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Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade

Print version ISSN 0104-7043On-line version ISSN 2358-0194

Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade vol.32 no.72 Salvador  2023  Epub May 06, 2024

https://doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2023.v32.n72.p391-410 

Estudos

O QUE PODEM AS EDUCAÇÕES MENORES EM HIV/AIDS? CAMINHOS POSSÍVEIS À EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E BIOLOGIA

WHAT CAN MINOR HIV/AIDS EDUCATIONS? POSSIBLE PATHS TO SCIENCE AND BIOLOGY EDUCATION

¿QUÉ PUEDEN EDUCACIONES MENORES EN VIH/SIDA ? CAMINOS POSIBLES A LA EDUCACIÓN CIENTÍFICA Y BIOLÓGICA

1Universidade de Pernambuco (UPE), Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)


RESUMO

Este texto é tecido ao modo de um manifesto e, através da cartografia, objetiva-se imbricar em educações menores em HIV/aids, em ressonâncias com a educação em ciências e biologia. São tangenciados três filmes que apresentam como temática central a pandemia de HIV/aids e, a partir deles, desdobram-se três escritas literárias ficcionais atravessadas por educações maiores e menores em HIV/aids. A partir dos filmes e das escritas literárias, mobilizam-se pensamentos e problematizações acerca dos caminhos e dos desafios contemporâneos no que diz respeito à pandemia de HIV/aids, assim como nas ressonâncias transdisciplinares que competem à educação em saúde e à educação em corpo e sexualidade. Ressaltam-se que tanto as narrativas fílmicas quanto as escritas podem compor as caixas de ferramentas potentes aos educadores em HIV/aids, em saúde, em ciências e biologia que estejam interessados em caminhar pelos caminhos menores, comprometidos com a produção de outras relações com o corpo, a saúde e a vida.

Palavras-chave: Educação em Ciências e Biologia; Educação em Saúde; Escritas Literárias; Cinema e Educação; Corpo e Sexualidade.

ABSTRACT

This text is woven in the form of a manifesto and, through cartography, aims to imbricate minor educations on HIV/AIDS, in resonance with education in science and biology. Three films that have the HIV/AIDS pandemic as their central theme are touched on and, from them, three fictional literary writings are unfolded, crossed by major and minor educations in HIV/AIDS. From the films and literary writings, thoughts and problematizations around the paths and contemporary challenges regarding the HIV/AIDS pandemic are mobilized, as well as the transdisciplinary resonances that behove health education, and education in body and sexuality. It is emphasized that both filmic and written narratives can compose potent toolboxes for HIV/AIDS, health, science and biology educators who are interested in walking down smaller paths, committed to the production of other relationships with the body, health and life.

Keywords: Science and Biology Education; Health Education; Literary Writings; Cinema and Education; Body and Sexuality.

RESUMEN

Este texto se teje en forma de manifiesto y, a través de la cartografía, pretende imbricar la educación menor sobre el VIH/SIDA, en resonancia con la educación en ciencias y biología. Se abordan tres películas que tienen como tema central la pandemia del VIH/SIDA y, a partir de ellas, se despliegan tres escritos literarios de ficción, atravesados por enseñanzas mayores y menores en VIH/ SIDA. A partir de las películas y escritos literarios, se movilizan pensamientos y problematizaciones sobre los caminos y desafíos contemporáneos frente a la pandemia del VIH/SIDA, así como las resonancias transdisciplinares que compiten a la educación en salud, y la educación en el cuerpo y la sexualidad. Se enfatiza que tanto las narrativas fílmicas como las escritas pueden componer potentes cajas de herramientas para educadores en VIH/SIDA, salud, ciencias y biología interesados en caminar por caminos más pequeños, comprometidos con la producción de otras relaciones con el cuerpo, la salud y la vida.

Palabras-clave: Educación en Ciencias y Biología; Educación en Salud; Escritos Literarios; Cine y Educación; Cuerpo y Sexualidad.

Introdução

Um pouco de possível, senão eu sufoco…

Gilles Deleuze (2013, p. 135)

Gilles Deleuze (2013), na belíssima entrevista Um retrato de Foucault, ao falar do trabalho de seu amigo, o filósofo Michel Foucault, poucos anos após a sua morte, afirma que “O pensamento jamais foi questão de teoria. Eram problemas de vida. Era a própria vida. Era a maneira de Foucault sair dessa nova crise: traçando a linha que lhe permitisse sair dela, e estabelecendo novas relações com o saber e o poder. Mesmo que às custas da própria vida…” (p. 135). Tal experiência laboral de se debruçar, pelo pensamento, nas modulações que incidem na produção dos sujeitos, nas redes de saber e poder, era algo intenso e, em muitos momentos, também difícil. Talvez, em alguns deles, insuportável. Assim, Deleuze reflete que Foucault necessitou de um pouco de possível para habitar o mundo, para seguir trabalhando com o pensamento imbricado com a vida, para existir sem sufocar, enquanto houvesse meios para tal, enquanto conseguisse, até o fim.

Como maneira de movimentar o pensamento para não sufocar, este trabalho é um recorte da minha tese de doutorado1, tecido ao modo de um manifesto, tendo a cartografia (DELEUZE; GUATTARI, 2019; ROLNIK, 2016) como caminho ético e metodológico de pesquisa. Imbrico-me, nos caminhos de pesquisa, em torno da pandemia de HIV/aids, nas ressonâncias desta em produções audiovisuais e nas maneiras de aprender - e, quiçá, ensinar - com/pelos/através dos filmes. Para tal, versando em torno de três filmes que tangenciam, como eixo guia, a temática do HIV e da aids, produzo e mobilizo, a partir da criação literária, três narrativas que versam em torno de uma educação em HIV/aids menor, contagiada - e contagiante - pelos filmes; e, a partir destas escritas, teço reflexões inspiradas em minhas vivências enquanto docente no campo do ensino de ciências e biologia, formador de professores/as, pesquisador em educação e pessoa interessada nas investigações de corpo, gênero, sexualidade, HIV/aids e convivências entre humanos e outros seres não humanos, como os vírus.

Dessa maneira, este texto percorre pelas beiradas os filmes 120 Batimentos por Minuto (2017), Carta para Além dos Muros (2019), e Como sobreviver a uma praga (2012), porém o foco reside, sobretudo, no investimento de escritas literárias inspiradas em possibilidades de alargar as suas ressonâncias audiovisuais para espaços outros, aquém e além de sua própria materialidade. Ao me debruçar neste tema em meio aos escombros da pandemia de covid-19, em territórios que se mostravam hostis à vida, foi-me demandado como necessidade para imbricar nos movimentos de pesquisa-vida também a busca de possíveis para não sufocar. Senti, neste habitar entre-pandemias, que estava em um deserto2 inóspito, mas, como refletem Deleuze e Guattari (2019), “o deserto é povoado” (p. 56). Restava, então, ver os possíveis que proliferavam e que se apresentavam como fecundos à vida que urgia. Mobilizar educações menores (GALLO, 2002) é, justamente, atentar-se às circunstâncias viáveis que residem nas frestas, nas menoridades, nas fissuras que se abrem em espaços múltiplos e inusitados.

Quais possíveis habitam na educação para mobilizarmos3 em caminhos menores as questões em torno do HIV e da aids? De que maneiras podemos pegar o que foi experienciado e produzido com muito sangue e às custas de incontáveis vidas nas últimas décadas em tal pandemia para pensar no covid-19 e em outras emergências por vir? O que pulsa em torno das diferentes formas de narrar os territórios do HIV e da aids? Como as imagens e os sons nos ensinam? Como podemos (nos) educar a partir de encontros entre corpos e produções artísticas, como os filmes? De quais formas colocam em questão os enunciados científicos e biomédicos hegemônicos? Como tangenciam as narrativas por vir, em vias de serem maquinadas, de outras pandemias? Quais linhas duras consolidam e quais linhas de fuga instauram? Como, com elas e a partir delas, podemos problematizar o que temos produzido em nossas práticas em espaços formais de escolarização no que tange às ciências da natureza? De que maneiras podemos mobilizá-las em nossas aulas, no ensino de ciências e biologia, em diálogo com as dimensões de saúde, pelos sinuosos, desviantes e desafiantes caminhos de uma educação menor? O que pode uma educação menor em HIV/aids? E, quiçá, o que poderiam múltiplas educações menores em HIV/aids, em agenciamentos coletivos, em movimentos político-militantes?

