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Revista Brasileira de Política e Administração da Educação

versão impressa ISSN 1678-166Xversão On-line ISSN 2447-4193

Revista Brasileira de Política e Administração da Educação vol.37 no.3 Goiânia set./dez 2021  Epub 15-Mar-2022

https://doi.org/10.21573/vol37n32021.109499 

ARTIGOS

A política pública de apoio financeiro à escola família agrícola de Natalândia: um enfoque sobre a implementação

The public policy of financial support to Natalândia family agricultural school: a focus on implementation

La política pública de apoyo financiero a la escuela de familia agrícola de Natalândia: un enfoque en la implementación

ALEX ANDRADE1 
http://orcid.org/0000-0002-9381-7479

PEDRO LUCAS DE MOURA PALOTTI2 
http://orcid.org/0000-0002-9071-9726

1Universidade Estadual de Minas Gerais Programa de Graduação em Administração e Economia Rural Departamento de Educação Natalândia, MG, Brasil

2Universidade de Brasília Programa de Ciência Política Departamento de Administração Pública Brasília, DF, Brasil


Resumo

O presente artigo procurou compreender, a partir da teoria bottom- up e dos escritos atuais sobre os burocratas de nível de rua, o processo de implementação da política estadual de apoio financeiro às Escolas Famílias Agrícolas em Minas Gerais. Para tanto, foram realizados três grupos focais com professores, famílias e estudantes dessas escolas no município de Natalândia/ MG. Os resultados indicam que a implementação foi bem-sucedida em razão da implementação conjunta, o que garantiu aos implementadores da Pedagogia da Alternância a capacidade de se dialogar em prol da essência do programa.

Palavras-Chave: Políticas públicas; implementação bottom-up; burocratas de nível de rua; Pedagogia da Alternância; transição agroecológica

Abstract

This article sought to understand the process of implementing the state policy of financial support to Family Agricultural Schools in Minas Gerais from the bottom-up theory and current writings on street-level bureaucrats. To this end, three focus groups were held with teachers, families, and students from these schools in the municipality of Natalândia/MG. The results show that the implementation was successful due to the joint implementation, which guaranteed the implementers of Alternation Pedagogy the ability to dialogue in favor of the essence of the program.

Key words: Public policies; bottom-up implementation; street-level bureaucrats; Alternation Pedagogy; agroecological transition

Resumen

Este artículo buscó comprender, desde la teoría bottom-up y los escritos actuales sobre burócratas de la calle, el proceso de implementación de la política estatal de apoyo financiero a las Escuelas de Familias Agrícolas en Minas Gerais. Con este fin, se llevaron a cabo tres grupos focales con maestros, familias y estudiantes de estas escuelas en el municipio de Natalândia/MG. Los resultados muestran que la implementación fue exitosa debido a la construcción conjunta que garantizó a los implementadores de Pedagogía de Alternancia la capacidad de dialogar a favor de la esencia del programa.

Palabras-clave: Políticas publicas; implementación bottom-up; burócratas a pie de calle; Pedagogía de Alternancia; transición agroecológic

INTRODUÇÃO

O direito à educação é previsto na Carta Magna de 1988 como “direito de todos e dever do Estado e da família” ( BRASIL, 2016 [1988]), de forma que o ensino ofertado tenha garantia de padrão de qualidade. Na prática, nem sempre é possível verificar a qualidade do ensino, em razão da falta de recursos, da gestão adotada pelo Estado ou pelas especificidades de cada caso. No caso da Educação do Campo, assegurada aos povos e comunidades tradicionais, percebe-se ainda maiores dificuldades de se aferir e encontrar resultados satisfatórios por meio dos processos de avaliação quantitativos utilizados atualmente pelo Estado. O Decreto 7.352/2010, do Governo Federal, estabeleceu um rol de princípios que o Estado deve adotar para promover o ensino dos estudantes oriundos do meio rural ( BRASIL, 2010 ). O ensino precisa ser contextualizado à realidade dos estudantes. Nesse sentido, a Educação do Campo “nasceu como crítica à realidade da educação brasileira, particularmente à situação educacional do povo brasileiro que trabalha e vive no/do campo”. ( CALDART, 2009 , p. 39).

É nesse contexto que as Escolas Famílias Agrícolas – EFAs – ganham destaque e reconhecimento, pois consistem em associação sem fins lucrativos cujos sócios são, sobretudo, agricultores familiares, os quais fazem a gestão administrativa, financeira e pedagógica dessas escolas. As lições e o modelo dessas instituições de ensino são originários da França ( ARAÚJO, 2015 ). As EFAs buscam discutir a questão da sucessão rural, discussões ambientais e a busca pelo emprego de técnicas de produção agroecológica.

