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Revista e-Curriculum

versão On-line ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.19 no.1 São Paulo jan./mar 2021  Epub 10-Maio-2021

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2021v19i1p57-81 

Artigos

A CULTURA DIGITAL NO CURRÍCULO: CENÁRIOS ATUAIS1

DIGITAL CULTURE IN THE CURRICULUM: CURRENT SCENARIOS

CULTURA DIGITAL EN EL CURRÍCULO: ESCENARIOS ACTUALES

Lídia Miranda COUTINHOi 
http://orcid.org/0000-0002-2876-8324

Gilka GIRARDELLOii 
http://orcid.org/0000-0002-5316-0038

i Doutorado em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pesquisadora do Núcleo Infância, Comunicação, Cultura e Arte (NICA/PPGE-CED/UFSC/CNPq). E-mail: lidiacoutinho1@hotmail.com - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0002-2876-8324.

ii Doutorado em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFSC. Líder do grupo de pesquisa Núcleo Infância, Comunicação, Cultura e Arte (NICA/PPGE-CED/UFSC/CNPq). E-mail: gilkagiradello@gmail.com - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0002-5316-0038.


RESUMO

Este artigo discute algumas das principais diretrizes nacionais e internacionais para a abordagem da cultura digital na educação na última década, com vistas à sua inserção nos currículos e na formação de professores. No contexto brasileiro, destacamos a Base Nacional Comum Curricular (2017) que, seguindo a tendência internacional, organizou-se em competências e habilidades, não sem muitas críticas e polêmicas. O documento sugere a ampliação do protagonismo da cultura digital na construção dos currículos, o que permite que tanto os conteúdos quanto as estratégias didáticas para o trabalho com a cultura digital sejam definidos nos contextos regionais e locais. O artigo examina, também, o caso de Santa Catarina, onde o currículo regional (2019) sugere que a questão seja explorada e detalhada nos Projetos Políticos Pedagógicos das escolas, o que identificamos como uma brecha para que os professores participem das escritas curriculares, com base em suas realidades e experiências docentes em campo.

PALAVRAS-CHAVE: Cultura Digital; Competência Digital; TDIC; BNCC; Currículo do Território Catarinense

ABSTRACT

This article discusses some of the main national and international guidelines in order to approach digital culture in education in the last decade, with view to its insertion in curricula and teacher training. In the Brazilian context, we highlight the National Common Curricular Base (2017) which, following the international trend, was organized in skills and abilities, not without much criticism and controversy. The document recommends expanding the role of digital culture in the construction of curricula, which allows both content and teaching strategies for working with digital culture to be defined in regional and local contexts. The article also examines the case of Santa Catarina state, where the regional curriculum (2019) suggests the issue to be explored and detailed in schools' Political Pedagogical Projects, which we identified as an opportunity for teachers to participate in curricular writing, based on their realities and teaching experiences in the field.

KEYWORDS: Digital Culture; Digital Competence; DICT; BNCC; Curriculum of Santa Catarina Territory

RESUMEN

Este artículo analiza algunas de las principales directrices nacionales e internacionales para el enfoque de la cultura digital en la educación en la última década, con miras a su inserción en los planes de estudio y la formación del profesorado. En el contexto brasileño, destacamos la Base Curricular Común Nacional (2017) que, siguiendo la tendencia internacional de organizarse en competencias y habilidades, no sin muchas críticas y controversias. Este documento sugiere la expansión del papel de la cultura digital en la construcción de planes de estudio, lo que permite que tanto el contenido como las estrategias de enseñanza para trabajar con la cultura digital se definan en contextos regionales y locales. El artículo también examina el caso de Santa Catarina, donde el plan de estudios regional (2019) sugiere que el tema sea explorado y detallado en los Proyectos pedagógicos políticos de las escuelas, que identificamos como una brecha para que los maestros participen en la escritura curricular, basada en sus realidades y experiencias de enseñanza en el campo.

PALABRAS CLAVE: Cultura digital; Competencia digital; TICD, BNCC; Plan de Estudios del Territorio de Santa Catarina

1 INTRODUÇÃO

Este artigo discute as principais diretrizes nacionais e internacionais para a abordagem da cultura digital na educação. O cenário vem se consolidando em documentos e eventos, organizados ou apoiados pela UNESCO, dedicados a debater a mídia-educação, a alfabetização midiática e informacional (AMI), a literacia digital (LD) e a competência digital (CD). Observamos que a literacia digital foi destacada como uma das Competências do Século XXI no contexto norte-americano, e a competência digital foi incluída entre as oito competências-chave para o aprendizado ao longo da vida, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Ao longo de mais de dez anos, muitos pesquisadores vêm tentando definir com clareza no que consiste a competência digital - hoje o termo mais usual - a ser desenvolvida, de modo a subsidiar a elaboração de currículos e de políticas públicas de formação de professores.

