem preservativo e do sêmen (DEAN, 2009; ASHFORD, 2015). Nesse sentido, queremos dizer que tornar algo erótico é constructo histórico, discursivo e criativo. Então, queremos retomar brevemente esse constructo no que se refere ao bareback.

No âmbito da produção das homossexualidades, com o advento da aids, como forma de enfrentar a epidemia, desconstruir o HIV/aids como uma “doença gay” e construir uma imagem favorável do homossexual, construiu-se uma série de normas sexuais que precisam ser seguidas, entre elas, o uso do preservativo em todas as relações, de modo que “responsabilidade equivaleria a sexo seguro” (ASHFORD, 2015, p. 198). Com isso, constitui-se aqui o “bom gay”, regulado, pois, por essa norma. Nesse sentido, pode-se afirmar que a vida dos homossexuais passou a ser objeto de governo, de modo que “a política da educação sexual segura é certamente uma das principais questões morais que cercam nossa sexualidade hoje” (STYCHIN, 1995, p. 84). Em oposição à figura do “bom gay”, emerge o barebacker. Mas não somente isso, no argumento de Ashford (2015, p. 206), “o bareback constitui um ponto importante de resistência à agenda homonormativa, não por produzir uma única leitura oposicionista, mas por abrir uma discussão sobre as infinitas construções queer do eu”, como também, ampliamos aqui, os modos como nos constituímos sujeitos em relação a uma série de verdades que nos é disponibilizada. Dito de outro modo, a prática bareback “não existe fora do regime de uso uniforme de preservativo instituído no início dos anos 1990” (TZIALLAS, 2019, p. 139).

Nomear o sexo sem preservativo entre homens como bareback, ou um conjunto de vídeos como pornô bareback, faz parte da relação que estabelecemos com as verdades produzidas pela política da educação sexual segura endereçada aos homossexuais, já que esse termo não está relacionado aos casais heterossexuais quando fazem a mesma coisa10 (GARCIA, 2009). O termo mal existia até final de 1997, o que, de certo modo, com a propagação da aids até esse momento, era algo inconcebível que homens renunciassem ao modelo de proteção difundido (DEAN, 2009). No final dos anos 1990, com as terapias medicamentosas, essas verdades passam a ter inflexões e passa a ser possível que a prática bareback ganhe notoriedade, mas, mesmo assim, prevalece na ordem do verdadeiro que o sexo deve ser feito sempre com preservativo. Ainda que os novos métodos de prevenção (Profilaxia Pré-Exposição [PreP] e Profilax ia Pós-Exposição de Risco [PEP]11) hoje façam parte dos modos como devemos nos proteger, eles emergem como “prevenção combinada”, não se descartando o uso dos preservativos. Desse modo, o bareback constitui ainda uma transgressão diante de tantas regras que insistem em dizer “use preservativo” e, logo, é tomado como objeto pela pornografia, que tem não somente a função de entreter, constituindo-se, pois, como uma instância pedagógica. Por isso, analisamos, como pedagogia do erotismo, o modo como essa transgressão não é somente visibilizada nos vídeos pornôs divulgados no currículo bareback, mas ensinada, incitada e demandada.

São mostrados outros modos de ter relações sexuais que não aqueles sancionados pela política que organiza a construção do “bom gay”. É desse modo que, no seu conjunto e modos de funcionamento, os vídeos pornôs mobilizados pelo currículo bareback adquirem caráter pedagógico, divulgando, disponibilizando, prescrevendo e ensinando modos de condução da conduta que rompem com as interdições direcionadas ao “bom gay”.

A prática bareback reincorpora, portanto, “comportamentos e ideias reprimidos pelo preservativo” (TZIALLAS, 2019, p. 117), adensando, assim, as relações entre erotismo e transgressão. Desse modo, considerando que houve um investimento também na pornografia como uma instância pedagógica, ela “pode ser categorizada em três gêneros e períodos de tempo amplos e sobrepostos: em ordem cronológica reversa: são bareback, preservativo e pré-preservativo” (SCOTT, 2015, p. 220). A pornografia bareback é construída para remontar a esse tempo do pré-preservativo ou, como sugere Tziallas (2019, p. 138), “a utopia do sexo sem restrições”. Dessa forma, a pornografia bareback surge no currículo aqui investigado como uma pedagogia desestabilizadora “de um sistema de disciplinamento social que postula bons gays liberais no topo da hierarquia e no centro dos holofotes, e os indisciplinados na parte inferior e/ou nas margens” (TZIALLAS, 2019, p. 138). Nesse sentido, nos vídeos pornôs bareback, “a ausência de preservativos é palpável como presença visual” (DEAN, 2009, p. 114), de maneira que os espectadores gays “não podem deixar de notar que algo não existe, porque ao longo de mais de uma década de pornografia nos acostumamos a ver os preservativos usados de maneira bastante consistente para cenas de sexo anal entre homens” (DEAN, 2009, p. 114). No currículo bareback, por meio das técnicas do foco e enquadramento e da reiteração e repetição das imagens, mobilizadas pela pedagogia do erotismo, a ausência de preservativo fica ainda mais em evidência. Mostra o exercício de poder dessa pedagogia, como ela está em disputa por modos específicos na direção da conduta de homens que fazem sexo com homens.

