1 INTRODUÇÃO
A presente investigação parte das práticas artístico-pedagógicas estabelecidas pelo projeto cultural REALIZACINE, entre os anos de 2021 e 2022, e desenvolvidas em parceria com a comunidade educativa (estudantes, professores e demais trabalhadoras/es) de 2 escolas públicas de favelas do bairro de Santa Cruz, Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro, com o objetivo de apresentar um conjunto de reflexões em torno de uma proposta para além do currículo escolar formalizado, relacionando cinema e educação como possibilidade de criação.
Este trabalho investigativo se justifica como uma articulação entre aspectos teórico-práticos do campo que relaciona cinema e educação, como fundamentação para as ações nas escolas, produzindo reflexões em torno do currículo como lócus de prática construída entre os sujeitos, o que possibilita articular diferentes saberes produzidos por Nós2, ou seja, sujeitos que dela fazemos parte, mas que apresentam diferentes experiências. Para tal, é importante apresentar algumas das referências e inspirações que movimentam este trabalho, como proposta para produzir reflexões entre cinema-educação-currículo-cultura nas relações da prática pedagógica com a pesquisa educacional.
Entendendo o(s) sentido(s) da pesquisa educacional em estrita relação ao par experiência/sentido (LARROSA, 2002), é possível apresentar um conjunto de artefatos3 produzidos nas práticas pedagógicas do REALIZACINE, justamente como possibilidades de produzir experiências de pesquisa. As experiências em questão partem da prática do exercício do Minuto Lumière4 como um primeiro contato com os gestos de criação com a linguagem cinematográfica. Com o propósito de produzir algumas reflexões, partimos da seguinte questão para construir os caminhos desta investigação: o que pode uma experiência de cinema no currículo escolar?
Nesse sentido, as reflexões a seguir estão atravessadas pelas experiência de ver e fazer filmes no espaço escolar, em defesa de produções curriculares que se estabelecem nas relações com e entre os sujeitos, relacionando-as a reflexões de Jacques Rancière (2002, 2012), Larrosa (2002), Bergala (2008), Fresquet (2013a, 2013b, 2014), Gabriel (2013), dentre outros. Procuramos tensionar uma experiência com o cinema na escola, como possibilidade de produção de conhecimentos.
2 REALIZACINE: VER E FAZER FILMES NA ESCOLA
O REALIZACINE surgiu como um desdobramento do Programa de Extensão Universitária CINEAD/UFRJ, buscando desenvolver práticas de iniciação ao cinema em locais onde a universidade não consegue chegar. Outra circunstância que tangenciou a idealização do projeto é a produção de estratégias de acesso à arte e à cultura de maneira gratuita, por intermédio do cinema. As ações concentraram-se no bairro de Santa Cruz, justamente por não possuir uma única sala de cinema, tornando o acesso limitado devido aos altos valores dos ingressos das sessões projetadas, somado às despesas com transporte para outros bairros, inviabilizando o contato de grande parte de seus moradores com esta linguagem.
Em 2020, por meio da Lei Emergencial Aldir Blanc, com o apoio do Prêmio Arte e Escola (Secretaria Municipal de Cultura da cidade do Rio de Janeiro), o REALIZACINE foi contemplado, possibilitando investir em equipamentos de cinema e desenvolver um conjunto de oficinas para crianças nas escolas municipais Otelo de Souza Reis e Haydea Vianna Fiuza de Castro, localizadas, respectivamente, nas favelas do Antares e no Aço. Em meio às circunstâncias da pandemia de covid-195, causada pelo vírus SARS-CoV-2 e as dificuldades de desenvolver práticas culturais, esta premiação representou a possibilidade de iniciar o projeto e produzir ações com o cinema no espaço escolar.
Para que as oficinas pudessem ocorrer em escolas públicas do município, foi formalizada uma parceria com a 10ª Coordenadoria Regional de Educação do Rio de Janeiro (10ª CRE). Em seguida, articulou-se o contato com as escolas municipais supracitadas, onde foram realizadas as oficinas de cine de maneira presencial, em 2021, no momento de reabertura das escolas do município do Rio de Janeiro. Sendo oferecidas para 30 jovens (15 de cada instituição) do 2º ano do ensino fundamental, no contraturno das práticas escolares, em dois encontros com duração de 1h30, em cada escola, ao longo do mês de abril. Práticas interrompidas pela segunda onda da pandemia, ocasionando a exibição dos filmes das crianças, em maio de 2022.
As oficinas tiveram lugar em diversos espaços das escolas, em parceria com a direção, os professores e demais trabalhadores da educação das unidades escolares organizando as práticas, o que possibilitou um espaço e um tempo para as ações artístico-pedagógicas com cinema, buscando alcançar um perfil heterogêneo em cada escola, abrangendo diversificados perfis sociais, raciais, etários e de gênero. Nestas experiências, apostamos na prática do exercício do Minuto Lumière como um primeiro contato com os gestos de criação com a linguagem cinematográfica, conforme veremos mais adiante.