O ensino ocorre por meio da Pedagogia da Alternância em que o estudante fica quinze dias na Escola e quinze dias em casa onde coloca em prática o seu aprendizado teórico, dentro da propriedade de suas famílias. Nessa esfera, a Pedagogia da Alternância potencializa a Educação do Campo ao permitir à juventude o acesso à educação, sem perder os vínculos sociais, produtivos e culturais com suas famílias e comunidades ( SILVA, 2006 ). Os estudos sobre a Educação do Campo evidenciam que a luta pela terra não é unicamente a disputa por um pedaço de terra, mas a busca por autonomia, libertação, por políticas públicas abrangentes e pelo reconhecimento e análise das práticas educativas presentes no território ( MUNARIM, 2011 ).

Estes significados da luta pela educação e pela autonomia dos povos do Cerrado (ZANELLI et al. , 2016), são demandas explícitas tanto dos movimentos nacionais que constroem a Educação do Campo, quanto dos grupos sociais que buscam igualdade material de direitos. A valorização jurídica da dimensão regional e de sua autonomia política, associada aos planos regionais de desenvolvimento são medidas necessárias para eliminar os desequilíbrios e as desigualdades na promoção do desenvolvimento das regiões problema do país ( MOLINA, 2006 ).

Dessa maneira, o presente artigo teve como questão fundamental saber como se deu a implementação e quais as consequências do programa do governo de Minas Gerais de Apoio Financeiro às Escolas Famílias Agrícolas e à Educação do Campo para a produção e reprodução social da vida no campo, a partir da teoria bottom-up e dos burocratas de nível de rua.

Por meio dessa análise, o artigo teve como objetivo geral compreender a contextualização jurídica sobre a Lei Estadual 14.614 de 31 de março de 2003 e os efeitos da implementação dessa política pública a partir do público alvo definido no percurso metodológico. Nesse cenário, tentaremos compreender como foi o contato dos professores, burocratas de nível de rua, com os princípios, diretrizes e valores presentes do programa do Governo do Estado de apoio as Escolas Famílias Agrícolas. Qual a relação desses professores com as famílias, os estudantes e a comunidade?

Empreenderemos um estudo de caso, voltado a compreender o processo de implementação da política pública de Educação do Campo tendo como base a Escola Família Agrícola de Natalândia - EFAN. Para tanto, o artigo foi dividido em cinco partes: 1) construção do conceito de política pública a partir do conceito da teoria bottom-up e sobre os burocratas de nível de rua; 2) apresentação de um histórico sobre a EFAN; 3) métodos empregados pela pesquisa; 4) apresentação dos resultados da pesquisa; e 5) as considerações finais e desdobramentos do estudo.

O CONCEITO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E A IMPLEMENTAÇÃO DA POLICY

Para melhor compreensão sobre o Programa de Apoio Financeiro do Governo do Estado de Minas Gerais para as Escolas Famílias Agrícolas do Estado, torna-se fundamental compreender e promover uma revisão teórica em torno do conceito de políticas públicas. Além disso, esta compreensão torna-se ainda mais necessária para o próximo capítulo, que terá o escopo de compreender o processo de implementação deste programa, cabendo fazer esta analise à luz da teoria e dos conceitos de políticas públicas identificados na melhor literatura contemporânea sobre a temática.

O conceito de políticas públicas não é pacífico na literatura, podendo ser entendido tanto como um processo de natureza técnico-política, voltado à resolução de problemas ( HOWLETT; RAMESH,1995 ), quanto aquilo que um governo decide fazer ou deixar de fazer, ou seja, suas ações e omissões ( DYE, 2010 ; SMITH; LARIMES, 2009). As políticas públicas apontam também para decisões inter-relacionadas, tomadas por atores políticos, que, em um contexto específico, definem seus objetivos e os meios necessários para alcançá-los ( JENKINS, 2009 ). Nesses termos, “compreender o processo das políticas públicas requer aprofundar o olhar nos arranjos institucionais que dão sustentação à implementação destas”. ( GOMIDE; PIRES, 2014 , p. 21).

Por sua vez, a implementação de políticas públicas se apresenta como um processo de fases múltiplas, que objetivam a concretização das decisões, compreendidas como a formulação da política pública ( RUA, 1998 ). Dessa maneira, os objetivos da decisão da política prevêem uma série de elementos para apurar o êxito em sua execução que perpassa desde a identificação dos problemas a serem solucionados, com as metas e objetivos a serem alcançados, até o procedimento institucional a ser adotado para a execução da política pública.

Do ponto de vista concreto, a implementação pode ser entendida como todas as ações realizadas pelas pessoas, seja de forma singular ou com participação coletiva, ou ainda sob representação da iniciativa pública ou privada com o intuito de se objetivar alcançar as decisões sobre políticas públicas. Dessa forma, podemos afirmar que os principais modelos de implementação vislumbrados são os denominados “modelo top-down ”, “modelo bottom-up ” e os “modelos híbridos”. Para fins da pesquisa, nos ativemos em aprofundar os estudos sobre a teoria bottom-up .

O modelo bottom-up , ao invés de se organizar de forma despolitizada, neutra e sem pretensões, respeitando a hierarquia das decisões e buscando a execução da policy a partir do comando do governo, propõe o contrário, realizar a implementação a partir do planejamento e de estratégias desenvolvidas pela burocracia de nível de rua, em busca de minimizar os problemas ligados à implementação.

