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Revista Brasileira de Política e Administração da Educação

Print version ISSN 1678-166XOn-line version ISSN 2447-4193

Revista Brasileira de Política e Administração da Educação vol.39 no.1 Goiânia  2023  Epub Sep 25, 2023

https://doi.org/10.21573/vol39n12023.123864 

Artigos

O (des)cumprimento dos planos municipais de educação com a gestão democrática

The (dis)compliance of municipal education plans with democratic management

El (des)cumplimiento de los planes educativos municipales con la gestión democrática

ALMIR PAULO DOS SANTOS1 
http://orcid.org/0000-0002-9283-3178

1 Universidade Federal Fronteira Sul Programa de Pós-Graduação Profissional em Educação Erechim , RS , Brasil


Resumo

Este trabalho discute a gestão democrática no âmbito das associações de municípios nos três estados da Região Sul do Brasil, tendo por objetivo analisar como os órgãos normativos explicitam seus limites e suas possibilidades para a gestão escolar democrática, no âmbito dos Planos Municipais de Educação. A metodologia é qualitativa e de análise documental. Observou-se a necessidade de avançar a perspectiva de gestão democrática, no aspecto da legislação municipal em relação à conexão entre o texto expresso com os atores escolares para a formulação de políticas educacionais municipais.

Palavras-Chave: Gestão Democrática; Legislação; Regulação

Abstract

This paper discusses democratic management in the context of municipal associations in the three states of the Southern Region of Brazil, aiming to analyze how the normative bodies explain their limits and their possibilities for democratic school management, within the scope of Municipal Education Plans. The methodology is qualitative and documental analysis. It was observed the need to advance the perspective of democratic management, in the aspect of municipal legislation in relation to the connection between the text expressed with the school actors for the formulation of municipal educational policies.

Key words: Democratic management; Legislation; Regulation

Resumen

Este artículo discute la gestión democrática en el contexto de las asociaciones municipales en los tres estados de la Región Sur de Brasil, con el objetivo de analizar cómo los cuerpos normativos explican sus límites y sus posibilidades para la gestión escolar democrática, en el ámbito de los Planes Municipales de Educación. La metodología es de análisis cualitativo y documental. Se observó la necesidad de avanzar en la perspectiva de la gestión democrática, en el aspecto de legislación municipal con relación a la vinculación del texto expresado con los actores escolares para la formulación de políticas educativas municipales.

Palabras-clave: Gestión democrática; Legislación; Regulación

INTRODUÇÃO

Este trabalho debate a gestão democrática no âmbito da legislação municipal das associações de municípios dos três estados do Sul do Brasil, a saber: AMAU/ RS, com 32 municípios; AMOSC/SC, com 21 municípios; e, AMSOP/PR, com 42 municípios, totalizando 95 municípios analisados. O estudo objetivou analisar como os órgãos normativos explicitam seus limites e possibilidades para a gestão escolar democrática, no âmbito dos Planos Municipais de Educação (PME).

A gestão democrática é um princípio orientador da escola pública, definido pela Constituição Federal de 1988 e referendado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que permitiu integrar a democracia como novo modelo de gestão escolar, definindo competências e atribuições aos entes federados. Estabeleceu, também, com clareza, a autonomia aos municípios para criar e gerir o seu próprio sistema de ensino em oferta, organização e gestão democrática para a educação municipal.

A premissa teórica deste estudo reside em políticas educacionais municipais provindas da ação dos atores políticos no contexto das práticas educacionais ( FREY,2000 ; BALL, 2011 ; WERLE, 2016 ; MAINARDES, 2018 ). Desse modo, essas políticas acolhem diferentes proposições, organizadas por uma estrutura de sentido e mobilizadas pela comunidade escolar que, nas práticas, constituem políticas educacionais. Sustenta-se o debate sobre a gestão democrática expressa na legislação, fortalecendo a autonomia da educação municipal ( NARDI, 2018 ; LIMA, 2018 ; OLIVEIRA, 2019 ), como princípio da participação na tomada de decisões dos processos políticos, a partir dos atores educacionais e de seus contextos escolares.

A metodologia é qualitativa de análise documental e envolveu noventa e cinco municípios, abarcando informações correspondentes ao que preconiza a Meta 19 do PNE (2014). No primeiro momento, constituiu-se um banco da legislação educacional dos municípios compostos pelas leis: Conselho Municipal de Educação (CME), Sistema Municipal de Ensino (SME) e Plano Municipal de Educação (PME). Após, analisaram-se os PME com maior número de leis, dentre a totalidade dos municípios. A análise seguiu a meta 19, que trata da efetivação da gestão democrática, as estratégias 19.1, que focalizam a nomeação dos diretores e diretoras escolares e a 19.8, que trata sobre desenvolver programas de formação de diretores e gestores escolares.

Organizou-se o texto em três sessões: na primeira sessão, apresenta-se uma síntese sobre as políticas educacionais no âmbito da educação municipal; na segunda, contempla-se a gestão democrática como princípio legal de participação dos profissionais da educação; e, na terceira, constitui-se um banco da legislação municipal e analisam-se os PME.

IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS EDUCACIONAIS E SEUS ATORES POLÍTICOS

As pesquisas em políticas educacionais têm demonstrado uma variedade de posições, estilos e preocupações relacionadas aos processos e aos métodos das reformas legais, como em suas tradições e práticas políticas. Segundo Oliveira (2010) , a política é uma palavra originária do vocábulo grego politikó , que expressa a condição de participação da pessoa referente às decisões sobre os rumos da pólis (cidade). A participação como elemento da implementação de políticas educacionais torna-se o foco de discussão teórica, fazendo referência às práticas políticas no contexto da educação municipal e sua legislação.

Com a Constituição Federal de 1988, os municípios são reconhecidos como entes federados, assegurando-lhes autonomia na organização da educação local, constituindo seu sistema de ensino em regime de colaboração entre os entes federados, atendendo, prioritariamente, a educação infantil. Esse reconhecimento possibilitou aos municípios constituir-se como um “lugar onde se desenvolve o ‘viver das pessoas’, de forma que o cidadão possa interagir mais proximamente com o poder municipal como um espaço de proposição de políticas” ( WERLE, 2016 , p. 04).

São essas conjecturas de políticas educacionais que se formam a partir de uma diversidade de “posições, estilos e preocupações diferentes em relação aos processos e aos métodos da reforma e em relação às tradições e práticas das ciências humanas” (BALL & MAINARDES, 2011, p.34). São atores educacionais que possibilitam a construção social e a ação política, ultrapassando as políticas formuladas pela estrutura de poder, focalizando políticas conectadas com a participação da comunidade escolar que “sofrem ação dos sujeitos e as modificam” (SANTOS, VISCARRA & SOLIGO, 2021, p. 24).

Essas políticas formuladas nos espaços educacionais, produto da ação dos atores políticos, acolhem “as diferentes declarações e/ou decisões, reunidas por um quadro geral da ação” ( FREY, 2000 , p. 2017), organizando uma estrutura de sentido, mobilizando elementos de valor e de conhecimento entre a diversidade de atores envolvidos. Essas políticas educacionais em que o “instituído (legislação) se relacione com o instituinte (sujeito da ação) de forma que o instituído sirva aos interesses sociais na medida em que o instituinte desenvolva a ação pública legal” (SANTOS, VISCARRA E SOLIGO, 2021, p. 25), atinge os objetivos traçados pelos atores.

Essa dimensão da política educacional identifica os aspectos que intervêm no processo de análise de políticas em ação, envolvendo processos criativos de interpretação, recontextualização da política, a partir dos atores envolvidos. Esse “contexto da prática, o qual é compreendido como um espaço de “produção” de alternativas para tentar fazer algo com a política proposta” ( MAINARDES, 2018 , p. 7). São análises de políticas públicas (policy analiysis) que enfatizam a interdependência entre os conteúdos da política e os processos correspondentes, constituindo-se em três dimensões da política para análise - polity, politcs, policy ( FREY, 2000 ; BALL, 2011 ; MAINARDES, 2018 ).

Políty refere-se à estrutura, à ordem do sistema político, delineada pelo sistema jurídico institucional público do sistema administrativo. Para Couto e Arantes (2017) , a políty define os parâmetros da convivência poliárquica, a estrutura constitucional, alicerçada a partir de um consenso entre os diversos atores políticos centrais. Ela delibera a ocupação dos postos de poder por um período e deliberam quais políticas públicas são implementadas, ocasionando a competição política por cargos e influências, como a tomada de decisões sobre as políticas de governo. Politics refere-se ao processo político, geralmente de caráter conflituoso, no que diz respeito à imposição de objetos, aos conteúdos e às decisões. Ela explicita a formulação da legislação municipal, imbricada pelas diversas instâncias político-administrativas e pelas organizações sociais. Policy contempla os conteúdos concretos das políticas, caracterizados por programas políticos, problemas técnicos e o conteúdo material das decisões políticas. São formulações de políticas que se originam nas práticas escolares, legislações da educação, com a participação da comunidade educacional. Essa diferenciação teórica de aspectos peculiares da política fornece categorias que podem se evidenciar proveitosas na estruturação para análise de políticas educacionais. Isso demonstra a importância de os profissionais da educação estarem interligados e constituírem proposições políticas a partir de sua realidade e de seus contextos.

É nessa rede de relações que as políticas (legislação municipal), no contexto das práticas educacionais e de seus atores, potencializam aceitar, aceitar parcialmente ou negar em sua totalidade a política proposta pela estrutura de poder. Essa (re) formulação de políticas estabelece um envolvimento atento e observador dos atores escolares com relação às políticas educacionais expressas nos conteúdos legais. É um processo criativo de interpretação e de recontextualização, com um olhar crítico para a realidade institucional (escola) e seus atores políticos. Mainardes (2018) explicita que é um processo de “interpretações de interpretações”, num processo de buscar compreender a política, “peneirar detritos da política”.

