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Revista Brasileira de Política e Administração da Educação

versão impressa ISSN 1678-166Xversão On-line ISSN 2447-4193

Revista Brasileira de Política e Administração da Educação vol.37 no.3 Goiânia set./dez 2021  Epub 15-Mar-2022

https://doi.org/10.21573/vol37n32021.111082 

ARTIGOS

Planos de Gestão Escolar: contradições e disputas na nova política de governança das escolas públicas estaduais de Santa Catarina

School Management Plans: contradictions and disputes in the new governance policy of state public schools in Santa Catarina

Planes de Gestión Escolar: contradicciones y disputas en la nueva política de gobernanza de las escuelas públicas estatales de Santa Catarina

1 Universidade Federal do Paraná Programa de Pós-Graduação em Educação Faculdade de Educação Curitiba , PR , Brasil

2 Universidade Federal da Fronteira Sul Programa de Pós-Graduação em Educação Faculdade de Educação Chapecó , SC , Brasil


Resumo

O artigo problematiza a adoção dos Planos de Gestão Escolar (PGEs), que versam sobre a nova forma de escolha do gestor e estratégia de governança das escolas públicas estaduais catarinenses, instituídos a partir de 2013, identificando as contradições e disputas que permearam sua implementação. Trata-se de pesquisa qualitativa, do tipo explicativa, realizada a partir de estudo bibliográfico e documental; os dados foram submetidos às técnicas da Análise de Conteúdo, de Bardin (2016). Evidenciou-se que, apesar da anunciação dos PGEs como instrumentos de gestão democrática, sua origem e operacionalização estão alinhadas às reformas neoliberais, que concebem a educação como um instrumento de dominação e não de emancipação humana.

Palavras-Chave: Políticas educacionais; Governança; Planos de Gestão Escolar

Abstract

The article questions the adoption of School Management Plans (SMPs), the new way of choosing Santa Catarina state public schools’ principal and governance strategy since 2013, identifying the contradictions and disputes that permeated its implementation. It is a qualitative research, of the explanatory type, carried out from a bibliographic and documentary study, the data were submitted to the techniques of Content Analysis (Bardin, 2016). It became evident that, despite the announcement of the SMPs as instruments of democratic management, their origin and operationalization are in line with neoliberal reforms, which conceive of education as an instrument of domination and not of human emancipation.

Key words: Educational policies; Governance; School Management Plans

Resumen

El artículo problematiza la adopción de Planes de Gestión Escolar (PGEs), que versan sobre la nueva forma de elegir el gestor y estrategia de gobernanza de las escuelas públicas del estado de Santa Catarina, adoptados desde 2013, identificando las contradicciones y disputas que permearon su implementación. Es una investigación cualitativa, del tipo explicativa, realizada a partir de estudio bibliográfico y documental; los datos fueron sometidos a las técnicas de Análisis de Contenido de Bardin (2016). Se hizo evidente que, a pesar del anuncio de los PGE como instrumentos de gestión democrática, su origen y operacionalización están alineadas a las reformas neoliberales, que conciben la educación como un instrumento de dominación y no de emancipación humana.

Palabras-clave: Políticas educativas; Gobernanza; Planes de Gestión Escolar

INTRODUÇÃO

A partir de 2013, a Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina (SED/SC) anunciou um novo modelo de escolha do gestor e estratégia de governança a ser implementada nas escolas que integram a rede pública estadual. A assunção à função de dirigente escolar passou a acontecer por meio da escolha de um Plano de Gestão Escolar (PGE) 1 , proclamado como possibilitador da gestão democrática. Esse documento propõe metas, estratégias, ações e objetivos à escola no período de vigência preestabelecido, bem como os responsáveis pela sua execução. Essa mudança ocorreu via Decreto Governamental n. 1794/2013 ( SANTA CATARINA, 2013 ).

Apesar dos avanços na legislação nacional, que garantiu a gestão democrática como princípio da gestão das escolas públicas brasileiras, com destaque para a Constituição Federal de 1988 ( BRASIL, 1988 ); Lei de Diretrizes e Bases (LDB) n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996 ( BRASIL, 1996 ); Plano Nacional de Educação em suas diferentes versões ( BRASIL, 2001 , 2014 ); Santa Catarina ainda utilizava a livre indicação como meio/forma de escolha dos dirigentes escolares. A indicação é apontada por Paro (2011) como uma das formas menos democráticas de escolha, não apresenta base técnica de sustentação, orienta-se pelo critério político-partidário e favorece o clientelismo político. A manutenção dessa forma de escolha até o ano de 2013 decorre das disputas entre os educadores, sua entidade representativa e o governo estadual. Todavia, os PGEs proclamados como instrumentos de gestão democrática foram instituídos por decreto, sua origem e operacionalização estão alinhadas às reformas neoliberais, que concebem a educação como um instrumento de dominação e não de emancipação humana.

Diante desse contexto, o objetivo deste artigo 2 é problematizar a adoção dos Planos de Gestão Escolar (PGEs), a nova forma de escolha do gestor e estratégia de governança das escolas públicas estaduais catarinenses, instituídos a partir de 2013, identificando as contradições e disputas que permearam sua implementação. Será destacada a possível origem dos PGEs, sua estrutura e base legal. Buscou-se focalizar como ocorreu a participação dos diferentes atores e segmentos escolares na conformação e implementação do novo modelo. Pretende-se, assim, problematizar em que medida os PGEs podem ser assumidos e apresentados como parte constituinte da democratização da escola, considerando que seu destino se conforma a partir de efetiva participação da comunidade.

O recorte histórico compreende os anos entre 2013 e 2019, sendo que o primeiro ano corresponde ao anúncio da nova política pela Secretaria de Estado da Educação e 2019 ao ano que se encerrou o segundo mandato dos PGEs como orientadores da gestão das escolas públicas estaduais em Santa Catarina. Embora a análise apresente considerações do período supracitados, serão focalizados os PGES (2016-2019) 3 . Os documentos analisados podem ser observados no quadro a seguir:

Quadro 1 Documentos referência para o estudo 

Documento Autoria Ano
Relatório: Avaliações de Políticas Nacionais de Educação: Estado de Santa Catarina, Brasil (OCDE) OCDE 2010
Relatório: Proposição de novos rumos para a qualidade da educação em Santa Catarina (CEE/SC) CEE/SC 2012
Decreto n. 1.794 e suas alterações Santa Catarina 2013
Portaria n. 01 Secretaria de Estado da Educação /SC 2014
Edital n. 07 Secretaria de Estado da Educação /SC 2014
Reportagem: Transição para eleição de diretores em SC começa nas escolas estaduais Diário Catarinense 2014
Portaria n. 024 Secretaria de Estado da Educação /SC 2015
Edital n. 016 Secretaria de Estado da Educação /SC 2015
Edital n. 021 Secretaria de Estado da Educação /SC 2015
Edital n. 023 Secretaria de Estado da Educação /SC 2015
Plano Estadual de Educação (2015-2024) Secretaria de Estado da Educação /SC 2015
Boletim n. 22 Sinte SC 2013
Notícia: Gestão Antidemocrática: Professores Grevistas são impedidos de disputar a eleição de diretores Sinte SC 2015a
Notícia: SINTE garante na justiça participação de grevistas no Plano de Gestão Sinte SC 2015
Decreto n. 194 Santa Catarina 2019
Portaria n. 1434 Secretaria de Estado da Educação /SC 2019

Fonte: elaborado pelos autores com base nos dados da pesquisa, 2020.

O artigo é resultado de pesquisa qualitativa, do tipo explicativa, realizada a partir de estudo bibliográfico e documental. Os documentos foram selecionados a partir das regras propostas pela Análise de Conteúdo (AC): regra da exaustividade, representatividade, homogeneidade e pertinência ( BARDIN, 2016 ). Conforme a autora, diferentes documentos e objetivos dos investigadores podem ser submetidos às técnicas da AC, que visam, em linhas gerais, evidenciar conteúdos latentes, indiretos, mensagens que podem estar por detrás do que foi escrito ( BARDIN, 2016 ). Dentre as técnicas que compõem a AC, utilizou-se a análise temática ou categorial, que permitiu evidenciar as contradições e disputas que permearam a implementação dos PGEs. Em relação ao aporte teórico, foram selecionados artigos e livros, que se constituíram em substrato importante para a compreensão do objeto de estudo, leitura e análise dos documentos e explicação do fenômeno em questão, que diz respeito ao novo modelo de governança, que, ao adentrar a administração pública, tem sido reverberado para a gestão da educação e da escola.