Diferentes perspectivas de educação são tangenciadas neste artigo, em flertes teórico-conceituais, para pensar nas questões em torno do HIV e da aids. A educação menor (GALLO, 2002; DELEUZE; GUATTARI, 2017), com seu caráter coletivo, político e militante, é o fio condutor que percorre as proposições de processos educativos que aconteçam pelos encontros (GALLO, 2002), que se façam nas modificações de uma vida, diferindo-se da escolarização (CORRÊA; PREVE, 2011). Também educações menores em biologia (SANTOS; SILVA, MARTINS, 2021) e em saúde (BASTOS, 2020a) me infectam em movimentos potentes para vasculhar - e, quiçá, criar - uma educação em HIV/aids menor. As experiências permeadas pelas cotidianidades, atravessadas pela cultura, também imbricam modos de aprender (SILVA, 1999). As questões curriculares são vistas, assim, como produtores de modos de ser e de habitar o mundo que acontece para aquém e além dos espaços escolares (SILVA, 1999), como encontros e composições (SILVA, 2002), podendo devir4, mutar, transformar (CORAZZA, 2010).

As potências cinematográficas são mobilizadas também para agenciar formas de infectar os saberes curriculares (ELLSWORTH, 2001), sobretudo no campo de ciências, de biologia e de saúde. Os filmes são tangenciados com as suas potências educativas a partir das afecções neles imbricadas, percebendo que muito é possível aprender com e a partir deles (MEYER; SOARES, 2005). O cinema é, assim, afirmado como pedagogia - processos e movimentos relacionados com as aprendizagens possíveis em múltiplas maneiras, espaços e tempos - à qual se insere e também se produz na cultura (LOURO, 2002), concretizando-se com as criações singulares e “produção de sentidos a partir de elementos reais” (MIGLIORIN; BARROSO, 2016, p. 17).

Neste trajeto, ensaio escritas de três cenas que possam puxar fios e tecer caminhos entre educações menores em HIV/aids, à espreita de possíveis - contatos, aprendizagens, ensinagens, afecções, contágios subjetivos, devires, e… e… e…5 São narrativas que falam por si só, não demandando, assim, explicações longas, numa tentativa incessante - e, quiçá, despotencializadora de sua força artística - de dizerdizer-dizer: elas estão cheias de vida, restando apenas tecer reverberações possíveis. São palavras ao vento, em movimento, versando em torno do desejo, da vida, do silêncio, da saúde, da infecção, do segredo, da visibilidade, da dor, da doença, da morte, da incerteza, do estigma, do prazer, dos conhecimentos científicos, das pedagogias em torno do corpo, dos encontros e do que neles se aprende. Cada uma delas atravessa e é permeada nos detalhes por filmes6 que tangenciam a pandemia de HIV/ aids. Nelas, assim como nas produções audiovisuais, é possível questionarmos quais são os diferentes espaços nos quais nos educamos, e como as experiências neles vividas produzem modos de ser e de estar no mundo.

Múltiplas referências permeiam as escritas literárias-ficcionais de tais cenas, sendo deglutidas e incorporadas antropofagicamente no texto, inspiradas no que ensinou Suely Rolnik (2016) acerca da cartografia:

Sendo tarefa do cartógrafo dar língua para afetos que pedem passagem, dele se espera basicamente que esteja mergulhado nas intensidades de seu tempo e que, atento às linguagens que encontra, devore as que lhe parecem elementos possíveis para a composição das cartografias que se fazem necessárias. O cartógrafo é, antes de tudo, um antropófago (ROLNIK, 2016, p. 23).

Abrir caminho ao que pede vazão, fruir. Inspirado em Deleuze (1997), em Crítica e Clínica, na qual afirma que “A literatura é uma saúde” (p. 9), percebo nas artes maneiras de vislumbrar saúdes outras, em seus desvios das normas e prescrições, sendo maneiras de me movimentar, visto que “A doença não é processo, mas parada do processo” (p. 13).

Escrever é um caso de devir, sempre em via de fazer-se, e que extravasa qualquer matéria vivível ou vivida. É um processo, ou seja, uma passagem de Vida que atravessa o vivível e o vivido. A escrita é inseparável do devir: ao escrever, estamos num devir-mulher, num devir animal ou vegetal, num devir-molécula, até num devir imperceptível (DELEUZE, 1997, p. 11).

Busco imbricar-me, em devir-literário, na “invenção de um povo, isto é, uma possibilidade de vida. Escrever por esse povo que falta…” (DELEUZE, 1997, p. 15), lembrando que escrever “‘por’ significa ‘em intenção de’, e não ‘em lugar de’” (p. 15). Escrever, assim, implica-se na criação de “um povo menor, eternamente menor, tomado num devir-revolucionário. Talvez ele só exista nos átomos do escritor, povo bastardo, inferior, dominado, sempre em devir, sempre inacabado” (DELEUZE, 1997, p. 14). Não seriam os filmes também a criação de povos que faltam, com as potências de suas menoridades, produzindo narrativas da pandemia de HIV/aids com estes tantos por ela intensamente afetados, na instauração de movimentos, de saúdes?

Em devir-vírus, em sutilezas ficcionais que tangenciam múltiplos cotidianos, mobilizei três narrativas literárias intituladas de cenas, dispostas a seguir, que carregam a força infectante de materializar a potência de nos educar em HIV/aids a partir das imagens e dos sons cotidianos e fílmicos, com os seus atravessamentos e (des)encontros. Nelas, temos pistas de educações menores em HIV/aids possíveis, necessárias e urgentes, na medida em que também marcam uma educação maior hegemonicamente em vigor. Logo após, teço ressonâncias delas sobretudo à educação em ciências e biologia em conexões transdisciplinares com a educação em saúde e educação em corpo, gênero e sexualidade, na percepção - e criação - de educações menores em HIV/aids.

Narrativas em cena7

Cena 1: Cotidianos

Em um dia útil qualquer - existiria dia inútil? -, em meados de 2022, Renata acorda às 5h 20min, fica na cama mais dez minutos, levanta, lava o rosto, troca de roupa, arruma os cabelos, engole algumas coisas, escova os dentes e, rapidamente, sai de casa. Depois de um longo tempo de trabalho dentro de seu lar, ainda é um pouco difícil chegar tão cedo ao seu destino laboral. Antes de partir, pega a sua mochila com a sua caixa de ferramentas cotidiana: dois livros didáticos, um de literatura, três cores de pincéis, um apagador, um absorvente para aqueles dias, uma garrafa de água, algumas pílulas, uma maçã e certa dose de coragem necessária.

Nos ônibus lotados, ela usa uma máscara, mas a maioria das pessoas lá já deixaram tal aparato biomédico de lado, como se o risco anunciado pela sua presença já houvesse desaparecido. No caminho, ela tenta ler um pouco nos quase cinquenta minutos de trajeto. Ao chegar no trabalho, em um bairro periférico, permanece com o rosto coberto, tirando rapidamente o material que o protege apenas para tomar um café. Adolescentes a cumprimentam na entrada e ela retribui com um aceno e palavras de ‘bom dia’. Sentira falta deste contato humano nos meses de ensino remoto: Renata é professora das disciplinas de ciências no ensino fundamental e de biologia no ensino médio em uma escola pública de uma cidade brasileira interiorana de porte médio.

Naquele dia, as duas primeiras aulas serão a continuação do tema vírus e das possíveis infecções por estes seres causadas. Para trabalhar as questões em torno do HIV e da aids, ela conseguira unir dois horários seguidos em uma mesma turma, coisa que só foi possível graças ao acordo que tivera com a professora de geografia, sua amiga, e com a supervisora pedagógica, para conseguir organizar a ordem das aulas. Tal movimentação ocorreu, pois aquelas aulas seriam um pouco diferentes das dinâmicas comuns: a turma se deslocaria para a sala de vídeo e assistiria a um filme.

Pontualmente, às 7h, ela entra na sala e, rapidamente, convida os estudantes para pegarem os cadernos e estojos, descendo ao outro espaço escolar. Por volta das 7h 10min, após deslocar e acalmar a turma - o que não foi tão difícil, pois estavam ainda tranquilos e sonolentos no começo do dia -, apagam-se as luzes e começase a sessão de cinema na escola. Cenas de Brasis contam a história de uma pandemia em suas reverberações abaixo da linha do Equador. São narrativas de luta, de memória e de resistência coletiva. O documentário Carta para além dos muros (2019) é assistido nestes dois horários e, logo em seguida, retornam à sala.

