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Série-Estudos

versão impressa ISSN 1414-5138versão On-line ISSN 2318-1982

Sér.-Estud. vol.28 no.63 Campo Grande maio/ago 2023  Epub 21-Ago-2023

https://doi.org/10.20435/serieestudos.v28i63.1558 

Artigo

Avaliação e a autonomia da criança na Educação Infantil: estudo de caso em uma escola de orientação montessoriana

Evaluation and autonomy of children in Early Childhood Education: case study in a Montessorian orientation school

Evaluación y autonomía del niño en la Educación Infantil: un estudio de caso en una escuela orientada a Montessori

1Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI), Frederico Westphalen, Rio Grande do Sul, Brasil


Resumo

O artigo sistematiza os dados e reflete sobre as informações coletadas com quatro professores e equipe gestora de uma escola montessoriana, com o objetivo de explicitar como acontece o processo de avaliação na Educação Infantil com ênfase na Pedagogia Montessoriana, bem como procura compreender o processo de desenvolvimento da autonomia das crianças inseridas nesta Pedagogia. A pesquisa foi realizada em uma escola de uma cidade do oeste do Estado de Santa Catarina, com a utilização de questionário aplicado via Google Forms. A análise dos dados segue a perspectiva qualitativa. A base teórica do estudo compõe-se por autores como Vasconcellos (1998), Villas Boas (2004), Montessori (1965, 1992, 2017), Hoffmann (2012a), Barlow (2006), dentre outros. Os resultados permitem entender e conceituar a avaliação na perspectiva montessoriana, bem como compreender de que maneira ela ocorre no contexto da Educação Infantil. Identificou-se que o foco do processo avaliativo está voltado para o desenvolvimento do educando, dando vazão ao exercício da liberdade de expressão, dentro do ritmo de cada criança, valendo-se do espaço e tempo próprio da infância que resulta no desenvolvimento de sua plena autonomia.

Palavras-chave: Pedagogia Montessoriana; avaliação; autonomia

Abstract

The article systematizes the data and reflects on the information collected with four teachers and the management team of a Montessorian school, with the objective of explaining how the evaluation process in Early Childhood Education takes place, with an emphasis on Montessorian Pedagogy, as well as seeking to understand the development process of the autonomy of the children included in this Pedagogy. The research was carried out in a school in a city in the west of the state of Santa Catarina, using a questionnaire applied via Google Forms. Data analysis follows a qualitative perspective. The theoretical basis of the study is composed of authors such as Vasconcellos (1998), Villas Boas (2004, 2008), Montessori (1965, 1992, 2017), Hoffmann (2012a), Barlow (2006), among others. The results allow understanding and conceptualizing the evaluation in the Montessorian perspective, as well as understanding how it occurs in the context of Early Childhood Education. It identified that the focus of the evaluation process is on the development of the student, giving vent to the exercise of freedom of expression, within the rhythm of each child, taking advantage of the space and time of childhood that results in the development of their full autonomy.

Keywords: Montessori Pedagogy; assessment; autonomy

Resumen

El artículo sistematiza los datos y reflexiona sobre la información recolectadas con cuatro docentes y el equipo directivo de una escuela montessoriana, con el objetivo de explicar cómo se da el proceso de evaluación en Educación Infantil, con énfasis en la Pedagogía Montessoriana, así como buscar comprender el proceso de desarrollo de la autonomía de los niños incluidos en esta Pedagogía. La investigación se llevó a cabo en una escuela de una ciudad del oeste del estado de Santa Catarina, utilizando un cuestionario aplicado a través de Google Forms. El análisis de datos sigue una perspectiva cualitativa. La base teórica del estudio está compuesta por autores como Vasconcellos (1998), Villas Boas (2004, 2008), Montessori (1965, 1992, 2017), Hoffmann (2012a), Barlow (2006), entre otros. Los resultados permiten comprender y conceptualizar la evaluación en la perspectiva montessoriana, así como comprender cómo se da en el contexto de la Educación Infantil. Se identificó que el enfoque del proceso de evaluación está en el desarrollo del estudiante, dando cauce al ejercicio de la libertad de expresión, al ritmo de cada niño, aprovechando el espacio y tiempo de la niñez que redunda en el desarrollo de su plena autonomía.

Palabras clave: Pedagogía Montessoriana; evaluación; autonomía

1 INTRODUÇÃO

Montessori (1965) propõe uma pedagogia que parte da necessidade de cada criança e de acordo com as suas capacidades cognitivas e subjetivas. Aponta caminhos capazes de fazer com que a aprendizagem aconteça de forma ativa e significativa. Sua pedagogia proporciona envolvimento dos estudantes, bem como estimula diferentes habilidades, sendo uma delas a de ser protagonista de suas ações.

Maria Montessori nasceu em 1870 e faleceu em 1952. Médica, psiquiatra, antropometrista, pedagoga, antropóloga, higienista, psicóloga experimental, teósofa, política e feminista, ela equilibra uma postura científica com argumentações de caráter antropológico, psicossocial e filosófico. O resultado dessas influências é uma forma inovadora de integrar o conhecimento científico experimental com uma visão filosófica, na busca de uma ciência para a Educação.

Ao observar cientificamente o trabalho incansável das crianças, Maria Montessori encontrou características biológicas e psíquicas intrínsecas e inerentes a toda a humanidade, entendendo, assim, o potencial da educação para desenvolver essas características humanas a favor de um mundo verdadeiramente pacífico. O pensamento desta médica italiana destaca-se por “colocar o estudante no centro do processo de ensino e aprendizagem”, tendo como foco a pedagogia que valoriza o interesse dos estudantes a criar materiais e técnicas para favorecer sua aprendizagem. Ou seja, Maria Montessori pensou na criança como um ser que precisa de apoio e ser mobilizado para o seu desenvolvimento global. Dessa forma, ela acreditava que o ato de educar transpunha a mera transmissão de conteúdos, sendo um momento para o seu amadurecimento social, cognitivo, emocional e cultural.