Parte-se do pressuposto de que a adoção dos PGEs pode ser entendida como parte integrante dos processos mais amplos de racionalização, burocratização e especialização a que as políticas sociais brasileiras, de modo geral, e as políticas públicas de educação, de modo específico, vêm sendo submetidas por intermédio da atuação de organismos multilaterais internacionais, no âmbito deste artigo caracterizado como agentes hegemônicos mundiais, visando à reprodução do modo capitalista de produção e a hegemonia neoliberal. No que diz respeito aos PGEs e à política educacional catarinense, a OCDE tem papel determinante, constituindo-se em importante think tank que influenciou a formulação da política. Portanto, a adoção dos PGEs integra um conjunto de estratégias mais amplas, que, em um contexto de reformas realizadas no âmbito do Estado, introduziram novos elementos na gestão da educação e da escola, os quais integram os pressupostos da Nova Gestão Pública (NGP) e da Nova Governança Pública, que têm sido propagados a partir de 1990 com o avanço do ideário neoliberal como fonte filosófico-ideológica orientadora das políticas educacionais.

No que diz respeito à organização do artigo, na primeira parte se situam e se discutem os principais modelos que predominaram na administração pública desde os anos de 1970, a partir do avanço neoliberal, e como esses trazem repercussões para a gestão democrática, utilizando como referência autores do campo da gestão educacional. Em seguida, destacam-se a origem e a estrutura dos PGEs, anunciados e propagados como possibilitadores de uma gestão democrática. Também se analisam as contradições e disputas evidenciadas na implementação do novo modelo ao longo de suas diferentes fases. Nas seções e subseções que seguem, são examinados e detalhados esses aspectos.

NOVAS FORMAS E MANEIRAS DE GOVERNAR: REPERCUSSÕES PARA A GESTÃO DEMOCRÁTICA DA ESCOLA PÚBLICA

Conforme Dale (2010 , p. 1100), ao longo de sua história “[...] o capitalismo não conseguia providenciar suas condições de existência extraeconômicas com os próprios recursos e, portanto, precisava do Estado para isso.” Desse modo, o Estado por meio de seus aparatos, dentre eles a educação, contribui para a resolução de questões centrais para o desenvolvimento do capitalismo, que são: “[...] garantir uma infraestrutura para a acumulação contínua e o desenvolvimento econômico, tal como a disponibilização de uma mão de obra diversamente qualificada; assegurar um nível de ordem e coesão sociais; legitimar as desigualdades inerentes ao sistema.” ( DALE, 2010 , p. 1100).

Nos tempos atuais, marcados pelas transformações no âmbito do Estado que visam atender aos propósitos capitalistas, explicitados por Dale (2010) , tem-se presenciado o recrudescimento de práticas e vocábulos. Muitos deles aparecem associados a prefixos ou precedidos por palavras, como novo e nova, a exemplo dos termos: neoliberalismo, nova gestão pública e nova governança pública. A proliferação desses vocábulos denota a complexidade da sociedade que se configura no final do século XX e início do século XXI. São palavras cujos significados se apresentam de forma polissêmica e multifacetada. Para entender esses termos se faz necessário observar sua origem, pressupostos e a forma como passam a integrar o âmbito do Estado e modificar a administração pública, bem como as formas de gestão da educação e da escola.

Essas transformações iniciaram-se após a crise do Estado providência, ou Estado do bem-estar social ( Welfare State ) nos anos de 1970, no qual predominou o modelo de administração pública burocrática ( OSBORNE, 2006 ). É nesse contexto que surge o neoliberalismo. Conforme Dardot e Laval (2016 , p. 7), “[...] o neoliberalismo não é apenas uma ideologia, um tipo de política econômica. É um sistema normativo que ampliou sua influência ao mundo inteiro, estendendo a lógica do capital a todas as relações sociais e a todas as esferas da vida.” As formas de gerir o público passaram por grandes mudanças, com o avanço do neoliberalismo. A partir de então, os modelos de administração pública foram redefinidos com base em ideias e concepções que têm suas ações pautadas em um modelo racional científico, o qual assume uma nova configuração, de acordo com as necessidades da economia e as razões do mercado.

Nessa perspectiva, Osborne (2006) destaca a existência de três paradigmas no âmbito da administração pública: 1) Administração Pública Burocrática, que predominou por quase um século, do final do século XIX até o final dos anos de 1970 e início dos anos de 1980; 2) Nova Gestão Pública ( New Public Management ), dos anos 1980 até o início do século XXI; e 3) Nova Governança Pública ( New Public Governance ), que emergiu no século XXI. Para o autor, a NGP foi apenas um momento transitório entre a Administração Pública Burocrática e a Nova Governança Pública ( OSBORNE, 2006 ). Todavia, alerta para o fato de que, na sua materialização, os diferentes modelos, seus elementos e estágios se sobrepõem e coexistem, de forma que podem ser observados elementos dos diferentes modelos em uma mesma organização.

A Nova Gestão Pública (NGP) “[...] remete-nos para um pacote de reformas que, uma vez iniciadas no Reino Unido, proliferaram para vários países e continentes.” ( SILVESTRE, 2019 , p. 33). Essas reformas estão atreladas ao neoliberalismo e sua atuação no e por meio do Estado, que tem papel decisivo na definição de limites para o mercado, ao mesmo tempo que cria condições para que ele possa florescer e se expandir ( BALL, 2020 ). O discurso dos reformistas pautou- se no pressuposto de que a “[...] produção realizada pelas organizações do setor público é ineficiente e daí que seja preferível que as organizações do setor privado possam executar tais serviços. Para a adoção dessa assunção muito contribuíram as ideias da Escolha Pública.” ( SILVESTRE, 2019 , p. 35). As reformas propunham a privatização dos serviços públicos em suas diferentes formas e a contratualização de serviços públicos que passaram a ser operacionalizados por atores privados. Segundo Ball (2020 , p. 65), em um contexto de reforma neoliberal, “O setor privado é o modelo a ser emulado, e o setor público deve ser ‘empreendido’ à sua imagem.” Todavia, as reformas e medidas adotadas em diferentes contextos não produziram os efeitos que prometiam, não melhoraram a eficácia, tampouco diminuíram os gastos do setor público ( SILVESTRE, 2019 ).

Ao sintetizar as distinções e similitudes entre os modelos organizacionais no que diz respeito ao tratamento do cidadão, Secchi (2009) aponta que, no modelo burocrático, o cidadão é concebido como um usuário, já nos modelos de administração pública gerencial (APG) e governo empreendedor (GE), correspondentes à NGP, proposta por Osborne (2006) , o cidadão é tratado como um cliente. Por fim, na perspectiva da governança pública (GP) ou Nova Governança Pública ( OSBORNE, 2006 ), “[...] os cidadãos e outras organizações são chamados de parceiros ou stakeholders , com os quais a esfera pública constrói modelos horizontais de relacionamento e coordenação.” ( SECCHI, 2009 , p. 363).

Embora não haja consenso quanto às origens, concepções e definições de governança pública, é possível apontar elementos importantes para sua compreensão por meio da literatura. Em relação à origem do termo governança, Jessop (2018 , p. 45, tradução nossa) esclarece que “O termo anglófono ‘governança’ pode ser rastreado até as palavras clássicas do latim e do grego antigo para ‘dirigir’ os barcos. Originalmente, referia-se principalmente à ação ou maneira de governar, guia ou conduta de direção e se sobrepõe a ‘governo’.” 4 Portanto, está relacionado às formas, às maneiras de governar, contudo denota uma ação e uma amplitude muito maior do que o governo em si.

Já o ressurgimento da governança está associado à expansão da globalização de cunho neoliberal; o termo ressurge no setor privado e passa a orientar as ações do setor público. Dardot e Laval (2016 , p. 275) afirmam que “A polissemia do termo é um indicativo de seu uso. De fato, ele une três dimensões cada vez mais entrelaçadas do poder: a condução das empresas, a condução dos Estados e, por fim, a condução do mundo.” Conforme Santos (2010 , p. 402), “Essa convergência de trajetórias não é fruto do acaso.” Afinal, “[...] desde meados da década de 1990 que a governação se tornou a matriz política da globalização neoliberal.” Bevir e Rhodes (2001) destacam que, contemporaneamente, o termo aparece associado ao Banco Mundial (BM), que, em 1992, introduziu e apresentou “[...] o conceito de boa governança como parte de seus critérios para empréstimos a países em desenvolvimento. Ele invocou a governança para se referir às mudanças no setor público associado à nova gestão pública, mercantilização e até mesmo privatização.” 5 ( BEVIR; RHODES, 2001 , p. 1, tradução nossa). No entendimento de Dardot e Laval (2016 , p. 288, grifo dos autores), a disseminação da governança no âmbito do Estado “[...] significa, mais profundamente, uma mudança do ‘formato’ e do papel do Estado, que é visto agora como uma empresa a serviço das empresas .” Depreende-se, assim, que a participação proposta pelas novas formas de governança é direcionada ao capital e seus representantes, que passam a utilizar os aparatos e instituições do Estado para atender aos seus propósitos, com vistas a garantir a hegemonia capitalista.