Nessa linha, Michael Lipsky (2019) , entre outros teóricos dessa narrativa de políticas públicas, aponta que a fase inaugural de uma política pública se configura com “os problemas com os quais os atores se deparam” (falta o número da página, por ser uma citação direta). O autor desenvolveu o conceito de “ street level bureaucracy ” (ou “burocracia de nível de rua”), por considerar que os burocratas locais estão mais próximos da realidade e dos problemas sociais do que os responsáveis pela decisão. Essa burocracia se articula a partir dos agentes implementadores próximos aos cidadãos e usuários da política pública, como o caso dos policias militares, professores, diretores de escola, agentes comunitários de saúde etc. (RUA, 1998).

Dessa maneira, Lipsky (2019) faz compreender que a “street level bureaucracy” possui a capacidade de tomar decisões simples em seu território e a partir disso adequar a política pública à realidade local, “inclusive, possui o poder de impedir e de transtornar a execução das políticas públicas, se assim desejar.” ( RUA, 1998 , p. 95). A implementação, que é uma fase muito complexa, foi representada na Figura 1 , com o modelo analítico no caso da teoria bottom-up aplicado ao Programa de Apoio Financeiro às Escolas Família Agrícola.

Fonte: Elaboração própria.

Figura 1 Relações teóricas observadas no estudo 

Percebe-se, a partir da Figura 1 , a atuação dos agricultores no processo de mobilização para a criação de uma associação e o processo articulado para a implementação de uma política pública de apoio ao programa de Educação do Campo, vislumbrado pelos sujeitos do local, em uma clara situação em que a política nasce de “baixo para cima,” ou seja, quando gerada pela sociedade civil - indivíduos, cidadãos, grupos comunitários e similares, sendo denominada de bottom-up ( LOTTA, 2012 ).

Esse tipo de abordagem pode ocorrer a partir do desejo e da crença ligados às pessoas e comunidades locais, por ações coletivas, geradas a partir das necessidades locais. Essas ideias reforçam a participação mobilizadora dos cidadãos, havendo posteriormente testes e validação da prática inovadora. Por essa razão, buscaremos analisar, na próxima seção, o histórico da instituição utilizada para realização do estudo de caso.

PILARES E ORGANIZAÇÃO DA ESCOLA FAMÍLIA AGRÍCOLA

A política pública instituída pela Lei 14.614 de 2003, de Apoio Financeiro à Escola Família Agrícola , apresenta em seu artigo 2º, a ideia crucial da política pública, qual seja:

  • será beneficiada com recursos provenientes do programa instituído por esta lei a escola que:

  • I - oferecer cursos gratuitos de ensino fundamental da 5ª à 8ª serie de ensino fundamental e ensino médio, com educação profissional;

  • II - for gerenciada por uma associação autônoma, composta de pais, pessoas e entidades comprometidas com o desenvolvimento da agricultura familiar;

  • III - aplicar o método da pedagogia da alternância;

  • IV - tiver como objetivo a formação integral do aluno, com a transmissão, inclusive, dos conceitos e conteúdos do desenvolvimento sustentável. ( MINAS GERAIS, 2003 ).

A escola utiliza-se quatro pilares fundamentais: o primeiro é a associação, que consiste no instrumento por meio do qual as famílias se comprometem com o projeto educativo dos filhos. O segundo pilar está associado à pedagogia da alternância: é a forma de educar que se aproxima mais da realidade do campo, visto que adota um conjunto de instrumentos pedagógicos que partem da realidade do aluno, valorizando o conhecimento pessoal e popular e prioriza suas experiências socioprofissionais; raciocínio semelhante ao do educador popular Paulo Freire ao conceber que “[n]ão há saber mais ou saber menos, há saberes diferentes“ (FREIRE, 1987, p.68).

O terceiro pilar apresenta um atendimento integral e personalizado, uma vez que o aluno é o centro do processo ensino-aprendizagem. Com essa visão, a EFA procura oferecer uma educação voltada para os aspectos humano, social, intelectual, profissional, ético e ecológico. O regime de internato favorece esse atendimento integral.

Por fim, o último pilar consiste no desenvolvimento do meio, uma vez que o modelo EFA atenta para o desenvolvimento dos sujeitos, mas ao mesmo tempo, para o próprio desenvolvimento do espaço em que o estudante está inserido. Diante disso, é necessário pensar nas questões culturais, ambientais, sociais, políticas, econômicas para que haja o desenvolvimento do meio em que vive o estudante.

A Figura 2 sintetiza os pilares que formam a Escola Família Agrícola .

Fonte: Elaboração própria.