A professora sabe dos tantos impactos que tal pandemia teve no mundo, sobretudo nos corpos dissidentes e nas minorias, como pessoas LGBTQIA+, habitantes dos países da África Subsaariana e comunidade negra, mas também afetando muitas brasileiras, mulheres cis, como ela. Assim, escolhera utilizar aquele espaço de educação formal para, além da mobilização de conhecimentos orgânico-virológicos realizados na semana anterior, também tangenciar a dimensão militante e coletiva por meio das imagens e sons pelo filme, retomando-as no próximo encontro para dar prosseguimento aos conteúdos a serem trabalhados. Nos últimos minutos de aula, Renata pede à turma, como tarefa para casa, que escrevam uma breve resenha sobre o filme, focando na dimensão do estigma em torno da pandemia de HIV/aids, pensando em como ele afeta a todos e de que maneira cada um pode nele incidir, tanto em sua manutenção quanto em sua desconstrução.

Tatiana, uma das alunas, chorou em silêncio na sala escura durante a exibição do documentário, passando despercebida pelos colegas e pela professora. Ninguém da turma sabe, mas ela tem um segredo: a jovem vive com HIV desde o seu nascimento, infectandose verticalmente - na gestação, no parto ou na amamentação. A sua mãe, poucos anos após o seu nascimento, repentinamente adoeceu e rapidamente veio a óbito. Casada, transou com apenas um homem em sua vida, que também morreu de aids. Tatiana, sempre apaixonada pelos conteúdos das ciências da natureza, emocionou-se com o filme por se ver naquelas narrativas, tanto pela presença de outras pessoas vivendo com HIV, inclusive através de transmissão vertical, quanto pelas ausências lá presentes.

Com as cenas, foi possível lembrar das muitas outras crianças e adolescentes que conhecera nas salas hospitalares chorando de dor e de medo de agulhas, fazendo exames, consultando e tomando remédios. Criadas por tios e avós em decorrência da perda de seus pais, algumas delas nem estão mais vivas. Ela também sentiu que nunca em seus processos de escolarização reconheceram afirmativamente, de fato, a sua existência, visto que a vivência com HIV e aids era sempre colocada como condição de alguém perigoso, uma coisa do outro, logo distante.

Tatiana, pela primeira vez, sentiu as questões em torno de tal pandemia atravessadas nos espaços da escola em uma lógica que fugia duplamente das narrativas biomédicas hegemônicas e das moralistas-estigmatizantes. Apesar de tal sensibilização, decidiu - assim como o personagem Caio, presente no filme que acabara de ver, e de tantas outras pessoas que conhecera nos cotidianos médicos - continuar com tal questão reservada para ela, coisa que aprendera com a sua avó desde a descoberta do “bichinho”, nome dado ainda criança para o ser que com ela vive, por medo da reação de seus colegas e de outros professores. Mas, no fundo, ela suspeita que algumas pessoas no espaço escolar saibam de sua condição de saúde, visto que desde criança tinha que tomar remédios, muitas vezes em momentos de aula, e vocês sabem como é… isto gera certa suspeita.

Na atividade extraclasse, Tatiana materializa sutilmente em palavras os seus sonhos de um mundo sem preconceitos, e que a cura à infecção pelo HIV seja possível, sustentando a sua esperança por um tempo por vir em que não seja mais necessário tomar remédios todos os dias.

Cena 2: Atravessamentos

Na sexta-feira, Jorge sai do trabalho mais cedo. O seu novo emprego é em uma multinacional com sede em algumas capitais do Brasil, a qual libera os funcionários no último dia da semana no horário do almoço. Fazem isso para tentar transparecer uma imagem de great place to work, mas, na prática, era um serviço cansativo, como os outros geralmente também são. Ele começa a planejar o final de semana, ainda sem muitas expectativas. Na empresa, poucos sabem de seu passado e de sua história, e assim preferem continuar - não que tenha vergonha ou nada desse tipo, apenas gosta de sua privacidade e de certo anonimato.

Depois de um tempo sem ficar com ninguém, decide usar no celular alguns aplicativos de encontros. No primeiro, colorido e com fundo branco, já por ele conhecido, coloca algumas fotos de rosto e de corpo inteiro, junto de uma breve descrição - quase um currículo profissional, mas com outros fins. Percebe que, diferente da última vez que usara a rede, alguns meses antes, é possível demarcar se tinha tomado as vacinas da covid-19. Felizmente, estava com as três doses em dia.

Naquela tarde, decide, também, experimentar outra rede de encontros que seus amigos tanto falam. Esta era destinada, sobretudo, ao público masculino que se relaciona com outros homens, mas também vê algumas pessoas trans e travestis por lá. Nela, ele decide não deixar pública uma foto de seu rosto. Pensa em colocar um registro de seu corpo apenas de cueca, sem a face, mas opta por observar misteriosamente, ao menos por enquanto. Segue atento e percebe que pode colocar informações em seu perfil, assim como no outro aplicativo já conhecido, mas de formas diferentes. Decide anunciar por lá que era um homem trans e, apesar de não ter nenhuma imagem sua, recebe uma série de mensagens de todos os tipos: curiosas, desejosas, chatas, invasivas e hipersexualizantes. Mesmo em total sigilo, enviam-lhe imagens de nudez explícita, o que o espanta um pouco. “É assim que aqui funciona então”, pensa.

Ao percorrer a nova mídia digital, vê também uma opção nomeada de Saúde Sexual, a qual apresenta a possibilidade de demarcar o Status HIV e período de último exame. Ele, como homem trans bissexual, fora, desde os momentos em que percorria as suas travessias desviantes de corpo, gênero e sexualidade, marcado também pelas pedagogias que se faziam em torno da pandemia de HIV/aids. O temor perante a morte, o sexo, o prazer e o desejo foram introjetados ao se reconhecer - e ser reconhecido - pertencendo a grupos específicos intensamente vulnerabilizados e estigmatizados, gerando medo sobretudo dos encontros. Mas, após atingir a maioridade e sair de casa, também aprendeu que tais questões não competem exclusivamente às pessoas trans e aos homens que se relacionam com outros homens.

Decidiu, a partir dos dezoito anos, que poderia ser quem era, relacionar-se e ser feliz, custasse o que custasse. Já havia passado por tanta coisa nas transições e demarcações de seu território que merecia uma dose de leveza. Aprendeu muito disso com amigos trans e não-heterossexuais que também precisaram viver estas e outras travessias e afirmações de seus modos de vida. Tomou a escolha de ter alguns cuidados, como usar a camisinha com quem transava. Ensinaram-lhe isso na escola e nas campanhas midiáticas: preservativo sempre - exceto no caso de adentrar em um relacionamento monogâmico (heterossexal?), espaço no qual se normalizou, com certa ingenuidade, não ser necessário.

Nas aulas sobre doenças sexualmente transmissíveis (DST) - termo hoje em desuso, substituído por infecções sexualmente transmissíveis (IST) -, nos cantos dos livros didáticos de ciências e biologia e nos discursos de alguns de seus professores, aprendera vagamente acerca das relações corporais entre homem/pênis-evagina/mulher, e a reprodução heterossexual, o que pouco ou quase nada teve de relação com a sua vida, não fazendo muito sentido e caindo rapidamente no esquecimento. Até o nome dado às camisinhas - masculina e feminina - era transfóbico, mas lera em páginas de conteúdo LBTQIA+ que estas poderiam ser, respectivamente, chamadas de preservativo externo e interno.

Adaptou, dentro do possível, aqueles ensinamentos às suas relações desejosas que rompiam tal lógica cisheteronormativa, mas, às vezes, achava extremamente confuso pensar em como aplicar aquele método em suas práticas de prazer. Quando se apaixonava, acabava deixando tal capa protetora de lado depois de alguns encontros - coisa que suas amigas cis e heterossexuais faziam até mais rápido do que ele e, quando ainda com receio, existindo o único medo de engravidar. O amor, suas entregas e seus riscos. Jorge acabara de sair de um último relacionamento e, por isso, decidiu voltar a usar os aplicativos de encontro.

Na nova rede que estava a se aventurar, além das narrativas cisfalocentricas e dos anúncios de prostituição, vê alguns perfis descritos como “casado com mulher/sigilo” e “macho hétero, só sexo”, deixando-o inquieto e questionando aquilo tudo, já que é um espaço sobretudo de pegação entre-homens gays e bissexuais. Começa a entender o que a medicina chama de homens que fazem sexo com outros homens (HSH) e que o desejo, por mais que se tente, não cabe em caixinhas. Sente-se confuso: a identidade e suas fissuras se borram…

Percebe também que algumas pessoas demarcavam aquela opção de “saúde”, mas muitas mantinham ela sem nenhuma informação. Status HIV: Negativo e Negativo, usando PrEP eram as principais opções publicizadas, quando respondidas. Viu, de relance, uma pessoa colocando Positivo, não detectável em seu perfil e pensou: “nossa, que coragem!”. Coragem da verdade ou rendimento aos dispositivos pedagógicos médico-confessionais virtuais? Exposições, silêncios, silenciamentos, forças afirmativas e confissões quase a céu aberto permeavam os fundos negros entre máscaras sigilosas que, no anonimato das telas do celular, insistem em dizer: diga, diga, diga.