Nesse sentido, a criança é vista como personagem importante e com papel ativo no processo de aprendizagem. O estudante vai construindo o seu ritmo de aprendizagem e passa por diferentes estágios, que se tornam mais complexos conforme avança. Dentre as formas de acompanhar e identificar o desenvolvimento infantil, está a avaliação.

A avaliação na Pedagogia Montessoriana acontece por meio da observação diária. Todos os dias, as crianças são avaliadas com pareceres descritivos nos cadernos dos educadores, mapeando as dificuldades, os desafios, as conquistas e os avanços em cada atividade realizada. Percebe-se a avaliação diagnóstica como um instrumento valioso no processo de ensino-aprendizagem, podendo ser uma via de mão dupla, possibilitando um possível diagnóstico do educando sobre os conhecimentos mediados no cotidiano escolar.

Este texto resulta da análise e reflexão sobre os dados de pesquisa de campo realizada com a utilização de questionário aplicado a professoras e gestoras de uma escola de educação infantil que trabalha sob a Pedagogia Montessoriana. A arquitetura do artigo contempla a metodologia e três categorias definidas para abrigar os dados. Estas emergiram de cada um dos três núcleos de questões que foram feitas aos participantes sobre a Pedagogia Montessoriana: avaliação e aprendizagem; a prática cotidiana dos educadores e educandos; e planejamento, avaliação e autonomia na escola, além das considerações finais.

2 METODOLOGIA

A pesquisa de campo foi realizada junto a uma escola de Educação Infantil do Oeste de Santa Catarina, envolvendo quatro educadoras, uma diretora e uma coordenadora pedagógica. Como instrumento, utilizou-se questionário aplicado no Google Forms. Inicialmente, entrou-se em contato com a direção pelo aplicativo WhatsApp. Como já havia a autorização prévia, foi solicitada a definitiva para aplicar o questionário. Com o aceite, foi enviado o questionário para as participantes definidas na metodologia do estudo. A Tabela 1 apresenta algumas características de cada grupo quanto à formação acadêmica em nível de pós-graduação, tempo de exercício profissional e em cargos de gestão.

Tabela 1 Tempo de exercício e formação em nível de pós-graduação 

Perfil Diretores Coordenadores Pedagógicos Professores
Tempo de experiência na gestão ou docência na escola atual 20 anos (1) 5 anos (1) 10 anos (1)
30 anos (1)
16 anos (1)
3 anos (1)
Pós-graduação Psicopedagogia e Pedagogia Montessori (1) Séries Iniciais e Educação Especial (1) Educação Infantil e Anos Iniciais (2)

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Conforme observado, a gestora do educandário2 atua há 20 anos, sendo a única com especialização relacionada à Pedagogia Montessoriana. Entre as quatro profissionais, observou-se, em duas educadoras, a mesma especialização acadêmica; outra está com a pós-graduação em andamento e outra não tem especialização. As graduações concentraram-se especificamente em Pedagogia. Os cursos de Psicopedagogia, Pedagogia Montessoriana, Séries Iniciais e Educação Infantil, foram os cursos de pós-graduação realizados pelos sujeitos.

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Gráfico 1 Formação inicial das diretoras 

Observa-se que somente quatro profissionais têm graduação e especialização completa (72%). Uma das profissionais está com a graduação incompleta (parou) (14%) e outra está com a graduação em andamento (14%).

O tempo de experiência de três participantes é de até 10 anos. Uma possui de 11 a 16 anos, outras entre 17 e 20 anos, e a última, entre 18 e 30 anos. Como se pode ver, há certa estabilidade das educadoras; o ambiente e as condições de trabalho são recompensadoras, por se tratar de uma instituição privada e não haver grande rodízio de profissionais. Isto também demonstra que a proposta da escola pode ser mais bem compreendida com o passar dos anos e implementada com maior efetividade.

À medida que as respostas dos questionários foram sendo lidas e refletidas, foi possível articulá-las com a base teórica construída no decorrer do estudo, tornando este momento realmente significativo. A análise dos dados é qualitativa e está contemplada em três categorias que são problematizadas na sequência: avaliação e aprendizagem sob a ótica da Pedagogia Montessoriana; a prática cotidiana dos educadores e educandos na escola montessoriana; e planejamento, avaliação e autonomia na escola montessoriana.

3 AVALIAÇÃO E APRENDIZAGEM SOB A ÓTICA DA PEDAGOGIA MONTESSORIANA

Na Pedagogia Montessoriana os estudantes têm a liberdade de desenvolverem as atividades no tempo e espaço que desejarem, respeitando-se os ritmos pessoais e cognitivos. A tarefa do educador é definir com o educando os passos da aprendizagem, oferecendo estratégias e dicas para a construção de novos saberes, articulados com o tempo necessário para que isso ocorra. Villas Boas (2004, p. 41) reforça que o professor é quem sabe o que os alunos precisam aprender; “[...] é ele quem é capaz de reconhecer e descrever o desempenho desejável, assim como indicar como o desempenho ainda incipiente pode ser melhorado”.