Conforme discute Tziallas, o preservativo “é um dos ícones emblemáticos da cultura gay liberal-normativa”, de maneira que o seu abandono pode “acarretar o retorno de formações culturais anteriores que contrastam fortemente com a cultura tradicional promovida nas últimas décadas” (TZIALLAS, 2019, p. 153), a qual “depende dos ideais conservadores de vida, saúde e segurança” (p. 153) incorporados ao preservativo. É, pois, e sse contraste em relevo na pedagogia do erotismo que dá a essa pedagogia inteligibilidade, ou ainda, mais que isso, esse contraste, o confronto, a objeção, a contraposição com a cultura institucionalizada do uso do preservativo, os quais constituem a sua engrenagem.

Considerando, pois, o investimento pedagógico pós-aids de uso do preservativo e as articulações com a pornografia, podemos entender por que “a pornografia produzida durante as décadas de 1970 e início dos anos 1980 é comercializada há mais de uma década como ‘pré-preservativo’”, ao passo que “vídeos recentes sem preservativo são produzidos e comercializados especificamente como ‘em pêlo’” (DEAN, 2009, p. 6). Essa forma de nomear compõe a produção do sexo sem preservativo como transgressivo e vai se constituindo, a partir dos modos de funcionamento do currículo bareback, com características pedagógicas, conforme discutimos aqui com a pedagogia do erotismo.

Dessa maneira, mesmo que os barebackers possam assumir diferentes posições de sujeitos na prática sexual bareback12, encontrar o erótico nas relações barebackers ou ver vídeos pornôs assim nomeados são produzidos histórica e culturalmente. Dito de outro modo, “o que quer que achemos erótico condensa uma história de metamorfoses e investimentos que o fizeram” (147-148). Trata-se de um efeito discursivo que, dados os efeitos positivos do poder, convencem-nos a distinguir algumas formas de sexo como eróticas, enquanto outras (como a penetração genital heterossexual) são normalizadas e naturalizadas.

Entendemos, pois, que ângulo e foco não são escolhidos de modo aleatório, muito pelo contrário, por isso são mobilizados aqui como técnicas de poder que têm efeitos específicos, uma escolha entre tantas outras possíveis. Em outras palavras, aproximando-nos das reflexões propostas por Botti (2003, p. 110), é possível dizer que um foco é “um recorte de uma realidade que se apresenta [como] um ponto de vista escolhido”. Quando, nessa pedagogia, elegem-se um ângulo e um foco como mais apropriados, instaura-se, por meio dessa escolha, um determinado ponto de vista que expressa a verdade na qual essa prática está inscrita e quais modos de condução da conduta pretendem-se prescrever com essa verdade. Ao funcionar com as técnicas de foco e enquadramento e a técnica de reiteração ou repetição das imagens de sexo sem preservativo, essa pedagogia não somente constitui a prática bareback como transgressiva, como vai operando para a desconstrução da vinculação do sexo sem camisinha como um erro.

No processo de normalização das práticas sexuais gays e homoeróticas, mais proeminentemente a partir da aids, classificam-se algumas práticas específicas como arriscadas versus seguras e modelos de intimidade saudáveis versus prejudiciais para produção de um certo de tipo de sujeito considerado bom e correto. Nos vídeos pornôs divulgados no currículo bareback, quando o sexo sem preservativo é constantemente exibido com ditos que remetem ao prazer que isso pode proporcionar, ele é reformulado como erótico, e “não como uma falha” (DEAN, 2009, p. 147).

Com esse tipo de imagem constantemente evocada para fabricação de uma verdade outra sobre a prática do bareback, parece haver uma contestação do entendimento do sexo sem preservativo como incorreto. Por oposição à percepção de transar sem preservativo como um erro, no currículo, mostra-se o sexo sem preservativo de maneira hiperbólica, distanciando-se ainda mais da consideração desse sexo como algo errado. Se um erro pode ser considerado um engano, um equívoco13, a reiteração dessa forma de ter relações sexuais, nos vídeos pornôs, aparece assim como prescrição, como uma conduta que é incitada, valorizada, desejada e autorizada. Em oposição à constituição da transa sem preservativo como um erro, o que se coloca em destaque aqui é que existem determinadas prescrições que são sancionadas. A pedagogia do erotismo surge, portanto, mostrando a possibilidade de transgredir, romper e violar esses modos de se conduzir e traçar outros.