Enquanto isso, Jorge sentiu uma inquietação. “É um outro universo!”, pensou. Aprendera um pouco com os seus amigos e companheiros de trajetória acerca da dimensão das outras tecnologias de prevenção às IST por meio de remédios, como a PrEP e a PEP, inclusive precisando recorrer certa vez a esta segunda, juntamente da pílula do dia seguinte, em um momento, depois de uma noite de muita bebedeira e tesão. Também vira rapidamente nas redes sociais que o gel lubrificante, algumas vacinas - como as de hepatite A, B e HPV - e até beber água participam do que vem se chamando de Prevenção Sexual Combinada, e que pessoas vivendo com HIV em tratamento tendem a não adoecer pela infecção e, menos ainda, desenvolver a aids, podendo atingir a indetectabilidade, logo intransmissibilidade do vírus. Questionou: por que nada daquilo fora também dito em outros espaços, como na escola e nos grandes veículos de comunicação? Pensou que, talvez, nem os seus antigos professores soubessem disso naquele momento, ou que alguns daqueles conhecimentos e tecnologias fossem mais recentes que a sua imersão no ensino básico alguns anos antes.

Sobre as mídias, refletiu que o moralismo dificultava a propagação de narrativas aprofundadas e problematizadoras em torno da prevenção às IST. Lembrou de um documentário que assistira há cerca de dois anos que narrava a luta, sobretudo de corpos dissidentes e minorias, como ele, nos Estados Unidos, contra a aids. As pessoas lá traçavam, coletivamente, maneiras de como sobreviver a uma praga (2012). Sentira, no momento que viu o filme, certo desconforto e reconhecimento. Pensou: “cara, e se fosse eu naquele tempo, será que sobreviveria?”.

Com todos aqueles atravessamentos, Jorge se lembrou que há mais de dois anos não fazia exames de rotina para as IST e decidiu que, naquela mesma tarde, iria para um centro de testagem e tratamento de sua cidade, vinculado ao Sistema Único de Saúde (SUS), fazer “O Teste”.

Cena 3: (Des)encontros

Após seis meses de pandemia, um flerte breve que começou nos corredores de uma empresa de call center, em janeiro de 2020, logo tomou proporções mais intensas. Pedro e Júlio se conheceram no trabalho, quando ainda acontecia ao modo presencial, pouco antes da emergência da covid-19 e, mais do que química, tiveram uma explosão em seus encontros. Com as medidas de isolamento decretadas, decidiram que, por morarem longe de suas famílias e em bairros vizinhos, se encontrariam sempre e apenas os dois, fazendo companhia um ao outro. Gostavam, além das carícias íntimas, de cozinhar e de assistir a filmes juntos.

Para a noite de sábado, depois de uma semana intensa de home office, em decorrência do cansaço, decidiram pedir uma pizza e tomar um vinho no apartamento de Pedro. Já fazia quase oito meses que estavam nesse rolo sério - monogamicamente imposto em decorrência da crise sanitária, mas até que vinha dando certo.

Era uma noite especial, sentiram, e para acompanhar os comes e bebes, Pedro sugeriu um filme: 120 Batimentos por Minuto (2017). Ao ler a sinopse, Júlio achou interessante, apesar de ficar um pouco incomodado com a temática. Mesmo assim, ambos concordam em assisti-lo. Enquanto fazem o download em plataformas virtuais, se deliciam com os aperitivos e com a companhia um do outro, mas, antes que percebam, o filme já fora baixado. Deitam juntos na cama e apagam as luzes. Um beijo antecede o apertar o play. O notebook fica entre eles, mas as mãos se acariciam em gestos ternos de carinho.

As cenas francesas retratam imagens de afagos e de amor, como as que experimentavam em seu relacionamento, mas também de luto, dor e tristeza. A história da pandemia de HIV/ aids é marcada pelo sangue de incontáveis pessoas que morreram nas últimas quatro décadas e dos tantos que seguem vivendo com o vírus, algo que fica evidente nas narrativas audiovisuais que assistiam. Um certo desconforto os afetava com as imagens e os sons: sentiam, de diferentes formas, que aquela história era deles também. Ambos ficam inquietos.

Júlio se recorda do medo que os seus pais tinham e nele criaram ao ensinarem, desde criança, que homossexuais, em geral, morriam de aids, doença que o pastor da igreja que frequentavam dissera ser um castigo divino pelo pecado do homossexualismo - termo estigmatizante que categoriza a relação homoafetiva como doença. Tal questão o levara a passar grande parte de sua vida beijando apenas meninas e sem transar com ninguém, barreira que custou a superar em seus processos de se reconhecer e afirmar gay. Já Pedro se inquieta por outros motivos: guardava um segredo.

As cenas seguem e, em um momento ápice do filme, o personagem Sean, extremamente adoecido pela aids e internado em um ambiente hospitalar, transa com Natan naquele mesmo espaço. Eles se emocionam. As imagens e sons continuam e caminham para um final intenso, como todo o filme era. Após isso, reina um silêncio. Ambos estão impactados, cada um à sua maneira.

Pedro sente que aquela noite era um momento de contar um pouco mais de sua vida a Júlio, por isso escolhera tal filme a ser assistido em sua casa. Ele também tinha medo da aids em sua infância e adolescência, ambas marcadas por pedagogias moralistas de pânico, terror e aversão. Na escola, nos anos em que cursara o ensino básico, ouvira, brevemente, em algumas aulas de ciências e biologia e em palestras pontuais marcadas por imagens amedrontadoras de corpos adoecidos, sobre prevenção sexual - sobretudo acerca da camisinha, do anticoncepcional e da pílula do dia seguinte em relações cisheterossexuais -, porém, apesar das tentativas da gestão e de seus professores que tanto admirava em tentarem quebrar barreiras morais para trabalhar tais questões, em decorrência dos currículos normativos hegemônicos, praticamente nada fora ensinado acerca das possibilidades de cuidar-se nas relações que fugiam da cisheteronormatividade. Dentro de casa, menos ainda havia aprendido sobre aquilo: não existia espaço para tais diálogos, apenas o silêncio se fazia presente. Aprendera muito na vida fora da escola, nas relações, nas práticas e nos encontros.

Cerca de dois anos antes daquela noite, decide tentar ter acesso à PrEP - método de prevenção ao HIV que, naquela época, era recentemente disponibilizado, em ‘conta-gotas’, nos postinhos do SUS de sua cidade, mesmo já sendo antigo e de fácil aquisição em outros países - como maneira de ‘superar aquele pânico’ nele introjetado e desde cedo ensinado acerca do HIV e da aids, desejando se sujeitar a uma rotina de escrutínio biomédico e de tomada de medicamentos diários em nome do ‘autocuidado’. Porém, ao realizar os exames necessários, recebera um resultado inesperado: reagente para HIV. Pensou: “putz, não deu tempo!”. Seu mundo desabou naquele momento.

Com aquele diagnóstico, parecia que os seus maiores medos se concretizavam, mas, com o passar dos dias, meses e anos, por meio do acolhimento e de uma intensa rede de apoio de amigos, profissionais da saúde e de conhecer outras pessoas em uma Organização Não Governamental (ONG) que também viviam com o vírus, viu que não era bem assim: existia muita vida pela frente. Naquela época em que estavam juntos, ele tomava dois comprimidos diariamente e, desde o início de seu tratamento, em 2018, atingira a indetectabilidade, recuperando e mantendo o seu sistema imune saudável. No começo tivera alguns efeitos colaterais - enjoo, insônia, tontura - mas que, com o tempo, passaram.

Após o filme, ele, com muita coragem e certo medo, narra a sua história para Júlio. Ambos vinham tendo uma convivência corporal intensa, de muito desejo e prazer, mas escolheram juntos neste tempo por manter o preservativo mesmo sem, até então, terem outros diálogos mais profundos acerca da prevenção. Após Pedro relatar tais questões, Júlio - mesmo bem informado, sobretudo pelas conversas com amigos, pelas publicações em redes de divulgação de notícias voltadas ao público LGBTQIA+ e por suas pesquisas pessoais, sabendo que, nas vivências com HIV em tratamento antirretroviral, tende-se a atingir a indetectabilidade e que Indetectável = Intransmissível (I=I), além das novas configurações da infecção pelo HIV - ficou assustado. Pedro tenta entendê-lo e lembra de como foi difícil no “começo de tudo”. Conversam um pouco mais sobre e depois Júlio desvia para outro assunto. Cerca de uma hora depois, ambos ficam em silêncio e dormem.