Para Dale (1989) , uma tarefa primeira na compreensão da relação entre o Estado e a educação é a distinção entre Estado e governo. Buscando esclarecer esses conceitos, afirma que governo é uma parte do Estado, constitui- se na parte mais visível e mais ativa do Estado, “[...] mas não é a totalidade do Estado.” 6 ( DALE, 1989 , p. 53, tradução nossa). Além da distinção entre Estado e governo, também se faz necessária a diferenciação entre governo e governança. Conforme Cepiku (2008) , governo corresponde a uma autoridade de tomada de decisão legitimada, que tem por base as regras institucionais formais, ao passo que, na governança, a autoridade pode ser formal ou informal, seu objetivo é produzir consenso sobre decisões específicas. Em relação aos atores, o governo é constituído por um pequeno número de participantes, geralmente do setor público, enquanto na governança, há um grande número de participantes, entre os quais identificam-se atores públicos, privados e integrantes da sociedade civil ( CEPIKU, 2008 ).

Portanto, o ressurgimento do termo governança, que adentra a administração pública, configurando a Nova Governança Pública ( OSBORNE, 2006 ) está atrelado às novas formas e maneiras de governar, que surgem a partir da globalização de cunho neoliberal, no âmbito internacional, nacional e local, nas primeiras décadas do século XXI. Nessa perspectiva, o Estado, em suas diferentes esferas, não é o único condutor ou ator responsável pelo direcionamento das ações e políticas públicas. Nesse sentido, compreende-se “a governança como resultado dos recentes processos de reforma.” ( GIRARDI, 2019 , p. 29), processos esses que surgem após o fracasso das medidas neoliberais propostas no âmbito da NGP. Portanto, as mudanças ocorridas no papel e função do Estado e na administração pública constituem-se em ferramentas analíticas importantes a serem tomadas em conta na análise das políticas, em especial, na análise das políticas educacionais que têm sofrido modificações decorrentes desses processos. Ao se compreender o Estado, sua relação com o capitalismo, bem como as transformações no âmbito da administração pública, na educação que foi e é utilizada como um instrumento para a manutenção da hegemonia e do próprio capitalismo, entende-se melhor as políticas educacionais e seus propósitos.

Por outro lado, esse é um campo de disputas permanentes, uma vez que uma educação que possibilita a emancipação humana, constitui-se instrumento poderoso, que pode contribuir para a construção de um novo projeto societário, para a materialização de um mundo mais igualitário e fraterno. Mészáros (2008 ,p. 73) afirma que “Nenhum desses objetivos emancipadores é concebível sem a intervenção mais ativa da educação, entendida em sua orientação concreta, no sentido de uma ordem social que vá para além dos limites do capital.” Nesse sentido, Tonet (2005 , p. 481) destaca que não cabe à educação liderar a construção de uma nova sociedade, todavia a educação tem uma contribuição importante nesse processo, “[...] na medida em que desperte e fundamente as consciências para a necessidade de uma transformação revolucionária e, ao mesmo tempo, transmita o que de mais avançado existe em termos de conhecimento.” Dada a importância da educação, não se pode se eximir dessa responsabilidade. Assume- se a educação humana emancipadora como opção política, sendo que a construção desse projeto demanda, entre outras questões, a existência de uma escola e formas de gestão democráticas.

Destaca-se que, no Brasil, a gestão democrática, princípio que rege a administração das escolas públicas, materializado nos principais marcos legais da educação nacional, é fruto das reivindicações dos grandes movimentos realizados por educadores, entidades representativas, estudantes e setores da sociedade civil dos anos de 1980 7 e das disputas evidenciadas nesse período. Sander (2009 , p. 73) afirma que os movimentos sociais que se organizaram no Brasil nos anos de 1970 e 1980 foram caracterizados por uma renovada efervescência política, dentre as suas pautas pode-se destacar a democratização e a anistia política e “[...] ações que se aprofundaram com o movimento das Diretas Já e os trabalhos da Constituinte que tiveram como resultado a promulgação da nova Carta Constitucional em 1988.”

A Constituição Federal de 1988, no artigo 206, inciso VI, consagrou a gestão democrática como um dos princípios segundo o qual o ensino público será ministrado ( BRASIL, 1988 ), porém, como destacado na lei, ele foi restrito somente à educação pública. Em 1996, decorridos oito anos da aprovação da Constituição Cidadã ( BRASIL, 1988 ), é aprovada a LDB de 1996 ( BRASIL, 1996 ), que no inciso VIII reiterou esse princípio. Contudo, o documento no Artigo 14º delegou aos sistemas de ensino a definição de normas para a implementação, de acordo com as peculiaridades locais, mediante a: “I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.” ( BRASIL, 1996 ).

A redação da LDB ( BRASIL, 1996 ) frustrou os setores que esperavam que a legislação viesse a detalhar e delimitar questões específicas em relação à gestão democrática, uma vez que ao estabelecer apenas princípios gerais, ela “[...] deixou para cada sistema de ensino definir, entre outros aspectos: a forma de provimento do diretor de escola, quais conselhos instituir, a proporção de participação de cada segmento e o caráter deliberativo ou consultivo desses blocos.” ( ARELARO; JACOMINI; CARNEIRO, 2016 , p. 4). Nesse sentido, a gestão democrática e participativa, nos espaços subnacionais, representados pelos sistemas de ensino federal, estadual e municipal, assumiu diferentes configurações, atravessada pela reforma do estado e reformas educacionais impulsionadas pelo avanço neoliberal. Para atender às exigências da globalização neoliberal, o Brasil, a exemplo de outros países, implementou a Reforma do Estado, durante o governo Fernando Henrique Cardoso. Em 1995, com a aprovação do Plano Diretor da Reforma do Estado ( BEHRING, 2008 ), iniciaram-se uma série de reformas constitucionais, que seguem em curso no Brasil atual. A reforma educacional pode ser situada nesse contexto e “[...] visava uma reestruturação, principalmente nas funções sociais de modo a criar condições para a inserção do país no mercado globalizado.” ( DRABACH; SOUZA, 2014 , p. 235). Diante desse contexto, reafirma-se que a gestão democrática é uma conquista, foi impressa na legislação nacional, todavia ainda demanda ações para a sua efetivação ( ARELARO; JACOMINI; CARNEIRO, 2016 ).

Para além do que propõe a legislação, a gestão democrática pode ser entendida como um processo político, “[...]através do qual as pessoas que atuam na/sobre a escola identificam problemas, discutem, deliberam e planejam, encaminham, acompanham, controlam e avaliam o conjunto das ações voltadas ao desenvolvimento da própria escola na busca da solução daqueles problemas.” ( SOUZA, 2007 , p. 130). Conforme o autor, esse processo deve ser pautado no diálogo, na alteridade, no reconhecimento das especificidades da escola, pressupõe a participação efetiva de todos os segmentos escolares na tomada de decisões, o respeito às normas construídas de forma coletiva e um amplo acesso às informações. Portanto, a instituição de mecanismos, como conselhos escolares, eleição para dirigentes escolares e outros associados à gestão democrática, por si só não garantem a efetivação dessa concepção de gestão, tampouco a democracia ( SOUZA, 2007 ).

Todavia, com o avanço das reformas neoliberais, a gestão democrática da educação e da escola ainda em busca de caminhos para a sua materialização passa a enfrentar novos desafios. Desafios esses relacionados às mudanças no papel e forma de atuação do Estado, às reformas vivenciadas no Brasil a partir dos anos de 1990. Nesse sentido, modelos pautados nos pressupostos da NGP e da Nova Governança pública 8 adentram a administração pública, bem como a administração da educação e da escola. É nesse contexto que em Santa Catarina surgem os PGEs. Segundo destacado no site da Secretaria de Educação, o novo modelo “fortalece a gestão democrática e os processos de participação da comunidade escolar e das instâncias colegiadas, instituindo a possibilidade da escolha do seu gestor por meio da análise de propostas de Plano de Gestão Escolar (PGE) [...]” ( SANTA CATARINA, 2019e ). Ademais, suas estratégias e formas de operacionalização apontam para a introdução de elementos da NGP e da Nova Governança Pública no campo da gestão escolar catarinense, que aproxima a gestão da educação e da escola à gestão empresarial.

