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Revista Educação em Questão

versión impresa ISSN 0102-7735versión On-line ISSN 1981-1802

Rev. Educ. Questão vol.58 no.57 Natal jul./sept 2020  Epub 12-Ago-2021

https://doi.org/10.21680/1981-1802.2020v58n57id20985 

Artigos

Subjetividades de um ensino: marcações de gênero na educação escolar (1970-1980)

Subjectivations of a teaching: Gender markings in school education (1970-1980)

1Universidade do Estado de Santa Catarina (Brasil)


Resumo

Este texto insere-se nos estudos de gênero e da História do Tempo Presente. Com os aportes teóricos metodológicos desses campos, busca-se refletir sobre as subjetividades construídas por meio do processo de ensino das décadas de 1970-1980. Como estudo de caso, foram utilizadas como fonte de análise, entrevistas com Liza, estudante do período, e que frequentou a Escola Ana Vanda Bassara, em Guarapuava- Paraná. Essa investigação permitiu compreender parte da vida escolar da estudante, a construção de subjetividades, e perceber como as marcações de gênero foram utilizadas na reafirmação de uma educação que idealizou mulheres para serem donas de casa conforme características da sociedade da época. A trajetória escolar da estudante foi marcada pela distinção de gênero que interseccionaram com outros marcadores, entre eles, a condição social. Esses fatores contribuíram para a subjetivação da estudante diante da reconfiguração das concepções de feminilidade ajustadas ao contexto social e ao modelo de ensino.

Palavras-chave: Educação; Gênero; Mulheres; História do tempo presente

Abstract

This text is inserted in the studies of gender and the History of the Present Time. With the theoretical and methodological contributions of these fields, it seeks to reflect on the subjectivities constructed through the teaching process of the 1970s-1980s. As a case study, interviews with Liza, a student of the period, who attended the Ana Vanda Bassara School in Guarapuava, Paraná, were used as a source of analysis. This investigation allowed us to understand part of the student's school life, the construction of subjectivities, and to see how gender markings were used in the reaffirmation of an education that idealized women to be housewives according to the characteristics of the society of the time. The student's school career was marked by the distinction of gender that intersected with other markers, among them, the social condition. These factors contributed to the subjectivation of the student in face of the reconfiguration of the conceptions of femininity adjusted to the social context and the teaching model.

Keywords: Education; Gender; Women; History of the present time

Resumen

Este texto se inserta en los estudios de género y de la historia reciente. Con las contribuciones teóricas y metodológicas de estos campos, buscamos plantear sobre las subjetividades construidas a través del proceso de enseñanza de los años 1970 y 1980. Como estudio de caso, fueron utilizadas como fuentes históricas las entrevistas con Liza, una estudiante de la época, que asistió a la Escuela Ana Vanda Bassara en Guarapuava-Paraná. Esta investigación permitió comprender parte de la vida escolar de la estudiante, la construcción de subjetividades y percibir cómo se utilizaron las marcas de género para reafirmar una educación que idealizaba a las mujeres para que fuesen amas de casa según las características de la sociedad de la época. La trayectoria escolar de la alumna estuvo marcada por la distinción de género que se cruzaba con otros marcadores, entre ellos, la condición social. Estos factores contribuyeron a la subjetividad de la alumna frente a la reconfiguración de las concepciones de feminidad ajustadas al contexto social y al modelo de enseñanza.

Palabras clave: Educación; Género; Mujeres; Historia reciente

Introdução

De acordo com Rousso (2016), ao realizar uma investigação da e sobre a História do Tempo Presente (HTP) deve ser considerada a existência de múltiplas temporalidades, pois o presente é constituído por um passado interrupto tanto no tempo e na historiografia. Como lembra o autor, deve-se ter “[...] a apreensão de uma história em movimento” (ROUSSO, 2016, p. 179).

Um olhar atento para o passado nos permite perceber como as (re)definições de gênero foram estabelecidas por meio de relações hierárquicas e são marcadas por constantes momentos de confrontação, distinção, negociação e/ou reforço, os quais, diante de uma lógica binária, impõem como homens e mulheres devem representar-se socialmente. Investigar esse binarismo leva a compreender como posicionamentos, ações, pensamentos, corpos e suas manifestações são definidas e realizadas pelas percepções construídas em torno de um corpo generificado.

Historicamente, uma concepção patriarcal esteve presente de maneira bastante intensa e fez com que permeasse entre nós, durante séculos, a concepção de que ser mulher(es) significaria ser somente filha, mãe e esposa. Concepções essas que, além de serem percebidas como naturais, em diferentes momentos foram apresentadas como limitação social e reforço da crença na inferioridade das mulheres em relação aos homens.

Partindo de reflexões em torno das desigualdades de gênero, e, de como foram utilizadas diferentes estratégias para justificar e/ou reforçar as relações hierárquicas entre homens e mulheres, a investigação promovida por esta pesquisa parte do pressuposto de que a escola é um dos territórios onde, além de serem construídas e percebidas as relações de gênero, ela foi, e continua sendo, um espaço de reforço das desigualdades de gênero. Além da distinção em torno do sexo percebido, as hierarquias e as relações de poder servem de instrumento para naturalizar valores, crenças, qualidades, qualificações, delimitam as profissões a partir de discursos que incidem, criam e recriam os corpos ditos masculinos e femininos.

Durante o recorte temporal da pesquisa, estiveram em vigor propostas educacionais que teve como base a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, nº. 5.692, de 11 de agosto de 1971. Acredita-se que, por meio da história oral, é possível perceber a subjetivação do ensino, e de como as distinções de gênero permearam esse processo. Para isso, serão utilizadas entrevistas realizadas com Liza. Estudante de Guarapuava-Paraná, que frequentou os bancos escolares em fins da década de 1970 e metade de 1980. Por meio dos relatos é possível compreender parte da prática das propostas curriculares da época e de como o gênero foi utilizado para a organização do cotidiano escolar.

Gênero e ensino em contextos educacionais

Por muito tempo, foi recorrente nas escolas, a distinção com base na divisão sexo/gênero, como o fato de existirem turmas ou instituições que restringiam a matrículas conforme o gênero. Junto a isso, desde as Leis Orgânicas do Ensino, de 1942, era comum disciplinas como Educação para o Lar; Puericultura e Economia Doméstica, destinadas às estudantes meninas, como forma de reafirmar as distinções e desigualdades de gênero já existentes. Com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº. 4.024, de 20 de dezembro de 1961, muitas dessas práticas foram rompidas, e, por não restringir a divisão de turmas com base no gênero, a base curricular seria a mesma, o que supostamente proporcionaria a mesma educação.