No outro dia, Júlio acorda cedo, despede-se de Pedro com um beijo no rosto e vai para a sua casa. Na semana seguinte, Júlio pede a Pedro que permaneçam um período sem se verem, pois precisava de um “tempo”.

Afecções em cena

Eu sou o HIV que você não vê…

Rita Lee e Roberto Carvalho

Rita Lee, desde meados da década de 1980, canta acerca do vírus do amor8 e do HIV que você não vê9, mas que está aí, no gosto azedo do medo que apresenta real perigo. O período de composição destas canções era de muito terror e incontáveis mortes diárias em torno da aids. Mas, nas décadas que se seguiram após a criação de tais músicas, muito mudou. Poderíamos hoje tecer outras musicalidades e produções artísticas em torno do HIV e da aids? O que tem sido criado contemporaneamente? Escritas, canções, séries, filmes? Ensinagens e aprendizagens outras? O que está em movimento nesta pandemia nos anos 2020? O que permanece vivo dos momentos iniciais da pandemia e que insistimos em assim manter? O que de novo tem surgido?

O HIV que não vemos está por aí em corpos humanos, vivos. Por que segue não visto? Eis a problemática do silenciamento (BOCCHETTI, 2022). E será que precisamos vê-lo sempre? Corremos, assim, também o risco de cair nas táticas confessionais (FOUCAULT, 2013), no perigo de pressionar todos para o compartilhamento das suas verdades íntimas, de suas práticas sigilosas, de seus corpos e de suas vidas.

Questões epidemiológicas, tramas biopolíticas (FOUCAULT, 2019)... ambas tão caras à educação em ciências e biologia. É justamente neste campo - do ensino de ciências e biologia - que, como afirmam Mariana Vilela e Sandra Selles (2015), se investe na educação em saúde nos espaços escolares, orientada, sobretudo, por abordagens biomédicas e higienistas, atuando na consolidação de binarismos que insistem em separar a saúde da doença. Ademais, reside aí - nas disciplinas escolares de ciências e biologia, como bem afirmam Paula Ribeiro e colaboradores (2016) - possibilidades de permear - e também produzir - ensinagens e aprendizagens em torno do corpo, do gênero e da sexualidade.

“Por isso, cuidado, meu bem, há perigo na esquina!”10. Aí - na educação em ciências e biologia, em saúde, e… - ainda habita o risco de rotular e segregar as vivências soropositivas ao HIV, quando localizadas e marcadas, a lugares distanciados da vida e de seus prazeres, como reflete Emerson Ignácio (2016):

O Corpo passa da dimensão do prazer à dimensão do dever e dela, à restrição própria ao que se considera no senso comum como abjeto, sendo, pois, corpos que importam como vida tratável, mas jamais como lugar de gozo. Restringe-se, assim, o corpo à sua condição de porta-vírus, de entidade plena no discurso, mas distanciado da Vida e dos seus Prazeres. (IGNÁCIO, 2016, p. 489)

Eis um cuidado necessário ao trabalhar tais questões, seja nas salas de aula, em nossas práticas docentes no ensino de ciências e biologia, seja nos espaços de cuidado da saúde, seja aonde for: não cair de amores pelo dispositivo da sexualidade (FOUCAULT, 2019), pelas teias biomédicas traçadas em torno da aids como um dispositivo (SALES; 2022b; PELÚCIO; MISKOLCI, 2009; PERLONGHER, 1987). Foucault (2010) já nos alertou em meados da década de 1970: “Não caiam apaixonados pelo poder” (p. 106). É preciso ter cuidado com as nossas relações e alianças com os conhecimentos científicos, e em como articulá-los em nossos cotidianos.

As narrativas presentes nas Cenas 1, 2 e 3, em lampejos literários e inspirações ficcionais, borram fabulação e realidade, atravessando processos de produção de discursos, práticas, subjetividades, silêncios, silenciamentos e modos de mobilizar falas, permeadas por tais dispositivos. Imbricam-se nelas “pedagogias da sexualidade” que, como disserta Guacira Louro (2019), são atravessadas pela emergência da aids: “Num tempo de AIDS, por exemplo, a preocupação com o exercício do ‘sexo seguro’ vem sugerindo novos modos de encontrar prazer corporal, alterando práticas sexuais ou produzindo outras formas de relacionamento entre os sujeitos” (p. 16). Ressaltam-se, assim, imagens de territórios em que humanos e vírus coexistem: um mundo (con)vivendo com o HIV e com a aids.

Nas linhas ficcionais das narrativas acima apresentadas não existem mentiras: são múltiplas histórias de vida, povos criados e que falam por si a partir de suas experiências e de seus aprendizados cotidianos. Os segredos são revelados por um cartógrafo que tudo vê, buscando se manter paradoxalmente distante e próximo. Pelo caráter de serem “apenas” cenas, consistem em recortes breves de cotidianos banais e intensos, deixando linhas em aberto para afecções e aprendizagens por vir.

Os filmes Carta para além dos muros (2019), Como sobreviver a uma praga (2012) e 120 Batimentos por minuto (2017) são situados nas narrativas criadas e atravessadas nas cenas, não como centralidades das histórias, mas como elementos que lá se fazem presentes, que carregam potências pedagógico-educativas, junto de tantos outros elementos que compõem territórios existenciais. As produções audiovisuais estão lá, produzindo modos de ser, de experimentar, experienciar e viver as sexualidades, visto que, como afirma Paul B. Preciado (2020), “a relação entre sexualidade e cinema não é da ordem da representação, mas da produção” (p. 103). Tais narrativas imagético-sonoras estão lá, ensinando, mas não são os únicos meios de aprender: compartilham os espaços com múltiplos agenciamentos educativos: a escola, as redes sociais, as relações pessoais, os encontros, a vida que urge e que ensina diariamente a como habitar o mundo11 e seguir intensamente vivo.

Os breves ensaios literários-ficcionais das Cenas 1, 2 e 3 buscam tensionar a dimensão da educação em HIV/aids por meio dos afectos, dos atravessamentos corporais, das vibrações subjetivas, das sensibilizações possíveis. Estas escritas iniciais, em si, permeiam diferentes territórios educativos - a escola, o trabalho, a casa, a rua, os filmes. A vida é reconhecida, em suma, como o principal espaço da educação, visto que aprendemos por estarmos vivos (RIGUE; DALMASO, 2020).

Entre o início da década de 1980, com a emergência pública e midiatizada dos primeiros casos catalogados da aids que, rapidamente se pulverizaram mundo afora na consolidação de uma pandemia que levou dezenas de milhões de pessoas a óbito até os anos 2020, período em que tal morte coexiste com múltiplas possibilidades terapêuticas e preventivas com antirretrovirais, muito mudou. No Brasil, rapidamente uma nova pandemia superou o número de vidas ceifadas pela aids: a de covid-1912. Não há quem tenha passado ileso a estas duas emergências pandêmicas: todos somos por elas impactados.

Ao reconhecer todas estas questões em movimento em torno da pandemia de HIV/ aids, indago: será que nós também temos mudado? Será que as ensinagens escolares em ciências e biologia, em torno de tais questões, se atualizaram ou seguem próximas do mesmo que se educava décadas atrás? Que discursos e práticas têm sido produzidos contemporaneamente? Como temos nos relacionado com os vírus, com o medo, com o adoecimento, com o cuidado de si e do outro, com os desejos, com os sonhos de uma cura à infecção e ao estigma, com as possibilidades materializadas em tecnologias? Ao nos afirmarmos como educadores em ciências e biologia, de quais formas temos nos articulado em nossas práticas educativas no combate aos preconceitos que se entrelaçam com moralidades em torno de tal território pandêmico? Temos nos empenhado na popularização das formas de prevenção e de tratamento ao HIV/aids e às outras IST, abrindo-nos às mudanças constantes neste campo? Será que as pedagogias em torno da moral familiar-cristã e do terror que ressoavam nos primeiros anos de emergência da pandemia continuam sangrando atualmente? Como seguimos atualizando muito do que nos marca e fere cotidianamente em relação ao corpo, ao desejo e ao prazer?

A partir das Cenas 1, 2 e 3, fica evidente a presença de uma educação maior em HIV/aids em diferentes espaços, à serviço dos interesses estatais, aliada à biomedicalização da vida e à manutenção do estigma, sustentada em linhas duras e segmentares, que investe no controle dos corpos por meio de pedagogias do medo e do terror. A partir delas, ressoam algumas questões: será que toda educação maior é sempre traumática, violenta e triste? De que formas podemos diminuir as dicotomias? Como seria possível transitar por entre diferentes linhas - duras, segmentares e de fuga (DELEUZE; PARNET, 1998) - nas ensinagens e aprendizagens?