Figura 2 Pilares da Escola Família Agrícola 

SOBRE O OBJETO DE ESTUDO: A EFAN

A Escola Família Agrícola de Natalândia - EFAN possui sede no assentamento de reforma agrária PA Saco do Rio Preto, no município de Natalândia, noroeste do Estado de Minas Gerais. É uma instituição sem fins lucrativos e mantida pela Associação EFAN, responsável por fazer a gestão administrativa, financeira e pedagógica, e é composta por agricultores e agricultoras familiares, sobretudo pais e mães dos estudantes, assim como alunos e simpatizantes ao projeto. A discussão em torno da EFAN se iniciou a partir da necessidade de oferecer um curso de ensino médio profissionalizante para os filhos de agricultores familiares da região (EFAN, 2018).

Nesse contexto, os assentados dos Projetos de Assentamento Saco do Rio Preto, Mangal e Mamoneiras, no Município de Natalândia-MG se organizaram frente à consolidação dos objetivos e às diversas negociações que eram feitas para viabilizar o funcionamento da instituição, que teve seu funcionamento iniciado em 2006, por meio de convênio celebrado entre o INCRA e a Universidade Federal de Viçosa, que já vinha desenvolvendo projetos de pesquisa na região Noroeste de Minas Gerais.

Frise-se ainda que, no ano de 2012, foi editada a Lei 12.695, de 25 de julho de 2012, que, em seu artigo 13, previu “a possibilidade de distribuição de recursos [...] em relação às instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos e conveniadas com o poder público, o cômputo das matrículas efetivadas” ( BRASIL, 2012 ). Embora a lei mineira que tenha instituído o programa seja de 2003, somente em 2013 o Governo do Estado deu eficácia a essa política pública ao garantir na Lei Orçamentária do ano anterior, a rubrica para o programa.

MÉTODO DE PESQUISA

Para melhor compreensão sobre o processo de implementação desta política pública de Educação do Campo, tornou-se necessário fazer um estudo de caso, escolhendo para tanto a EFAN, em razão desta apresentar o maior número de estudantes em uma mesma instituição beneficiada pela política pública, assim como o maior número de municípios atendidos. Para isso, foram realizados três grupos focais, voltados a compreender o processo de implementação de políticas públicas dentro da EFAN, a partir da visão dos professores, estudantes e familiares. Desta feita, para fins de constituição de grupo focal, foram analisados todos os professores que atuaram na EFAN de 2013 a 2019. Sobre grupos focais, Morgan (1998) define como uma técnica de pesquisa qualitativa, derivada das entrevistas feitas em grupo, que objetiva reunir informações por meio das interações com as pessoas do grupo. A escolha dos professores recaiu pelo fato de estarem como burocratas do nível de rua e por constituírem uma das principais interfaces do Estado perante os cidadãos e os beneficiários diretos.

Em outro vértice, foi relevante compreender as percepções dos beneficiários diretos da política pública, no caso, os estudantes e os familiares, de modo a configurar papel instrumental para revelar os desafios em que se viram inseridos, as dificuldades, as vantagens e desvantagens do modelo de ensino sob a ótica da formação teórica e humana. Assim como, de perceber o grau de relevância ou de irrelevância que os beneficiários atribuíram à política pública e se houve ou não alteração na perspectiva do jovem e da família a partir do ingresso do estudante na instituição.

Considerando que a instituição abrange estudantes de vinte e quatro municípios e três Unidades da Federação, optamos por constituir um grupo focal com todos os alunos egressos e residentes atualmente no município de Natalândia, que se formaram entre 2015 (primeira turma de estudantes concluintes) e 2018, o que totaliza vinte e três estudantes, com idade média de 20 anos, de um universo de cento e vinte estudantes concluintes no período. Posteriormente, foi montado um grupo focal específico com as famílias destes estudantes com o propósito de compreender a implementação da política pública sob a ótica das famílias.

O grupo dos doze professores formou o primeiro grupo focal a ser ouvido. Para tanto, um convite foi direcionado a cada um dos professores, sendo reforçado pelo diretor escolar. O encontro ocorreu na sala de professores da EFAN, de modo que os participantes se sentaram em um formato de círculo, nos moldes em que a sala já se encontrava. De início, foram apresentados os objetivos da pesquisa e a proposta do trabalho, sendo lançada a primeira pergunta.

Diante de cada pergunta e a partir de cada resposta dada, os professores adicionavam suas impressões às dos colegas, fazendo com que o conteúdo das falas fosse complementar. Em algumas vezes, era necessária a mediação para retomar ao objetivo do grupo focal, contudo tendo o cuidado necessário para preservar a impressão de cada participante sobre o momento anteriormente vivenciado.

O primeiro encontro durou cerca de duas horas. Na oportunidade, ficaram acertadas as datas dos dois encontros posteriores, a partir de um calendário que há havia sido feito com outros dois grupos focais. O objetivo era ouvir os grupos de forma intercalada. O segundo grupo focal foi formado pelos estudantes, que estavam um pouco apreensivos, por não nos conhecerem. O grupo foi ouvido em uma das salas de aula da escola, sendo observada a mesma sistemática registrada no grupo dos professores. Com os estudantes tivemos dois encontros, tendo, cada um deles, uma hora e meia de duração.