Dado o golpe de Estado, durante a ditadura civil militar, foram realizadas novas reformas educacionais. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº. 5.692, de 11 de agosto de 1971, foi a maior delas. A partir dessa Lei ficou estabelecido que o ensino escolar deveria proporcionar a formação para o trabalho, isso fez com que o ensino técnico se tornasse compulsório. A partir dessa legislação também foi ampliada a obrigatoriedade de matrícula, até os 14 anos de idade, e extintos os exames de admissão. Com uma nova reconfiguração, o ensino fundamental passou para 8 anos, (primário de 1ª a 4ª séries e de 5ª a 8ª séries) e o ensino de segundo grau com três anos de duração. Com base nessa divisão, as instituições de ensino deveriam proporcionar uma educação voltada ao trabalho. Na segunda metade do ensino fundamental passou a ser desenvolvida a “sondagem de aptidões” com a oferta de disciplinas específicas para áreas de atuação profissional, e o ensino de segundo grau técnico como compulsório.

Parte desse processo pode ser compreendido através da observação da proposta curricular adotada pela Escola Ana Vanda Bassara, em Guarapuava –Paraná. Instituição onde a estudante Liza frequentou parte do ensino fundamental. Nessa escola, mesmo sem a obrigatoriedade, existiu a separação por turmas entre meninos e meninas. E, para as meninas, como parte da formação para o trabalho, a partir de 1980, foi ofertada a disciplina de “Indústria Caseira”, que, entre seus objetivos incluía a preparação para o casamento, orientar para o cumprimento de atividades domésticas e cuidados com o corpo de acordo com as características socioculturais da época.

A análise deste texto contribui para a reflexão de como parte das propostas da LDB de 1971, principalmente as correspondentes sobre formação para o trabalho, interviram no cotidiano local. Busca-se perceber as reverberações das práticas educacionais e a naturalização de valores construídos em torno de um corpo sexuado. Para tanto, acredita-se tal como Scott (1995, p. 21) que “[...] o gênero é um elemento constitutivo de relações sociais baseado nas diferenças percebidas entre os sexos”. Para a autora, usar o gênero categoricamente enfatiza as relações que inclui o sexo, mas que, “[...] não é diretamente determinado pelo sexo nem determina diretamente a sexualidade” (SCOTT, 1995, p. 7).

As construções de gênero percebidas em torno de um corpo sexuado estão envoltas de relações de poder, e entre elas, as instituições de educação que junto a diferenciação de gênero, contribuí para reforçar desigualdades sociais. Desta maneira, destaco como o gênero, além de ser construído socialmente, legitima e organiza a sociedade pautada em um simbolismo marcado na percepção dos corpos sexuados. As práticas corporais da gestualidade, modos de dançar, o vestir, o comer, a ação do trabalho, dentre tantas outras atividades, fazem parte de aprendizados, construídos e socializados em um determinado tempo e lugar.

A escola é um espaço marcado por relações de força, representações de disputa e desigualdades, e contribui para a distinção, percepção e construção de gênero. Sua organização é pensada sobre o corpo. As atividades e demais pedagogias exercidas na Escola Ana Vanda Bassara não atuaram da mesma maneira em todos os sujeitos. Mas, diante dos saberes, organização e demais práticas realizadas na instituição, contribuiu para a formação de subjetividades relativas ao binarismo de gênero.

Guattari e Rolnik (2005), ao refletirem sobre o processo de modelização/construção de subjetividades, fornecem arcabouço para perceber as influências da instituição nesse processo. Segundo os autores, “[...] o processo de singularização da subjetividade se faz emprestado, associado, aglomerando dimensões de diferentes espécies” (GUATTARI; ROLNIK, 2005, p. 24). A escola, enquanto instituição autorizada, através de suas pedagogias, contribui para a formação de subjetividades.

Sobre o uso da fonte oral, a estudante, como um sujeito ativo no sistema de ensino, e nas demais relações sociais em sua trajetória pessoal, permite perceber como as relações de gênero construídas/(re)construídas e (re)significadas pela escola contribuíram para construção das subjetividades. Alberti indica a possibilidade de optar por entrevistas temáticas ou de história de vida. Optou-se pela entrevista temática, considerando, tal qual a autora, que “[...] a escolha das entrevistas temáticas é adequada para os temas que têm estatuto relativamente definido na trajetória de vida dos depoentes” (ALBERTI, 2005, p. 38).

Junto ao apoio teórico metodológico informado por Alberti, em que indica os caminhos necessários para o uso das fontes orais para a investigação histórica, como a elaboração das perguntas, da seleção dos/as entrevistados, da transcrição, dentre outros procedimentos, na análise pretende-se perceber a cristalização dos acontecimentos e o sentido atribuído a eles. Como indica Alberti, (2005 p. 186) “[...] nesses momentos, a narrativa do entrevistado vai além do caso particular e oferece uma chave para a compreensão da realidade”.

Compreende-se que a estudante entrevistada apresenta contribuições relevantes para perceber as relações de gênero, interesses educacionais e demais mudanças econômicas e sociais realizadas no período observado.

“A gente organizava antes, mesmo sem antes ter alguém para casar”: mulheres além do papel

Desejos e dificuldades para frequentar os espaços escolares são algo comum nas lembranças de quem almejava experimentar a vida urbana e desfrutar de um ensino pouco acessível no meio rural. Liza, estudante que passou por essa trajetória, lembra que “[...] eu morava no interior, e a minha vontade sempre foi assim, eu queria assim estudar um pouquinho mais. Aí quando eu vim pra cá, eu morava junto com minha tia” (LIZA, 2015).

Por meio das entrevistas com a estudante, nota-se as percepções de Liza sobre os ensinamentos recebidos na escola, principalmente os correspondentes à disciplina “Indústria Caseira”, mesmo sendo 34 anos após as anotações do caderno da referida disciplina. Liza, até a data da entrevista, tinha 49 anos de idade, casada, mãe de três filhas, funcionária pública e residente em Guarapuava-PR.

Na citação acima, a fala da estudante indica parte de uma realidade muito comum na época, de que várias crianças e adolescentes separaram-se de suas famílias e mudaram de cidade para ingressar e/ou continuarem os estudos. Uma aventura em busca de melhores oportunidades. Como indica Arend (2013, p. 72), “[...] poderia lhes proporcionar maiores chances no mercado de trabalho, inclusive obter um posto na indústria ou no setor comercial quando adultas”. Junto aos documentos da instituição escolar, foi identificado que Liza veio morar em Guarapuava, e foi matriculada aos 13 anos de idade na 5ª série B da Escola Ana Vanda Bassara (LIVRO REGISTRO DE MATRÍCULA, 1980).