Todo esse debate trouxe desdobramentos para as políticas educativas brasileiras, sendo que hoje temos a cultura digital presente na Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2017), como uma das dez competências gerais a serem desenvolvidas nos currículos dos estados e municípios. Para exemplificar os modos como isso está se delineando, apresentamos o currículo estadual de Santa Catarina, publicado em 2019. Em 2020, essa discussão ganha novos contornos em função da crise sanitária, que mobilizou redes educativas, gestores e professores a buscarem soluções tecnológicas e midiáticas para a mediação pedagógica, e, de certa forma, aproximou as famílias dessa questão. Novas experiências e reflexões certamente emergirão desse momento histórico, e este artigo busca contribuir para que possamos situá-las dentro de um contexto maior, nacional e internacional, político e educativo.

2 MÚLTIPLOS CONCEITOS EM DEBATE

Em 2005, durante o Colóquio de Nível Superior sobre Competência Informacional e Aprendizado ao longo da vida, foi elaborada a Declaração de Alexandria (2005), que definia a alfabetização midiática e informacional (AMI) como a capacidade de reconhecer, localizar, avaliar, aplicar e criar informações dentro de contextos culturais e sociais, e apontava seu papel central na educação continuada. A declaração conclamava a sociedade a apoiar a adoção de estratégias de competência informacional e do aprendizado ao longo da vida; o desenvolvimento profissional em educação e outras áreas a serviço dos princípios e práticas da competência informacional e do aprendizado ao longo da vida; e a inclusão da competência informacional na educação básica e continuada para setores econômicos-chave. A partir de 2006, esse debate sobre as competências a serem desenvolvidas por meio de aprendizagem ao longo da vida2 ganha protagonismo no âmbito do Parlamento Europeu e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), e a competência digital (CD) configura-se como uma das oito competências-chave, considerada transversal ao desenvolvimento de todas as outras, e necessária à globalização e ao fortalecimento de economias baseadas no conhecimento (inclusão social, participação cívica e consciente na sociedade e economia, crescimento econômico sustentável e inteligente). A competência digital foi definida como a utilização crítica e confiante das tecnologias da sociedade da informação para o trabalho, o lazer e a comunicação, sustentada pelas habilidades em Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), sobretudo pelo uso do computador. O debate gerou uma recomendação no âmbito europeu, a Agenda Digital para a Europa (2010), que vem sendo sistematicamente atualizada, e marca o início de uma ampla produção de documentos, que inclui, entre os mais importantes, o texto Competência Digital na Prática (COMISSÃO EUROPEIA, FERRARI, 2012).

Diferentes conceitos e/ou designações foram sendo adotados nesses documentos, bem como problematizados por inúmeros pesquisadores. Só para ilustrar a grande variedade de expressões que tangenciam o termo competência digital, temos new literacies (KNOBEL; LANKSHEAR, 2011), multiliteracies (COPE; KALANTZIS, 2016), media education (Buckingham, 2018) media literacy (Bulger e Davidson, 2018), e techno literacy (KELLNER; KAHN, 2015). No intuito de clarear essa variedade semântica, Da Silva e Behar (2019) analisaram o conceito de competência digital, e Lucas, Moreira e Costa (2017) mapearam mais de 30 termos correlatos. Segundo este último trabalho, o termo competência digital é o mais comumente utilizado, seguido de literacia digital. Este último, divide opiniões, descrito por alguns como abarcando a dimensão crítica, enquanto para outros é relativo apenas às habilidades técnicas. A Comissão Europeia (2008) definiu literacia digital como o conjunto de habilidades necessárias para alcançar a competência digital, definição que para Lucas, Moreira e Costa (2017, p. 186) é “assaz estranha”, porque confunde conceito com processo. Apesar de não haver um consenso internacional e de seguirmos com diferentes designações, os autores citados afirmam que todas elas “parecem concorrer para as noções de que a literacia e competência digital são conceitos multidimensionais que envolvem a integração complexa de processos técnicos, cognitivos, metacognitivos e de consciência cívica e ética”.

Diante de tal pluralidade, a OCDE estabeleceu um quadro de referência, o Digital Competence Framework for Citizens (DigComp), para a compreensão e o desenvolvimento da competência digital, que se propõe a estabelecer uma linguagem única e partilhada sobre seus principais componentes e, ao mesmo tempo, fornecer referências para aferir iniciativas e desempenhos, de modo a poder ser utilizado por entidades públicas e privadas. Este quadro adotou como referencial a já citada publicação de Ferrari (2012). Desde 2013 foram publicadas três versões do quadro da OCDE, analisadas em artigos nacionais (LUCAS, MOREIRA, COSTA, 2017; MATTAR et al., 2020), sendo que a mais recente é o DigComp 2.1 (2017). O documento é organizado em áreas que se desdobram nas competências3 propriamente ditas, a partir das quais foram estabelecidos oito níveis de proficiência: básico (1 e 2), intermediário (1 e 2), avançado (1 e 2), altamente especializado (1 e 2). Cada nível traz o conhecimento, as habilidades e atitudes, em uma tabela com 168 descritores, que contém exemplos de situações de uso na escola e em casa.