O modelo descentraliza as decisões e as responsabilidades para o âmbito local. Na sua operacionalização, pais, professores, funcionários e alunos escolhem o PGE que julgam adequado para a sua escola por meio de votação direta, ou seja, a Escolha Pública, um dos pressupostos da NGP está presente na nova política de gestão. Já o proponente deverá, dentro do período de vigência do plano, cumprir as metas a que se propôs. Para tanto, o gestor assina um termo de compromisso ao assumir a função, comprometendo-se a cumprir a legislação, as determinações da Secretaria de Estado da Educação e o PGE, isso porque “Durante a vigência do PGE, o gestor e a comunidade escolar [...]” são os responsáveis pelo “[...] monitoramento de sua execução com base em diagnósticos e dos indicadores que a escola produz.” ( SANTA CATARINA, 2019e ). Sendo assim, o novo modelo se utiliza de mecanismos de contratualização da gestão e da responsabilização dos sujeitos escolares, com base nos resultados apresentados pela escola, no período de vigência do PGE.

Conforme Garcia (2019) , a utilização de instrumentos de contratualização, sobretudo na gestão escolar, representada pelo gestor, ilustra a importação do modo de gestão privada pela esfera pública. “Os acordos/contratos funcionam, assim, como instrumentos para articular as formas de gestão, responsabilizando os gestores e profissionais no interior da escola pelo considerado sucesso da política educacional dos governos.” ( GARCIA, 2019 , p. 89). Evidenciam-se assim indícios da transferência e aumento da responsabilização da comunidade e do gestor da escola pública pelos seus rumos. Os diferentes sujeitos devem participar da escola e suas formas de gestão, porém atenta-se para os instrumentos propostos pelas reformas neoliberais, os quais modificam as formas de participação, frente ao processo de mudança no papel e atuação do Estado na execução das políticas educacionais, trazendo repercussões para a materialização da gestão democrática. Diante do exposto, argumenta-se que é preciso se manter vigilante e fazer o enfrentamento a uma série de medidas que estão sendo tomadas no campo educacional, ligadas aos interesses do mercado, para que uma “educação para além do capital” 9 e uma gestão democrática sejam possíveis.

PLANOS DE GESTÃO ESCOLAR: A PROCLAMAÇÃO DA DEMOCRATIZAÇÃO DA GESTÃO NA REDE PÚBLICA ESTADUAL DE SANTA CATARINA

Por meio do Decreto Governamental n. 1794 ( SANTA CATARINA, 2013 ) 10 , anunciado no dia 15 de outubro de 2015 (Dia do Professor), o governo de Santa Catarina instituiu que as escolas escolheriam o seu PGE e por meio dele o gestor escolar. Segundo publicação da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (FIESC), esse processo difere do que é geralmente concebido, ou seja, “[...] a eleição direta de Diretor pela comunidade escolar, na qual os candidatos se apresentam, no geral, com plataformas e propostas, sem plano definido.” Conforme determina a “[...] regulação catarinense, a prioridade não é o candidato, mas seu plano de gestão: a comunidade escolar escolhe o plano, não propriamente o candidato, cuja designação decorre daquele.” ( FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA, 2017 , p. 21, grifo nosso). Denota-se, assim, a valorização da escolha realizada pelas famílias, destacada na implementação da política e analisada na próxima seção, uma tendência presente nas políticas educativas contemporâneas implementadas pelos países desenvolvidos alinhados aos preceitos neoliberais, a adoção desses procedimentos pode contribuir para a privatização da educação ( ADRIÃO; GARCIA, 2017 ).

A adoção dos PGEs gerou polêmicas, uma vez que o processo não foi discutido com a comunidade. O Sinte-SC foi uma das primeiras entidades a manifestar sua insatisfação em relação à mudança instituída via decreto, afirmando que a categoria sempre buscou a eleição de diretores como um dos mecanismos para a democratização da escola pública, já o decreto, além de não ter a força de lei, ser algo muito instável e sujeito às mudanças de governo, poderia ser facilmente modificado conforme os interesses do governo, além de limitar a participação dos membros do magistério no processo de escolha dos planos, ao estabelecer uma série de requisitos para que o proponente pudesse apresentar seu PGE ( SINDICATO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO DE SANTA CATARINA, 2013 ).

A estrutura inicial dos PGEs foi definida pela Portaria n. 01/2014 ( SANTA CATARINA, 2014c ). Por meio da legislação e das orientações emanadas pela Secretaria é possível perceber que os planos seguem um modelo previamente elaborado, cabendo ao proponente apresentar sua proposta, conforme as orientações preestabelecidas. Em 2015, o processo de elaboração dos PGEs foi orientado pela Portaria 024/2015. Segundo a legislação, ao elaborar o seu plano, o proponente “Deve ter como base o projeto político-pedagógico da escola, a Proposta Curricular do Estado de Santa Catarina e a legislação vigente.” ( SANTA CATARINA, 2015h ). Já em 2019, a estrutura do PGE foi referendada pela Portaria n. 1434/2019 ( SANTA CATARINA, 2019f ). A organização do documento, tomando como base o processo de escolha realizado em 2015, pode ser visualizada na figura a seguir.

Fonte: elaborada pelos autores, 2019, a partir da Portaria SED/SC n. 024/2015, sistema WEBGESC /

Plano de Gestão Escolar11 e Nascimento (2015) .

Figura 1 Estrutura dos Planos de Gestão Escolar (2016 a 2019) 

É possível observar por meio da análise das legislações ( SANTA CATARINA 2014c , 2015h , 2019f ) que não ocorreram alterações significativas na estrutura dos PGEs ao longo dos anos. Contudo, merece destaque, a questão da formação do candidato. Nas duas primeiras fases (2014 e 2015), uma das exigências para a inscrição era a comprovação de formação em gestão escolar, esse requisito foi retirado do processo de inscrição de PGE que ocorreu em 2019. Na sequência, buscou-se elucidar as influências presentes na origem dos PGEs, observam-se as fases de implementação dos PGEs e as contradições e disputas que permearam esse processo.

ORIGEM E FASES DA IMPLEMENTAÇÃO DA NOVA POLÍTICA: A PARTICIPAÇÃO EM QUESTÃO

A origem do novo modelo aponta para o amplo cenário internacional e nacional, para o avanço da globalização e neoliberalismo, para a influência internacional na formulação das políticas públicas educacionais. Em Santa Catarina esse processo pode ser evidenciado por meio da atuação da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Siems (2019) afirma que as aproximações entre o governo de Santa Catarina e a OCDE iniciaram-se em 2006 e se intensificaram em 2009, quando os alunos catarinenses alcançaram resultados significativos na prova do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), realizado pela OCDE. Em 2009, o então Governador Luiz Henrique da Silveira solicitou que a OCDE realizasse uma avaliação do sistema educacional do estado.

As observações e recomendações oriundas dessa avaliação foram publicadas em 2010. Na seção Os diretores de estabelecimentos escolares , a OCDE enfatiza que, no estado catarinense, os dirigentes escolares são escolhidos de duas formas: “Em alguns casos, são eleitos pela comunidade escolar. Na maioria das vezes, são designados por nomeação política. Ambos os sistemas apresentam desvantagens.” ( ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, 2010 , p. 244). As recomendações afirmam a necessidade de se rever esses critérios, uma vez que em países desenvolvidos os diretores são escolhidos “[...] com base na competência, na experiência e na qualificação dos candidatos.” ( ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, 2010 , p. 245), portanto, apresentam possíveis indícios da origem dos PGEs, não somente como forma de escolha do gestor ou mero instrumento de planejamento, mas como estratégia de governança relacionada ao projeto neoliberal. Infere-se, assim, que a OCDE figurou como um importante think tank na formulação da nova política de gestão. Conforme Mendes e Peroni (2020 , p. 66), “Os think tanks são organizações que existem desde o século XIX e atuam como formuladoras de ideias e opiniões, produtoras de conhecimento e influenciadoras de políticas públicas nas mais diversas áreas de atuação.” A publicação da OCDE ( ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, 2010 , p. 25) não deixa dúvidas em relação aos propósitos de tal estudo “O relatório destacou muitos pontos fracos no sistema educativo com referência ao preparo da população para a economia do conhecimento.” Ou seja, era preciso reformar a educação e suas formas de gestão, para atender aos interesses econômicos do capital e seus representantes.