O “interior” a que a estudante se refere, é em um sítio onde atualmente é a cidade de Goioxim, localizada a 88 km de Guarapuava, onde morava com a família de pequenos agricultores de origem polonesa, plantavam para o consumo e venda de pequenas quantidades para o mercado local. Filha mais velha de um total de 04 crianças, Liza relata que teve contato com a língua portuguesa apenas quando ingressou no ensino fundamental, em 1975. Nessa época, a localidade onde a estudante morava ainda era distrito. A inexistência de formação de 5ª a 8ª série na escola do distrito é apontada por ela como sendo o motivo de sua mudança. Afirma que quando chegou, “[...] fui logo para o colégio [...]”, sendo que os motivos declarados por Liza para sair de sua família e passar a morar com a tia, que era viúva, pautavam-se na continuação dos estudos.

O caderno da disciplina “Indústria Caseira”, correspondente à 7ª série de 1982, da estudante Liza, foi um instrumento direcionador para o debate sobre conteúdos desenvolvidos durante as aulas. Essa disciplina foi desenvolvida como uma forma de direcionar as estudantes meninas para o casamento, maternidade e trabalho doméstico. Sobre a manutenção do caderno, após mais de 40 anos de sua produção, Liza afirma que, “[...] tenho umas manias sabe de guardar as coisinhas, eu guardo em um baú, [...] para um dia você olhar, relembrar, chorar um pouquinho” (LIZA, 2016).

A guarda do caderno e os demais itens que compõem o seu baú faz parte de um processo de subjetivação que contribui para a construção autobiográfica. Para Artiéres (1998, p. 11), trata de uma prática de construção de si pois, segundo o autor, “[...] arquivar a própria vida é se pôr no espelho, é contrapor à imagem social a imagem íntima de si próprio”. Quando Liza arquiva seus documentos pessoais, e/ou busca através deles fazer uma releitura sobre seu passado, é um confronto de seu passado com suas lembranças. Uma construção do eu que revela, através dessas lembranças, diferentes transformações que agem em si.

Questionada sobre a organização de sua turma ser composta somente por meninas, Liza declara que, “[...] tá assim totalmente diferente do que quando eu estudava. Que isso não faz tanto tempo assim! [...] não se misturava menino com menina. [...], nós estudava menina numa sala, e menino em outra, inclusive em outro pavilhão, [...], era separado” (LIZA, 2015). Ao comparar o passado com o presente, a divisão de turmas entre meninos e meninas foi longo apontada como a principal diferença de quando estudava.

De forma naturalizada e normalizada, Liza relembra:

[...] eu vim do interior, eu não tinha assim nem noção, porque quando eu estudava de primeira a quarta série era junto menina com menino, aí quando eu entrei aqui na quinta série na época né, era separado menino e menina. É pra mim era legal. [...] Aí depois, acho que depois na sétima série na época chamavam assim, aí que misturo. Aí pra mim foi terrível! Terrível, terrível a mistura de meninos. Mas a partir dali que a gente começou a perceber que lógico, que meninos e meninas podem estudar junto né (LIZA, 2015).

O olhar sobre o passado de Liza está mergulhado na visão dicotômica do gênero, onde expressa também parte de seus medos e angústias do período em foi estudante. A experiência nos primeiros anos de ensino contribuiu para gerar um conforto no cotidiano escolar. Esse que foi rompido no instante em que as turmas foram mescladas e contribuiu para gerar desconforto na estudante.

Sobre as atividades em geral que realizava na escola, Liza narra:

[...] a educação física como já era separada as turmas, toda a vez que a gente ia pra, jogava alguma coisa, era só menina né, e os meninos tinham os horários deles. E na hora do recreio, era interessante, porque a gente não conseguia assim se mistura junto com os meninos, era que meio que separado os meninos ficavam lá meio que jogando bola e gente ficava mais né, também não se misturavam muito. [...] não era proibido, mas na hora do recreio a gente acho que, talvez porque já era separado em sala, talvez por isso a gente não conseguia se misturar, aí depois quando misturo a gente foi aos poucos aprendendo né, que se pode jogar bola junto com os meninos, que você pode brincar junto com os meninos. Mas antes era difícil, no início (LIZA, 2015).

Ao olhar para o passado, Liza realiza uma seleção dos fatos ocorridos, uma vez que a memória é sempre seletiva. Ao sermos questionados/as sobre nossas vivências passadas, realizamos um trabalho inconsciente sobre a memória, a qual está relacionada ao presente histórico do sujeito. Assim como Jelin (2001), compreende-se a memória enquanto um trabalho, uma produção sobre o passado, e nos indica que, ao falarmos sobre o passado, existe uma transformação simbólica que busca elaborar um sentido sobre ele, em que passado, presente e futuro estão imbricados. Desta maneira, diferentes marcos culturais, sociais, e principalmente de gênero, agem durante esta seleção.

Liza, ao olhar sobre suas experiências escolares, faz uma comparação, uma seleção de seu presente junto à percepção de breves mudanças do tempo, em que se identificava como estudante. Primeiro, ao comparar a educação escolar do presente, Liza se refere à educação do Ensino Fundamental II como uma das maiores mudanças em relação à composição de turmas. Em sua fala, transparece a aceitação e normalização da divisão entre meninos e meninas. Quando passou a estudar em Guarapuava, a distinção sexuada das turmas lhe serviu de conforto por não ter que conviver diretamente com “os meninos”, o que gerou um grande desconforto no momento que passou a estudar em turmas mistas.

As marcas e distinções de gênero estão explícitas na fala de Liza. Para a estudante, a divisão de turmas com base no gênero foi uma forma de se sentir mais confortável. Suas justificativas são de ter vindo do interior e desconhecer, e/ou até mesmo não estar acostumada com tais relações. Uma experiência difícil e de desconforto que perdurou até conhecer os outros estudantes. Essa fala possui um ponto bastante significativo para perceber a subjetivação da estudante frente às distinções de gênero. Quando ingressou na 5ª série, as práticas pedagógicas realizadas na Escola Ana Vanda Bassara faziam com que Liza normalizasse tais imposições, que para ela a colocavam em uma situação de conforto.

As memórias de Liza indicam uma forte marcação de gênero e a reafirmação do projeto escolar vivido. A rígida divisão em sala fez com que os/as estudantes dessem continuidade a esta separação em outras atividades realizadas na escola, internalizando nos/as estudantes a demarcação do gênero. Por outro lado, tais separações possibilitavam que as estudantes pudessem fazer e falar de assuntos que fossem proibidas ou incapazes de serem ditos, enquanto estivessem perto de um menino, por exemplo. Aos poucos, passaram a conviver com os meninos e até mesmo a participar dos jogos de bola e atividades físicas em geral. Ao falar sobre isso, se antes as brincadeiras eram realizadas separadamente, ao interagir com os “meninos”, a estudante compara também suas colegas, e mostra como foram, paulatinamente, aprendendo a conviver. Liza indica o quanto a educação recebida na escola contribui para subjetivação sobre as marcações/distinções de gênero, e, em meio a algumas mudanças, como a própria instituição possibilitou novas redefinições e as atividades das quais poderia exercer.