Apostamos no cinema como instrumento de pesquisa sobre a memória nos territórios periféricos, como gesto de criação por crianças e jovens, expandindo as relações curriculares. Por meio destas práticas, foi possível dar materialidade a 30 filmes produzidos pelas crianças, o que também contribuiu tanto à elaboração de reflexões sobre a formação de uma juventude local como à produção de uma memória audiovisual sobre o bairro de Santa Cruz. Nesse sentido, vale ressaltar que existem poucos filmes criados a partir do bairro de Santa Cruz e, principalmente, nas favelas do Antares e do Aço.
Uma importante inspiração para as práticas do REALIZACINE se dá em torno das ações do projeto 10x10, da Fundação Calouste Gulbenkian6 (FCG), com o qual se estabeleceu um intercâmbio entre artistas e professores para experiências de criação no contexto escolar. A equipe que participou da elaboração inicial do projeto é formada por um pedagogo e um cineasta, que estabelecem práticas em colaboração. Nas reflexões de Pires et al. (2016) em relação ao 10x10, essa condição da relação educador-artista é representada por uma noção do “comum” como construção a ser realizada em espaços e tempos determinados e que surgem no cotidiano do trabalho da educação e nas relações estabelecidas a partir dele.
Assim, partilhamos, portanto, da dimensão apresentada pelas autoras, na qual o “comum não é algo dado, implica uma construção que põe em comum algo que não o era” (PIRES et al., 2016). O deslocamento do comum, fora de uma lógica que pressuponha a homogeneidade, cria diferentes tessituras em torno do currículo e nos aproxima das perspectivas de uma educação, na qual se leva em consideração o pressuposto de que cada encontro é sempre único, irrepetível e encenado em suas relações.
As perspectivas artístico-pedagógicas em torno do cinema como gesto educativo possibilitam ter como condição central a igualdade de inteligências entre os diferentes sujeitos envolvidos, dada pela condição de espectador (RANCIÈRE, 2012) entre aquelas/es diante de uma mesma tela, de um mesmo filme e que, ainda, permite se expandir a outros processos de subjetivação pela prática de exercícios de criação - de fazimento de filmes - com e entre os sujeitos envolvidos em determinada prática. Isto é, pela possibilidade de que estudantes, professores e trabalhadoras/es da educação estabeleçam entre si movimentos coletivos de criação ao partir (e partilhar) de determinada experiência comum ao grupo.
Para compreender um pouco melhor o conceito de “igualdade de inteligências”, vale a pena lembrar que a condição central da Pedagogia de Rancière se dá justamente pela relação de horizontalidade entre os saberes, como lógica disruptiva do que denomina embrutecimento. As reflexões do filósofo argelino Rancière (2002) partem em torno de Joseph Jacotot, um pedagogo que viveu no século XVIII na França e que desenvolve a noção de emancipação intelectual a partir de uma experiência de ensino e aprendizagem de francês com falantes/ouvintes de holandês. Processo educativo que ocorre sem que Jacotot fosse fluente em holandês e seus alunos, em francês, na qual desenvolve atividade com os estudantes a partir da leitura do livro “Telêmaco”, com uma versão bilíngue da obra. Para a surpresa (e espanto) do pedagogo, os alunos não só aprenderam sozinhos o francês, como discutiram com propriedade acerca do mesmo livro. Experiência que se revela como sua grande descoberta, a de que qualquer pessoa pode aprender sozinha e o professor pode ensinar mesmo que seja ignorante em um determinado assunto. Isso não quer dizer que o professor não precisa saber de nada, pelo contrário.
Assim, as inteligências se revelam de diferentes formas; logo, aquilo que uma pode, todas podem. Não há diferença entre as inteligências, não há hierarquia entre os saberes. Sendo essa a condição para o princípio de igualdade. A tomada de consciência dessa igualdade, segundo Rancière (2002, p. 26), chama-se emancipação. Para tal, é imprescindível uma postura crítica por parte do professor, isto é, ir em busca de uma pedagogia que procure romper com a postura geralmente atribuída aos docentes na educação tradicional, a saber: meros explicadores de conteúdos.
Desta maneira, compreendemos que, por intermédio destas experiências, ao mesmo tempo coletivas e individuais, emergem um conjunto de possibilidades pedagógicas de expressão e de valorização das diferentes subjetividades ao ver e fazer filmes no espaço educativo. Há, nestas práticas, uma infinidade de percursos e possibilidades em torno do que é singular para cada indivíduo nas relações de ver e ouvir o que está diante de si e dos demais, ao exibir um plano, uma cena ou ainda um filme. Há, também, infinitas possibilidades criativas ao materializar isso em produções fílmicas dos sujeitos envolvidos, em relação à partilha de algo de si com o outro. Produzir cinema como gesto educativo é, inevitavelmente, sobre fazer escolhas, tomar decisões. Isso possibilita, também, fazer partilhas daquilo que se escolhe ao filmar algo.