Indícios da origem dos PGEs também podem ser encontrados na obra publicada pelo Conselho Estadual de Educação de Santa Catarina (CEE/ SC) que, ao se debruçar sobre o estudo da OCDE ( ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, 2010 ), faz Proposições de novos rumos para a qualidade da educação em Santa Catarina: visão do CEE sobre a avaliação da OCDE ( SANTA CATARINA, 2012 ). No documento há referência direta à instituição de PGEs, afirmando a necessidade da implementação de mudanças estruturais envolvendo governo e setores da sociedade civil, uma vez que a articulação entre vontade política e competência técnica, aliada “[...] a planos de gestão orientados por metas, avaliação de conhecimentos, desempenho e qualidade de resultados poderão superar os desvios e fragilidades do sistema em vigor e dar novos rumos à educação em Santa Catarina.” ( SANTA CATARINA, 2012 , p. 12). Em outro trecho, o documento enfatiza que a “[...] inexistência de planos de gestão e de processos avaliativos [...]” ( SANTA CATARINA, 2012 , p. 35) figura como um dos fatores que impedem ou dificultam a autonomia escolar. Conforme Siems (2019) , o documento do CEE/SC (2012) constitui- se em ferramenta de fabricação de consenso em relação às recomendações da OCDE, além de apontar para a influência do setor privado, cuja composição é predominante no CEE/SC, na condução das políticas educacionais.

Nessa perspectiva, por meio da análise dos documentos, é possível inferir que a nova política, na sua formulação, sofreu a influência de vários atores e instituições, os quais podem ser observados na Figura 2 .

Fonte: elaboração dos autores, 2020.

Figura 2 Influências na formulação da Nova Política de Gestão de Santa Catarina 

Percebe-se que diferentes atores, relacionados aos contextos internacional, nacional e local, disputaram a formulação e o conteúdo da política, de acordo com seus interesses e concepções. Mainardes (2018) afirma que compreender e elucidar a essência das políticas educacionais, sua formulação, fundamentos e fins, constituem-se desafios dos pesquisadores que atuam no campo. Em relação aos PGEs, denota-se que as concepções ligadas ao capital internacional, aliadas aos interesses capitalistas locais, figuram como um elemento de destaque. Contudo, esse é um espaço de disputas, de resistências e enfrentamentos como apontam os documentos oriundos do Sinte-SC e a trajetória histórica da gestão da educação catarinense.

No que se refere ao processo de implementação dos PGEs, a partir dos documentos norteadores da nova política de gestão escolar, com vistas à análise, classificou-se esse processo em três fases ou momentos distintos: 1ª fase – Planos de Gestão Escolar (2014-2015); 2ª fase – Planos de Gestão Escolar (2016-2019); e 3ª fase – Planos de Gestão Escolar (2020-2023). Visualizam-se essas etapas na figura a seguir.

Observa-se que em escolas onde houve vacância 12 na função de gestor escolar, ou não ocorreu o processo de escolha, as fases podem se apresentar de forma distinta, porém a maioria das instituições vivenciou a trajetória apresentada pela Figura 3 . Conforme evidenciado na introdução, o artigo tem como foco principal a 2ª fase, embora apresente dados referentes à 1ª e 3ª fase.

Fonte: elaboração dos autores, 2020.

Figura 3 Fases da implementação dos Planos de Gestão Escolar em Santa Catarina 

No período que antecede a instituição dos PGEs, a trajetória histórica da gestão escolar catarinense foi marcada por importantes acontecimentos que remontam as décadas de 1980 e 1990, quando houve intensa mobilização e participação dos educadores na busca pela democratização da escola e suas formas de gestão. No âmbito desses movimentos, a eleição para dirigentes escolares era considerada importante instrumento para a concretização desse anseio ( DAROS, 1999 ). A eleição chegou a ser instituída por meio de lei específica nos anos de 1985 e 1991 ( PACHECO, 2007 ), contudo foi declarada inconstitucional, sendo que a indicação para o cargo continuou a ser utilizada no estado como meio/ forma de escolha do gestor até o ano de 2013 ( PALÚ; PETRY, 2020 ), quando os PGES foram instituídos via decreto governamental.

A seguir, analisam-se as diferentes fases da implementação da nova política de gestão no estado catarinense.

PLANOS DE GESTÃO ESCOLAR (2014-2015)

Conforme o Decreto SC n. 1.794/2013, os gestores que estavam na função, indicados pelo poder executivo, poderiam continuar na gestão caso apresentassem um PGE e este fosse aprovado em todas as etapas previstas na legislação e referendado pela comunidade escolar ( SANTA CATARINA, 2013 ). Apenas nas escolas em que houve vacância do cargo houve seleção de novos dirigentes escolares. Conforme a Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina (SED/SC), isso representou “[...] uma nova forma de escolha da função de diretor na rede estadual de ensino, por meio da seleção de Plano de Gestão Escolar.” Os primeiros PGEs tiveram vigência até 31 de dezembro de 2015 ( SANTA CATARINA, 2013 ).

A primeira versão dos PGEs traz considerações do consultor ad hoc , profissionais externos contratados para analisarem e emitirem parecer sobre os planos ( SANTA CATARINA, 2015g ). Como o tempo destinado à inscrição e postagem do plano no sistema WEBGESC , que se constitui em uma plataforma virtual de hospedagem dos planos, foi inferior a um mês, presume-se que os proponentes não tiveram muito tempo para discutir esses planos com a comunidade escolar, ou seja, a participação pode não ter ocorrido no processo de elaboração dos PGEs, como se preconiza em uma gestão de fato democrática.

Quanto ao primeiro processo de seleção, as diferentes etapas de escolha dos PGEs seguiram o cronograma definido pelo edital n. 07/SED/13/03/14, que sofreu alterações. As inscrições e postagens dos PGEs foram realizadas entre 24 de março e 17 de abril. A análise e a qualificação dos PGEs pelos consultores ad hoc ocorreram entre 18 de abril e 10 de junho. Nesse mesmo período, entre os dias 17 de abril e 13 de junho, foram formadas as Comissões Escolares de Gestão e aconteceram as defesas dos planos no âmbito das escolas. No dia 13 de junho transcorreu a votação para a escolha dos PGEs na unidade escolar, sendo que os gestores escolhidos foram designados e empossados até o dia 30 de junho de 2014 ( SANTA CATARINA, 2014b ).

Em relação à inscrição do proponente, na seleção dos PGEs de 2014, o Decreto SC n. 1794/2013 estabeleceu como primeiro critério “ser professor efetivo do Quadro do Magistério Público Estadual.” ( SANTA CATARINA, 2013 ). Portanto, os demais membros, entre os quais os especialistas em assuntos educacionais (administradores, supervisores e orientadores), assistentes técnicos pedagógicos e assistentes de educação, não puderam participar desse processo. Ponto polêmico também foi a votação, uma vez que os votos dos diferentes segmentos tiveram pesos diferenciados, conforme estabelecia o Decreto SC n. 1.794/2013: I – peso 2 (dois) relativamente à escolha dos pais ou responsáveis; II – peso 1 (um) relativamente à escolha dos estudantes; e III – peso 1 (um) relativamente à escolha dos profissionais da educação ( SANTA CATARINA, 2013 ). Percebe-se que o voto do segmento pais ou responsáveis teve um valor maior do que o voto do professor/funcionário, e até mesmo do que o voto do aluno.

A valorização do voto dos pais e responsáveis aponta para o modelo empresarial de gestão, evidenciando que esses são tidos como fiscais do “produto educacional” ofertado na escola, não somente no momento da escolha do PGE, mas também em outros, por meio do monitoramento e avaliação da gestão. Isso porque, na ótica gerencial, “[...] a escola deve ser liberta do Estado e passar a ser gerida como empresa. Cria-se, assim, um referencial competitivo que fornece aos pais possibilidade de escolha sobre o tipo de escola que desejam para seus filhos.” ( CARVALHO, 2009 , p. 1154). Os pais são tidos como clientes, que devem fiscalizar e, ao mesmo tempo, avaliar os serviços ofertados. Nessa perspectiva, o mercado passa a ditar os rumos das políticas educacionais, empresariando “[...] a educação, redefinindo as normas de qualidade, a concepção de interesse público e a relação dos pais com a escola, com base numa perspectiva consumista e individualista.” ( CARVALHO, 2009 , p. 1159).