Junto das distinções existentes na composição de turmas, e nas propostas da disciplina de “Indústria Caseira”, a escola em questão é formada pelas distinções e marcações de gênero. Para Meyer (2013, p. 18), o gênero passa a englobar toda a construção cultural e social, “[...] incluindo aqueles processos que produzem corpos, distinguindo-os e separando-os como corpos dotados de sexo, gênero e sexualidade”. A distinção corporal, um dos argumentos para a composição das turmas e distribuição entre os pavilhões da escola, representa uma fronteira. Uma divisão instituída através do gênero que permitia ou restringiria o espaço que os/as estudantes deveriam frequentar, circular.

Já adulta e 34 anos após ter frequentado a instituição, Liza percebe esse período como um tempo curto: “[...] veja que não faz tanto tempo assim, não sei se isso chega a dar trinta anos”. Um tempo que passou rápido, e de que suas lembranças ainda são possíveis de serem narradas. Conforme Jelin (2001, p. 23), “[...] todo processo de construcción de memorias se inscribe em una representacíon del tiempo y del espacio”. Tais narrativas sobre esse passado consistem na observação de diferentes tempos, presente, passado e futuro, que se entrecruzam e permitem que a entrevistada, partindo de seu presente, projete imagens de si para os outros.

Contrastando com os enunciados existentes no caderno, a narrativa da entrevistada nos mostra uma vivência bastante diferente daquela projetada nos manuscritos, que deveriam ser realizadas pelas mulheres, nos meandros do lar. Mesmo no período da escrita do caderno, Liza carregava diversas responsabilidades. Ela relembra:

[...] assim, logo eu já comecei a trabalhar, logo que eu vim pra cá, cuidando de um bebezinho. Aí depois eu passei a trabalha de diarista pra eu poder me manter aqui né. Meu pai me ajudava no que ele podia, [...]. Daí depois que eu terminei o ensino fundamental eu fui para São Paulo. Lá eu trabalhei, fiquei cinco anos, trabalhando em casa de família também. Aí quando eu voltei, aí que eu continuei os estudos. Que daí eu fui trabalhar em imobiliária, daí eu acho que já, já era necessário né você estuda um pouquinho mais (LIZA, 2015).

Não bastava apenas ter um lugar para morar em Guarapuava, era preciso ter dinheiro para custear os estudos e demais gastos como alimentação, higiene e moradia. No período em que estudava, era obrigatório o pagamento de uma taxa mensal para os/as estudantes frequentarem as instituições públicas de ensino do Estado do Paraná. Conforme demonstrativos de matrículas da instituição, poucas pessoas tiveram a isenção de suas taxas mensais. Tal cobrança perdurou até a promulgação da Lei nº 7.962, de 23 de novembro de 1984, que extinguiu a cobrança de taxas como forma de garantir o acesso e permanência dos/as estudantes. Mesmo com as dificuldades de sua manutenção na escola, Liza não estava entre os/as estudantes contemplados/as com a isenção e se tornou um agravante para seus custos.

Conforme a fala da estudante, suas condições econômicas a levaram a buscar um emprego. Segundo Liza (2016), “[...] eu trabalhava na casa da minha tia, tipo assim, eu dava conta da casa, estudava, mas eu também trabalhava depois do almoço como diarista e como babá para uma senhora perto de casa, depois eu fui promovida a diarista”. A promoção referida por Liza apresenta traços de maior confiança com os/as patrões/oas, e de que os serviços realizados condiziam com as expectativas dos/as empregadores/as. Conforme Brites (2001), as relações existentes no trabalho doméstico contribuem para a construção de laços de afetividade, onde em sua maioria isso se torna uma barreira para a efetivação de direitos trabalhistas. Liza expõe pouco sobre suas experiências com a família que trabalhou e morou junto em São Paulo. Deixa explicito, porém, que existiu a exclusão de direitos, como as férias, por ter vivido cinco anos contínuos naquela cidade.

Sua rememoração demonstra que morar em Guarapuava exigia dela o esforço para sobreviver. Primeiro, trabalhar na casa da tia, depois, trabalhar na casa de outras pessoas para poder sustentar-se, e por fim, frequentar a escola. Uma realidade que indica a reprodução dos quadros domésticos como forma de sobreviver, bancar os estudos e/ou constituir independência. De maneira subjetiva, a narrativa demonstra que o passado é encarado como superação diante do esforço prestado para trabalhar e estudar.

Na narrativa de Liza, as atividades fora do lar foram iniciadas aos 12 anos de idade. Conforme Arend (2013), a noção de infância, construída e forjada por processos históricos, delimita o corpo e o que pode ser feito com ele. Discursos de juristas e psicólogos contribuíram para a elaboração do Código dos Menores em 1979, em que “[...] as pessoas entre 0 e 18 anos passaram a ser consideradas ‘seres em formação’, tanto do ponto de vista corporal quanto psicológico” (AREND, 2013, p. 70). Essas discussões articulavam-se junto a introjeção de ideia de que eram pessoas dotadas de direitos (AREND, 2015). Ser menor de idade não isentaria de exercer um trabalho. Conforme o art. 403 da Consolidação das Leis do Trabalho de 1943, em vigor no período, apenas proibia o trabalho do menor de 12 anos sob o objetivo de, “[...] garantia de frequência à escola que assegure sua formação ao menos em nível primário” (BRASIL, 1943). Quando matriculada na 7ª série, Liza estava com 15 anos, e há três anos já trabalhava na casa da tia e em outra residência. Uma realidade de muitas crianças e adolescentes que desempenhavam atividades condizentes ao espaço doméstico que foram divididas com base na distinção sexual e reproduzidas na esfera pública. Devido às leis criadas para a infância, a contratação dos menores deveria ser pautada para não prejudicar o desenvolvimento dos estudos. Em relação às meninas, Arend (2013, p. 76) afirma que, “[...] grande parte delas começava entre os 9 e 10 anos a trabalhar como babás e, com o avançar da idade, tornavam-se empregadas domésticas”.

A década de 1980 marcou sua entrada no mundo do trabalho informal. A escola e esses empregos informais, fizeram parte de sua rotina até concluir o ensino fundamental e seguir para a cidade de São Paulo, onde trabalhou como empregada doméstica por aproximadamente cinco anos. Conforme a narrativa de Liza, quando retornou para Guarapuava, conseguiu emprego em uma imobiliária, o que a fez procurar a formação de nível médio. Foi apenas no fim da década de 1980 que a estudante concluiu o ensino de segundo grau.