Os desafios em analisar as políticas no âmbito da educação (legislação) municipal vão muito além da abrangência dos resultados e da implementação do Estado. São políticas formuladas a partir dos atores que, no contexto da educação municipal, tornam-se sujeitos ativos da política, focalizando o envolvimento, a reflexão e a melhoria da educação local. Mainardes (2018) destaca que a interpretação ocorre numa leitura inicial, observando se essas políticas fazem sentido – “o que o texto significa para nós? O que nós temos que fazer?”. Torna-se, desta forma, um olhar decodificado de retrospectiva e prospectiva.

As proposições, em que se estabelece a interpretação de políticas educacionais, no contexto das instituições educacionais, estão postas nos atores escolares. São eles que possibilitam as reinterpretações da política a partir de seu contexto, de suas práticas e da realidade escolar. O envolvimento desses atores escolares, de forma coletiva, colaborativa e democrática possibilita o fortalecimento das ações, das releituras conectadas à realidade escolar e à formulação de políticas educacionais a partir do contexto das ações escolares. São “vivências democráticas no cotidiano escolar, traduzidas na presença de mecanismos participativos de gestão na própria escola e nos sistemas de ensino” (ESQUINSANI, 2021, p.71).

São percursos de análise de políticas educacionais municipais que seguem a discussão, fazendo referência a uma escola participativa, de diálogo e que provoca seus atores, na constituição de políticas no âmbito local.

GESTÃO DEMOCRÁTICA: O PRINCÍPIO LEGAL DE PARTICIPAÇÃO

Com o fim do regime militar, na década de 1980, surge a possibilidade de uma nova organização da sociedade civil brasileira, fortalecendo a ideia de que seria implantada a democracia. Feldman (2018) , ao abordar o imaginário social da democracia nesse período, esclarece que o discurso em prol da eficiência esteve subordinado às aspirações democráticas e de efervescência social, impulsionando o movimento pela municipalização, por conta da abertura política.

O Brasil insere-se no contexto mundial de reestruturação dos Estados nacionais para um modelo normativo global, fundamentado pelos princípios de descentralização, privatização e flexibilização (Afonso, 2001; Santos, 2001 ; Ball, 2013 ), organizando e estruturando sua gestão pública a partir da lógica de mercado e implementando políticas públicas de corte social. A reforma do Estado brasileiro, na década de 1990, incorpora a descentralização da administração pública, com foco na eficiência ( Batista, 2018 ; Pereira, 2018 ; Flac, 2019; Nardi & Scheneider, 2019) da gestão estatal, a partir de medidas de privatização, deslocando as responsabilidades aos entes federados. Esse novo ordenamento movimenta a estrutura do sistema das contas públicas e dá início à modificação na forma de atendimento às demandas sociais, adotando a estratégia de “descentralização” da gestão, implementando políticas sociais no âmbito municipal.

A descentralização na esfera municipal é compreendida como uma estratégia de controle, referente à formulação, à implementação e à avaliação das políticas educacionais (Locatelli, 2011; Batista, 2018 ; Nardi & Scheneider, 2019). A referida reforma coloca em curso, a partir da descentralização, o modelo federativo de organização social, com base na autonomia dos entes federados, tendo como meta a descentralização do poder, objetivando diminuir os gastos públicos (Afonso, 2013; Ball, 2013) . A educação torna-se estratégia para a efetivação do “regime democrático como norte para a autonomia do poder local e a descentralização” ( BATISTA, 2018, p , p.8).

Essa autonomia conquistada traz o conteúdo da gestão democrática expresso na legislação da educação municipal, como uma temática que tem sido objeto de vários estudos e pesquisas, tanto em nível nacional quanto internacional ( NARDI, 2018 ; LIMA, 2018 ; OLIVEIRA, 2019 ). É um princípio articulador das ações políticas, pois a gestão democrática “carrega, em seu contexto de articulação conceitual e prático, várias perspectivas, concepções e um contexto complexo de disputas e de ressignificações” (SANTOS, SOLIGO, VISCARRA, 2021, p. 42). Para Lima (2018) , a gestão democrática ainda é compreendida, no contexto escolar, por princípios empresariais e privados em vários países, sob os discursos de reformas e modernização do setor público, tornando incompatível com a realidade de muitas instituições educacionais.

No Brasil, a gestão democrática ganhou força de lei na década de 1980, a partir dos movimentos democráticos da sociedade brasileira. A Constituição Federal de 1988 abre a possibilidade dos entes federados em regime de colaboração compartilharem suas responsabilidades, a partir do princípio de “gestão democrática do ensino público, na forma de lei” (art. 206, inciso VI), estendendo aos municípios o direito de organizar seu sistema de ensino. Batista (2018) explicita que a Constituição Federal de 1988 conferiu autonomia política às municipalidades, no que tange à concepção e à gestão de políticas sociais, possibilitando ações efetivas nas práticas político-administrativas.