As avaliações nas “comunidades de aprendizagem” do Centro Girassol acontecem diariamente, e os educandos são avaliados em cada ação, continuamente, e precisam estar preparados para qualquer desafio. Villas Boas (2004) ressalta que a escola é o lugar de inovações e de revolução de ideias. Isso requer o desenvolvimento de trabalho coletivo, acompanhado de reflexão constante sobre o processo avaliativo. O processo de avaliação nas salas infantis é contínuo e acontece com a educadora supervisionando diariamente os educandos e fazendo anotações da sua evolução e das dificuldades em atividades específicas que foram planejadas. Conforme Hoffmann (2004), avaliar é um ato de mediar e construir conhecimento, analisando todo o processo educativo.

Em relação à avaliação do Centro Girassol, todas participantes afirmaram que avaliam por meio da observação diária. Orquídea afirma3 que “[...] o principal meio de avaliação Montessoriana é a avaliação diária”. É notório que a avaliação na Educação Infantil não visa dar notas às crianças, mas, segundo Silva (2012), tem como objetivo observar a criança, compreender sua dinâmica, para interferir no momento certo em que aparecem suas dificuldades. Para Barlow (2006, p. 59), o olhar do avaliador representa sua autoridade. Ele pode transmitir os mais diversos sentimentos e emoções. Pode orientar a criança para que modifique seu ser e agir.

Pode-se fulminar, fuzilar com o olhar, mas também encorajar, apoiar, aprovar, proteger. Pode-se olhar de viés ou de cima, ou, ao contrário, com simpatia, confiança. O olhar pode ser sombrio, inquisidor, frio, duro, mas também amigável, irônico, terno, compreensivo [...]. (grifos do autor).

No entendimento de Silva (2012), a avaliação nesta fase deve ser contínua e dinâmica, e o educador deve intervir sempre, (re)planejando a ação educativa, tentando (re)significá-la de forma apropriada, de acordo com as dificuldades de cada criança e do grupo como um todo. Neste sentido, a autora enfatiza a necessidade de a avaliação “[...] na Educação Infantil ser mediadora do desenvolvimento da criança” (SILVA, 2012, p. 4). Em relação à proposta de avaliação da aprendizagem, Lírio da Paz menciona:

A avaliação é feita diariamente, a partir de anotações sobre o desempenho dos alunos com os materiais, a partir dos planejamentos individuais que são feitos pensando em cada criança, em sua idade e suas conquistas. Também são avaliados conceitos sociais, suas relações com as outras crianças, adultos e com o mundo. São feitas anotações sobre o que a criança já conquistou, o que está em desenvolvimento e o que falta ser apresentado ou conquistado.

Sabe-se que a Educação Infantil é a primeira etapa da educação básica, de acordo com a LDB 9.394/96 (BRASIL, 1996). Para Hoffmann (2012b), nesta fase da educação, espera-se que seja oportunizado à criança o desenvolvimento de suas habilidades e competências, de modo a favorecer o aprimoramento das suas capacidades. Para isso, é fundamental o professor estar atento e observar as crianças. Borba (2009) afirma que observar as crianças é um recurso fundamental do professor para conhecer e compreender melhor suas formas de pensar, de comunicar-se, de interpretar e de agir sobre o mundo. Alguns autores, como Hoffmann (2012a) e Silva (2012), concordam que é fundamental ter conhecimento a respeito das crianças, onde e como elas vivem, respeitar sua individualidade e, nesta perspectiva, realizar as intervenções no sentido de ser um “[...] transformador na aprendizagem dos alunos” (SILVA, 2012, p. 5).

A educadora Violeta externa que “A forma como se avalia uma criança dentro da Pedagogia Montessoriana é diferente. Avaliamos de forma individual, cada criança cada uma em seu tempo, com diferentes níveis de desenvolvimento”. Hoffmann (2012a) enfatiza que o primeiro passo do processo avaliativo é acompanhar, compreender o desenvolvimento infantil. A primeira base do processo avaliativo da Educação Infantil é a curiosidade do educador sobre as crianças, o ato de refletir sobre elas, de maneira a contribuir para questões que guiem o educador a ser agente investigativo do seu processo de aprendizagem, de forma criativa e mediadora. Carlino (2017, p. 131 apud BIGGS, 1996, 1998) defende que uma boa avaliação deve ter três características: válida, explícita e educativa.

Válida enquanto avalia o que se compromete a ensinar. Explícita porque compartilha de início, com os que serão avaliados, os critérios de desempenho mais exitoso [...]. Em terceiro lugar, uma avalição é educativa se promove aprendizagem, não apenas pela informação que o professor fornece ao final do processo, mas durante, e também se a atividade cognitiva que a própria tarefa avaliativa demanda para ser realizada corresponde e está alinhada com os objetivos do ensino. (grifos do autor).

Percebe-se que a avaliação envolve uma observação carregada de sensibilidade para com o educando, pois, entre os princípios da avaliação, está a coleta de dados para o planejamento das propostas pedagógicas e sua relação com todos os elementos que proporcionam uma ação educativa. Corsino (2009, p. 9) defende que são os educadores que dão o tom ao trabalho. São eles que reforçam ou não a capacidade crítica e a curiosidade das crianças, que as aproximam dos objetos e das situações, “[...] que acreditam ou não nas suas possibilidades, que buscam entender suas produções, que dão espaço para fala, a expressão, a autonomia e a autoria”. O olhar avaliativo é o modo que o educador tem, na Educação Infantil, de explorar constantemente o mundo da criança, tendo em vista que observar e compreender o desenvolvimento infantil e suas etapas é essencial para que se possa desenvolver sua práxis educativa.