Também salta aos olhos que mobilizar educações menores em HIV/aids13 pode acontecer de múltiplas formas e em territórios variados, dentro e fora da escola, como ocorre pelas linhas de fuga que vão germinando, demandando de nós “a capacidade de forjar outras formas de cartografar os territórios do HIV e da aids, instaurando possibilidades por vir de narrar tais caminhos que se fazem no encontro entre humano e vírus” (SALES, 2022b, p. 22). Salas de aula, ruas, casas, redes sociais, filmes: são todos espaços educativos. Imbricar-nos na criação e experimentação de educações menores em HIV/aids é reconhecer que “Em pedagogias e educações subversivas agenciadas por micropolíticas contagiosas, cabe-nos criar possíveis, a partir do que foi negado, controlado e vigiado até então: o direito ao prazer, ao gozo, ao desejo e à potência de vida” (SALES, 2022b, p. 22).

Dessa forma, sobre as educações menores em HIV/aids, é possível afirmar que:

Ao mobilizarmos as questões em torno do HIV, da aids e da educação, os caminhos não estão prontos, demandam serem construídos, no enfrentamento do estigma, dos dispositivos médicos, do preconceito, das linhas que descarrilham em mortes, das tensões que cerceiam o desejo. (...) Resta-nos investir em uma educação em HIV/aids - e ciências e biologia e saúde e... - que ensine a viver mais, a desejar mais, a perceber mais o mundo, a dar mais vazão aos afetos, atenta aos bons encontros, fugindo do que rouba-nos a alegria. Para tal proposta afirmativa da vida, necessita-se de uma relação educativa que não destrói e corrói as existências, ao contrário, uma relação de composição, desterritorialização, devir, feito a potência viral infectiva e afectiva que adentra os espaços, não causando a doença, e sim a saúde da mudança, da metamorfose, da abertura à mutação, ao porvir (SALES, 2023, p. 44-45).

Assim, percebo que educações menores em HIV/aids são possíveis nos trajetos cotidianos que se colocam a favor das fugas e dos desvios às perspectivas que restringem e subjugam a vida aos saberes e práticas biomédicos. Eis a sinuosa e necessária tarefa às educações em ciências, biologia, saúde e… de não romper e nem negar estes campos bio-fármaco-médicos de produção - de saberes, práticas, tecnologias e processos de subjetivação -, mas criar com eles alianças transdisciplinares - com as filosofias, as artes, e… - que possam expandir a percepção dos acontecimentos que se fazem pelos caminhos do desejo, pela/com/em meio à vida (SALES; RIGUE; DALMASO, 2023).

Nas Cenas 1, 2 e 3, as produções audiovisuais que aparecem em relances por meio dos diferentes encontros lá suscitados, permeiam as histórias, abrem possíveis afecções e, logo, também formas de aprender e de ensinar. Neste artigo, fiz a escolha de adensar o olhar aos filmes, infectando-os e contagiando-me com narrativas outras - sobretudo com as escritas literárias ficcionais -, mas ressalto que mobilizar educações menores em HIV/aids pode acontecer com materiais diversos: as ferramentas são muitas, demandando serem escolhidas e movimentadas pelos educadores.

Os filmes aqui apresentados, mesmo que de relance, nos dão pistas de educações menores em HIV/aids, não como formulários, receitas, bulas e prescrições a serem seguidos, mas como inspirações, afecções, linhas prenhes de trajetos por vir. Com as narrativas audiovisuais, temos pistas de como agenciar transbordamentos possíveis à educação em ciências e em biologia e… em espaços escolares e não escolares, e… e… e… nos caminhos múltiplos, contagiosos, afectivos, inspirados no devir-vírus, no fecundo contágio com/em meio à/pela vida que nos interpela nos diferentes espaços e tempos que percorremos.

Mobilizar as narrativas fílmicas aqui cartografadas nos anos 2020, enquanto ainda somos afetados pelos atravessamentos da emergência da pandemia de covid-19, apresenta-se com certas particularidades: a proliferação de saberes e práticas biomédicos em múltiplos espaços cotidianos os quais, anteriormente, não se faziam (tão) presentes; a intensificação das políticas higienistas, do distanciamento, da aversão ao outro, do medo, do pânico e, também, do perigo e da proximidade com a morte. Tais questões são tangenciadas sutilmente nas Cenas 1, 2 e 3, que abrem esta seção por meio das máscaras, das vacinas e do isolamento, relacionado à covid-19, juntamente da inquietação dos/as personagens perpassados/as pelas tramas das ciências médicas, e afetados pelo estigma que permeia o HIV e a aids. Estas instâncias imbricadas em percepções advindas das conexões entre-pandemias, ora sutilmente e ora explicitamente, compõem as minhas escritas advindas dos encontros com as produções audiovisuais, visto que, mesmo que a sua criação e publicização tenha sido anterior à covid-19, como doença (re)conhecida, o nosso encontro se fez após tal período e carrega as marcas de leituras e experiências imbricadas nesses contextos.

As narrativas literárias presentes nas Cenas 1, 2 e 3 também trazem a dimensão da presença dos filmes em cotidianos, afetando diretamente diferentes pessoas, imbricando na produção e movimentação de modos de vida, educando. Que atravessamentos já não foram experimentados a partir de encontros com estas e outras produções? Quantos estão em vias de acontecerem? Como podemos mobilizarmo-nos para tal, articulando-as em nossas vidas e práticas pedagógicas? Eis a potência do por vir.

O documentário14 Carta para além dos muros (2019), ao tecer narrativas audiovisuais em torno da história da pandemia de HIV/ aids no Brasil, conecta-as com acontecimentos globais e histórias de outros territórios. O seu título, inspirado nas cartas para além dos muros produzidas por Caio Fernando Abreu, posteriormente publicadas no livro Pequenas Epifanias (2014), nos convida a transpor as tantas barreiras para nós impostas, também as que ajudamos a construir. Caio relata nas escritas, entre poéticas e mistérios, os processos em torno da sua descoberta15 e vivência com HIV. A partir de tal interlocução, o filme tece paralelos com a vida de Caio, um personagem recém diagnosticado como um corpo infectado pelo vírus. Múltiplas narrativas vão se trançando: a de Caio F. Abreu, a do personagem Caio recém diagnosticado, a de tantos outros sujeitos que atuaram na história do HIV e da aids no Brasil e no mundo, seguindo nas lutas até os tempos atuais. Percebo que o filme traça variadas rotas nas vidas afetadas pela pandemia de HIV/aids, não focando na perspectiva única do sofrimento e da morte - por mais que ela também seja real e esteja presente em muitos momentos -, mas da militância, do desejo, da força coletiva. São pedagogias da memória que carregam a potência de afetar quem assiste, como ocorreu com a personagem Renata na cena 1. Assim, engendra educações menores em HIV/aids, ressoando em possibilidades outras de narrar uma pandemia, para além dos já saturados e naturalizados discursos biomédicos que pouco ou quase nada trazem de relação com as vidas que são atravessadas pelo HIV e pela aids.

O documentário estadunidense Como sobreviver a uma praga (How to survive a plague, 2012) se passa sobretudo nos anos iniciais da pandemia de HIV/aids, retratando movimentos do Coletivo ACT UP, principalmente na cidade de Nova Iorque. A história da pandemia de HIV/ aids é também a nossa história, como percebe Júlio na Cena 2, e eis a urgência e importância de tecer narrativas de memória, como no documentário. Será que se estivéssemos em outros momentos, como nas décadas de 1980 e 1990, nós sobreviveríamos a estes territórios pandêmicos? E quem passou por todos estes anos de pandemia, de que formas foi marcado? A morte é personagem no filme, assim como o luto e a luta. Tais dimensões - da luta e do enlutar-se - tecem-se em conexões viscerais. A educação menor imbricada nas narrativas audiovisuais impulsiona a luta, o desejo de permanecer vivo e a solidariedade - mobilização tão importante nos movimentos sociais de HIV/aids no Brasil e no mundo. Busquei, a partir do filme, encontrar inspirações nos ventos do Norte que pudessem chegar ao Sul e movimentar formas de lutas, de resistência e de ensaiar modos outros de narrar - e habitar - a pandemia de HIV/aids, com os múltiplos impactos e afecções possíveis a partir dela.