No campo das pedagogias que vinculam cinema e educação, partilhamos da Pedagogia da Criação, retratada por Alain Bergala (2008) como alternativa para a prática de ampliação da imaginação e de valorização dos processos criativos por parte dos sujeitos envolvidos, posto que eles, na condição de espectadores/criadores, caminhem juntos na construção de conhecimentos. Esta Pedagogia pressupõe que os filmes não sejam introduzidos como mais um conteúdo escolar, demonstrando maior abertura às sensações e aos significados que emergem dos encontros. A arte não se ensina, diz Bergala (2008), mas se experimenta. Por meio dessa perspectiva, o cinema na escola é apresentado como arte, de modo a integrar o conjunto de conhecimentos transmitidos pela escola como uma experiência artística de alteridade7 e como um momento de encontro entre espectadores e obras. O cinema na escola, nessa perspectiva, assume, também, a capacidade de romper com um sistema que privilegia a explicação sustentada pela pedagogia tradicional, uma vez que professores e estudantes articulam coletivamente o que cada plano, cena ou filme possa vir a provocar. O filme torna-se o fio condutor para a possibilidade de experiências com um comum inventado.
Nessa dimensão, o autor compreende o cinema como possibilidade de encontro, ato que se dá desde a infância, com os filmes como “obras de arte e de cultura” (BERGALA, 2008, p. 46). O cinema relacionado à educação, nesta perspectiva, emerge como possibilidade de transgressão do modelo de educação vigente: o de transmissão, já que representa uma alternativa para o acesso a experiências desconhecidas, o que possibilita o encontro com a experiência da Alteridade (BERGALA, 2008).
Algumas reflexões, mais especificamente em torno das exibições de filmes como gesto educativo8, provocam (re)pensar os sentidos empregados com a ação: em primeiro lugar, há uma ressignificação da organização espacial de uma sala de aula (auditório ou outro espaço) em relação à perspectiva tradicional, cuja experiência é atravessada pelo pressuposto que afirma que a disposição dos corpos dos educandos e, hipoteticamente, da atenção do grupo esteja voltada para o educador como um suposto gesto de transmissão do conhecimento. Em segundo lugar, a presença de imagens em movimento, numa tela, e também de sons, cria algumas condições para desestabilizar essa condição hierárquica, historicamente constituída e naturalizada nas relações educativas. A primeira delas se percebe no ato em que passamos a estar, sem exceções, todos e todas diante da mesma tela; desta maneira, a disposição do corpo do/a educador/a na sala é uma importante mudança do ponto de vista epistemológico, já que se torna mais um/a espectador/a diante do filme. A segunda diz respeito ao fato tomar como ponto de partida aquilo que se vê e ouve nos filmes, já que isso permite que cada espectador/a apresente as suas percepções, opiniões, gostos, interesses e sentimentos diante do que é exibido, em relação com suas próprias experiências de vida (REZENDE FILHO et al., 2015). Condição que desestabiliza binarismos em torno da dicotomia “certo” x “errado”, deslocando as noções de currículo representadas pelas pedagogias tradicionais a uma noção mais aberta, plural, de abertura ao mundo e aos encontros, colaborando, portanto, para desenvolver um currículo construído no decorrer do processo.
Há também outra dimensão, pertinente para a nossa investigação, como é o caso de experiências que emergem entre os sujeitos envolvidos numa prática pedagógica com cinema, quando dispõem de uma câmera e são apresentados a determinado exercício de criação com o cinema. Movimento, este, que sempre implica criações singulares, como é o exemplo dos Minutos Lumière (FRESQUET, 2013a, 2014) produzidos por 30 crianças das séries iniciais das duas escolas de favela da periferia carioca, nas quais desenvolvemos oficinas de cinema, conforme veremos mais adiante. Assim, ao mesmo tempo que se configuram como um gesto comum e partilhável com e entre todos e todas, também se apresentam como condição central à ampliação da capacidade de imaginar e inventar mundos. Assim:
Embora o cinema não tenha nascido com o propósito de ensino - é possível aprender, desaprender e reaprender a cada vez que se liga um projetor contra uma telona ou um quadro branco, ou bem quando flagramos ou forjamos o real com uma câmera ou montamos imagens e sons para construir sentidos e inventar mundos. (FRESQUET, 2010, p. 210).
Desta maneira, produzir experiências de iniciação ao cinema e apresentar algumas regras do jogo negociadas com o grupo emerge como um desafio para construir colaborativamente caminhos que só conhecemos no processo - e que, ao mesmo tempo, enfatizam, como condição política da educação, a necessidade de estabelecer práticas pedagógicas que rompam com as relações hierarquizadoras entre os saberes:
No sentido paradoxal, a experiência de colocar alguns limites como “regras do jogo” para a criação tem produzido uma diversificação maior dos processos e dos produtos analisados, tanto dos ensaios e exercícios audiovisuais dos professores como dos estudantes. (FRESQUET, 2014, p. 73).