Girassol afirma que “O processo de avaliação da aprendizagem acontece diariamente pela observação e registros do professor no planejamento individual, através do manuseio dos materiais, normalização da criança e do meio ambiente e atividades propostas”. Percebe-se que se faz necessário compreender o processo de avaliação na Educação Infantil por meio de reflexões e discussões da prática pedagógica do educador. É imprescindível ter clareza dos meios e métodos utilizados para se avaliar e dos seus efeitos em relação aos educandos. Soma-se a isso os aspectos metodológicos envolvidos, os objetivos do planejamento, da instituição, da sociedade, contextualizados e contemplados no projeto político-pedagógico do educandário.

Em relação à evolução e aprendizagem dos educandos inseridos na Pedagogia Montessoriana, Margarida menciona:

Percebe-se que a Criança evoluiu com os materiais próprios da Pedagogia Montessoriana. A professora faz a apresentação tendo presente o objetivo de cada material, em seguida é a vez de observar se a criança já intui o objetivo ou se há necessidade de reapresentar em outro momento para que atinja assim objetivo de cada material.

Percebe-se, então, que, além de a avaliação basear-se no ato de observação, a práxis avaliativa acontece por meio de ações mediadoras. Segundo Hoffmann (2012a), a avaliação mediadora tem como característica a observação individualizada da criança, a ação reflexiva sobre os diversos comportamentos do educando e o planejamento como forma intencional de propor atividades significativas.

Compreende-se que todos os dias os educandos são avaliados e são feitos registros avaliativos de cada um deles, enfatizando sua evolução, as conquistas e os desafios propostos nas atividades realizadas e desenvolvidas. Os saberes de cada educando são construídos em movimentos de idas e vindas, por isso é estratégico que o educador assuma a posição de mediador desse conhecimento, direcionando-se a ações educativas.

Silva (2012) cita os registros diários das observações realizadas, pensando em informações básicas para o aperfeiçoamento do planejamento; cita os relatórios individuais, que, segundo ela, mostram avanços, expectativas, mudanças e descobertas, a partir de onde o educador pode fazer uma reflexão e análise sobre em que situação a criança pode melhorar sua aprendizagem.

Conforme Lírio da Paz, a “[...] proposta de avaliação da escola é descritiva sobre aspectos de desenvolvimento da criança dentro de cada área de conhecimento e, também, com base no manuseio de materiais e compreensão das atividades”. A avaliação é realizada diariamente pelo professor, por meio da observação, o que requer preparo para que saiba o que ver, como ver e em que direção reorientar o trabalho. Para isso, faz-se necessária uma formação condizente com os princípios da Pedagogia Montessoriana.

Orquídea comenta que “A proposta de avaliação é um parecer descritivo, contendo todas as suas habilidades, conquistadas na escola ou não, conceitos sobre socialização, adaptação e progressos ou dificuldades”. Compreende-se que a realização do parecer descritivo exige do educador o “[...] exercício de atenção nas manifestações dos alunos (orais e escritas), exercício de descrever e refletir teoricamente sobre tais manifestações, de partir para encaminhamentos ao invés de permanecer nas constatações” (HOFFMANN, 1994, p. 122).

O parecer de cada educando deve ser construído dia a dia e exige do professor atenção e tempo para registrar as atividades individualmente, de forma clara e significativa. Esta é uma tarefa desafiadora que demanda organização e reflexão do professor e o entendimento da avaliação em uma perspectiva formativa.

Vasconcellos (2003, p. 221) afirma que a finalidade maior da avaliação da aprendizagem é a transformação social, uma vez que a “[...] mudança efetiva da avaliação pede a articulação do trabalho pedagógico com outras frentes de luta, indo além dos muros da escola; há todo um combate geral a ser travado simultaneamente no sentido da transformação social”. A partir dela, o educador pode ter subsídios para encontrar a melhor forma de ensinar, percebendo se o trabalho que vem sendo realizado está, de fato, com o foco nos educandos, melhorando, também, a sua maneira de ensinar.

Considera-se que a avaliação encontra sentido e significado se for utilizada como mecanismo de auxílio para o educador, para a escola, pensando sempre no desenvolvimento de cada criança que experiencia a Pedagogia Montessoriana. A avaliação, para Montessori (1965), é vista como processo diário, alimentando a prática pedagógica. É com base nessa prática que o professor revê propostas, ajusta interesses e esclarece dúvidas. Villas Boas (2008) concebe a autoavaliação como um componente importante da prática pedagógica, para auxiliar o estudante a perceber o próximo passo do seu processo de aprendizagem.

A autoavaliação é um componente importante da avaliação formativa. No entender de Villas Boas (2008, p. 51), “[...] refere-se ao processo pelo qual o próprio aluno analisa continuamente as atividades desenvolvidas e em desenvolvimento, registra suas percepções e seus sentimentos” e identifica futuras ações, para que haja avanço na aprendizagem.

A criança aprende que a autoavaliação e a avaliação em grupo são tão importantes quanto a avaliação individual, pois cria espaço de fala, reflexão e escuta, momentos de verdadeiro aprendizado para todos. Maria Montessori (1965, p. 91) afirma que: “[...] a aprendizagem não é aquilo que o adulto transmite, mas sim um processo natural que se desenvolve espontaneamente no indivíduo humano em virtude de experiências realizadas no seu ambiente natural”.

4 A PRÁTICA COTIDIANA DOS EDUCADORES E EDUCANDOS NA ESCOLA MONTESSORIANA

Ao refletir sobre os motivos que nos conduziram a pensar na Pedagogia Montessoriana, percebe-se que este foi o momento mais rico da trajetória, uma vez que mostra como realmente acontece o processo de autonomia dos educadores para com seus educandos. O contato com a base teórica oportunizou à pesquisadora refletir e dialogar com autores defensores da Pedagogia Montessoriana. Foi possível compreender, pelo acesso aos questionários, a relação teoria x prática como ações indispensáveis à aplicação do método em meio à aprendizagem dos educandos.