Com a LDB/96 (Lei Federal n° 9.394/1996), a educação municipal fortalece o princípio da gestão democrática e a autonomia entre os entes federados, definindo aos sistemas de ensino “normas de gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios” (art. 14). O primeiro, o princípio da participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto político pedagógico da escola, e o segundo dá ênfase à participação das comunidades escolares em conselhos escolares ou equivalentes. Para Esquinsani (2021), a LDB/96, ao tratar dos princípios da gestão democrática, a participação se torna o elemento aglutinador entre os profissionais da educação na elaboração do projeto político pedagógico das escolas, como também, nos conselhos escolares. Esse princípio configura-se como um dos pontos fundamentais, pois define e direciona a gestão democrática, compreendida como um processo político dos atores que atuam na escola, identificando problemas, discutindo fatos ou leis, deliberando e planejando a partir do próprio contexto escolar. Para Souza e Pires (2018) , a gestão democrática deve facilitar, ao máximo, o acesso à participação da sociedade nos diversos âmbitos das instituições. Logo, a democracia só se efetiva com projetos coletivos e participativos.

A coletividade e a participação são princípios fundamentais nas práticas democráticas, aqui, tratando-se da gestão educacional, também expressa nas metas do Plano Nacional de Educação (PNE) pela Lei, n° 13.005/2014. Em seu conteúdo, a gestão democrática é apresentada na meta 19, bem como suas estratégias, ensejando “assegurar condições, no prazo de 2 (dois) anos, para a efetivação da gestão democrática da educação” (PNE, meta 19). Esquinsani (2021) contribui com esse debate, afirmando que as oito estratégias primeiras da meta trazem quatro focos para a consecução da efetividade da gestão democrática da educação (19.2; 19.3; 19.4; e 19.5) no fortalecimento de colegiados, sendo a participação apresentada na estratégia 19.6 e as autonomias pedagógica, administrativa e a de gestão financeira nas estratégias 19.7. Já o cuidado específico com a formação e a eleição de diretores, na gestão escolar, está expressa nas estratégias 19.1 e 19.8. Souza e Pires (2018) compreendem que a aplicação do PNE, para a efetivação da gestão democrática, está associada ao mérito e à participação na gestão escolar pública.

A legislação educacional nos indica que a participação social constitui um dos elementos fundamentais na construção da democracia. Participar, dialogar e ter proposições práticas, a partir das experiências na educação escolar, é acompanhar e direcionar políticas educacionais baseadas em reais necessidades institucionais. Isso possibilita superar o autoritarismo e o clientelismo na condução das políticas públicas. Flach e Sakata (2016) explicitam que a legislação educacional e os sistemas de ensino assumem a responsabilidade de normatizar e efetivar a gestão democrática. É um exercício prático da democracia por meio da participação dos sujeitos, contribuindo com a tomada de decisões, fazendo-se responsáveis pela efetivação dos direitos legalmente previstos. Santos, Soligo e Viscarra (2021) explicitam que os mecanismos de gerenciamento da educação pública incentivam e qualificam a materialização de espaços de participação.

A legislação educacional (CF/88; LDB/96; PNE/2014) possibilitou que estados, municípios e o Distrito Federal organizassem seus sistemas de ensino, elaborando leis específicas, decretos, orientados pelo princípio da gestão democrática em seus sistemas de ensino, de maneira mais emblemática com a LDB/96. Além disso, autorizou aos entes federados organizarem seu próprio regramento, em regime de colaboração. Souza e Pires (2018) explicitam que a inovação que representou a inclusão do princípio da gestão democrática na Constituição Federal de 1988 reforçou e consolidou ações, muitas vezes, já realizadas nos sistemas de ensino.

A gestão democrática, embora explicitada na legislação educacional e em seus sistemas de ensino, como sendo o elemento articulador da participação e da coletividade nos espaços da educação, precisa focalizar práticas efetivas por seus atores educacionais. “A gestão democrática educacional precisa ser compreendida como uma mediação entre aquilo experimentado concretamente dentro da escola e uma prática social voltada para a construção de uma nova sociedade igualitária” ( MOREIRA, 2021 , p.14). São proposições que objetivam a garantia do princípio da gestão democrática no contexto das práticas educacionais, nas quais seus atores vão se construindo a partir da participação e da coletividade, pois “a gestão democrática não se institui por lei ou por determinação governamental, mas é desenvolvida na experiência prática, sendo necessária o desenvolvimento de consciência coletiva” ( FLACH, 2020 , p. 234). Assim, cada sujeito que participa está presente no planejamento e na execução da ação, atingindo com mais intensidade o objetivo proposto pelo coletivo.

PERCURSO METODOLÓGICO

Considerando o objetivo proposto, analisar como os órgãos normativos explicitam os limites e as possibilidades para a gestão escolar democrática no âmbito do PME, pretende-se utilizar como base metodológica a análise documental e exploratória dentro de uma perspectiva qualitativa. Conforme destacam Ludke e André (1986, p.38), “a análise documental pode se constituir numa técnica valiosa de abordagem de dados qualitativos, seja complementando as informações obtidas por outras técnicas, seja desvelando aspectos novos de um tema ou problema”. A delimitação do campo de estudo envolve três Associações Municipais dos três Estados do Sul do Brasil, quer sejam: AMAU/RS, composta por 32 municípios; AMOSC/SC, com 21; e, AMSOP/PR, com 42. A escolha dessas associações municipais teve como critério diferentes realidades da educação municipal e de sua legislação. Esse trabalho é fruto de uma pesquisa maior do grupo de pesquisa, acerca de educação e democracia, vinculada à Universidade Federal Fronteira Sul, que integra esses 95 municípios.