Seguindo análise da escolha dos PGEs (2014-2015), conforme notícia divulgada no site do governo do estado de Santa Catarina, foram escolhidos 83 novos gestores para as escolas onde o cargo estava vago, nas demais os dirigentes escolares que já estavam na função apresentaram um PGE com vigência para o segundo semestre de 2014 e primeiro semestre de 2015 e continuaram no cargo ( SANTA CATARINA, 2014a ). Dito de outra forma, Santa Catarina possuía em 2014 cerca de 1.230 escolas públicas estaduais ( PORTAL QEDU, 2014 ), em 1.111 ocorreu o processo de escolha do PGE e somente em 83 escolas ocorreu a escolha/nomeação de novos gestores proponentes; nas demais, os gestores que já atuavam apresentaram seu PGE e permaneceram na função ( DIÁRIO CATARINENSE, 2014 ). Portanto, mesmo com a mudança na forma de escolha, um número significativo de dirigentes escolares que haviam assumido a função por meio da indicação, deu continuidade à sua gestão a partir da escolha de um PGE.

PLANOS DE GESTÃO ESCOLAR (2016-2019)

Em 2015, no segundo processo de escolha dos PGEs, puderam concorrer os membros do magistério público estadual que se enquadravam nos critérios preconizados pelo Decreto n. 1794/2013 ( SANTA CATARINA, 2013 ). Esse documento sofreu alterações, especialmente no que diz respeito a essa questão; no ano de 2015, o decreto modificado apresentou 11 requisitos para a inscrição do proponente, entre as quais se destacam:

I – ser professor, especialista em assuntos educacionais ou assistente técnico pedagógico, efetivo do Quadro do Magistério Público estadual; (Redação alterada pelo Decreto Nº 243, de 2015); […] VII – comprovar a conclusão ou a matrícula em: a) curso de formação continuada em gestão escolar, de no mínimo 200 (duzentas) horas, ofertado pela SED ou por instituição de ensino superior credenciada pela SED; ou b) curso de pós-graduação lato sensu em gestão escolar, ofertado por instituição de ensino superior autorizada pelo Ministério da Educação (MEC) ou pelo Conselho Nacional de Educação (CNE); (Redação alterada pelo Decreto Nº 284, de 2015); […] VIII – Não possuir mais de 5 (cinco) faltas injustificadas nos 3 (três) anos anteriores à inscrição do Plano de Gestão Escolar [...] (Incluído pelo Decreto Nº 307, de 2015). ( SANTA CATARINA, 2013 ).

Nascimento (2015 , p. 221) alertou para o fato de o novo modelo de gestão das escolas públicas estaduais catarinenses estar pautado em decreto e não em lei específica: “[...] esta forma de formalização pode juridicamente ser revogada, cancelada a qualquer momento.” O uso desse “[...] instrumento facilita a alteração do seu conteúdo ou simplesmente a sua revogação a qualquer momento pelo governador.” E, de fato, as alterações aconteceram. A primeira mudança diz respeito à possibilidade de outros profissionais do magistério público estadual estarem aptos a propor um PGE. Com a alteração da legislação em 2015, especialistas em assuntos educacionais (administradores, supervisores e orientadores escolares), bem como assistentes técnicos pedagógicos, também puderam participar do processo. Em 2017, o Decreto 1794/2013 sofreu uma nova alteração e possibilitou que os assistentes de educação também pudessem apresentar seu plano.

Em julho de 2015, o Sinte-SC divulgou matéria intitulada Gestão Antidemocrática: Professores Grevistas são impedidos de disputar a eleição de diretores , tornando pública a insatisfação da entidade em relação ao requisito das faltas. O sindicato afirmou que o governo, “Ao impedir que profissionais grevistas participem do Plano de Gestão alegando que as faltas injustificadas são um impeditivo a sua participação, deixa bem claro quem realmente tem o poder, e certamente não é o povo.” ( SINDICATO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO DE SANTA CATARINA, 2015a ). Diante do impedimento, o Sinte-SC entrou com ações individuais, que foram deferidas pela justiça catarinense, garantindo a homologação da inscrição dos professores grevistas no processo de escolha ( SINDICATO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO DE SANTA CATARINA, 2015b ).

A votação aconteceu nos dias 26 ou 27 de novembro, sendo a data estipulada pela Comissão Escolar de Gestão. Segundo lista final publicada pela SED-SC, 893 escolas tiveram seus gestores escolhidos por meio dos PGEs em 2015. As informações e os números revelam que, na maioria das escolas catarinenses, apenas um PGE foi inscrito, uma vez que o processo contou com a participação de 1.184 planos. Segundo informações da Coordenação de Gestão Escolar da SED/SC ( SANTA CATARINA, 2019b ), entre os planos escolhidos, 67% estão associados a gestores que já estavam na função no mandato anterior e 33% dos PGEs escolhidos foram propostos por novos gestores. Ou seja, a proporção de gestores que apresentaram um novo plano de gestão e foram reconduzidos é considerável.

Outro aspecto que chama a atenção é a manutenção do termo clientela da escola ( SANTA CATARINA, 2015h ), utilizado para identificar os alunos, pais e responsáveis, presente na legislação que orienta a estrutura dos PGEs em sua dimensão socioeconômica. Em relação à participação da comunidade escolar, chamada no roteiro de elaboração do PGE de “clientela”, Nascimento (2015 , p. 218) afirma que “[...] denota aí uma necessidade de se rever sob qual perspectiva essa ‘clientela’ terá maior, menor ou igual poder de decisão na gestão da escola.” Paro (2015 , p. 97) alerta para a tomada de medidas, e aqui se acrescenta para o uso de termos análogos aos utilizados em unidades produtivas; o autor denomina esses usos de equívocos e afirma que isso “[...] leva a administração da escola a orientar-se pelos mesmos princípios e métodos adotados em empresa capitalista, que tem objetivos antagônicos ao da educação.” Altera-se, portanto, a relação entre escola, estudantes, famílias e a sociedade, configurando “[...] apenas uma relação existente entre uma escola pública e um aluno ou seus pais, desconsiderando o restante da sociedade. O conceito de cliente não contempla o interesse público.” ( DASSO JÚNIOR, 2014 , p. 19). Nesse sentido, a educação é concebida como uma mercadoria ou serviço, a escola como uma empresa, o estudante como cliente, os pais e famílias como colaboradores e fiscalizadores. Desse modo, além de alterar a concepção e o sentido da participação no âmbito da escola, também são alteradas as relações da escola com a sociedade, o que difere da participação plena preconizada na gestão democrática.

PLANOS DE GESTÃO ESCOLAR (2020-2023)

Em 2019, finalizado o período de vigência dos PGEs 2016-2019, ocorreu novo processo de escolha, dessa vez para os PGEs 2020-2023, o que aponta para a continuidade da política apesar da mudança que houve no governo estadual catarinense. No entanto, o Decreto n. 1.794/13 ( SANTA CATARINA, 2013 ) foi revogado e em seu lugar foi instituído o Decreto n. 194/2019 ( SANTA CATARINA, 2019c ), que definiu as regras para o processo de escolha do gestor escolar por meio dos PGEs. Essas, grosso modo , assemelham-se aos requisitos anteriores, porém não exigem formação específica em gestão escolar para os gestores proponentes ( SANTA CATARINA, 2019c ). Outra alteração diz respeito à valoração dos votos, uma vez que, no processo de 2019, não houve diferenciação. Todavia, pelas novas regras, tanto o pai, mãe ou responsável poderiam votar, tendo o voto peso um, mantendo assim a valorização da escolha realizada pelas famílias, portanto, não alterou a lógica do processo.

No que diz respeito à inscrição, o Decreto n. 194/2019 manteve os critérios dos anos anteriores, inclusive o impedimento dos profissionais que possuem mais de cinco faltas injustificadas em sua ficha funcional registradas nos três anos que antecedem a inscrição do PGE ( SANTA CATARINA, 2019c ). A escolha ocorreu nos dias 23, 24 ou 25 de outubro, conforme estabelecido pela Comissão Escolar que coordenou o processo ( SANTA CATARINA, 2019d ). Segundo dados da Coordenação de Gestão Escolar, 992 escolas públicas estaduais catarinenses participaram do processo de escolha, no qual foram inscritos 1318 PGEs. Nessa fase, 63% dos gestores que já estavam na função foram reconduzidos, o que equivale a 617 profissionais, sendo que 37% das vagas foram ocupadas por novos gestores ( SANTA CATARINA, 2020 ). Alerta-se para a manutenção do termo clientela da escola em nova portaria lançada no ano de 2019 ( SANTA CATARINA, 2019f ).