Segundo Girassol, “Na Pedagogia Montessoriana a intervenção do educador acontece de maneira singular com cada criança, dentro do que foi planejado, através do trabalho pessoal”. Esse saber e fazer consciente dos educandos ocorre a partir da observação aos seus colegas e da sua forma livre de trabalhar.

A educadora precisa ajudar o educando a agir, pensar e querer de forma peculiar, sendo uma arte de espírito, conforme expressa Montessori (1965). Em sintonia a isso, Freire (1996, p. 59) leva a refletir sobre a importância de ser autor quando afirma que educar exige respeitar o protagonismo do educando, “[...] o respeito à autonomia e dignidade de cada um é imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros”.

Conforme a coordenadora Rosa, “[...] a mediação entre professor e aluno ocorre de acordo com suas observações. Nem sempre é necessário interromper a criança para explicar algo que ela está explorando”. Na verdade, “[...] é a criança nova que nos pode conduzir e mostrar-nos o nosso caminho” (MONTESSORI, 1965, p. 110). Por isso, as crianças necessitam ter liberdade de escolher seu trabalho, visto que “[...] a atividade da criança há de ser impulsionada pelo seu próprio eu, e não pela vontade da mestra” (p. 97), reconhecendo e respeitando seu desenvolvimento cognitivo.

Rosa destaca que “[...] se a criança não está trabalhando de forma correta com o material Montessori, a professora faz a mediação apresentando de maneira correta”. Para Montessori (2017), o comportamento responsável requer disciplina, porém, esta é algo visível e ativo, sem condenações ou rigidez. Este fator é o grande diferencial das escolas montessorianas. Observa-se, nesse sentido, que é possível educar com amorosidade e permitir que a criança aja de forma consciente e correta por meio da demonstração e explicação ativa do educador.

Na perspectiva montessoriana, a Educação Infantil é orientada por princípios filosóficos como: Vida Prática, Educação Sensorial, Educação Cósmica, Intuição à Matemática, Linguagem, Dança, Inglês e Educação Física. Esses pilares formam um circuito virtuoso, partindo do princípio de que cada um é parte ativa e essencial para o aparecimento, crescimento e desenvolvimento dos demais.

Segundo a Organização Montessoriana Brasileira (OMB, 2023, s.p.),

O professor Montessori despende muitas horas estudando e praticando as várias lições com o material de todas as matérias. Deve estar treinado para reconhecer uma criança não leitora de acordo com a idade, habilidades e interesses em determinadas lições, e preparado para auxiliar no progresso individual.

Percebe-se que a busca por novos conhecimentos é constante pelos educadores, o que ressalta a importância de se criar oportunidades para este aperfeiçoamento, uma vez que o ser humano é um constante devir, é um perene fazer-se a si mesmo, um ser que se constrói no percurso histórico, nele se humaniza. Portanto, sua processualidade é mencionada por Freire (1996, p. 15) quando afirma que se necessita de uma educação mais humanizada, pois “[...] formar é muito mais do que puramente treinar o educando no desempenho de destrezas”. O autor destaca, ainda, que:

A melhora da qualidade da educação implica a formação permanente dos educadores. E a formação permanente se funda na prática de analisar a prática. É pensando sua prática, naturalmente com a presença de pessoal altamente qualificado, que é possível perceber embutida na prática uma teoria não percebida ainda, pouco percebida ou já percebida, mas pouco assumida. (FREIRE, 1996, p. 72).

Para que esses componentes curriculares sejam trabalhados efetivamente, é fundamental que se reúnam profissionais aptos e ávidos por conhecimento. O Centro Educacional Girassol conta com uma equipe seleta e experiente de educadores envolvidos com a educação e de educadoras comprometidas com o cotidiano escolar. A maioria tem curso superior em Pedagogia, especialização no Sistema Montessori e pós-graduação em Gestão em Psicopedagogia.

Todas as segundas-feiras, os educadores se reúnem com a Coordenação Pedagógica do educandário para formação e estudo da Pedagogia Montessoriana. Os temas variam desde os conceitos da própria Pedagogia Montessoriana até as dificuldades encontradas no cotidiano da sala de aula. É um momento de muito estudo, discussões, debate de opiniões e reflexões sobre a prática montessoriana, quando são feitas leituras de autores atinentes à educação, como Freire e a própria Maria Montessori, os quais contribuem com os saberes e fazeres sobre o entendimento de novas teorias e práticas que se tornam importantes para agregar e contribuir com o legado Montessori.

Observa-se, nesse momento, a ética profissional e o compromisso das educadoras em tornar tudo significativo, pois “[...] educação é uma arte, uma interação e muitas outras coisas, mas é também a atividade pela qual prometemos às crianças e jovens um mundo sensato, no qual devem ocupar um espaço que seja significativo para si mesmos” (TARDIF, 2008, p. 182).

Conforme dados coletados, a formação das professoras é realizada semanalmente, com capacitação interna pela consultora Montessori que a escola possui. Esta tem formação Montessori e, também, é consultora da Associação Brasileira de Educação Montessori (ABEM). Desse modo, compreende-se que a formação do professor, seja inicial, seja continuada, é fundamental para o bom exercício da profissão. São saberes históricos, teóricos e práticos que fomentam a atuação desses profissionais. De forma concomitante a ela, está a construção e a definição da sua identidade profissional, e a reflexão sobre a sua construção torna-se pertinente.