Em 120 Batimentos por Minuto (120 Battements par Minute, 2017), as cenas se passam na França, sobretudo em Paris, na década de 1990, período de grande terror em torno da pandemia de HIV/aids. Percebo, nos anos 2020, que muitos dos resquícios morais, de pânico, medo e preconceito que circundavam o HIV e os processos de adoecimento por ele possivelmente desencadeados naqueles anos iniciais da emergência viral seguem em curso, se intensificando com a emergência da covid-19, como por intermédio do fortalecimento da noção biomédica-estigmatizante de “grupos de risco”. Tais questões ficam evidentes, na Cena 3, com a reação de pânico suavemente disfarçada por Júlio perante a coragem de Pedro dizer suas ‘verdades íntimas’, não conseguindo - ou desejando - reagir de outra forma que não fosse aversiva e de fuga, ficando nítido muito do que segue em curso no que tange tal relação humano-vírus16. Encontrar com produções contemporâneas de momentos outros do passado da pandemia movimenta possibilidades de vislumbrar quais imagens permanecem pulsando nos anos 2020, e que cartografias são traçadas a partir delas.

Em 120 Batimentos por Minuto (2017), assim como em Como sobreviver a uma praga (2012), os militantes do Coletivo ACT UP travam lutas contra laboratórios científicos e instituições estatais, mobilizando-se na defesa do direito à saúde, aos tratamentos e prevenções possíveis à aids e às infecções oportunistas. Para além das batalhas por produtos biomédicos, os sujeitos presentes nas narrativas fílmicas exigem que sejam reconhecidos como vivos, que possam existir intensamente, desejar com vontade, fugindo da morte civil que Herbert Daniel (DANIEL; PARKER, 2018) denuncia. Os/as personagens pulsam, demandam vida, supitam, proliferam, expandem e se contagiam com a força que neles vibra. O vírus e a aids também são personagens no filme, compartilhando as cenas com os humanos em potências multiespécies (TSING, 2019), em devir-vírus.

Nas imagens, nos sons e nas escritas, o desejo salta aos corpos, mesmo nos adoecidos e próximos à morte, em cenas que nos ensinam, atravessam e produzem formas múltiplas de permear saberes curriculares ao se engendrarem como manifestos pela vida, pelo prazer e pelo tesão, na força coletiva, no contágio afectivo vivido nos encontros.

Considerações finais

Nas narrativas - audiovisuais e escritas - aqui mobilizadas - habita, constantemente, a tensão entre desejo e medo, vida e morte, saúde e doença17. Linhas de fuga são nelas embrionadas na instauração de formas - e não fôrmas!18 - outras de narrar uma pandemia: por meio da força da vida, do desejo, da potência e da luta, mesmo em momentos de esgotamento. Com elas, nos infectamos rizomaticamente com a possibilidade de imbricar na educação em ciências e biologia, em gestos ativos de instaurar fissuras. Coloco-me, dessa forma, em movimentos incessantes de procurar - e criar - possíveis em meio à(s) pandemia(s) - de HIV/ aids e covid-19 - para não sufocar.

A partir dos filmes proliferam possibilidades de mobilizar educações menores em HIV/aids, fugindo dos discursos biomédicos, incidindo fraturas nas imagens moralistas e estigmatizantes em torno das relações humano-vírus, do corpo e do prazer, do tesão, do desejo e da vida. Eles são, mais do que objetos, a materialização de alguns caminhos possíveis, mas não os únicos. Existem múltiplos trajetos por vir e ferramentas a serem utilizadas.

As narrativas aqui tangenciadas traçam pedagogias do desejo, da luta pela vida, da potência que habita no coletivo. A força de tais ações coletivas-militantes fissura tramas hegemônicas, instaurando menoridades. Nelas habitam as possibilidades de engendrar educações menores que confrontem os dispositivos imbricados em torno do corpo, do desejo, da vida, associados à sexualidade e, também, à aids. Forjam-se educações militantes, políticas e coletivas - logo, menores -, em defesa e afirmação da vida, ativamente se posicionando no combate ao estigma em torno do HIV e da aids, na desconstrução de pré-conceitos, na possibilidade de experimentar-se, de agenciar bons encontros e com eles aprender, de mobilizar pelo corpo os desejos, de dar vazão aos fluxos, de vibrar intensamente.

Os filmes e as escritas presentes nas Cenas 1, 2 e 3, ao infectarem diferentes espaços, movimentam tais fissuras, agenciam formas outras de narrar uma pandemia e de nos relacionarmos com os vírus, em possíveis convivências que, como percebemos, são inevitáveis ao habitarmos o mundo. Resta a nós, educadores/as em ciências e biologia e saúde e… nas salas de aula, nos museus, nos cinemas, nas praças, nas ruas, nas escritas, nos hospitais, nos livros, nos caminhos múltiplos da vida, e… e… e… a contínua tarefa de cultivarmos a sensível, potente e sutil capacidade de estarmos atentos/as às afecções possíveis a partir de tais encontros, de manter o nosso corpo vibrátil (ROLNIK, 2016) poroso e em movimento, de articularmos possibilidades de nos contagiarmos com tais produções, mobilizando-as, dentro de nossas caixas de ferramentas19 (FOUCAULT; DELEUZE, 2019) da docência-vida, em nossos cotidianos e práticas educativas, de criar modos outros de ensinarmos e de nos educarmos com e a partir dos trajetos audiovisuais.

Ao mobilizarmos as questões em torno do HIV, da aids e da educação, os caminhos não estão prontos, demandam serem construídos, no enfrentamento do estigma, no questionamento dos dispositivos (bio)médicos, do preconceito, das linhas que descarrilam em mortes, das tensões que cerceiam o desejo - questões que, mais uma vez, reforço: são fortemente produzidas e atualizadas no ensino de ciências e biologia, mas não precisam assim continuar sendo: é possível criar outras relações e traçar diferentes caminhos, abrir “brechas, fissuras e possibilidades de escapes no Ensino de Biologia” (SANTOS; SILVA, 2019, p. 165) em práticas de educações menores. Habitar os territórios pandêmicos não é algo simples, demanda-nos muita força e atenção para agenciar bons encontros, mesmo quando a vida, em risco, parece estar próxima do fim20.

“É preciso estar atento e forte, não temos tempo de temer a morte”21, já nos ensinaram Gilberto Gil, Caetano Veloso e Gal Costa. São “tempos difíceis, mas não impossíveis”, recorda Gallo (2019, p. 1). É necessário seguir, organizando encontros, articulando educações nas menoridades possíveis e nos movimentando, fazendo alianças com as ciências, as artes, as filosofias, na força do coletivo. As pistas para os trajetos por vir na produção de formas outras de educar em HIV/aids são muitas, os caminhos são múltiplos. Nada está acabado, tudo está em movimento. É possível agenciar diferentes rotas e, quiçá, formas outras de trilhar as antigas estradas. Uma potente pista, então, é estar aberto ao sutil e intenso contágio afectivo presente nas imagens, nos sons e nas escritas, ao mundo que nos circunda e que também constituímos, aos devires infectantes, ao desejo e à força transbordante da vida.

1Este artigo é um recorte da minha tese de doutorado Educações menores em HIV/aids: o que pode a educação em ciências e biologia em cartografias audiovisuais? (SALES, 2022a) realizada no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia, sob orientação da professora doutora Lúcia de Fátima Dinelli Estevinho, a qual buscou cartografar as potências educativas de três filmes que versam em torno da pandemia de HIV/aids, e as ressonâncias destes à educação em ciências e biologia.

2 Inspirado no “deserto subjetivo que se desenha em torno da AIDS, em sua relação com o(s) outro(s), qualquer(quaisquer) que seja(m), quando este(s) teme(m) o contágio”, proposto por Paulo Buenoz (2009, p. 235) em seu potente ensaio CorpoCobaia e o Caderno das Contaminações ao mobilizar os atravessamentos vividos por um corpo que foi cobaia de experimentos para a produção de remédios para tratamento da aids.

3 Este texto varia entre primeira pessoa do singular e do plural pois, na medida em que “eu” - o “autor” - escrevo as cartografias ao modo de um manifesto, numa suposta singularidade, convido quem comigo se encontra - pelas linhas e… - a participar destas composições enquanto sou tomado por uma coletividade em multiplicidades de afetos: uma multidão que infecta, contagia e cria (com) as palavras.

4Devir é “[…] jamais imitar, nem fazer como, nem ajustarse a um modelo, seja ele de justiça ou de verdade […]. Os devires não são fenômenos de imitação, nem de assimilação, mas de dupla captura, de evolução não paralela, núpcias entre dois reinos” (DELEUZE; PARNET, 1998, p. 10).

5Inspirado no conceito de rizoma, de Deleuze e Guattari (2019).

6Os filmes aqui tangenciados são 120 Batimentos por Minuto (2017), Carta para Além dos Muros (2019), e Como sobreviver a uma praga (2012), sendo escolhidos por terem sido anteriormente mobilizados em minha tese de doutorado.