Dessa forma, “como regime de produção audiovisual e performativa, a pornografia está envolvida na produção de saberes e usos dos prazeres corporais, convocando um exercício de ver corpos e formas sexuais” (OLIVEIRA, 2013, p. 247). Os corpos e as formas sexuais divulgados inscrevem as verdades aqui produzidas – “gozada dentro sempre é mais gostoso”14, sexo sem preservativo “é um tesão”15 –, não como uma falha, vinculando esses saberes a outro regime de verdade.

A pedagogia do erotismo, ao mobilizar técnicas específicas para exibição dos vídeos pornôs no currículo bareback, tensiona as verdades já construídas no que se refere à prevenção, fazendo emergir outras verdades. Ao funcionar dessa forma, essa pedagogia não apenas apresenta possibilidades de ter relações sexuais sem preservativo em oposição a uma série de normas, mas também prescreve, ensina e, por meio de uma série de estratégias, mostra a prática sexual bareback como desejável, excitante e boa, recorrendo aqui para o erotismo que está vinculado à transgressão à norma do uso obrigatório do preservativo em todas as relações sexuais. Assim, esse currículo classifica e prescreve posturas e condutas adequadas em relação às práticas sexuais. Trata-se aqui de um funcionamento curricular constituído minuciosamente nas tramas das relações de poder.

Se, no currículo bareback, por meio da pedagogia do erotismo, produzem-se certas verdades, pode-se inferir que, quando pensamos que essas verdades estão direcionadas a um espectador específico, esse espectador “está longe de se constituir como um espectador voyeur passivo” (OLIVEIRA, 2013, p. 247). Pelo contrário, ele se produz a partir das verdades que aqui são divulgadas. Assim, a produção da subjetividade barebacker está também amalgamada com as verdades produzidas pela pedagogia do erotismo.

Quando Dean (2009) afirma que a pornografia bareback constitui um modo de pensar sobre os limites corporais, intimidade, poder e, claro, sobre sexo, o autor não diz que as ideias sobre sexo ou aids são refletidas nas práticas exibidas nesses vídeos, mas que as ações nesses vídeos “coreografam um modo de pensamento incorporado” (p. 105). Os corpos em cena fazendo sexo sem preservativo constituem um discurso contrário ao discurso da prevenção que prescreve que todas as relações sexuais devem ser feitas com camisinha, que interdita qualquer relação que apresente riscos de contrair o vírus do HIV e, dessa forma, “a pornografia de bareback também pode constituir uma forma válida de pensar sobre um vírus” (p. 105). Mesmo que hoje essas discursividades sejam atravessadas pela utilização da PrEP, “ao contrário do ‘pré-condom’ pornô gay produzido durante os anos 1970 e início dos anos 1980, o pornô de bareback está longe de ser esquecido pelo hiv” (p. 105).

Desse modo, podemos falar de um atrito que não é somente entre os corpos das pessoas que estão em cena, quando se compreende a capacidade de a imagem pornográfica “ativar-se no corpo do espectador” (PRECIADO, 2018, p. 281) ou, conforme Linda Williams (2004) também sugere, que pensar que a pornografia é imagem incorporada, imagem que não somente se faz corpo, mas capta o corpo no “encontro com um dispositivo tecnologico erotizado” (WILLIAMS, 2004, p. 7), o “espectador” não somente assiste, mas se constitui com o modo de pensamento divulgado.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os vídeos pornôs bareback lançam mão da pedagogia do erotismo, a qual funciona com técnicas específicas, para produzir interesse, simpatia, disposição pelo sexo bareback, e apresentam algo que inicialmente pode parecer repulsivo como objeto de desejo. Ao incitar a violação das normas do discurso da prevenção, produzem-se tensões naquilo que se convencionou como normal, como correto. Esse parece ser o efeito que se pretende causar quando, de maneira reiterada, os vídeos são exibidos mostrando incessantemente, por meio do recurso de aproximação das câmeras, paus sem preservativo entrando em cus, espermas sendo expelidos de ânus, ou sendo engolidos por bocas no sexo entre homens.

Inscrevendo o erotismo como transgressão, analisamos, aqui, como a pedagogia do erotismo emerge nos vídeos pornôs contestando o regime normativo da prevenção de doenças com camisinha nas relações sexuais, incitando a transgressão a essa norma. Discutimos técnicas acionadas para produção da prática bareback como eróticas. A pedagogia do erotismo que emerge no currículo bareback é historicamente situada e, desse modo, está vinculada à transgressão ao processo no qual “o sexo anal sem preservativo tornou-se visivelmente marcado – e, portanto, comercializável – como uma preferência específica, uma condição de excitação” (DEAN, 2009, p. 147).