O educador montessoriano necessita de uma formação diferenciada. Além de estar em constante busca de pesquisa/estudo, deve ser um observador pronto a guiar os educandos para viver e conviver com saberes e fazeres significativos. Ademais, deve sentir-se preparado e seguro para criar possibilidades e oportunidades para que a criança possa experienciar a partir das suas necessidades e interesses. Diante disso, Montessori Júnior (1992, p. 125) revela que:

O sucesso do relacionamento de educadores e educandos nas classes Montessorianas depende da habilidade do educador em apresentar novos desafios de maneira sensata, usando todo o seu poder de observação, seu conhecimento dos períodos sensitivos e sua compreensão da função do material Montessori. Os educadores orientam as crianças de acordo com aquilo que observam nelas. Nesse sentido, é a criança que dirige o adulto, ou melhor, não é um caso de diretor e dirigido. Adultos e crianças trabalham em conjunto para atingir uma meta comum: o desenvolvimento. Dessa forma, ambos são diretores, e ambos são dirigidos.

A professora Rosa enfatiza que, quando ocorrem cursos em nível nacional, a equipe gestora desloca o grupo para congressos na área. Junto disto, Girassol salienta que “[...] incentivamos e auxiliamos financeiramente a equipe de professores nos cursos de treinamento nos centros de formação Montessori”.

Fica claro o quanto a escola se preocupa em incentivar seus educadores para agregarem conhecimentos teórico e práticos, além daqueles de sala de aula, qualificando-os e preparando-os com novas metodologias de ensino-aprendizagem. É primordial que o professor montessoriano tenha, simultaneamente, formação científica e espiritual, ou seja, precisa saber, saber fazer e saber ser (AZZI, 1999). É essencial que ele conheça, estude e saiba sobre os educandos. Quanto mais o educador conhecer das diversas áreas, mais subsídios terá para auxiliar e motivar os estudantes no contexto da escola.

Falar do cotidiano da escola já encanta, o que dizer de mediar, nessas entrelinhas, os principais objetivos da pesquisa?! É possível avaliar por meio da Pedagogia Montessoriana numa realidade tradicional? Será que nas escolas próximas existem características e ações que trabalham a autonomia da criança conforme a Pedagogia Montessoriana? São questionamentos que se deixam aqui, em meio a essas entrelinhas de conhecimentos... Abre-se o desafio de conhecer essa Pedagogia que é tão diferenciada e efetiva no ato de observar e trabalhar saberes e fazeres significativos.

5 PLANEJAMENTO, AVALIAÇÃO E AUTONOMIA NA ESCOLA MONTESSORIANA

Muito se fala de Maria Montessori e de sua proposta pedagógica; entretanto, dá-se ênfase apenas aos espaços montessorianos, desconsiderando-se outros aspectos de sua Pedagogia. Se as características da sua proposta fossem hoje analisadas e observadas, será que ela ganharia vida além dos educandários montessorianos? Para Savater (1998), o indivíduo pode aprender muito sobre o que o rodeia, mesmo que ninguém lhe ensine direta ou indiretamente.

A Pedagogia Montessoriana tem grande destaque na educação do século 21 e, muitas vezes, não é percebida ou reconhecida pelas escolas, tampouco pelos próprios educadores. Na Educação Infantil, trabalha-se com a educação dos sentidos, e muitas atividades realizadas em sala de aula são embasadas nessa proposta. No cenário presente, ela está fortalecida, ganhou vida e significado por meio de suas contribuições pedagógicas. É impossível falar desta Pedagogia sem mencionar a importância do educador que a utiliza em sala de aula, pois ela tem a potência para possibilitar caminhos de aprendizagens significativas.

Muitas escolas experienciam a Pedagogia Montessoriana em atividades com materiais sensoriais, atividades psicomotoras ou com material dourado, treinamentos e programas educacionais, sendo um deles o Plano Nacional de Alfabetização na Idade Certa (PNAIC)4, que trabalha a confecção de materiais, sem fazer referência explícita de que se trata de Montessori. Esses são alguns projetos com finalidades pedagógicas que, muitas vezes, não mencionam os criadores dos materiais.

Compreende-se o ato de planejar e avaliar como ferramenta facilitadora da práxis docente. Desta forma, Jesus e Germano (2013) consideram que a teoria histórico-cultural articula as ideias que trabalham a interação da criança e o meio, ou seja, quanto maior a diversidade de contato com temas gerais, mais as crianças terão aprendizagem significativa, e essa aprendizagem ocorrerá pela mediação do adulto facilitador.

Girassol menciona que “[...] o planejamento de cada criança é individual, onde o professor propõe atividades para cada uma dentro de seu nível de desenvolvimento. Com o uso da observação, identifica-se os requisitos, evoluções e estímulos necessários”. Para Araújo (2010, p. 9), atualmente,

[...] planejar, é traçar, delinear, programar, elaborar um roteiro na tentativa de desenvolver conhecimentos, de interação, de experiências múltiplas e significativas para com os alunos. Por isso não é algo que se encontre pronto, como uma receita. Ao contrário, o planejamento é flexível e, como tal, permite ao educador repensar, revisando e buscando novos significados para a sua prática pedagógica.

Compreende-se que as ações de planejamento não resultam apenas de uma única fonte, e sim de múltiplas concepções para e com o educando. Sendo assim, o saber docente é composto de vários saberes derivados de diferentes fontes. Estes são profissionais, disciplinares, curriculares e experienciais (TARDIF, 2008).