Por fim, após os primeiros encontros com os professores e os estudantes, ouvimos os familiares dos alunos envolvidos. Devido à dificuldade dessas pessoas em se deslocarem de suas casas, resolvemos fazer um único encontro que teve a duração de quatro horas, com um intervalo de vinte minutos para um lanche servido pela escola.

É relevante salientar que em razão da metodologia adotada, que compreendeu os atores envolvidos no processo, reunimos as condições necessárias para verificar a implementação e efetividade da política pública de apoio financeiro do Estado às Escolas Famílias Agrícolas. Os grupos focais foram fundamentais também para compreendermos as consequências da implantação da política pública do governo de Minas Gerais com o financiamento às Escolas Famílias Agrícolas, analisando o prisma municipal e as famílias envolvidas diretamente com o projeto. A técnica também auxiliou a analisarmos as lacunas e os marcos legais que devem ser executados para plena efetividade da política pública examinada, de modo a realizar recomendações aos gargalos e obstáculos presentes, a partir da legislação mantida em nosso ordenamento jurídico.

A Tabela 1 sintetiza algumas informações sobre cada Grupo Focal.

Tabela 1 Grupos Focais 

Grupo Focal/ Variante Quantidade de Encontros Número de Pessoas Local de Realização/ formato Duração total dos Encontros
Alunos 2 encontros 23 Sala de aula, em círculo 3 horas
Professores 3 encontros 12 Sala dos professores, em círculo 6 horas
Famílias 1 encontro 18 Sala de aula, em círculo 4 horas

Fonte: Elaboração própria.

Como regra, os encontros se deram em sala, com um gravador e um assistente que anotava suas impressões sobre o processo, assim como as falas na integralidade. Esse foi o método utilizado em todos os encontros, com todos os grupos focais formados.

OS RESULTADOS DA IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA DE APOIO FINANCEIRO ÀS EFAS DE MINAS GERAIS: UMA ANÁLISE EM TORNO DA EFAN

Com base nas informações extraídas a partir dos grupos focais, a pesquisa apresentará a seguir, os resultados obtidos, considerando as dimensões propostas a partir da implementação da política pública, permitindo que, a partir das variáveis de cada público alvo, do marco analítico da teoria bottom-up e das respostas às diversas perguntas feitas, seja possível a mais clara resposta à pergunta fundamental.

A PARTICIPAÇÃO DOS PROFESSORES NA IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA

A atividade do professor, antes de mais nada, é um exemplo claro do papel dos burocratas de nível de rua, conforme reconhecido por diversos autores que estudam a implementação de política públicas ( LIPSKY, 2019 ; LOTTA, 2012 ). No caso específico do programa de apoio financeiro às EFAs do Estado de Minas Gerais, percebe-se de forma inaugural que a política pública foi desenhada de baixo para cima, no modelo bottom-up de implementação.

De todo modo, coube aos professores, ao menos este é o sentimento do grupo entrevistado, ajustarem o que se faziam nas salas de aula às ações pretendidas pelo governo na política pública. Afinal, cabe ao professor desenvolver técnicas e gerenciar a sala de aula, atendendo aos objetivos da turma e, então, da própria política pública.

A Lei 14.614/2003 continha dois requisitos para que a instituição fosse beneficiada com a política pública e recebesse o apoio financeiro, quais sejam: a) aplicar o método pedagógico da alternância e b) ter como objetivo a formação integral do aluno, com a transmissão, inclusive, dos conceitos e conteúdo do desenvolvimento sustentável.

Percebe-se que os dois requisitos depositam suas expectativas nos professores. Primeiro, por serem fundamentais e indispensáveis no processo de elaboração do projeto político pedagógico da instituição, documento obrigatório para o seu funcionamento e elemento indispensável para que a instituição se apresente como candidata a receber o apoio financeiro. Segundo, por garantir a discricionariedade e autonomia do professor, mas exigindo um conhecimento e formação específica voltada ao contexto da Educação do Campo, o que delineia o seu perfil de burocrata de nível de rua. Afinal, “na melhor das hipóteses, burocratas de nível de rua inventam modos de processamento em massa, que mais ou menos permitam lidar com o público de forma justa, apropriada e ponderada”. ( LIPSKY, 2019 , p. 19).

Podemos dizer que a multiplicação de formadores, experiências e trocas favorece a partilha com a família, comunidade, instituições, associações, parceiros, entre outros que assumem a co-formação na alternância e, em razão do movimento da alternância (sessão escolar e sessão familiar) e seus instrumentos pedagógicos, promovem uma rede relacional . Conforme Gimonet (2007) , relacionando o campo social, familiar e profissional, criando um sistema relacional amplo e denso, constituído de pequenas ilhas relacionais no seio das quais os contatos humanos se multiplicam.

Para melhor elucidação sobre a implementação da política pública, foi importante compreender a valoração dada pelos professores selecionados na pesquisa no tocante ao programa do pelo governo de Minas Gerais.

Nesse prisma, três questionamentos nortearam a posição dos professores selecionados no grupo focal, quais sejam: Qual a impressão dos professores sobre o apoio do governo? O que o apoio do governo significou para as EFAs? Quais os pontos positivos e negativos vistos pelos professores sobre a política pública vislumbrada na Lei?