Como um indício da imagem que se pretende construir de si, Liza se coloca sempre como uma mulher ativa, que conseguiu enfrentar as limitações e dificuldades que lhe foram impostas. Primeiro como criança aos 12 de idade quando passa a morar em uma cidade em pleno processo de modernização; depois, aos 16 anos, para São Paulo, a maior cidade da América Latina. O relato sobre seu retorno, em fins dos anos 1980, e a luta pela sobrevivência, são reelaborados em suas lembranças como uma conquista. Sobre a função que exercia na imobiliária, Liza comenta que era técnica administrativa: “[...] eu digo também por que hoje eu ainda sou técnica administrativa. Eu trabalhava com locação né, atendimento ao público, tudo.” Uma associação de seu presente e passado que consiste na redefinição das diferentes funções que ocupou. Atividades exercidas por uma mulher que correspondem a uma formação racional, mas praticadas por uma mulher bem diversa da idealizada pela disciplina de “Indústria Caseira”. A ocupação de um cargo administrativo no espaço público, por Liza, é um exemplo do lento processo de inserção das mulheres em atividades públicas, e ainda, uma contradição aos interesses de uma formação para o lar. De forma subjetiva, essa ruptura entre o ideal de mulher da disciplina de “Indústria Caseira” e a ocupação atual de Liza, permite perceber como o ensino escolar foi utilizado como umas das formas em romper com as distinções de gênero.

Ao utilizar o gênero como categoria, compreende-se que as distinções constituídas através das diferenças hierárquicas, tanto a aquisição do diploma como o emprego no setor administrativo, contribuem com o rompimento de barreiras impostas para as mulheres, na conquista tanto da formação escolar, como na atuação profissional, por anos considerados exclusivamente para os homens. Desta maneira, ao cruzarem-se as lembranças do presente e do passado, no decorrer da entrevista Liza nos apresenta um breve depoimento de sua vivência escolar, a qual relaciona com sua trajetória de vida. Um depoimento que, como destaca Oberti (2010, p. 14), “[...] hablan desde sus presentes, assumiendo el pasado de manera desordenada”. Ou seja, a narrativa se constrói a partir de um passado descentrado, mas que de modo organizado busca selecionar o que pretende falar e o que quer ocultar.

Liza traceja reflexões que expõem os sentimentos sobre as experiências, análises e observações sobre sua infância, adolescência, juventude, educação escolar, distinção social, mas, de forma bastante intensa, marcas que expressam definições de gênero. Ou seja, como a estudante relembra a divisão já constituída entre o masculino e o feminino em diferentes momentos de sua vida. Na escola, em meio o distanciamento legitimado, em que o jogar bola e correr eram coisas de meninos. Ao exercer o trabalho, junto a um contexto em que as mulheres vinham ocupando gradativamente outros cargos, Liza deixa de ser empregada doméstica e passa para um cargo de auxiliar administrativo. Em meio às desigualdades já existentes, busca a instrução escolar como maneira de fixar-se em tal profissão. Mesmo que ainda com posicionamentos sexista, a educação serviu como forma de muitas mulheres ocuparem e afirmarem-se em diferentes posições nos mundos do trabalho que por anos foram-lhes recusadas.

Ao buscar compreender as percepções de Liza sobre os enunciados e atividades desenvolvidos na disciplina de “Indústria Caseira”, evidencia-se o posicionamento da entrevistada quando questionada sobre o seu casamento:

[...] quando eu me casei, eu não tinha assim praticamente nada. A gente foi morar em uma casa de aluguel. [...] Aí eu tinha um terreno, que é esse terreno aqui do lado, aí a gente conseguiu eu acho que depois, eu não lembro exatamente há quanto tempo, mas eu acho que uns oito meses mais ou menos depois que eu me casei, nós conseguimos montar uma casa aqui. Mas essa casa, a gente conseguiu, tipo que cobrir e fazer duas paredes. Uma parede a gente não conseguiu, a gente encostou algumas tábuas ali, não tinha forro, não, não tinha nada na casa. Porque a gente queria sair do aluguel, e daí a mesma casinha ali depois com o tempo a gente conseguiu aumentar um pouquinho, e melhora, mas não foi muito fácil no início sabe. Gostoso lembrar! [...]. Mas não foi muito fácil não (LIZA, 2015).

As devidas atenções com espaços dentro de casa, móveis e demais itens, ficaram apenas idealizadas em um projeto no papel, pois a casa que Liza recorda ainda não poderia ser definida como uma casa, segundo ela. A casa descrita pela disciplina de “Indústria Caseira”, se encontra presente de forma sub-reptícia nessa narrativa, na recusa da entrevistada em nomear de casa, o espaço construído para a sua família. Ao reelaborar sua memória, Liza se expressa de maneira eloquente ao referir-se à primeira construção, denotando orgulho por ter sido feita pelo casal. Nas anotações do caderno, Liza escreveu várias vezes que o homem e a mulher deveriam tomar conhecimento sobre as etapas, materiais e demais atenções para a construção da casa. Decorrentes 34 anos dos registros do caderno, e com 25 anos de casada, a entrevistada enfatiza a ação conjunta do casal. A sociedade pautada pelo discurso de modernização fez com que fossem repensadas as atividades distribuídas entre os/as integrantes da família. Na rememoração de Liza, transparece parte dessa redistribuição de tarefas, por meio de sua reiterada atuação na construção e/ou busca de rendimentos para comprar o material, participando de forma ativa nas decisões referentes à construção da casa.

Ao afirmar de que não possuíam praticamente nada, reforça o que fora aprendido como um projeto legítimo, construído detalhadamente na escola, e do que foi vivenciado pela estudante. Um distanciamento econômico e simbólico substituído por uma casa alugada. Tais recordações ativam as memórias afetivas de Liza, fazendo com que se emocione durante sua fala. É um período visto como de grandes dificuldades, em que não conseguiu seguir os ensinamentos proferidos na disciplina sobre a construção da casa. Um processo de subjetivação modelizado pela escola propunha que as estudantes tivessem a mesma condição social, e que, através do planejamento, buscassem participar na construção da casa.