Violeta salienta que o “[...] planejamento é feito de forma individual respeitando cada nível de desenvolvimento da criança, englobando as áreas de conhecimento trabalhadas”. Ainda, segundo Vasconcellos (1999), do ponto de vista educacional, o planejamento é um ato político-pedagógico porque revela intenções. Segundo ele,

[...] planejar é elaborar o plano de mediação, de intervenção na realidade, aliando às exigências, decorrente de intencionalidade, de colocação deste plano prática. [...] é um processo mental, de reflexão, de tomada de decisão, por sua vez, não uma reflexão qualquer, mas “grávida” de intervenção na realidade. (VASCONCELLOS, 1999, p. 43).

O autor concebe ao planejamento uma identidade de intervenção na ação e de reflexão sobre o ato de planejar, de maneira a intervir no contexto social. É nesse aspecto que o ato de planejar assume dimensão de grande relevância e importância conscientizadora, de transformação, sem a qual não se poderia promover mudanças.

O planejamento pode ser feito individualmente por cada educador ou de modo participativo. Pode passar por mudanças no decorrer das aulas e ser desenvolvido de forma diferenciada para cada turma, respeitando as habilidades e competências de cada criança. Isso acontece via observação direta e indireta, na qual o educador deve respeitar a singularidade e a individualidade de cada educando, para que ele se desenvolva de forma integral. “A observação é uma das técnicas que o professor dispõe para melhor conhecer seus alunos, identificando suas dificuldades e avaliando seu avanço nas várias atividades realizadas e seu progresso na aprendizagem” (HAIDT, 2011, p. 224).

Os resultados dos questionários aplicados revelam que as educadoras têm conhecimento, embasamento e fundamentação teórica na Pedagogia Montessoriana, adquirida pela constante busca de cursos e formações. Isso contribui na compreensão e realização da avaliação. Esta acontece por meio da observação e da elaboração de pareceres descritivos. Neles constam os avanços, a evolução e os aspectos a serem redirecionados em cada estudante, ressaltando-se suas potencialidades. Esta prática sintoniza com o pensamento de Freire (1996), de que a docência e a boniteza precisam andar de mãos dadas.

Percebe-se que um planejamento organizado pode alcançar objetivos significativos para a atividade pedagógica em sala de aula. Quando o educador planeja sua ação, está mais bem preparado para enfrentar desafios que possam surgir, como, por exemplo, controlar a classe em situações de indisciplina. Assim sendo, a ação de planejamento da rotina escolar realizada pelo educador, seja em sala de aula ou não, é uma aliada da rigorosidade metódica, que, além de proporcionar suporte ao trabalho docente, pode tornar-se organizadora do âmbito escolar e, consequentemente, fortalecer as ações mais propositivas de aprendizagem.

Gandin (1994, p. 115) ressalta a oportuna articulação avaliação-planejamento. Segundo ele, “[...] o processo de planejamento inclui o processo de avaliação, sem exagero pode-se afirmar que o planejamento é um processo de avaliação que se junta a ação para mudar o que não esteja de acordo com o ideal”. Observando pelo olhar do autor, percebe-se que a avaliação se torna um fator responsável para e com a reorganização da prática educativa a fim de norteá-la aos seus objetivos.

Girassol pondera sobre isso:

A função da avaliação na escola é permear o trabalho do professor e auxiliar a criança em seu desenvolvimento integral. Autonomia é outro tipo de trabalho, uma área avaliada, sim, pelos professores, mas que precisa ser trabalhada com ambiente preparado.

O ambiente preparado é um alicerce na prática diária das educadoras montessorianas, e, conforme o seu entendimento, é a maior ferramenta de trabalho; portanto, merece cuidado e planejamento. Conforme Maria Montessori (2017, p. 15),

[...] é preciso montar o ambiente conforme a necessidade dos educandos, pensando e repensando sempre que necessário a mudança, mesmo que seja a troca de lugar das próprias estantes, pois mudando de lugar eles terão que ter a percepção que trocou.

Em outras palavras, as crianças necessitam “interagir” nos espaços e com os espaços, sentir-se parte deles a ponto de perceber as transformações que neles ocorrem, o que os auxilia na formação da consciência de mundo e demonstra a sua capacidade e autonomia no pensar sobre o que veem. Orquídea salienta que a metodologia de avaliação no processo de ensino-aprendizagem acontece a

[...] partir de um estudo das habilidades de cada criança em sua determinada idade. Então são pautados objetivos a serem atingidos, onde avaliamos quem está além ou aquém de determinados parâmetros definidos em relação ao que se espera da criança em termos de desenvolvimento.

Em suas reflexões e análises em relação à infância, Montessori (1965) desenvolveu concepções próprias, relacionadas à individualidade no ensino e na aprendizagem. Sua proposta fundamenta-se em uma pedagogia com ênfase no educando como sujeito do seu próprio desenvolvimento cognitivo. O diferencial da Pedagogia Montessoriana está na forma como envolve a criança, considerando-a um ser livre para se movimentar pela sala de aula, utilizando os materiais para a sua autoeducação e propondo trabalhar a personalidade, as habilidades e os estados emocionais.

Em relação aos instrumentos de avaliações, Lírio da Paz comenta que

[...] realizamos uma avaliação diagnóstica, para sabermos em que níveis se encontra a criança. Depois, embasada nos planejamentos individuais, avalio os aprendizados com cada material, a aquisição do vocábulo e se chega ou não ao objetivo específico pensado para cada material, Manuseio correto, realização da atividade e finalização.

Compreende-se, portanto, que há práticas avaliativas que promovem etapas de democratização do processo de ensino. No entanto, há outras que contribuem para ações e atos cada vez menos democráticos tanto na qualidade quanto na sua extensão. Rosa exemplifica: “[...] avaliamos de forma individual e diariamente. Levamos em consideração a concentração da criança, o manuseio de materiais Montessori, a normalização nos grandes grupos, as habilidades motoras conquistadas, sua independência e autonomia”.