As pedagogias e suas técnicas em funcionamento no currículo bareback, ativadas por meio dos vídeos pornôs, evidenciam as complexas relações de poder que constituem a prática sexual aqui analisada. Isso porque, ao mesmo tempo em que a prática bareback emerge como uma contestação à homonormatividade – com suas prescrições e demandas para constituição de um bom gay –, como mostramos ao longo do artigo, ela também se aproxima das normas de gênero, quando opera com a pedagogia da masculinização (OLIVEIRA; SALES, 2022). Nesse sentido, a “pornografia é em geral um terreno fértil para se pensar como a transgressão ou a dissidência de normas de caráter sexual convive mútua e contingencialmente com a obediência e a reiteração das normas” (DÍAZ-BENITEZ, 2009, p. 594).

Segundo Dean (2008, p. 81), “o discurso bareback foi inventado por alguns homens gays para manter seu sexo fora dos limites da respeitabilidade”. São homens que, de acordo com ele, “não querem ser considerados ‘normais’ e, portanto, estão deixando claro que algo diferente do normal pode não ser apenas defensável, mas positivamente desejável” (DEAN, 2008, p. 81). Ao considerar currículo como artefato cultural, mostramos como esse currículo funciona no ciberespaço por meio de relações de poder para constituição da subjetividade bareback. Como criação cultural, esse artefato se manifesta e se atualiza de diversas maneiras, até mesmo por meio dos vídeos pornôs, como discutimos aqui. São mobilizadas as pedagogias que expressam verdades sobre práticas sexuais, divulgam, ensinam e incitam os sujeitos a se vincularem a modos específicos de se conduzir.

3Essa e as demais traduções dos originais em língua estrangeira foram feitas pelo autor e pela autora deste artigo.

4Esse termo será utilizado aqui, uma vez que “alguns homens casados [com mulheres] e outros homens ostensivamente heterossexuais participam regularmente de atividades eróticas casuais com pessoas do mesmo sexo sem se considerarem gays” (DEAN, 2009, p. 11), assim como ocorre com a prática bareback.

5Para mais detalhes, ver Oliveira (2021).

6Apesar de os blogs e perfis utilizados para esta pesquisa estarem públicos, por questões éticas, optamos por não divulgar especificamente quais são, pois isso poderia levar à identificação dos indivíduos responsáveis pelas publicações. Consideramos que são informações que, de algum modo, “podem trazer efeitos para estes se utilizadas em pesquisas” (RECUERO, 2014, p. 69).

7Considerando as delimitações quanto ao tamanho do texto neste periódico, optamos por resumir a metodologia e priorizar a discussão das análises. Sugerimos a leitura da tese da qual esse texto se origina para aprofundamentos quanto à metodologia.

8Neste artigo, analisamos apenas a pedagogia do erotismo. Para análise da pedagogia da masculinização, ver: Oliveira e Sales (2022).

9Ditos do currículo bareback destacados e analisados no texto Mais prazeroso, mais excitante e bem melhor: a produção da verdade sobre o prazer no currículo bareback (OLIVEIRA, SALES, 2020).

10Segundo Garcia (2009, p. 540), “não existe um termo análogo nem uma subcultura que agrupe, por exemplo, homens que mantenham relações casuais com mulheres, ou homens casados que mantenham sistematicamente relações sexuais sem preservativo com suas esposas, ainda que tais práticas também acarretem biologicamente risco de transmissão de HIV ou outras ITS (infecções de transmissão sexual) de acordo com critérios científicos.' Em boa medida, o casamento heterossexual escapou até pouco tempo da vigilância epidemiológica do HIV por razões culturais”.

11Para mais detalhes, ver: Oliveira (2021).

12Ver seção 3 da tese “Cavalgar sem sela”: ensinamentos, demandas e incitações do currículo bareback em oposição às normas do uso do preservativo (OLIVEIRA, 2021).

13Disponível em: https://www.dicio.com.br/erro/. Acesso em: 14 set. 2020.

14Postagem de 13 de dezembro de 2019. Disponível em: blogbarebackbr.blogspot.com. Acesso em: 5 jan. 2021.

15Postagem de 22 de fevereiro de 2019. Disponível em: blogbarebackbr.blogspot.com. Acesso em: 21 dez. 2019.

AVISO: este artigo contém linguagem sexual explícita e seu conteúdo é de inteira responsabilidade do autor.

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Recebido: 19 de Agosto de 2022; Aceito: 03 de Outubro de 2022

Danilo A. de Oliveira: Doutor em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professor adjunto da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Membro do Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Currículos e Culturas (GECC) e do Observatório da Juventude (OJ/UFMG). E-mail: oliveira.danilo@ufma.br, Orcid:http://orcid.org/0000-0003-3222-3172

Shirlei Rezende Sales: Doutora em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professora do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação na UFMG. E-mail: shirlei.sales@hotmail.com, Orcid:https://orcid.org/0000-0003-4446-9508

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