A disciplina de “Indústria Caseira”, propugnava a atuação das mulheres nas tomadas de decisões do casal. Como uma atitude racional, o casamento deveria constituir-se como forma de dar maior valorização do trabalho doméstico. Valorizando as mulheres como capacitadas a administrar a indústria projetada para o lar, a gerência dos gastos, o que deveria ser iniciado antes mesmo da união ser oficializada entre os cônjuges. A construção do enxoval, item em destaque no caderno de Liza, era uma das formas de as mulheres preparem-se para o casamento e, gradativamente, desenvolverem a aptidão para a manutenção do vínculo. Sobre os preparos do casamento, Liza comenta:

[...] foi mais ou menos porque é, tipo, a minha mãe queria, e eu nunca quis decepcionar né. Ela sempre quis que fosse tudo bonitinho então foi assim. [...] consegui organizar tudo, enquanto eu morei em São Paulo eu preparei meu enxoval, e depois o que faltou a minha mãe me deu o resto (LIZA, 2016).

Além das subjetividades, marcadas pela dicotomia do gênero, Liza afirma que buscou atender tanto aos ensinamentos da escola como a atenção a valores contidos em sua família. Vivendo em São Paulo entre os anos de 1984-1989, Liza descreve esse período como um momento propício à confecção do enxoval: “[...] comprava no shopping e pagava parcelado,” e mesmo com a existência do crédito e renda para adquirir os itens, a ajuda da mãe é descrita como fundamental, para “deixar tudo bonitinho”. Destaco a ênfase de Liza na participação de sua mãe para a construção do enxoval. Conforme Perrot, esta foi uma prática construída no Brasil desde o século XIX, onde os saberes de trabalhos manuais eram transmitidos de mãe para a filha. A autora destaca que “[...] o enxoval cuidadosamente preparado nos meios populares, sobretudo rurais, é uma longa história entre mãe e filha. A confecção do enxoval é um legado de saberes e segredos do corpo e do coração” (PERROT, 1989, p. 14).

Com base nas experiências de Liza, nota-se que em fins do século XX, através da produção do enxoval, ainda se praticava a transmissão do saber e cuidados de mãe para filha. Porém, o contexto vivenciado por Liza era outro. Os produtos passaram cada vez mais a ser comprados, com uma indústria do consumo em franca expansão, e cada vez menos produzidos pelas próprias mulheres, mães ou noivas. A modernização, imbuída de vários objetos, entre eles, indumentárias, peças de cama, mesa e banho, dentre outros objetos elencados na lista do caderno de “Indústria Caseira”, passaram a ser produzidos de maneira industrial. Enquanto trabalhava em São Paulo, Liza comprou seu enxoval. Por afirmar que parte de seu salário estava voltado em adquirir bens voltados ao casamento, de forma subjetiva, a estudante informa traços das distinções de gênero reafirmadas pela escola. As condições de classe não foram motivos para inibir a função das mulheres em preparar o enxoval.

Questionada se tinha um namorado e/ou um pretendente quando começou a preparar o enxoval, Liza responde:

[...] não, não, a gente organizava antes, mesmo sem antes ter alguém para casar. Isso também porque era mais difícil né. Hoje é tão facinho você comprar as coisas. Por que antes não era tão fácil assim. Porque tinha que ser tudo bonitinho conforme lista tá, tá e tá (LIZA, 2016).

Seguir toda a listagem que registrou em seu caderno, produzir um enxoval não consistia apenas em comprar ou produzir peças e objetos, mas sim esperar alguém. De maneira intersubjetiva, o relato de Liza expõe um discurso recorrente sobre a complementariedade. Idealizado no amor romântico e a espera do príncipe encantado, foi reforçada na disciplina de “Indústria Caseira” e fazia parte da vida de Liza. Uma espera do outro para completar-se enquanto mulher, esposa e mãe. Sobre casamento, namoro e noivado, etapas prescritas na disciplina de “Indústria Caseira” como fundamentais e necessárias a serem seguidas, realizadas depois que retornou de São Paulo em 1989, Liza afirma:

[...] então, quando eu conheci o meu marido a gente começou a namorar. Aí um dia eu fui para a casa da mãe e contei. Lógico, contei primeiro para o pai, porque eu contava tudo para o meu pai. [...] Mais assim, não foi como hoje como minha filha que namora há três anos, [...] meu pai e meu marido eu acho que eles devem ter se visto duas ou três vezes antes de nós se casar. Mas assim, eles sempre pediram para que fosse, para que quando fosse se casar, mesmo que não fosse a festa. Mas o meu pai sempre exigiu que eu casasse de vestido de noiva, eles faziam questão de um almoço alguma coisa assim. Então teve uma pequena preparação sabe (LIZA, 2016).

As recordações de Liza nos indicam a existência da aceitação da norma. Mantinha-se a autoridade do pai, mesmo morando distante desde os 12 anos de idade. Conforme Scott (2011, p. 55) “[...] a mobilidade para a cidade pode permitir uma fuga relativa das moças de controles paternos no campo e a entrada num mundo de novas oportunidades”. Liza tinha maior autonomia, e consequentemente menos vigilância em seu namoro. Comparando seu namoro com o da própria filha, fica evidente a vontade de um controle maior. Segundo Liza, na época seu noivo era funcionário público. Suas rememorações nos indicam que as reuniões familiares com o namorado/noivo consistiram basicamente em organizar o casamento. Entre as exigências da família de Liza, vestir-se de noiva e ter uma festa, eram fundamentais para a realização da cerimônia e festejo do casamento. Ou seja, buscou-se a manutenção simbólica de uma sociedade e uma mulher que já havia rompido há algum tempo com as amarras do recato e subalternidade em relação aos homens. O namoro, enxoval e casamento idealizados na escola, consistiram no reforço de gênero, já existentes na sociedade da época. Nas narrativas de Liza, as subjetividades reforçadas na escola estão presentes na distinção entre as atividades ditas femininas e masculinas para serem realizadas no lar; na ideia de racionalidade empregada na programação e cumprimento das tarefas; e, a manutenção da crença na autoridade paterna; na ideia de casa, conforto, casamento e o ser mulher modelizada pela disciplina de “Indústria Caseira”.

Ao narrar suas experiências, Liza constrói uma imagem de si, pautada, principalmente pela ideia de superação das dificuldades vivenciadas. Sobre o enfoque da higiene e estética feminina, descrita em seu caderno, Liza relembra: “Era um sonho né, beleza você só colocava bonitinha ali no papel”. Para ela, o encantamento maior, vinha da imagem da própria professora:

[...] o que eu lembro [...] é da professora dessa matéria que era a Indústria Caseira, [...] era a professora I, I. F. B., [...], eu acho que eu nem piscava nas aulas dela. Porque eu achava aquilo tão interessante do jeito que ela falava, porque ela tinha um jeito todo especial, a gente ficava lá assim olhando para ela, porque assim, eu não imaginava que o que ela falava a gente podia, porque aqui tem, eu não sei se você conseguiu ver algumas coisas assim tipo em uma casa, o que que você precisa ter, é panos de pratos todos bonitinhos. Eu, pra mim aquilo era fantástico, porque eu achava quilo tudo muito bonito e pensava. Será que um dia eu vou conseguir né, é fazer um enxoval, por exemplo, com as dicas que ela passava. Eu achava aquilo impossível. Eu lembro, que eu ficava assim, hipnotizada olhando ela sabe, e ela era fantástica, como professora ela era fantástica (LIZA, 2015).