Nessa perspectiva, realizou-se uma pesquisa exploratória da legislação municipal, analisando-se: os Planos Municipais de Educação (PME), as Leis de Sistema Municipais de Ensino (SME) e os Conselhos Municipais de Educação (CME), no período de 2015 a 2020. Num primeiro momento, constituiu-se um banco de leis municipais, evidenciando uma diversidade de legislação no âmbito das três associações. No segundo, com maior número de leis, a análise seguiu com os PME, analisando a meta 19 do PNE, que trata da gestão democrática e das estratégias 19.1, referente à nomeação dos diretores e das diretoras de escolas e a 19.8, que trata programas de formação de diretores e gestores escolares.

SISTEMA DE ENSINO NA EDUCAÇÃO MUNICIPAL E SUA LEGISLAÇÃO

Ao se constituírem entes federativos autônomos, a partir da Constituição de 1988, fortalecidos pela LDB de 1996, os municípios compuseram seus sistemas municipais de ensino, integrando-se às políticas e aos planos educacionais da União e dos Estados. O grau de autonomia, conferido aos entes federados, constitui força coercitiva nas políticas educacionais, ao estabelecer que “a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino” ( BRASIL, 1988 , p. 139). Tal dispositivo indica a necessidade de cooperação entre os entes federados e a educação, em observância às especificidades, às competências e às responsabilidades de cada ente para o atendimento educacional. Isso propicia aos municípios constituírem seus “sistemas de ensino desde logo, passando a usufruir existência legal, ficando a organização e o seu modo de funcionamento sob a esfera da autonomia dos entes federativos, obedecendo ao princípio de colaboração recíproca” ( CURY, 2008 , p. 1201).

Como ente federado os municípios são compreendidos como uma face das políticas e de sua organização legal. São interesses resultantes de inúmeros processos de negociação, disputas e ressignificações, elementos do “mundo constitucional” ( FREY, 2000 ). São formulações de políticas municipais, demonstrando sua estrutura organizacional, num determinado espaço e tempo histórico, que potencializam conduzir a educação local.

Textos legais, quando são elaborados pelas estruturas do poder, condicionam e limitam a participação das organizações sociais e educacionais. Por outro lado, no contexto da escola, esse conteúdo legal pode sofrer interferência dos sujeitos, quando colocados em prática. São influências das mais diversas interfaces dos organismos sociais, políticos e culturais, carregados de interesses, às vezes, submersos, formatando o conteúdo e a sua legislação. Os atores implicados no processo elaboram “[...] certas modificações nas políticas públicas, alterações que têm origem em sua interpretação sobre as políticas públicas em si e na extensão de sua concordância em relação a elas” ( STROMQUIST, 1996 , p. 28).

O município, ao criar sua legislação, indica a intenção de assumir a responsabilidade administrativa, política e educacional, caracterizando-se por colocar em prática suas propostas pedagógicas e constituir um projeto para a educação local.

É um esforço conjunto da organização social/educacional de seus sujeitos que ali querem qualificar o ensino e a aprendizagem e constituir políticas mais próximas de sua realidade. Pressupõe-se, assim, o exercício da autonomia e das responsabilidades de seus atores locais, permitindo, por conseguinte, constituir o banco de leis (PME, SME, CME) dos 95 municípios, buscando identificar quantitativo de leis em cada associação.

Fonte: sites dos municípios e das associações

Gráfico 1 Banco da legislação municipal (PME, SME e CME) 

Observa-se que as três associações municipais constituem PME, em observância da Lei n° 13005, de 25 de junho de 2014 ( BRASIL, 2014 ), que cria o Plano Nacional de Educação (PNE) e possibilita aos municípios, em regime de colaboração, criar seus PME. O PNE explicita também que os “Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão elaborar seus correspondentes planos de educação ou adequar os planos aprovados em lei, em consonância com as diretrizes, metas e estratégias prevista no PNE” ( Brasil, 2014 , art. 8°). Garcia & Bizzo (2018) afirmam que o PNE se caracteriza por uma política educacional, com intuito de responder a demandas reais da Nação.

Quanto às leis SME, identificaram-se duas situações distintas: a associação dos municípios da AMAU e da AMOSC apresentaram todas as leis de SME, enquanto nos municípios da AMSOP, reconheceram-se 4% da legislação correspondente. Flach (2020) salienta que o Estado do Paraná, atualmente, conta com 4% dos municípios com SME, seguindo-se os municípios ao sistema de ensino estadual.