O que se percebe ao fazer a leitura dos pontos registrados e do processo histórico de implementação desta política pública era que o estado desejava dar uma resposta aos movimentos sociais com relação aos anseios de uma Educação do Campo e, por falta de outra política voltada aos povos e comunidades tradicionais, garantiu o financiamento destas instituições.

Os sentimentos desses professores convergem ao sentimento de que a política em primeiro momento não teve acompanhamento técnico por parte do estado e que ele não capacitou a equipe nem a própria associação mantenedora, que faria a prestação de contas do projeto.

Contudo, nos parece evidente que deram valor positivo à ação por parte do estado. Em especial, pelo fato de que em sua concepção o governo estadual via o programa como forma de reconhecer a relevância desses educadores e do próprio movimento, outrora, sendo apoiados pela iniciativa privada e por projetos isolados.

Tão relevante quanto saber a valoração dada pelos professores à política pública analisada, é importante compreender a formação dessa equipe de professores, em especial o seu alinhamento acadêmico com os princípios da Educação do Campo.

O desenho da formação de professores voltados a essa didática se mostra semelhante. O registro dos professores selecionados mostra que os cursos voltados à Educação do Campo ainda eram incipientes no Estado de Minas Gerais, nem se mencionando cursos voltados à Pedagogia da Alternância. Apenas três professores possuíam curso superior com práticas voltadas para essa formação específica, embora todos tivessem algum curso de graduação. Esses professores haviam sido formados na primeira experiência do Estado de Minas Gerais, ocorrida a partir de 2006, com cursos de licenciatura em Educação do Campo, ofertados pela Faculdade de Filosofia e Letras de Diamantina em parceria com a Universidade Estadual de Minas Gerais.

A falta de planejamento do estado para iniciar a política pública por parte e a situação prática evidenciada pela instituição fizeram com que os momentos iniciais da instituição fossem uma mescla da realidade das instituições públicas que ofertam ensino regular, com o esforço para se fazer uma transição para o que havia sido desenhado no projeto político pedagógico. O sentimento remanescente entre os professores é o de que a equipe teve muita autonomia para encontrar um caminho a seguir, sendo fortalecida e conduzida pelos professores com maior experiência e que já haviam formação em área correlata à da Educação do Campo.

Ao compreender os instrumentos utilizados pelos professores para se aproximarem dos princípios da Educação do Campo e automaticamente do escopo da política pública, podemos melhor relacionar com o processo de implementação, em especial, para compreender a implementação da política pública sobre o prisma da teoria bottom-up .

Nesse contexto, percebe-se um claro aprimoramento do trabalho que as EFAs do estado desenvolviam para implementar a política. Essas instituições já apresentavam como objetivo, desde suas origens, a oferta de cursos de Formação Profissional Técnica de Nível Médio, integrada com o Ensino Médio e em regime de alternância, com enfoque em agroecologia, permitindo ao estudante conhecimentos, saberes e competências profissionais necessárias ao exercício profissional e da cidadania, com base nos fundamentos sociais, históricos e culturais em que estão inseridos. Ao criar a Lei 14.614/2003, o Estado de Minas Gerais considerou todos esses aspectos e instrumentos para garantir a implementação da política pública, o que se percebe um apelo evidente da teoria bottom-up .

No mesmo sentido, a atuação dos professores e sua autonomia demonstram uma atuação clara dos burocratas de nível de rua. Dessa forma, como não havia um regramento de conduta profissional e um procedimento padrão para que os professores desenvolvessem estes instrumentos pedagógicos, os resultados poderiam sair de forma distinta em cada espaço, isto é, de uma sala de aula para outra, de uma família para outra ou de uma escola para outra, uma vez que a autonomia de cada professor e a forma como eles conduziriam o dialogo poderiam garantir resultados distintos.

Por outro lado, os indicadores sociais configuram um dos grandes instrumentos para realização da gestão de projetos permitindo, sobretudo, por meio da avaliação, delinear os contornos necessários para a reformulação de políticas públicas existentes. Por essa razão, compreendemos que nesse ponto os professores reúnem diversas condições de avaliar a política pública esculpida na legislação estadual, uma vez que podem colaborar com o planejamento, implementação, execução, avaliação dos programas, projetos e serviços sociais.

Sobre essa questão, os professores apontaram que as diretrizes da educação indígena e quilombola ainda não haviam ganhado corpo próprio e discussão em nível estadual na época. Com base nas questões, conclui-se que a política pública não apresentou críticas elementares a serem destacadas, justificando-se em razão do fato de o Estado de Minas Gerais ter se apropriado do trabalho que essas instituições já desenvolviam desde o início da década de 1970, em outros estados da federação.

O ENVOLVIMENTO DAS FAMÍLIAS NA IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA

As famílias tiveram o papel de pontuar a política pública em análise sobre três dimensões: a) as percepções com a proposta de ensino da escola, b) se a conclusão do curso abriu portas para ampliar o aumento de renda da família; e c) se a conclusão do curso fez repensar as práticas ambientais anteriormente existentes.