As lembranças sobre os conteúdos da disciplina são eclipsadas pela lembrança da professora: “[...] a professora andava muito elegante, usava roupas bonitas, maquiagem, muito bem arrumada.” Castanho (2001), ao realizar uma pesquisa sobre as lembranças escolares, identificou entre suas entrevistas diferentes recordações sobre professores/as. Com base em entrevistas feitas com estudantes, a atuação dos/as professores/as atinge de maneira diferente as pessoas que passaram pelos bancos escolares. Tais interferências ocorrem tanto na formação escolar, como nas relações exteriores a escola. Para a entrevistada, a professora da disciplina de “Indústria Caseira” foi alguém marcante, não apenas pelo conteúdo que era trabalhado em sala, mas, principalmente, “[...] porque ela tinha um jeito todo especial, a gente ficava lá assim olhando para ela.” Uma admiração que, além de dar ênfase às lembranças agradáveis que tem pela professora, aponta que a afeição pela docente era diferente das demais mulheres com as quais ela conviveu. Sempre arrumada, maquiada e com vestimentas diferentes da qual estava habituada. Liza apresenta que a professora era esteticamente agradável aos olhos de uma criança/adolescente vinda do interior. Esse olhar reflete a subjetivação construída/reafirmada pela escola sobre o que é ser mulher, em que a posição social e a estética corporal da professora serviram como um guia comparativo para aprendizagem desenvolvida na disciplina de “Indústria Caseira”.

Ao reelaborar suas lembranças, a entrevistada associa o encantamento com a imagem da professora aos assuntos discutidos em sala de aula. Um momento de hipnose que não era apenas pela imagem da docente, mas que se completava, pela novidade, pelos sonhos e fantasias que eram trazidos à tona durante as aulas, em meio aos recortes das revistas. Namoro, casamento, casa, enxovais, associados ao universo dos contos. Uma produção de subjetividades que ao mesmo tempo em que se apresentava como uma realidade diversa da estudante, fez com que ela sonhasse. Em meio à distinção da realidade da estudante, encantava-se em aprender como deveriam ser executadas as atividades no lar, o preparo para o casamento, o que uma casa deveria conter, dentre tantas outras atividades generificadas, que as tornariam esposa, mãe e dona de casa. Em suma, um futuro agradável, melhor que o presente vivido. Sobre o uso cotidiano dos ensinamentos da disciplina de “Indústria Caseira”, Liza afirma:

Em casa, quando eu morava lá no interior, porque a minha mãe mora até hoje. Que lá, se você vai fazer por exemplo, um, um, um, ah, uma pano de prato, pra pegar um exemplo, eu não imaginava, por isso que eu ficava fascinada com as coisas que ela falava, porque o que se fazia. A mãe eu lembro que ela comprava um tecido lá que era um tecido escuro, ela precisava alveja aquilo lá pra fazer um pano de prato, sem, sem bordado nenhum, eu não bordava, a mãe também não. [...] A partir dessas aulinhas de com a professora I., eu sempre assim pensei, o dia que eu tiver a minha casinha, eu quero tentar fazer algumas coisinhas do que ela me ensinou, tudo bonitinho, tudo organizadinho, e eu acho que eu aprendi bastante, porque eu gosto disso, apesar de que hoje eu não tenho tanto tempo assim né, mas eu gosto. As coisas bonitas, organizadas né, bem feitinhas. [...]eu acho que aprendi muito [...]. Porque, pra mim tudo era novidade, e a partir do que eu aprendi aqui essas novidades eu via em casa de quem eu trabalhava. Coisas que eu não conhecia, que lá eu conseguia né, limpá, aí eu vou limpar tal coisa do jeitinho de que ela ensinava. Que eu não sabia fazer isso né! (LIZA, 2015).

Mesmo com a inexistência de apontamentos específicos sobre panos de prato em seu caderno, ao comparar sua vida no interior com a vida na cidade, em meio a tantos itens que marcavam a vida na cidade, uma vida mais moderna, Liza contrasta esses espaços a partir da percepção sobre os panos de prato: rústicos e alvejados. O longo processo para clarear os panos, executado por sua mãe, é contrastado com a novidade e a possibilidade de comprá-los prontos.

A disciplina de “Indústria Caseira” propunha a idealização de mulheres como esposas, mães, donas de casa e ativas racionalmente na tomada de decisões para o lar. A ressignificação do espaço doméstico, comparado a uma indústria, ao mesmo tempo em que valorizava o saber e atuação das mulheres, fortalecia as relações entre mulheres e a vida no lar, e também as responsabilizava pelo fracasso ou sucesso dos gastos familiares. Liza, ao reelaborar suas lembranças, mesmo tendo ocupado atividades marcadas e permeadas por distinções de gênero, teve desde sua adolescência maior autonomia por tomar suas decisões. Os ensinamentos da “Indústria Caseira” não correspondiam à realidade que ela vivia nas suas relações familiares, mas essa esposa, mãe, racional, produtiva e esteticamente considerada bonita e higiênica, presente nas anotações do caderno, estava encarnada na imagem da própria professora. Em meio a distinções de classe, um mundo diferente da vida no interior, sem os bordados e objetos modernos no lar, e a partir da vivência como empregada doméstica, ela visualizava a modernidade onde trabalhava. Desde cedo trabalhando pela sobrevivência, alguns ensinamentos da disciplina de “Indústria Caseira” foram postos em prática, ainda na adolescência.

Ao comparar sua vida no interior e as experiências que teve como estudante na cidade, nota-se que os ensinamentos da “Indústria Caseira” serviram para aproximar e apresentar a ela objetos que estavam distantes de sua realidade. A costura, uma das formas de evitar gastos através da confecção ou até mesmo reparo em roupas, é posta como uma de suas práticas cotidianas. Uma internalização dos saberes e práticas desenvolvidas por muitas mulheres e reafirmadas pela escola como marcas da feminilidade.

Sobre os ensinamentos da chamada “estética pessoal”, Liza declara:

[...] na época eu tinha até vontade, mais eu não podia financeiramente. Se eu podia comprar um shampoo para o meu cabelo, já tava bom. E se hoje eu faço alguma coisa, eu mesmo procuro correr atrás. Aquilo até poderia ter sido aproveitado, bem, se eu tivesse condições na época, mais como eu não tinha então, eu não aproveitei. [...] Era um sonho né, beleza você só colocava bonitinha ali no papel! Então na época eu só usava shampoo. Assim não tinha como comprar outros produtos e eu morava com minha tinha. Tipo, o que eu ganhava eu dava para ela, sabe, eu tinha que fazer compras, então pra mim não sobrava muita coisa não. Então eu mal lavava com o shampoo (LIZA, 2016).