Interessa-nos, como produção de pesquisa no campo da educação, uma centralidade em relação aos processos, já que estes também permitem deslocar as dimensões em torno do currículo de uma visão instrumentalizada/instrumentalizadora em torno do trabalho da educação (GOMES; GONÇALVES, 2015). Assim, todo o processo até a produção dos filmes que emergem desses encontros é que provocam a emergência de experiências e reflexões de um currículo inventado entre nós, ponto de partida para as investigações apresentadas no artigo.
Ao conceber os gestos educativos como movimentos de criação, de resistência e de emancipação, valemo-nos do cinema no espaço educativo, dentro e/ou fora da escola, como uma alternativa para essa construção. Assim, procuramos nos distanciar de uma dimensão instrumentalizada e meramente técnica sobre o cinema e o audiovisual, inventando possibilidades práticas para a produção de conhecimento escolar, levando-se em conta e valorizando o processo de criação dos filmes, e não os filmes como produtos em si.
3 O CINEMA NA PERSPECTIVA DA IGUALDADE DE INTELIGÊNCIAS: ALGUMAS POSSÍVEIS CONSTRUÇÕES DE UM “COMUM” PARA PRODUÇÕES CURRICULARES
Em sua obra intitulada “O Espectador Emancipado” (2012), Jacques Rancière constrói uma crítica sobre a estética, na qual proporciona um período compreendido entre a separação das formas sensíveis de produção da arte e os seus efeitos nas formas sensíveis de recepção. Orientada por uma mudança de ordem política, o autor abandona a divisão da sociedade em grupos destinados à obediência. A dimensão política sobre a estética, apresentada pelo filósofo, parte da necessidade de reconfigurar esta ordenação, sendo possível expandir novos modos de ver, ouvir e sentir. Amplia, desta maneira, as suas discussões que transgridem a dimensão hierarquizadora entre os indivíduos, na qual supostamente existiriam homens de inteligência ativa e que, por esta condição, dominam outros.
A dimensão em relação ao trabalho da educação (GOMES; GONÇALVES, 2015) reverbera discussões sobre a importância do distanciamento da Educação de um caráter produtivista, que se volta, em geral, somente aos chamados “resultados” educacionais, gerando determinados índices e indicadores de “eficiência”, sem considerar os diversificados processos que envolvem as especificidades de cada gesto educativo. Esta dimensão situa tanto a prática educativa como a de pesquisa no campo da educação como “[...] gestos de criação, de abertura ao mundo e aos outros - a outras linguagens e pessoas - e não como trabalho burocrático, executivo e produtivo” (GOMES; GONÇALVES, 2015, p. 41). Assim, os processos de criação de pesquisa que temos experimentado se caracterizam por perseguir as pistas que vão surgindo de práticas pedagógicas diversificadas.
Ao longo das práticas educativas do REALIZACINE, buscamos valorizar o processo, e não os resultados (“produtos”) em torno das práticas pedagógicas investigadas. Dessa forma, as reflexões trazidas pelas autoras supracitadas, em relação ao contexto desta investigação, inspira-nos a prática de exercícios de criação com o cinema, como alternativa para inverter a lógica do sistema explicador no contexto escolar. Circunstâncias que suscitam, inclusive, reflexões sobre o nosso próprio papel como trabalhadores da educação, o que nos inclui, também, como sujeitos da investigação.
Larrosa (2002, p. 20) observa que é de costume “pensar a educação do ponto de vista da relação entre ciência e técnica ou do ponto de vista da relação entre teoria e prática”. Entretanto, no campo educacional, o autor propõe que pensemos a partir de uma terceira possibilidade, mais existencial e estética, a partir do par experiência/sentido.
O autor conceitua a experiência como algo singular e irrepetível, na qual o saber não se coloca fora do sujeito. O cinema como processo educativo, nesta perspectiva, assume uma função de criação, o que permite, justamente por esta condição, criar artefatos singulares e irrepetíveis relacionados à própria prática pedagógica. Assim, todo o processo até a produção dos filmes que emergem desses encontros é o que provoca a emergência de experiências e reflexões de um currículo inventado entre o Nós. E que emerge como ponto de partida para as investigações apresentadas no artigo.
O ponto de partida se concentra na prática pedagógica em que a função do “mestre” seja desempenhada por cada estudante, ação que se caracteriza pelo encorajamento de que cada um use a sua própria inteligência como condição para criar seus próprios filmes, correndo alguns riscos. Como característica do próprio do processo educativo, tal liberdade possibilitaria que cada um deles se sinta instigado a aprender sobre algo. Assim, exercícios de iniciação ao cinema (BERGALA, 2008; FRESQUET, 2013a, 2014), embora apresentem algumas regras do jogo, reverberam em possibilidades para uma educação que potencialize os gestos de emancipação intelectual (RANCIÈRE, 2002) entre os sujeitos envolvidos. Inspiradas no trabalho de Alain Bergala9, algumas experiências nesse sentido vêm sendo produzidas, (re)inventadas e partilhadas ao longo dos últimos anos , corroborando o entendimento da importância da entrada do cinema em escolas públicas como gesto de criação e alteridade.