Em relação ao CME, identificaram-se os municípios das associações da AMSOP e da AMAU, muito próximo a constituírem CME, sendo 52,82% na AMSOP e 52% na AMAU. A AMOSC surpreende com 98% dos municípios com CME. Ribeiro & Nardi (2018) , ao analisarem as bases normativas e as condições político-institucionais da gestão democrática em sistema de ensino do Estado do Piauí, destacaram a importância das instâncias de participação no âmbito local e suas condições concretas de viabilizar, legitimamente, a distribuição do poder no trato dos assuntos educacionais, referendando que é de interesse público, para o âmbito de recursos públicos, da autonomia conquistada e na organização da educação local. Evidencia-se com o SME que a AMOSC e seus municípios contemplam quase a totalidade legal. A AMAU tem nos PME e SME a totalidade de leis e com 52% de CME. A AMSOP apresenta a totalidade de PME, entretanto, um número reduzido de SME. Werle (2009) afirma que os sistemas municipais de ensino devem: acompanhar a ampliação e a qualificação dos educadores; possuir estruturas de apoio, acompanhando as necessidades reais de cada instituição escolar; e, dispor de recursos financeiros e humanos para desenvolver e qualificar a educação local.

A autonomia político/administrativa e financeira, constituída aos municípios como ente federado e seu reconhecimento de auto-organizar-se, permite a intervenção constante da população e a sua participação nas definições das políticas públicas educacionais, no sentido de sedimentar práticas democráticas, tanto na elaboração da legislação municipal, como nas ações concretas que propiciam a qualidade da educação municipal. Nardi & Scheneider (2019), ao abordar o município como ente federativo, fazem referência ao papel e a responsabilidade do município no desenvolvimento social, incluindo a democratização da gestão do ensino público, incluindo a participação social na constituição do sistema municipal de ensino e a sua aplicação prática no contexto escolar, pois as legislações devem ser [...] retrabalhadas, aperfeiçoadas, ensaiadas, crivadas de nuances e moduladas através de complexos processos de influência, produção e disseminação de textos” (BALL, 2001, p. 102). São posições em disputas que se articulam como elementos que possibilitam alterações na legislação a partir dos diferentes contextos e limitações, como recursos disponíveis e normas legais, muitas vezes, distantes da realidade escolar. O que o banco de leis municipais tem demonstrado é que vários municípios não cumprem a formulação legal na constituição e na valorização da autonomia, nas instâncias da educação local. São orientações necessárias que contribuem para orientar as práticas das gestões escolares e seus profissionais da educação.

OS PLANOS MUNICIPAIS DE EDUCAÇÃO: (DES) CUMPRIMENTO COM A GESTÃO DEMOCRÁTICA

Após constituir um banco da legislação municipal dos 95 municípios, seguiu-se analisando os PME, comparativamente ao Plano Nacional de Educação, em sua Meta 19, que assegura “condições, no prazo de dois anos, para a efetivação da gestão democrática da educação” ( BRASIL, 2014 , p. 82) e a estratégias 19.1, que trata da “nomeação dos diretores e diretoras de escola, critérios técnicos de mérito e desempenho, bem como a participação da comunidade escolar” ( Brasil, 2014 , p. 82), bem como a estratégia 19.8, que objetiva “desenvolver programas de formação de diretores e gestores escolares, bem como aplicar prova nacional específica a fim de subsidiar a definição de critérios objetivos para o provimento dos cargos” ( BRASIL, 2014 , p. 83).

A pesquisa realizada utilizou, exclusivamente, os PME dos 95 municípios. Esses foram elaborados e publicados em cumprimento ao art. 8º da lei 13.005, de 25 de julho de 2014, adequando-se ao prazo de um ano, a contar da promulgação da referida lei e com ampla participação da comunidade educacional e da sociedade civil. São documentos públicos, promulgados pelo executivo local, disponíveis para análise e pesquisa, no âmbito da comunidade educacional como a população em geral. A análise focaliza a Meta 19 dos PME e suas referências à efetivação da gestão democrática para o contexto das práticas na educação municipal.

Quadro 1 Meta 19 PME - gestão democrática 

Meta 19 PME Gestão
Democrática
Cópia do PNE Colado ao PNE Não explicita
metas e
estratégias
Total de
Municípios
AMAU 04 08 18 2 32
AMOSC 09 04 01 07 21
AMSOP - 17 - 24 42
TOTAL 12,32% 27,55% 18,05% 31,35% 95

Fonte: elaboração própria

A análise da composição dos PME, referente à meta 19, levou à seguinte constatação: dos 32 municípios da AMAU/RS analisados, 12,50% explicitam práticas de gestão democrática (provimento democrático). 25% das leis não fazem nenhuma modificação do PNE, tratando, simplesmente, de uma cópia do PNE; 56,25% têm um acréscimo (respeitadas as competências dos entes federados) muito pequeno no conteúdo da meta 19, praticamente, colado ao PNE e 6,25% apresentam, dos PME, somente os aspectos iniciais da lei (apresentação, diretrizes, regime de colaboração), não apresentando as metas e as estratégias.