Tanto a comercialização de produtos específicos, como a indicação destes itens para o cumprimento do fazer-se mulher(es), contribuem para o agenciamento e construção das subjetividades. Liza expressa um sentimento de perda sobre seu passado por não ter conseguido adquirir os produtos, postos como necessários às mulheres. Como um lamento, afirma que tais interesses não passaram de colagens no papel. As tantas dicas para cuidar cabelos, unhas, pele etc., e manter a estética pessoal, são contrapostas ao pouco poder aquisitivo que tinha na época.

Sobre o uso e desuso das dicas da disciplina, Liza afirma: “[...] as coisas vão mudando né, a gente vai se atualizando né. São coisas que mudam não é igual aprender a fazer uma faxina a 20 anos atrás e hoje é a mesma coisa. Isso não, o cabelo muda, a unha muda, a moda vai moda vem né.” Comparando o corpo e uma casa, Liza afirma que os cuidados com o lar sempre são os mesmos. Um processo inconsciente de que as atenções e demais interesses com a higienização da casa já estão naturalizados. O corpo, cabelos, unhas, pele, e a moda são por ela percebidos como mutáveis, dinâmicos, conforme a geração e os contextos históricos.

Considerações Finais

Durante a década de 1970, existiu um avanço considerado de mulheres a setores de trabalho que antes foram recusados. Essa movimentação corresponde a um duplo processo: o primeiro, de conquistas oriundas do movimento de mulheres e feminista, o segundo, como consequência do acesso de muitas meninas/mulheres ao ensino escolar. Ao investigar sobre parte da trajetória escolar de Liza é possível compreender sobre as reconfigurações do ensino escolar da época, e de como as distinções/desigualdades de gênero foram utilizadas para atender um novo contexto. Ou seja, não se proibia o acesso das meninas ao ensino escolar, mas, diante das mudanças, o ensinamento recebido na escola deveria garantir a reafirmação do espaço doméstico como estreitamente feminino, e, caso viessem a ocupar um trabalho distinto do lar, as marcas da suposta feminilidade deveriam acompanhar essa movimentação.

As traduções e os relatos de Liza nos indicam que a disciplina de “Indústria Caseira” buscou construir uma concepção de mulheres. Construído pela escola que modelizava as subjetividades, o acesso a formação escolar contribuiria o adentrar em outras atividades no mundo do trabalho, mesmo que sob a franja do trabalho doméstico e informal. Além do saber ler e escrever, Liza recebeu uma educação que a profissionalizava como esposa, mãe, dona de casa e empregada doméstica, para que o cumprimento das atividades domésticas pudesse acompanhar uma sociedade moderna: o novo inserido no espaço doméstico.

Mesmo que apresentando uma ressignificação dos espaços, formação e educação para as mulheres, o saber escolar contribuiu de maneira intensa para a demarcação de gênero, em um momento em que a cidade de Guarapuava apresentava um processo de modernização. As projeções de como ser mulher e, respectivamente, como se comportar como uma, propunha que as mulheres fossem economicamente ativas, mas limitadas ao ambiente doméstico. Tais investigações indicam que a organização da disciplina de “Indústria Caseira”, seja nos conteúdos e até mesmo em suas propostas a serem cumpridas por centenas de estudantes, não condizia com a realidade da escola, com a realidade de Liza e de muitas outras mulheres e meninas do país.

Junto a tentativa em identificar a formação das subjetividades, essas observações possibilitaram também compreender as relações do passado estudado e o presente, tanto da entrevistada como do pesquisador. Distintos momentos em que as discussões de e sobre as desigualdades de gênero ainda fazem sentido. Tal como nos lembra Rousso (2016, p. 17), o presente não se reduz a uma soma de instantaneidades, é possível, segundo o autor, “[...] conferir uma espessura, uma perspectiva, uma duração”.

A educação escolar, principalmente a recebida pela disciplina de “Indústria Caseira”, contribuiu para a formação das subjetividades da estudante. Nesse processo, o gênero interseccionou com outros marcadores sociais que permitiram reconfigurar sua trajetória, mas sempre de maneira a reforçar a feminilidade. Vinda do campo, desde os 12 anos de idade trabalhava como empregada doméstica. A condição social contribuiu de forma intensa para marcar a posição de Liza frente o saber recebido na escola e o colocado na prática. Com uma realidade bastante diversa, os ensinamentos promovidos na escola não foram aplicados em seu lar, mas sim na casa da tia e das patroas onde trabalhava. O casamento, tema tão debatido ao decorrer da disciplina, agiu de forma sutil na formação de Liza. Suas lembranças demonstram que até seus 24 anos de idade viveu a espera de alguém para completar-se como mulher. O dinheiro ganho com o trabalho, principalmente durante o período que ficou em São Paulo, foi fundamental para construir o enxoval para o tão sonhado casamento. Branca, e de descendência de origem europeia, sua a condição social fez com que Liza deixasse os cosméticos em segunda opção, apresentados na disciplina como necessários para aperfeiçoar a suposta beleza feminina. Quando encontrado o suposto príncipe, as subjetividades de Liza, composta por uma instrução escolar marcada por um modelo burguês, fez com que ela não conseguisse chamar de lar a casa que construíram para morar.

As observações deste texto não limitam ao conhecimento sobre o passado investigado. A compreensão sobre o modelo de ensino desenvolvido nas décadas de 1970 e 1980 traz à tona sobre o impacto do ensino escolar na vida das pessoas. Principalmente, das dificuldades enfrentadas por muitas meninas/mulheres, ao buscarem a formação escolar. Por tanto, a exemplo da trajetória de Liza, como dos distintos discursos que ainda assombram a educação, cabe lembrar a necessidade de pensarmos propostas educacionais que visem romper com as desigualdades de gênero, e, se possível, proporcionar melhores oportunidades.

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Recebido: 25 de Maio de 2020; Aceito: 09 de Junho de 2020

Ms. Jorge Luiz Zaluski

Universidade do Estado de Santa Catarina (Brasil)

Programa de Pós-graduação em História

Doutorando em História

Bolsista pela Fundação e Amparo à Pesquisa do Estado de Santa Catarina

Integrante do Laboratório de Relações de Gênero e Família

Orcid id: https://orcid.org/0000-0003-0795-263X

E-mail: jorgezaluski@hotmail.com

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