7Diferentes siglas permeiam as escritas que se seguem. Buscando garantir a sua fluidez literária, elenco as que não foram descritas ao longo do texto nesta nota de rodapé, na ordem em que aparecem: HIV é a forma abreviada para vírus da imunodeficiência humana, em inglês; LGBTQIA+ é a sigla para Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais/Travestis, Queer, Intersexuais, Assexuais, e o mais (+) apresenta-se como espaço de maneiras de ser e de se reconhecer a serem incluídas e reconhecidas; PrEP é a abreviação para a Profilaxia Pré-Exposição para o HIV, sendo atualmente disponibilizada no Brasil na forma de pílulas de uso diário que previnem a infecção pelo HIV antes de possíveis exposições; já a PEP é a abreviação para Profilaxia Pós-Exposição para o HIV, sendo um medicamento de uso temporário após uma possível exposição ao HIV, atuando também na prevenção de tal infecção; e HPV diz respeito ao papilomavírus humano, grupo de vírus que infectam humanos, podendo ser transmitidos também por via sexual.

8 Música Vírus do Amor, de Rita Lee e Roberto de Carvalho.

9Música O gosto do Azedo, de Beto Lee.

10Trecho da música Como nossos pais, de Belchior.

11Acerca dos modos de habitar o mundo, teço um manifesto em defesa de uma educação em ciências que aconteça com/em meio à/pela vida, junto de Fernanda Rigue e Alice Dalmaso no texto Modos de Habitar o Mundo: uma educação em ciências com/em meio à/pela vida (SALES; RIGUE; DALMASO, 2023): “modos de habitar o mundo, de criar mundos, de criar encontros, de nos criarmos em educação” (p. 4).

12Segundo o Boletim Epidemiológico - HIV/aids (2022) “Desde o início da epidemia de aids (1980) até 31 de dezembro de 2020, foram notificados no Brasil 360.323 óbitos tendo o HIV/aids como causa básica” (BRASIL, 2022, p. 23). No dia três de julho de 2022, o site do Ministério da Saúde registrava a marca de 671.858 mortes em decorrência da covid-19 no Brasil. Disponível em: https://covid.saude.gov.br/. Acesso em: 03 jul. 2022.

13Algumas outras pistas de educações menores em HIV/ aids mobilizadas nos meus últimos anos de pesquisa-vida estão presentes em trabalhos como: no ensaio A aids como dispositivo: linhas, te(n)sões e educações entre vida, morte, saúde e doença, ao perceber a aids como um dispositivo produzido em tempos e espaços específicos, estando entremeado em torno do desejo entre linhas que agenciam a vida, a morte, a saúde e a doença, permanecendo em movimento e, assim, sendo possível nele incidir, criando brechas, rupturas e desvios em educações menores; no texto “The Aids Memorial”: histórias de amor, perdas e lembranças em pedagogias de afetos, escrito em parceria com Daniela Carvalho (SALES; CARVALHO, 2021), no qual articulamos educações menores em HIV/aids ao entrarmos em relação com histórias de pessoas afetadas pela pandemia de HIV/aids presentes no memorial digital The AIDS Memorial e, com elas, escrever cartas lançadas ao tempo para ecoar palavras de amor e de solidariedade; no artigo Mesclando imagens, criando narrativas outras: educações menores em HIV/aids e(m) filmes (SALES, 2023), ao experimentar a mistura entre manipulações visuais e escritas em torno do desejo e da vida afetados pelo HIV e pela aids; e na tese de doutorado Educações menores em HIV/aids: o que pode a educação em ciências e biologia em cartografias audiovisuais? (SALES, 2022a) ao pensar em como produções artísticas - sobretudo filmes - podem ser potentes para educar em HIV/aids em perspectivas que fujam, fraturem, criem e apresentem maneiras outras de pensar o desejo e a vida para além da lógica biomédica, sobretudo na educação em ciências e biologia.

14Parte destas considerações acerca dos três filmes aqui percorridos foram apresentadas no 9º Seminário Brasileiro de Estudos Culturais e Educação/6º Seminário Internacional de Estudos Culturais e Educação (9º SBECE/6º SIECE), que aconteceu de forma remota no ano de 2022, com o título de: Pistas de uma educação menor em HIV/aids: reflexões a partir de filmes. Elas também compõem a tese de doutorado Educações menores em HIV/ aids: o que pode a educação em ciências e biologia em cartografias audiovisuais? (SALES, 2022a) e permeiam algumas discussões presentes no artigo Mesclando imagens, criando narrativas outras: educações menores em HIV/ aids e(m) filmes (SALES, 2023).

15 Tal processo de diagnóstico ocorreu por meio d“O Teste”, também presente ao fim da cena 2, com Jorge indo realizá-lo.

16A história entre Pedro e Júlio, sem um final decisivo, deixa em aberto a potência do por vir, com seus diferentes desfechos possíveis, restando a eles pegar as rédeas desta história de diferentes (con)vivências entre humanos e vírus para ensaiar os caminhos por eles desejados e factíveis.

17Discuto também acerca destas tensões entre desejo e medo, vida e morte, saúde e doença, atravessadas pela aids enquanto um dispositivo, no ensaio A aids como dispositivo: linhas, te(n)sões e educações entre vida, morte, saúde e doença (SALES, 2022b).

18Inspirado no potente e sensível texto Por um Ensino de Biologia que se permita escutar a voz dos passarinhos e desenhar o cheiro das árvores, de Sandra Bastos (2020b, p. 43, grifos meus), e nas seguintes provocações: “Por isso, provoco meus alunos (futuros professores de Ciências e Biologia) a pensarem e planejarem suas aulas como eventos calorosos que proporcionem bons encontros. Encontros alegres que os inspirem a sonhar e colocar em prática outras formas (nunca fôrmas!) de nos construir professores. Formas que nos forcem a pensar que a docência se trama na rua, no pátio, nas praças, no supermercado, no dia a dia, no mundo lá fora… lá onde o vento faz a curva…”.

19O conceito de caixa de ferramentas é melhor explorado na tese de doutorado Educações menores em HIV/aids: o que pode a educação em ciências e biologia em cartografias audiovisuais? (SALES, 2022a) no segundo capítulo, intitulado de Uma caixa de ferramentas. No texto Entre humanos e não-humanos: o que pode a Educação em Ciências? (RIGUE; SALES, 2022), em parceria com Fernanda Rigue, mobilizamos a caixa de ferramentas como possibilidade de ensinar e de aprender ciências da natureza.

20Recordo-me e inspiro-me nesta afirmação a partir das potentes mobilizações de Perlongher (1987, p. 87-88, grifos meus): “Envolvidos numa rede de encontros sociais, os corpos produzem intensidades. Por sinal, os afetos e repulsões entre os corpos, suas sensações, são eles próprios intensivos, isto é, modulam-se segundo limiares de intensidade, cuja produção transtorna e atravessa os próprios corpos, extremando ou subvertendo até a organização fisiológica do organismo. Daí que procuras muito fortes de intensidade, de êxtase nas sensações, possam tensionar o corpo até o limite de sua resistência, até as portas da morte e da desagregação. O desejo tenderia ao excesso, à desmesura, à fuga. Os caminhos são variáveis. A busca extremada de intensidade pode percorrer as vias da orgia, da perversão radical e sistemática, até a extenuação e a repetição apática dos gestos. Linha de fuga sempre fronteiriça, ela pode beirar o abismo da destruição ou da autodestruição, desencadeando uma paixão de abolição. Tanto o perverso que perambula pelas bocas do perigo, quanto o consumidor de drogas que se obstina na exacerbação até o impossível de uma vertigem frenética estariam mergulhando (ou naufragando?) nas areias movediças onde a intensificação do desejo roça a morte. No entanto, essa procura desenfreada não é estritamente suicida, embora o suicídio possa aparecer, à maneira de um acidente ou de uma tentação, na complexidade de seus meandros. Essa demanda de intensidade é essencialmente afirmativa - afirma a vida tensionando-a e tensionando o corpo, viajando na experimentação dos seus limites”.

21 Música Divino, Maravilhoso, de Gilberto Gil e Caetano Veloso, eternizada na voz de Gal Costa.

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Recebido: 31 de Agosto de 2023; Aceito: 10 de Outubro de 2023

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Professor Adjunto no curso de licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade de Pernambuco (UPE), Campus Petrolina. Pós-doutorando em Divulgação Científica e Cultural pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Doutor em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia (PPGED/UFU). Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia (PPGED/UFU). Licenciado e Bacharel em Ciências Biológicas pelo Instituto de Biologia da Universidade Federal de Uberlândia (INBIO/UFU). Licenciado em Pedagogia pela Universidade Estácio de Santa Catarina (UNESA). E-mail: tiagoamaralsales@gmail.com

Artigo revisado por Larissa Martins Freitas

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