Em relação à questão curricular, Carmem Teresa Gabriel (2013), ao discutir as relações entre cinema-educação-currículo-cultura, apresenta uma perspectiva na qual privilegia a ideia de “formação do sujeito imerso no processo de escolarização da educação básica” (p. 20), no qual discute “os sentidos de escola, currículo e cinema, evidenciando as imbricações entre o jogo político e o jogo da linguagem” (GABRIEL, 2013), defendendo um sentido político de cultura na definição de currículo. Isso significa, segundo a autora, propor uma outra leitura política do cultural no campo do currículo e que se afasta de perspectivas que insistem em significar cultura de forma coisificada, associada discursivamente aos objetos de ensino (GABRIEL, 2013). Nesse sentido, a autora problematiza algumas questões que nos interessam, ao relacionar cinema e educação como possibilidades de produção de subjetividades, em meio às experiências vivenciadas na educação básica:
Como pensar os efeitos da entrada na escola da linguagem cinematográfica, nesses processos de subjetivação? Que impactos na cultura cinematográfica, quando essa é inserida na cultura escolar? Que implicações para a definição de “cinema” ou “currículo escolar” podem ser identificadas no momento em que ambos os termos se articulam para definir o sentido de “formação na educação básica? [sic]. (GABRIEL, 2013, p. 20).
Nas duas escolas, no encontro com os estudantes, foi perceptível a curiosidade das crianças em relação a nossa presença. Possivelmente “tramando” o que esses “personagens” adultos, “diferentes” daqueles que habitualmente frequentam aqueles espaços escolares, estariam fazendo ali. Situação que, a nosso ver, despertou a atenção dos estudantes logo na nossa entrada, nas salas de aula, a fim de fazer o convite para a experiência. A primeira pergunta que fizemos - “Quem aqui já viu um filme?” - foi seguida pela resposta positiva e entusiasmada de todas as crianças presentes nas turmas. Gancho para a pergunta seguinte - “Mas quem aqui já fez um filme?” -, questionamento que revelou um tom de surpresa por parte das crianças. O silêncio e a expressão de curiosidade revelavam uma resposta negativa que entoava um certo ar de questionamento por parte delas - “Mas como assim fazer um filme?”.
Assim, procuramos apresentar e desenvolver possibilidades de despertar a vontade de aprender cinema com o cinema, ou seja, assistindo e fazendo cinema. Isto se deu apoiando-nos nas reflexões que Jacques Rancière elabora sobre o método de igualdade de inteligências, sobre o qual afirma que “[...] esse método da igualdade era, antes de mais nada, um método da vontade. Podia-se aprender sozinho, e sem mestre explicador, quando se queria, pela tensão do próprio desejo ou pelas contingências da situação” (RANCIÈRE, 2002, p. 30). Assim, o trabalho da educação praticado pelo REALIZACINE busca desenvolver propostas artísticas, culturais e pedagógicas centradas nos gestos de ver e fazer filmes como práticas educativas, além de exibir os filmes produzidos nos contextos supracitados, para os seus próprios criadores, como gesto afirmativo de criação e difusão cinematográfica.
4 REFLEXÕES SOBRE VER FILMES COMO GESTO EDUCATIVO
As oficinas foram iniciadas com a exibição de filmes e o propósito de introduzir diferentes apelos e abordagens estéticas para as crianças, representando o ponto de partida das práticas pedagógicas e um primeiro encontro com uma cinematografia diferente da habitualmente conhecida pelas crianças. Esse momento da prática nomeamos por Exibição de Referências. Nesta proposta, cada Vista Lumière é exibida três vezes. Na primeira, de maneira mais espontânea, com o propósito de gerar uma curiosidade inicial sobre aquilo que se vê e ouve nos filmes. Na segunda, de provocar a atenção dos estudantes para aquilo que não foi visto na exibição anterior. E a terceira, como uma abertura à criação, procurando exercitar a imaginação para que cada participante relate o que faria de diferente no filme.
Rancière (2012), sobre a condição de espectador, tece uma crítica à possibilidade de calcular o efeito de um espetáculo sobre aqueles/as que o recebem: para o autor, a política da arte deve levar em consideração os efeitos estéticos dessa arte. Assim, a escolha de filmes para exibir como gesto educativo nos desafia a cumprir este papel em alguma medida. Para além disso, a noção de igualdade de inteligências, proposta pelo autor e comentada anteriormente, funciona como inspiração ao exercício de nossa prática educativa, representando a possibilidade de uma partilha entre nós, ao passo que a importância do educador se revela justamente pelas escolhas daquilo que se dá a ver e ouvir, como gesto de partilhar os filmes.