Os relatos das famílias, convergem para o discurso de Jesus (2011) que afirma que a Educação do Campo colabora com as expectativas de pensar o meio rural como espaço e território viável e, a partir de diversas experiências, viabiliza o fortalecimento das ações na busca por políticas públicas no intuito de garantir as ações educativas, mas também fomentar a diversificação da produção no território camponês em harmonia com o meio ambiente.

Nesse ponto, podemos ainda destacar que é valioso quando a gestão pública compreende a participação dos usuários para alcançar a eficiência do serviço público. A sensação de atendimento e contemplação com a política pública advém, por essa razão, da adoção da teoria bottom-up e seus princípios de atuação, uma vez que conservou em seu desenho as características e os contornos que os usuários esperavam dessa política.

As famílias registraram, contudo, que faltou ao governo equiparar as Escolas Famílias Agrícolas às Escolas Públicas relativas a alguns direitos, como por exemplo a possibilidade de acesso ao material do Programa Nacional do Livro Didático Rural e oferecer o sistema de cotas para alunos de escolas públicas nos processos seletivos, uma vez que a maior parte do recurso advém do poder público.

As questões levantadas são relevantes para fins desse estudo, uma vez que as famílias, como beneficiárias e usuárias do serviço público, contribuíram para que houvesse o aperfeiçoamento da política pública uma vez que, a partir de uma falha e consequente redefinição, foi possível remodelar o design da ação governamental. Esta falha a que nos referimos foi corrigida quando, em 2015, o governo estadual editou uma resolução permitindo o aumento de recursos para as escolas, o que propiciou às instituições fazerem a aquisição dos livros didáticos que melhor ilustrassem a realidade do plano didático.

Por outro prisma, observa-se que a política pública analisada tem como eixos transversais a elevação do número de profissionais da área técnica, por meio da expansão da assistência técnica e extensão rural. Com base nesse quadro, foi questionado às famílias se após a implementação da política pública houve aumento em sua renda e, caso tenha havido, se esta se relaciona à formação do jovem. Ao mesmo tempo, as famílias são alvo do constante processo de formação da instituição após a definição das diretrizes e finalidades, que contam com a sua participação para traçar as ações e os assuntos a serem abordados.

Por essas razões, a compreensão sobre a percepção das famílias acerca do processo de implementação de políticas públicas torna-se indispensável neste processo pois elas possuíam o condão de modificar a própria política pública, em virtude da autonomia existente no processo de gestão escolar.

Com base nos relatos, percebe-se que a política pública soube contornar resultados que foram positivos para além da formação pedagógica dos estudantes e que esses resultados foram favoráveis ao desenvolvimento da agricultura e da economia para o meio em que as famílias estavam inseridas.

A PARTICIPAÇÃO DOS ESTUDANTES NA IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA DE APOIO FINANCEIRO

Podemos dizer que uma das originalidades deste trabalho consiste exatamente em compreender, à luz da teoria bottom-up , a participação dos estudantes no processo de implementação da política pública de apoio financeiro as EFAs.

No que tange aos estudantes, a pesquisa observou duas dimensões. A primeira teve o escopo de compreender quais as percepções dos estudantes sobre a proposta de ensino da escola. Essa dimensão é relevante para averiguar se o estudante percebeu alguma mudança entre escola atual e a antiga e se o projeto da escola dialogava com a sua realidade. A segunda dimensão, se pautou em compreender se os estudantes tiveram novos posicionamentos que garantissem novas oportunidades, de modo a investigar se o estudante repensou suas práticas ambientais e se colaborou para o meio em que estava inserido.

Percebe-se que os estudantes avaliaram positivamente a implementação da política, sendo relevante ressaltar a importância do envolvimento dos burocratas de nível de rua, os professores, com sua participação no projeto de formação e em atenção aos princípios e finalidade da política pública.

Com base na discussão e alegações trazidas pelos estudantes, percebe-se o sentimento e a identidade campesina, a preocupação com o meio e com a forma de privilegiar práticas agropecuárias sustentáveis que estejam ligadas diretamente à proposta pedagógica da instituição, que prioriza discussões sobre essas questões, a fim de mostrar para os estudantes, alternativas viáveis e adaptáveis de acordo com a realidade de cada família.

Ademais, o modo de atuação dos estudantes contribuiu para melhor aceitação da política pública estudada, pois garantiu, a princípio, a sensação de tranquilidade e de evolução para as famílias que aceitaram os projetos de intervenção em suas propriedades. Além disso, os exemplos vistos nas unidades experimentais, executados nas propriedades dos estudantes, estimularam os agricultores vizinhos a adotarem o mesmo procedimento, fomentando em parte a assistência técnica nessas localidades.