A figura que segue sintetiza e apresenta um panorama da implementação da nova política, ao longo das três fases apresentadas:

Fonte: elaborada pelos autores, 2020, a partir dos documentos analisados.

Figura 4 Panorama Geral da implementação dos PGEs como orientadores da Gestão Escolar em Santa Catarina 

O panorama geral e a análise dos documentos influenciadores e norteadores dos PGEs possibilita a identificação de elementos alinhados às concepções neoliberais que são propagadas para o campo da gestão da educação e da escola, dentre os quais se destacam: alinhamento ao processo de internacionalização das políticas educacionais; influência de atores hegemônicos globais na formulação e condução das políticas, em especial da OCDE; uso de termos, instrumentos e procedimentos análogos à gestão empresarial; responsabilização dos atores locais pela gestão da escola; seleção de dirigentes escolares a partir de critérios técnicos (Decreto SC n. 1.794/2013) e apresentação de plano de gestão escolar; valorização da escolha realizada pela família (entendida como clientela); gestão com foco nos resultados (desempenho dos alunos) e metas quantitativas; formação para gestores a partir dos preceitos do novo modelo; ressignificação da participação da comunidade e do papel do conselho deliberativo escolar, que assume função fiscalizadora e executora; parcerias envolvendo a escola, terceiro setor e setores empresariais (parceiros da escola); contratualização, responsabilização e avaliação periódica da gestão escolar; centralidade do papel do gestor escolar, que apresenta um PGE e escolhe os assessores de direção; incentivo às boas práticas de gestão ou boa governança; direcionamento das ações da escola a partir do princípio da eficiência e eficácia. Portanto, os indícios e evidências observados no estudo apontam para a face contraditória dos PGEs, uma vez que eles são proclamados como possibilitadores de uma gestão democrática, porém suas estratégias e formas de operacionalização indicam a concretização das reformas neoliberais e seus pressupostos no âmbito da educação pública.

Em dezembro de 2015 foi aprovado o Plano Estadual de Educação de Santa Catarina (PEE/SC 2015-2024) ( SANTA CATARINA, 2015d ). Na sua introdução são citados importantes aportes legais que influenciaram a sua elaboração, entre eles a publicação da OCDE ( ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, 2010 ) e do CEE/SC ( SANTA CATARINA, 2012 ). Também são citados conferências e movimentos da sociedade civil organizada, evidenciando as disputas entre as diferentes concepções de educação, gestão e sociedade defendidas pelos diferentes atores. O Plano em sua meta 18 estabeleceu a gestão democrática como princípio e entre as estratégias para sua implementação cita os PGEs ( SANTA CATARINA, 2015d ). Mesmo diante das contradições e disputas é possível identificar que a gestão democrática com a aprovação do PEE/SC passa a ter status de política pública, sendo abordada no âmbito do sistema estadual de ensino, ultrapassando a concepção de gestão democrática restrita ao campo escolar.

Destaca-se ainda que movimentos recentes merecem atenção, os quais propõem alterações na legislação, a exemplo da indicação apresentada na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (ALESC), a qual propunha “a implantação de um projeto de gestão compartilhada das escolas da rede estadual de ensino entre a Secretaria de Educação e a Secretaria da Segurança Pública.” ( SANTA CATARINA, 2019a ). Tal proposição foi arquivada. Porém, o estado catarinense anunciou adesão ao Programa Nacional de Escolas Cívico-Militar (Pecim) do Governo Federal, que prevê a atuação de profissionais do quadro militar na gestão educacional e escolar ( GORGES, 2020 ). São transformações substanciais no âmbito da gestão da educação e da escola, que demandam estudos e debates, dadas suas repercussões para a materialização da gestão democrática.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A mudança na política de escolha do dirigente escolar e estratégia de governança das escolas públicas estaduais catarinenses, implementada por meio dos PGEs, instituídos via decreto governamental a partir de 2013, está inserida em um contexto mais amplo de reformas neoliberais que modificaram o papel e a atuação do Estado e suas instituições, bem como as formas de administração pública, as quais são reverberadas para a administração da educação e da escola. Nesse sentido, o artigo problematizou a adoção dos PGEs, evidenciando as contradições e disputas que permearam a sua implementação.

Uma das principais contradições diz respeito à instituição dos planos. Os documentos denunciam a ausência da participação e do debate no processo de constituição do modelo em questão. Profissionais da educação, sua entidade representativa, comunidade escolar e a sociedade em geral não foram ouvidos ou consultados. Os PGEs foram instituídos via decreto, portanto tampouco houve discussão na Assembleia Legislativa, que na atual democracia representa a Casa do Povo. Mesmo assim, os PGEs foram proclamados como instrumentos possibilitadores de uma gestão democrática ( SANTA CATARINA, 2013 ).

Observou-se que, a origem e formas de operacionalização dos PGEs estão relacionadas às reformas neoliberais, que buscam conformar uma educação alinhada aos propósitos do capitalismo. No cenário catarinense, a OCDE teve papel fundamental, pois a pedido do governo estadual realizou estudo e uma série de recomendações para o setor educacional, com vistas ao “[...] preparo da população para a economia do conhecimento.” ( ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, 2010 , p. 25). A implementação do modelo, portanto, representa um esforço de adequar a educação pública aos ideários apregoados pela OCDE. Essas proposições foram legitimadas e tiveram a anuência do CEE/SC ( SANTA CATARINA, 2012 ).

Em caso de não apresentação de PGE, ou mesmo de não aprovação do plano proposto, caberia à Secretaria de Estado da Educação a designação do diretor de escola ( SANTA CATARINA, 2013 , 2019c ), que assumiria a função por meio de indicação até a implementação do modelo. Portanto, há uma forte responsabilização da comunidade escolar e do conselho deliberativo escolar, que passam a ser concebidos como avalistas, que devem garantir a implementação da política. Por isso, argumenta-se que os PGEs, além de se constituírem como forma de escolha, podem ser entendidos como estratégia de governança. A participação política é aceita desde que dentro dos marcos propostos pelo modelo, e não de uma forma ampliada.

Os modelos administrativos da NGP e da Nova Governança Pública concebem a administração do Estado e suas instituições a partir dos pressupostos do mercado. Nesse sentido, a educação é entendida como mercadoria ou serviço, a escola como uma empresa, o estudante como cliente, os pais e a família como parceiros, clientes-colaboradores e fiscalizadores. Sob o manto neoliberal e seu modelo de governança, esconde-se o caráter da privatização do espaço público. Muitos desses elementos estão presentes nos documentos que instituíram os PGEs, conforme evidenciado na análise.

Termos e instrumentos inerentes ao mercado passaram a integrar o âmbito da administração pública e são reverberados para a gestão da educação e da escola, a exemplo da contratualização. No contexto catarinense, o gestor, ao ser nomeado por meio da escolha do PGE, assina um termo de compromisso, um contrato, assumindo o novo modelo, sua concepção de mundo, sociedade, educação e formas de gestão. As famílias, os alunos e os profissionais da educação, ao referendarem o PGE, também assumem responsabilidades frente ao modelo e seus pressupostos. O gestor e a comunidade passam a responder por uma instituição pública, que cada vez mais adquire um caráter privado.

Em relação às disputas, observou-se que elas ocorrem no campo conceitual, estão relacionadas à concepção de educação, conhecimento, modos como se define o aluno, a escola, os pais e a comunidade. Apontam para diferentes formas de participação na elaboração e implementação das políticas educacionais. Observa-se que a educação é reconhecida como um setor estratégico, tanto pelos setores progressistas, que a concebem como instrumento de transformação, mudança e emancipação, quanto pelos setores conservadores, que representam o capitalismo neoliberal, o mercado, que, estrategicamente, utilizam a educação para a concretização de seus propósitos. No contexto catarinense, as disputas remontam à trajetória histórica da gestão e da educação e envolvem os profissionais da educação pública, que sempre defenderam a democratização da educação e suas formas de gestão, e o governo, que por meio de diferentes estratégias manteve até 2013 a indicação como forma de escolha dos dirigentes escolares e, a partir dessa data, instituiu os PGEs via decreto. No que diz respeito aos PGEs, observou-se uma ênfase nos processos de escolha, que concebem os estudantes e famílias como clientes e parceiros. Essa perspectiva altera o sentido da participação, convertendo a participação cidadã em participação fiscalizadora.