Numa experiência com cinema, a escolha dos filmes como referência/inspiração representa uma das responsabilidades do educador, as quais, ao mesmo tempo que são carregadas de intencionalidade, produzem situações inesperadas que fogem de nosso controle, movendo o currículo a caminhos desconhecidos. Circunstância que, ao ser compreendida como experiência construída no coletivo e nas relações, apresenta uma dimensão curricular centrada na valorização do processo como intrínseco ao trabalho da educação. Exige, pois, um olhar atento às relações, aos sentidos que tensionam práticas comuns a determinado grupo e dos gestos de criação implicados nas práticas educativas. Nesse sentido, o trabalho da educação parte de uma condição que se situa entre a pluralidade e a singularidade, tendo em vista que:
Educar também exige e estabelece uma certa pluralidade - mostrando a diferença entre as pessoas presentes, tanto como evidenciando as semelhanças que subjazem à compreensão. Educar constitui um espaço de aparição; é um espaço controlado de aparição, é um espaço encenado em que cada um desempenha um papel, sendo um processo irrepetível, e cujos resultados são imprevisíveis. (GOMES; GONÇALVES, 2015, p. 29-30).
Procuramos tensionar a criatividade dos envolvidos para esse exercício de imaginação com as seguintes perguntas: (1) “O que vocês fariam diferente?”; (2) “Onde posicionariam a câmera se estivessem filmando?”; (3) “Quando vocês começariam a filmar?”. Tais questionamentos provocaram nas crianças o interesse por fazer os seus filmes, revelando-se como uma possibilidade real de fazer, que, ainda, quase que despretensiosamente, apresenta um gesto imprescindível para a criação cinematográfica: a tomada de decisões. Movimento este experimentado na exibição de outras 5 Vistas Lumière.
Portanto, ao partir da afirmativa de que educar é um ato irrepetível, argumentamos que, a cada exibição em contexto educativo, diferentes possibilidades de produção curricular se constroem no interior do próprio processo. Dito de outro modo, ao estarmos diante da mesma tela, do mesmo filme, distintas possibilidades curriculares se (re)configuram a cada situação de ver filmes em cada contexto. Daí a importância em observar os sujeitos implicados nas relações e as situações que vão acontecendo a partir das práticas pedagógicas, já que a nova dinâmica se coloca como condição e possibilidade de romper com as dinâmicas tradicionais da escola. Em última instância, essa dinâmica pode ser compreendida como um convite a que cada um venha a opinar, a questionar, a se permitir experimentar, imaginar, fazer suas próprias escolhas.
Partilhamos da perspectiva segundo a qual as exibições de obras audiovisuais no contexto educativo “tendem a posicionar o aluno não apenas como aprendiz, mas também como espectador” (REZENDE FILHO, 2015, p. 145). A essa condição de espectatorialidade, vale enfatizar, relaciona-se a possibilidade do uso de obras fílmicas para o intercâmbio de experiências de vida, imersas nas relações entre os espectadores e as obras fílmicas, e que estão para além do espaço educativo. A presença do cinema e do audiovisual, portanto:
Traz para o espaço escolar experiências de ordem social, estética e cultural, adquiridas fora da escola e balizadas por valores que não estão sob o controle do professor, e que, normalmente, não são de seu conhecimento. Essas experiências expressam preferências, escolhas, expectativas e motivações que atuam como mediadores nos processos de ensino-aprendizagem com obras audiovisuais. (REZENDE FILHO et al., 2015, p. 111).
Procurou-se, com as práticas educativas realizadas, subverter esta lógica, partindo de escolhas, e instigar a curiosidade das crianças, a fim de que fossem implicados movimentos a outras formas de fruição e atenção dos estudantes no contato com o objeto fílmico, apresentando, inclusive, as especificidades das primeiras produções e o desafio representado na ocasião. Buscaram-se, nesse sentido, outras possibilidades estéticas e narrativas para os estudantes, ampliando, deste modo, o acesso a novos e diferentes referenciais artísticos e estéticos.
5 REFLEXÕES SOBRE FAZER FILMES COMO GESTO EDUCATIVO
No momento seguinte da prática, isto é, a passagem ao ato, partimos para uma prática de criação. Nela, organizamos a saída de duas duplas10, que, mediadas, cada uma por um membro da equipe do REALIZACINE, partiriam para filmar nos espaços da escola. Ao longo da proposta prática, as demais crianças permaneciam em sala/auditório assistindo aos filmes disponibilizados, também mediadas por ao menos uma pessoa da equipe, em articulação com o trabalho das professoras regentes.