É importante corroborar que a impressão que permaneceu foi a de que o êxito da política pública deriva do empenho dos burocratas de nível de rua em compreender sua importância enquanto agentes de desenvolvimento. Mas também na capacidade do gestor público em delinear uma política que garantisse a essência que já era aplicada e ao mesmo tempo conservasse a autonomia dos atores envolvidos no processo de implementação.

Com base nos elementos trazidos pelos estudantes, percebeu-se o seu envolvimento e sua atuação como protagonistas da política pública, permitindo, por meio de suas análises e participações, a adaptação da política.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A construção da política pública de apoio financeiro às EFAs voltadas à Educação do Campo, em linhas gerais, ocorreu graças à participação dos burocratas de nível de rua, incluindo-se professores, familiares e estudantes. Com apelo à realidade e boa comunicação com os objetivos da política, representou o atendimento a pretensões antigas dos movimentos sociais e da população campesina em contar com um modelo de educação que dialogasse com respeito à diversidade do campo em seus diferentes aspectos a partir da formação profissionalizante.

Outra consideração pertinente é que a teoria bottom-up e os estudos atuais sobre os burocratas de nível de rua, ofereceram respostas suficientes para compreender o processo de implementação, de modo que foi possível esgotar a pergunta fundamental, permitindo apontar que a política pública garantiu a sensação de melhor formação aos estudantes e aos familiares, na mesma medida em que garantiu novas oportunidades para geração de emprego e renda, diversificando a produção agrícola e favorecendo a transição agroecológica no meio em que está inserido o público alvo. A atuação da equipe de professores foi pautada pela autonomia didática a partir dos diversos instrumentos que tiveram a sua disposição.

A pesquisa permitiu certificar, ainda, que os estudantes e familiares tiveram papel ativo na implementação da política, pois, em comunhão com os professores e equipe pedagógica, traçaram estratégias para ver solucionada a questão da formação de qualidade e de que forma ela poderia contribuir para o desenvolvimento do meio.

É relevante pontuar que, embora não tenha havido relatos sobre os desvios de finalidade da política pública e ficado evidente que o Estado tomou a decisão de delinear a política pública com o intuito de preservar as ações historicamente utilizadas por esse modelo pedagógico, a sua omissão quanto à fiscalização das atividades poderia ter comprometido o resultado e inclusive a continuidade da política. Nesse sentido, a pesquisa realizada permite enfatizar uma das originalidades do trabalho, em especial, ao estudo do método bottom-up . A peculiaridade da Pedagogia da Alternância e, por essa se fazer em construção constante com seus atores (pais, professores, estudantes e parceiros), garantiu aos burocratas de nível de rua (atores da Pedagogia da Alternância) a capacidade de se dialogar em prol da essência do programa estatal, permitindo que os beneficiários se sentissem contemplados na área da educação e como sujeito de direitos. A reivindicação e apontamentos sobre as carências da política pública impulsionaram o Estado a aperfeiçoá-la, em especial, no tocante à ampliação de recursos para permitir a adoção de materiais didáticos.

Por fim, é possível concluir que a luta para o desenvolvimento da educação “do” campo deve continuar ocorrendo, seja para dar efetividade aos direitos já assegurados, seja para positivar outros direitos tão necessários a esses cidadãos, permitindo, enfim, compreender que campo e cidade formam duas partes de uma única sociedade que dependem uma da outra e não podem ser tratadas de forma desigual. A implementação da política pública conseguiu o êxito esperado, em especial, por ter desburocratizado o processo de liberação de recursos, fazendo com que estes chegassem aos beneficiários, e por ter garantindo a autonomia necessária para a demanda das ações.

Pela riqueza do levantamento empírico realizado, há alguns elementos essenciais que podem nortear a implementação de políticas públicas com características semelhantes em outras localidades. Cabe pontuar que o primeiro elemento a se observar é a capacidade de se estabelecer o diálogo com os beneficiários da política pública antes de tomar a decisão acerca da implementação. Ademais, entendemos que o segundo elemento importante seria a capacidade do gestor público em fazer a leitura adequada e de delinear as especificidades do objetivo a ser definido e alcançado pela política. Não obstante, um terceiro elemento imprescindível seria a capacidade de diálogo em todos os níveis do governo, transcrevendo-se um escopo claro do programa e permitindo-se que a execução não se furte aos princípios delineados na política pública. Por último, deve-se pensar nos mecanismos de controle e de acompanhamento da execução. Dessa maneira, compreendemos que o respeito a estes elementos cumpriram papel fundamental para que a política pública atenda às exigências e às demandas do público alvo, garanta o atendimento aos princípios da administração pública e assegure a eficiência do emprego dos recursos públicos.

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Recebido: 30 de Novembro de 2020; Aceito: 04 de Julho de 2021

Alex Andrade Mestre em Administração Pública pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP). Advogado e Secretário de Governo de Natalândia/MG. E-mail: alxpires@hotmail.com

Pedro Lucas De Moura Palotti Doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB). Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (EPPGG) no Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA). Professor do Mestrado Profissional em Administração Pública pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) e de Governança e Desenvolvimento da Escola Nacional de Administração Pública (Enap). E-mail: pedropalotti@gmail.com

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