Nos 21 municípios da AMOSC/SC, há alguns avanços quanto ao conteúdo da meta 19 dos PME. 42,86% inserem em seu conteúdo da gestão democrática na meta 19 dos PME, com foco na realidade local dos municípios. Seguem as orientações do PNE, mas apresentam uma postura mais propositiva (garantindo a consulta pública à comunidade escolar) de orientações democráticas para a educação dos municípios. Compreende-se que essa postura de autonomia, constituída com a participação da comunidade escolar, tem contribuído tanto na formulação legal, como em seu monitoramento.

Com a AMSOP/PR, com 42 municípios, a análise não apresentou nenhuma alteração entre o PNE e os PME, na meta 19. Duas proposições são apresentadas: a primeira explicita que 40,48% dos municípios fazem cópia do PNE, não tendo nenhuma alteração; a segunda demonstra que 57,14% constituem seus PME no formato legal, apresentando as questões introdutórias (aspectos históricos e geográficos dos municípios, caracterização física, infraestrutura e os aspectos educacionais), porém, não especifica as metas e suas estratégias dos PME. É pertinente respeitar a autonomia do município como ente federado de constituir sua legislação, como também seguir o Plano de Educação Estadual ou Federal. Entretanto, surgem alguns questionamentos: os municípios que não constituem sua legislação possuem observância a sua realidade, suas dificuldades e seus avanços educacionais. As orientações legais de outro ente federado possibilita contribuir com as práticas e as ações de seus gestores escolares, professores e comunidade educacional? Santos & Castro (2020) explicitam que a gestão escolar na contemporaneidade é um elemento importante do processo de democratização da qualidade da educação pública no Brasil, sendo uma gestão que vai além do conceito de gerenciamento, compreendida como uma concepção prática coletiva, permeado por princípios democráticos de participação.

Esse debate impulsiona a seguir, analisando a nomeação dos diretores e diretoras escolares a partir da estratégia 19.1 dos PME.

Quadro 2 Estratégias 19. 1 - Nomeação dos diretores e diretoras escolares 

Diretores escolares Eleição Indicação Nada consta Municípios
AMAU 13 - 19 32
AMOSC 03 02 16 21
AMSOP 07 03 32 42
TOTAL 24,21% 4,21% 81,05% 95

Fonte: elaboração própria

Em relação à estratégia 19.1 do PNE, em específico “a nomeação dos diretores e diretoras de escola” ( BRASIL, 2014 , p.83), os PME das três associações apresentam a seguinte configuração: dos 95 municípios, 24,21% fazem escolha de seus gestores a partir de eleições, com a participação da comunidade escolar. Observa-se um número mais elevado nos municípios da AMAU/RS. 4,21% são indicados pelo governo local e 81,05% das estratégias analisadas nada constam em relação à escolha de seus gestores. Para Lima (2021) , o contexto atual de seleção de diretores se efetivou por meio da Lei 13.005, de 2014 ( BRASIL, 2014 ), que aprova o PNE, considerando que a nomeação dos diretores de escola deve seguir critérios técnicos de mérito e desempenho, com a participação da comunidade escolar, em observância ao princípio da gestão democrática.

Observa-se, nos dados analisados, que 81,05% da legislação dos PME não menciona os procedimentos de seleção dos diretores. Se os diretores são personagens centrais no processo de implementação das práticas de gestão no contexto escolar, em conjunto com a comunidade escolar, sob a liderança do diretor, com apoio de um supervisor administrativo e pedagógico, como o conteúdo legal analisado não apresenta as formas de acesso ao cargo? Lembrando Lima (2021 , p.19), “os diretores têm importante papel no diagnóstico, no planejamento e na gestão das políticas públicas, frente aos novos desafios educacionais”.

A escolha do(a) gestor(a) escolar feita pela comunidade educacional é uma das propostas mais democráticas, uma vez que representa a grande maioria que ali participa do processo e contribui também para auxiliar durante as práticas de gestão. “Prover diretores por meio de eleições, nas quais a comunidade escolar tenha o poder decisório sobre quem ocupará a função/cargo de dirigente escolar, é algo decisivamente democrático” ( SOUZA, 2019 , p. 274).

Ao assumir o cargo de gestor/a escolar, a formação continuada é uma das proposições fundamentais para a garantia da qualidade e da efetividade da gestão. Por essa razão que se realizou um levantamento das estratégias 19.8, que trata da formação do gestor(a) nos 95 PME.