Ao longo do exercício de criar os filmes, o que observamos foi a necessidade de favorecer movimentos de atenção, de modo que houvesse um primeiro exercício de observar e ouvir a escola, como um ensaio para a criação dos filmes, este sem o uso da câmera e demarcado pelo gesto de enquadrar com os dedos. Esta prática se configura como uma brincadeira de olhar entre os dedos, mas que é capaz de direcionar a atenção para que se observe pelo ponto de vista da criação cinematográfica. Enfatizamos que possibilitar algum tempo livre para observar o espaço da própria escola antes de filmar foi um exercício fundamental para perceber e construir relações outras com o espaço escolar - conjunto de ações que circunstanciam no conjunto de tomadas de decisões pelos estudantes e revelam marcas autorais de seus gestos de criação, ao produzir filmes de um minuto.
Ao conceber a pesquisa educacional como gesto de criação, isto é, uma experiência que se dá pela prática, no encontro com os sujeitos que dela fazem parte, sem que haja necessariamente um método definido a priori, interessa-nos refletir sobre o fazimento de filmes, também, como uma possibilidade curricular a ser explorada. Não pelos filmes, materializados em si, mas pelas condições de criá-los, levando-se em conta as escolhas empregadas e as especificidades implicadas em fazer os filmes.
De acordo com Gabriel (2013), as experiências com a linguagem cinematográfica, sob uma perspectiva de igualdade e de criação, representam possibilidades para o exercício da horizontalidade nas relações educativas e, portanto, nos fazeres curriculares. A autora descreve o papel de tais práticas como possibilidades para “[...] deslocar o foco dos sujeitos que ensinam e aprendem, para os sujeitos que se constituem no processo de aprendizagem em meio às relações que estabelecem com o conhecimento” (GABRIEL, 2013, p. 25).
Tendo isso em vista, podemos afirmar que é na prática educativa que está implicado o nosso papel político, de mediar e negociar as regras de um jogo inventado, comum a determinado grupo, e que aposta, como condição inicial, a igualdade entre os sujeitos. Como parte do processo pedagógico, o trabalho da educação exige um olhar atento às relações, aos sentidos que tensionam práticas comuns elaboradas com determinados grupos e dos gestos de criação implicados nas práticas educativas.
Assim, há um processo de tomada de decisões sobre onde e como filmar, e que revela algo do encontro entre diferentes subjetividades nas relações de ver e fazer filmes no espaço educativo. Destacamos uma das características em torno da produção dos filmes das crianças que revela a (re)apropriação dos espaços da escola como locações cinematográficas, produzindo sentidos outros nas relações com e entre os seus sujeitos com a escola. É essa condição que procuramos valorizar: o processo e não os resultados (“produtos”) em torno das práticas pedagógicas investigadas. Destas experiências e práticas, surgiram inúmeras reflexões coletivas junto à comunidade escolar sobre a própria escola.
Ao apresentar os mesmos exercícios de criação de filmes, o que se percebem são caminhos completamente plurais sobre os gestos de criação, materializados em escolhas, por exemplo, sobre em quais lugares da escola filmar. Desta maneira, foram produzidos Minutos Lumière nos corredores, no pátio, em salas de aula, no refeitório, na cozinha, apresentando diferentes ângulos de câmera e gestos de criação empregados.
Portanto, desde a infância manusear equipamentos de cinema e ter o encontro com exercícios relacionados à linguagem cinematográfica - de materializar a memória de um retorno às aulas em meio à pandemia - é uma possibilidade curricular a ser explorada de forma criativa, inventiva, além de criar “condições de tempo e meios” (FRESQUET, 2013a, p. 22) para relacionar criação cinematográfica como produção de conhecimento escolar.
6 REFLEXÕES SOBRE EXIBIR FILMES PRODUZIDOS NA ESCOLA COMO GESTO EDUCATIVO
A exibição das produções fílmicas realizadas nas oficinas representa uma alternativa para o compartilhamento coletivo da expressão das subjetividades envolvidas, a qual reflete diretamente na ampliação de repertórios e referenciais artísticos nos espaços educativos, como gesto colaborativo e compartilhável das escolhas individuais de cada estudante. Embora represente uma espécie de culminância, ao representar uma espécie de “desfecho” da prática, abrem-se inúmeras possibilidades de construir outros caminhos pedagógicos, representando, inclusive, algumas possibilidades de articulações com o currículo formal vigente.
[...] um saber particular, subjetivo, relativo, contingente, pessoal. Se a experiência não é o que acontece, mas o que nos acontece, duas pessoas, ainda que enfrentem o mesmo acontecimento, não fazem a mesma experiência. O acontecimento é comum, mas a experiência é para cada qual sua, singular e de alguma maneira impossível de ser repetida. [...]. Por isso, também o saber da experiência não pode beneficiar-se de qualquer alforria, quer dizer, ninguém pode aprender da experiência de outro, a menos que essa experiência seja de algum modo revivida e tornada própria. (LARROSA, 2002, p. 27).