Um exemplo de como esses documentos reverberaram nas políticas educativas dos países é o de Portugal, que, em 2018, criou o Programa Nacional Competências Digitais e.2030 - Portugal INCoDe.2030, e em setembro de 2019 publicou o Quadro Dinâmico de Referência de Competência Digital (QDRCD) baseado no DigComp 2.1. São definidos como objetivos gerais da publicação apoiar a definição de políticas e estratégias, desenhar programas de educação, avaliar e certificar competências por autodiagnóstico e via entidades certificadoras. Em relação ao DigComp 2.1, o documento troca a expressão Resolução de Problemas por Desenvolvimento de Soluções, mantém todas as competências, exceto a 3.4 (Programação), por entender que ela está espelhada em outras, e opta por quatro níveis de proficiência (básico, intermediário, avançado e altamente especializado).

No contexto norte-americano, esse movimento também ocorreu. A Parceria para as Competências do Século XXI (P21) foi fundada em 2002, como uma coalizão entre o governo Bush e grandes corporações estadunidenses da tecnologia, destacando as competências de uso do computador relacionadas à literacia digital, e exemplificando como as parcerias público-privadas têm tomado conta das políticas educativas em muitos países, incluindo o Brasil. Sobre as Competências do Século XXI,Kellner e Kahn (2015, p. 67) destacam que elas têm relação com o raciocínio, e com habilidades sociais com foco no trabalho e na proficiência tecnológica, portanto demandam uma política curricular com núcleo comum. Diante disso, os autores defendem “o engajamento crítico rigoroso com uma diversidade de tecnoliteracias emergentes (inclusive de habilidades relacionadas com as novas tecnologias de aprendizagem)” e afirmam “a necessidade de conhecimento curricular humanístico e fortemente acadêmico (e as competências de produção de conhecimento), que podem também melhor servir à reconstrução de uma sociedade democrática crítica” (KELLNER; KAHN, 2015, p. 67). A educação não pode ser resumida à prescrição do desenvolvimento de habilidades voltadas ao mercado de trabalho e, como advogam Miguel Arroyo (2013) e vários outros autores, professores devem ter vez nos currículos, trazendo, para essas escritas, suas autorias e identidades profissionais.

Importantes pesquisadores dedicam-se aos estudos das competências e literacias midiáticas, com abordagens que incluem as dimensões éticas e ideológicas, essenciais para a formação de professores, e a construção de currículos próprios para o trabalho com a cultura digital. No contexto ibérico, bastante influente no Brasil, podemos citar os trabalhos de Pereira, Pinto e Moura (2015), Gozálvez Pérez, García-Ruiz e Aguaded-Gómez (2014), Monteiro, Aguaded-Gómez, Ferrés (2017), e ainda a pesquisa de Joan Ferrés (2007), mais antiga mas ainda muito relevante por sua amplitude de dados e por ter influenciado o programa de trabalho da União Europeia Educação e Formação 2010. Mais recentemente, Ferrés e Alejandro Piscitelli (2015) procederam à revisão dos parâmetros para a educação midiática propostos no documento, tendo a cultura participativa como norte, isto é, o “espírito crítico e estético com a capacidade de expressão e o desenvolvimento da autonomia pessoal com o compromisso social e cultural” (p. 1). Esses trabalhos e estudos, capitaneados por pesquisadores conceituados no meio acadêmico, opõem-se a propostas instrumentais, essencialmente técnicas, que flertam com a já superada informática educativa e que surgem em determinados contextos. Um exemplo disso é a atual proposta curricular de Londres, com ênfase em coding/programação, que substituiu uma proposta anterior, com base na Mídia-Educação, referência em currículo de perspectiva crítica e de multiliteracias.

A UNESCO vem, desde 2005, apoiando a realização de eventos e a publicação de declarações, recomendações e documentos (DUDZIAK; FERREIRA; FERRARI, 2017), em favor da alfabetização midiática e informacional (AMI). Especificamente sobre formação de professores, produziu os documentos Padrões de Competências em TIC para professores: marco político (2009) e Alfabetização midiática e informacional: currículo para formação de professores (2013). Este último, propõe uma Matriz Curricular de formação e a unificação dos termos media literacy (alfabetização midiática) e information literacy (alfabetização informacional), passando a adotar alfabetização midiática e informacional (AMI). Segundo o documento, a alfabetização informacional enfatiza o acesso, a avaliação e o uso ético da informação, enquanto a alfabetização midiática enfatiza a compreensão das funções das mídias e o engajamento para a autoexpressão. Por tal entendimento, possuem ênfases complementares, e passam a ser agrupadas em uma única expressão.