Quadro 3 Estratégia 19.8 - Formação do Gestor 

Formação de Diretores Formação Nada consta Municípios
AMAU 24 08 32
AMOSC 03 18 21
AMSOP 11 32 42
TOTAL 39,95% 61,05% 95

Fonte: elaboração própria

Observa-se nos dados referentes à estratégia 19.8 que trata do “desenvolvimento de programa de formação de diretores e gestores escolares” ( BRASIL, 2014 , p.84), a necessidade de formação continuada dos gestores(as) na educação municipal. Na análise dos 95 municípios das três associações, 40% dos municípios expressam nos PME formação continuada para gestores (oportunizar formação aos gestores). No entanto, em 61,05% desses, na estratégia 19.8, não faz qualquer referência à formação do gestor. Santos e Castro (2020) trazem o entendimento das grandes demandas dos gestores escolares e afirmam que uma delas é a viabilidade de condições para o desenvolvimento do processo pedagógico competente, criativo, tendo em vista a complexidade do ensino e da aprendizagem na atualidade. Outra referência é a qualificação do gestor, com foco na participação dos diferentes segmentos da comunidade escolar. Esse olhar atento às diferentes ações têm implicação direta com a estratégia apresentada. Seria fundamental que a formação continuada dos gestores estivesse expressa nos PME, como orientação, pois fortalece as ações práticas dos gestores de forma democrática, fazendo um percurso empírico de conexão com a prática e o texto dos PME, reformulando a legislação, quando fosse necessário, ao fazer histórico das diferentes realidades democráticas da educação municipal.

CONCLUSÕES

Este artigo teve como objetivo analisar como os órgãos normativos explicitam os limites e as possibilidades para a gestão escolar democrática no âmbito dos PME. Nesse sentido, a discussão, primeiramente, perpassou a implementação de políticas municipais a partir de seus atores escolares. Esses profissionais da educação, no contexto das práticas escolares, produzem políticas educacionais, uma vez que é a construção social da ação política que ultrapassa as políticas formuladas pelas estruturas de poder e focaliza políticas da ação dos sujeitos escolares e as modificam. Posteriormente, o arcabouço teórico se dedicou a compreender a gestão democrática como um princípio legal que direciona para a participação nos espaços da gestão escolar e as suas instâncias, sendo a autonomia a conquista expressa na legislação da educação municipal, ou seja, o princípio articulador das ações políticas da gestão democrática.

Os resultados indicam, a partir do banco de leis dos 95 municípios, que todos os municípios constituíram seus PME. Quanto aos SME, os municípios da AMAU/RS e da AMOSC/SC apresentam todas as leis, enquanto a AMSOP, somente 4% de SME, seguindo o sistema estadual do Paraná. Em relação ao CME, a AMSOP e a AMAU têm muita proximidade (52,82% na AMSOP/PR e 52% na AMAU/RS). A AMOSC/SC surpreende com 98% dos municípios com CME. Nesse contexto, a reflexão enfatiza a autonomia dos municípios em gerir a educação local. No entanto, muitos municípios não constituem, legalmente, sua educação local e seus princípios democráticos. A autonomia legal é um princípio que se origina da participação e da coletividade em suas diversas instâncias da educação municipal. Porém, não são o que os dados têm demonstrado.

Quanto à meta 19 dos PME, referente às práticas de gestão democrática, encontram-se 12,50% dos municípios da AMAU/RS apresentando orientações de práticas de gestão democrática. 42,86% dos municípios da AMOSC/SC também focalizam em seus conteúdos orientações de práticas de gestão democrática, enquanto os municípios da AMSOP/PR, a meta 19 é muito próxima ou colada ao PNE. Referente à estratégia 19.1 da meta 19 dos PME, relativo ao acesso ao cargo, dos 95 municípios, 24,21% fazem escolha de seus gestores a partir de eleições, com a participação da comunidade escolar. Em relação à estratégia 19.8 da meta, 19 dos PME pertencentes à formação do gestor e 40% dos 95 municípios trazem em seu conteúdo possibilidades de formação continuada para seu gestor.

Ademais, considera-se que estudo referente a legislação municipal carece de aprofundamento, focalizando as decisões políticas, os critérios e a organização em cada instância da educação municipal. Além disso, reitera-se a importância da constituição da autonomia legal e local, como proposição fundamental de orientação da comunidade escola. Porém, evidencia-se que muitos municípios têm descumprido a legislação referente à gestão democrática, em específico a partir das ‘vozes’ das instâncias educativas que, em seus contextos escolares, produzem políticas. Isso nos indica a necessidade de avançar a perspectiva de gestão democrática, tanto legal em relação à conexão entre o texto expresso com os atores escolares, como na participação, na reflexão e na ação em formular políticas educacionais municipais a partir da realidade dos profissionais que, no contexto da prática, fazem política.

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Recebido: 20 de Abril de 2022; Aceito: 06 de Julho de 2022

Almir Paulo dos Santos Doutor e Pós-doutor em Educação pela Universidade do Vale do Rios dos Sinos (UNISINOS), com foco nas temáticas: indicadores de práticas de gestão democrática, gestão escolar, sistemas de ensino e avaliação em larga escala. Docente e Coordenador Adjunto do Programa de Pós-Graduação Mestrado Profissional em Educação – da Universidade Federal da Fronteira Sul – Campus Erechim/RS. Exerce a docência e orienta no mestrado e graduação. Coordenador do projeto de pesquisa: indicadores de práticas de gestão democrática no âmbito da Educação Básica a partir das avaliações em larga escala (CNPq). Coordenador do grupo de pesquisa educação e democracia – UFFS. E-mail: almir.santos@uffs.edu.br

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