Conforme Montessori (1965), em classe montessoriana há trabalho coletivo, com manifestação de ajuda mútua; no entanto, cabe ao professor identificar as necessidades de cada educando e intermediar com práticas específicas para cada um. Mas, para que isso ocorra, há restrição no sentido de que as classes montessorianas não sejam numerosas, uma vez que cada criança pode contar com a educadora e com seus colegas. Montessori (1965) explicita alguns princípios a serem observados pela educadora montessoriana, como:

  1. Facilitar à criança um trabalho ativo e contínuo, orientado à cada criança, porque compete a esta escolher os objetos e exercitar-se com eles;

  2. Observar para que o material oferecido à criança contenha em si mesmo o controle do erro;

  3. Criar possibilidades de autoatividade da criança por meio de materiais de desenvolvimento que se prestem à atividade da criança;

  4. Orientar por meio das palavras. Estas são sempre necessárias: não raro, será necessário demonstrar simplesmente como se manuseia um objeto;

  5. Estar atenta à objetividade. É necessário que a personalidade da mestra desapareça e que unicamente fique em evidência o objeto sobre o qual ela quer atrair a atenção das crianças;

  6. Preparar os meios materiais das atividades e que o material seja “limitado” e em quantidade suficiente para dar conta do que ela propõe.

Percebe-se que, para ser uma educadora montessoriana, são requeridos muitos saberes e habilidades. Dentre eles, exercer as atividades sem interferir na aprendizagem dos educandos e estar sempre observando-os para dar suporte ao seu crescimento e evolução. É um exercício de responsabilidade não intervir no processo de aprendizagem, o que desafia ainda mais o educador, pois há crescimento mental e humano de ambos. Nesse momento, questiona-se o fato de os educadores não utilizarem a Pedagogia Montessoriana, pois nas escolas tradicionais a intervenção dos educadores acontece de forma muito ativa, sendo algo normal, fator pelo qual, muitas vezes, acaba prejudicando os próprios educandos que assumem uma condição submissa e passiva.

O educador montessoriano é um guardião, como menciona Maria Montessori em suas obras, estando sempre pronto para servir o educando, fato que rompe completamente com o ensino tradicional. Diante das respostas expressas nos questionários, foi possível voltar um olhar ainda mais admirável para a Pedagogia Montessoriana, reforçando sua relevância para o processo de ensino e aprendizagem. Reitera-se que ela precisa ser mais divulgada e conhecida pelos profissionais da Educação. Por fim, cabe refletir se somente a escola montessoriana pode desenvolver estes pilares pedagógicos ou se há outras escolas que também podem ser lembradas por trabalhos semelhantes? É preciso acreditar nos educadores e em suas capacidades de fazer com que a aprendizagem aconteça de forma ativa e prática, como ocorre na Pedagogia Montessoriana.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo se propôs a investigar e conhecer o processo de avaliação na perspectiva da Pedagogia Montessoriana, bem como o desenvolvimento da autonomia dos educandos inseridos nela. Dar sentido a um tema tão humanizador e diferenciado na educação como a Pedagogia Montessoriana, com certeza, foi um dos grandes desafios desta pesquisa. Pode-se afirmar que os objetivos propostos proporcionaram acreditar de forma intensa na resposta que esta proposta pedagógica pode dar na educação das crianças, especialmente no desenvolvimento de sua autonomia. Compreender o processo avaliativo sob a orientação das concepções da filosofia de Maria Montessori oportunizou ressignificar olhares e conhecimentos sobre a avaliação na Educação Infantil.

Durante as reflexões e análises dos questionários desta pesquisa, reafirmou-se o que já se havia considerado nas leituras, ou seja, de que são visíveis as ações avaliativas com a utilização da observação e da livre escolha de desenvolvimento de cada atividade, bem como os objetivos das atividades proporcionadas nesta metodologia, que visam à autonomia e independência direta de cada aluno. Nesse sentido, a Pedagogia Montessoriana é uma concepção que difere de outras propostas, por ser uma prática inovadora, pois está voltada ao desenvolvimento humano em cada etapa de sua vida, atendendo às necessidades específicas de cada criança.

Aposta-se na Pedagogia Montessoriana, pois os pilares em que se baseia são aqueles que podem mudar o processo de ensino e aprendizagem das próximas gerações: a vida prática e a educação cósmica, que permitem viver e conviver com as diferenças, não despendendo energias para resolver a dicotomia certo-errado, simplesmente fazendo, manipulando, experimentando e descobrindo diferentes possibilidades para a realidade.

2Utiliza-se a expressão “educandário” quando nos referimos de forma específica à instituição que foi lócus da pesquisa e aquelas que trabalham sob a orientação montessoriana.

3Para diferenciar os depoimentos das participantes do referencial teórico, utilizaremos a letra em itálico.

4O Plano Nacional de Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) tem o intuito de garantir a alfabetização de todos os educandos até os oito anos de idade.

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Recebido: 07 de Julho de 2021; Aceito: 15 de Junho de 2023

Ritieli Anese: Mestre pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI). Pedagoga pela Unidade Central de Educação Faem Faculdade (UCEFF). E-mail:ritieliaa@hotmail.com, ORCID:https://orcid.org/0000-0001-6046-1472

Arnaldo Nogaro: Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEDU) e do Programa de Pós-Graduação em Atenção Integral à Saúde (PPGAIS) na Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI). Líder do grupo de Pesquisa Ética, educação e formação de professores, certificado pelo CNPq. E-mail:narnaldo@uricer.edu.br, ORCID:http://orcid.org/0000-0003-0517-0511

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