Em maio de 2023, retornamos às escolas para exibir os filmes produzidos nas oficinas. A comunidade escolar assistiu às produções fílmicas das crianças durante a exibição, foram duas sessões com basicamente umas 100 crianças em cada uma que lotaram os auditórios das escolas. A situação mais marcante foi em torno dos personagens dos filmes se reconhecendo e reconhecendo seus professores. O público ficou muito empolgado pelos filmes, todos produzidos por crianças e que retratam algo do cotidiano da retomada das aulas, ainda em 2022.
Assim, a própria exibição de filmes, nesses cenários e contextos, diversifica as possibilidades curriculares e investigativas, ampliando os possíveis modos de leituras em torno dos próprios filmes produzidos pelos estudantes. Portanto, a cada nova experiência de exibição dos filmes, observamos um movimento singular em que é possível perceber algo novo, que tende a se diversificar, ao levar em consideração, por exemplo, o contexto de exibição das obras audiovisuais, elencando, por exemplo, fatores como: a audiência (ou o público para qual exibimos), os modos de exibição e a estrutura para a exibição.
Em nossas experiências nas escolas de Santa Cruz, numa condição de oficina, com alguns poucos encontros (o que se difere da condição de ser professor de determinado grupo), a presença do cinema e do audiovisual pressupõe características que estão além do controle do educador e que, em geral, não são de seu conhecimento. Ainda assim, é possível perceber um conjunto de fatores que apresentam consequências sobre o enriquecimento estético em torno das possibilidades de observar o próprio cotidiano, refletir e intervir sobre ele.
7 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo procurou estabelecer um diálogo entre o cinema e a educação, introduzindo algumas discussões em torno dos interesses de produção de sentidos de escola e de currículo. Assim, nós nos propusemos a tecer algumas considerações sobre as relações entre as práticas pedagógicas com o cinema, como alternativas para a horizontalidade nas relações entre estudantes e professores na contemporaneidade. Cabe a nós, por exemplo, explorar as potencialidades dessas articulações como condição para criar outras formas de produção de subjetividades com e entre crianças e adultos implicados no processo escolar.
Neste estudo, um dos exemplos da horizontalidade das experiências pedagógicas com o cinema esteve associado às regras do jogo, na experiência com estudantes ao longo do processo de realização das práticas, como algo comum e construído entre Nós. Isso representa interessantes alternativas para a invenção e a expressão dos estudantes, materializadas nos gestos de criação com o exercício do Minuto Lumière, ao mesmo tempo que se singularizam no processo de tomada de decisões de cada sujeito e que estão relacionadas às escolhas do que filmar, como filmar e, ainda, atravessadas pelas diversas circunstâncias inesperadas.
Essas possibilidades nos levaram, também, a (re)pensar a função do “mestre”, que, nesta perspectiva, caracteriza-se pelo encorajamento de que cada estudante use de sua própria inteligência, cuja dinâmica se deu na parceria do trabalho em conjunto de professores e estudantes, correndo riscos que representam as circunstâncias que são inerentes ao processo educativo. Experiência que, para os sujeitos envolvidos, possibilita diferentes maneiras de aprender sobre algo novo, estabelecendo um estrito diálogo entre experiência e conhecimento escolar. Desta maneira, a presença do cinema na escola, sob uma perspectiva artística, de abertura aos processos de criação, representa como principal função política a de que todos os envolvidos possam experimentar iguais condições para fazer seus filmes.
O REALIZACINE, como projeto artístico-cultural-pedagógico, busca alternativas para que o cinema seja distribuído democraticamente no espaço escolar, como bem cultural. E por que não como possibilidade de produzir conhecimento escolar? Circunstância esta que, no campo curricular, representa uma singela contribuição para a socialização dos filmes e de formas de produção tão desigualmente distribuídas em nossa sociedade. No espaço escolar, o cinema relacionado ao currículo representa uma alternativa para produzir sentidos que envolvem as múltiplas subjetividades. Desta maneira, compreendemos a possibilidade de explorar as práticas de ver e fazer filmes, relacionando-as às subjetividades no processo de construção e de distribuição do conhecimento escolar.
Nesse sentido, o REALIZACINE, como projeto artístico-cultural que relaciona cinema e educação, busca propor uma reflexão sobre as relações educativas com crianças do bairro de Santa Cruz a partir de suas práticas pedagógicas, entendendo que cada criança é um indivíduo único. Igualmente, buscamos provocar e refletir sobre a relação que cada criança tem com a escola, que se materializam nessas experiências pela escolha de alguns espaços escolares como locação para produzir seus filmes, conforme comentado anteriormente - aspecto este carregado pelas suas subjetividades e significados ao longo do processo de fazer e exibir seus filmes.
Nesse sentido, as práticas com o cinema na escola extrapolam as relações curriculares quando representam a comunidade local nas imagens, pela produção de seus próprios sujeitos, criando uma relação na qual a escola, como palco de uma experiência audiovisual, possibilita diferentes experiências pela expressão da linguagem. Portanto, é possível apresentar uma lógica de horizontalidade entre os envolvidos, enquanto prática comum, como condição para uma produção de currículo.