Portanto, a partir das evidências apontadas no estudo entende-se que os PGEs têm função estratégica na nova governança da educação, constituem- se em instrumentos que transcendem o planejamento, passando a direcionar a forma de participação na escola e até mesmo o comportamento dos profissionais da educação. O PGE focaliza a liderança do gestor proponente. Documentos importantes, oriundos do debate e construção coletiva, como o Projeto Político-Pedagógico (PPP) e a Proposta Curricular de Santa Catarina (PCSC), são secundarizados frente à centralidade do PGE. Por fim, ressalta-se que os PGEs, como instrumentos de escolha do gestor escolar, apresentam um avanço se comparados à indicação, contudo sua operacionalização direciona as ações da escola a partir dos pressupostos da NGP e Nova Governança Pública, que modificaram a forma de administrar o Estado e suas instituições.

Diante da complexidade desses processos, aponta-se a necessidade da continuidade das investigações e estudos que permitirão uma compreensão mais ampla desse fenômeno e suas repercussões para a materialização da gestão democrática como parte importante da democratização da própria sociedade.

É importante destacar, ainda, que esse processo não ocorre de forma homogênea e sem resistência. Apesar dos tempos difíceis que se tem vivenciado, faz-se necessário uma leitura crítica dos PGEs, bem como das demais políticas educacionais e, a partir delas, a construção coletiva de formas de enfrentamento frente ao retrocesso que muitas representam para o campo educacional. A luta por uma educação democrática e emancipadora, pela democratização da escola e suas formas de gestão não pode ser interditada sem resistência. Mesmo com as adversidades dos tempos atuais, acredita-se que somente essa perspectiva de gestão poderá contribuir para a existência de uma escola que tenha como objetivo a construção do conhecimento com qualidade social, sobretudo para a grande maioria da população que frequenta as escolas públicas, a qual, muitas vezes, tem na educação de qualidade a única oportunidade para alcançar outros mundos e conhecimentos que não lhe podem ser negados em nome dos interesses do capital.

REFERÊNCIAS

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1Por meio da análise dos documentos influenciadores e norteadores dos PGEs, depreende-se que o modelo é anunciado como um instrumento de gestão democrática, contudo sua origem e operacionalização apontam para a introdução de elementos da nova gestão pública e da nova governança pública no âmbito da escola, modelos esses oriundos das reformas neoliberais. A escola passa a ter suas ações direcionadas a partir da lógica do mercado, cujos interesses e fins se contrapõem aos interesses públicos. Portanto, não se constitui em mero instrumento para assunção à função de gestor escolar, tampouco configura-se apenas como um instrumento de planejamento das ações da escola. O PGE, seus pressupostos e valores introduzem uma lógica racional econômica na escola, documentos importantes para a materialização da gestão democrática, como o Projeto Político-Pedagógico (PPP) e a Proposta Curricular de Santa Catarina (PCSC) em suas diferentes versões, mesmo citados nas portarias que orientam a elaboração dos planos, não têm seus pressupostos contemplados como referência para as ações da escola, como se evidenciou na análise dos textos dos PGEs realizada em pesquisa mais abrangente ( PALÚ, 2019 ), a qual deu origem ao artigo. Portanto, a instituição dos PGEs pode ser entendida como uma nova estratégia de governança, bem como uma concepção de mundo, sociedade, homem, educação e formas de gestão. O gestor escolar, ao assumir a função por meio da escolha de um PGE, assina um termo de compromisso de gestão; a comunidade escolar referenda esse modelo por meio de votação, assumindo responsabilidades no que se refere à implementação do modelo e seus valores na sua plenitude.

2O artigo aborda aspectos apresentados na pesquisa dissertativa intitulada Planos de Gestão Escolar em Santa Catarina: a gestão democrática em questão ( PALÚ, 2019 ), realizada no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), campus Chapecó-SC. A dissertação foi orientada pelo Professor Dr. Oto João Petry.

3O artigo focaliza a segunda fase (2016-2019) de implementação dos PGEs, que corresponde ao processo de escolha mais abrangente, uma vez que na primeira fase (2014-2015), os gestores que haviam assumido a função por meio de indicação permaneceram na gestão após a apresentação de um PGE e aprovação do mesmo pela comunidade escolar, ou seja, em poucas unidades escolares houve escolha de novos gestores. Destaca-se que esse período temporal (2016-2019) foi objeto de estudo de pesquisa dissertativa ( PALÚ, 2019 ), que deu origem ao artigo, na qual foi realizado um estudo aprofundado dos documentos norteadores e influenciadores do novo modelo e análise de 10 (dez) PGES, escolhidos como amostra para o estudo.

4“The anglophone term ‘governance’ can be traced to the classical Latin and ancient Greek words for the ‘steering’ of boats. It originally referred mainly to the action or manner of governing, guiding, or steering conduct and overlapped with ‘government’.” ( JESSOP, 2018 , p. 44, tradução nossa).

5“[...] the concept of good governance as part of its criteria for lending to developing countries. It invoked governance to refer to changes in the public sector associated with the new public management, marketization, and even privatization. ” ( BEVIR; RHODES, 2001 , p. 1, tradução nossa).

6“[...] but it not the whole of the State. ” ( DALE, 1989 , p. 53, tradução nossa).

7Datam desse período grandes mobilizações de educadores representados pelas associações, como a Associação Nacional de Educação (ANDE), Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped) e o Centro de Estudos Educação Sociedade (Cedes). Essas foram responsáveis pela organização das Conferências Nacionais de Educação (CBEs), que aconteceram ao longo dos anos de 1980, com destaque para a IV Conferência Brasileira de Educação, na qual foi promulgada a Carta de Goiânia, que contou com a participação de mais de seis mil pessoas que indicaram propostas para a nova constituição ( PINO et al., 2018 ). A gestão democrática da educação figurava dentre as reivindicações dos educadores.

8O Decreto n. 9.203, de 2017 ( BRASIL, 2017 ), institui a política de governança no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. Conforme o decreto a governança pública é entendida como um “[...] conjunto de mecanismos de liderança, estratégia e controle postos em prática para avaliar, direcionar e monitorar a gestão, com vistas à condução de políticas públicas e à prestação de serviços de interesse da sociedade.” ( BRASIL, 2017 ). O documento destaca seis princípios da nova política: capacidade de resposta; integridade; confiabilidade; melhoria regulatória; prestação de contas e responsabilidade; e transparência. Muitos estados e municípios têm criado legislações próprias, assumindo essa política como orientadora das ações da administração pública.

9Conforme propõe Mészáros, em sua obra A educação para além do capital (2008).

10Em 2019, o Decreto n. 1.794/2013 ( SANTA CATARINA, 2013 ) foi revogado, sendo substituído pelo Decreto n. 194/2019 ( SANTA CATARINA, 2019c ). Esse último passou a regulamentar a escolha dos PGEs a partir de então.

11Disponível em: http://sistemas2.sed.sc.gov.br/webgesc/wpusuextbuscapge.aspx . Tomou-se como referência a versão inicial dos PGEs 2015. Acesso em: 10 fev. 2019.

12Conforme o Decreto SC n. 1.794, a vacância na função de dirigente escolar ocorre nos seguintes casos: “I – conclusão da gestão escolar; II – renúncia; III – destituição; IV – aposentadoria; ou V – morte.” ( SANTA CATARINA, 2013 , p. 7).

Recebido: 27 de Janeiro de 2021; Aceito: 04 de Maio de 2021

Janete Palú Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal do Paraná (UFPR), na Linha de Pesquisa de Políticas Educacionais. Mestra em Educação pela Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Integrante do Grupo de Pesquisa em Gestão e Inovação Educacional (GPEGIE) da UFFS e do Grupo de Pesquisa Políticas e Gestão da Educação da UFPR. Professora de História e Assistente Técnica Pedagógica da rede pública estadual de Santa Catarina. E-mail: janete.palu@ufpr.br

Oto João Petry Doutor em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Professor e Pesquisador da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Líder do Grupo de Pesquisa em Gestão e Inovação Educacional (GPEGIE). Integra a Linha de Pesquisa em Políticas Educacionais do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da UFFS. E-mail: oto.petry@uffs.edu. br.

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