A Matriz Curricular proposta organiza-se em três áreas temáticas centrais, a saber: “1. O conhecimento e a compreensão das mídias e da informação para os discursos democráticos e para a participação social; 2. A avaliação dos textos de mídia e das fontes de informação; 3. A produção e o uso das mídias e da informação” (UNESCO, 2013, p. 22). Essas três são ligadas a outros seis temas de educação geral (Política e visão; Currículo e avaliação; Pedagogia; Mídia e informação; Organização e administração; Desenvolvimento profissional de professores), cada um relacionado a uma meta curricular e a habilidades curriculares que os professores devem desenvolver. Os módulos fornecem esboços dos conteúdos e atividades e envolvem sete competências que os professores devem adquirir. São propostas dez abordagens pedagógicas (Abordagem investigativa; Aprendizagem baseada em problemas; Investigação científica; Estudo de caso; Aprendizagem colaborativa; Análise de textos; Análise de contextos; Traduções; Simulações; Produção), com visível ênfase na investigação e na leitura crítica, nas experiências práticas e na colaboração. Acreditamos que este documento pode se constituir em um referencial importante para a elaboração de programas, projetos e ações de formação continuada de professores. Todavia, não podemos negar o que a política das competências representa em um contexto educacional mais amplo, e no contexto brasileiro, em especial. Desvelam-se divergências teóricas e políticas, visões até mesmo antagônicas, colocando em guerra curriculistas, gestores, políticos, professores, empresas e organizações da área da educação, em debates travados com intensidade nos últimos anos no Brasil, e que explicitam conflitos e negociações que no campo do currículo nunca cessam.

3 A PEDAGOGIA DAS COMPETÊNCIAS NO BRASIL E A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR: GRANDES POLÊMICAS, MUITAS DISPUTAS

A “pedagogia das competências” encontra campo nos documentos das políticas educacionais e definições curriculares no Brasil desde o final da década de 1990 - com base mais na concepção da OCDE do que na da UNESCO e de pesquisadores da União Europeia. Impulsionada, em grande medida, pelas críticas à compartimentação disciplinar do conhecimento, visando à experiência concreta (saber-fazer) e à interdisciplinaridade4, ganhou força com a ampliação e universalização dos modelos avaliativos da educação pública brasileira.

Inúmeros pesquisadores formularam severas críticas a tal abordagem nos anos 2000. Para Dias e Lopes (2003, p. 1157), “o currículo por competências, a avaliação do desempenho, a promoção dos professores por mérito, os conceitos de produtividade, eficiência e eficácia, entre outros, disseminam-se nas reformas educacionais em curso no mundo globalizado”, pressionado para avaliações contínuas do desempenho docente, haja vista que as competências seriam relacionadas à aquisição de habilidades avaliáveis. Ao mesmo tempo, se instaura o aligeiramento da formação docente, criando-se um paradoxo: avalia-se mais e investe-se menos. Ramos (2001) defendia que essa abordagem apresentava limites para a formação humana integral - tanto pessoal quanto social, uma vez que privilegia a profissionalização pessoal em detrimento do comprometimento coletivo -, e seria um retorno ao funcionalismo. Maués (2003) afirmava haver uma mudança ideológica, uma vez que o desempenho escolar passou a ser diretamente conectado ao crescimento econômico, cuja responsabilidade maior está na ação do professor. Fortaleceu-se a defesa de uma formação prática dos professores, assentada nas experiências, na formação continuada e na educação a distância, fazendo diminuir o valor do saber científico/conhecimento teórico, importante na formação de um professor que consiga ir além das aparências, capaz de compreender os processos sociais e relacioná-los aos conteúdos curriculares. Construiu-se toda uma política de defesa por uma formação mais técnica para o professor, impulsionada pela flexibilização da legislação das licenciaturas e do aumento dos cursos de magistério nos Institutos Superiores, deixando o Bacharelado para as universidades federais. De Freitas (2002) denunciou que o modelo das competências estava sendo usado para validar o aligeiramento e a pulverização da formação inicial de professores e para responsabilizar o professor por sua formação e aprimoramento profissional, em um país que oferece péssimas condições de trabalho e remuneração no magistério e onde tal docência é vista como profissão de menor valor ou de transição a outros postos mais especializados.

Apesar dessas e de muitas outras críticas contundentes, as avaliações nacionais e internacionais revelaram grandes fragilidades na educação pública brasileira, que acabaram sendo impropriamente resumidas a uma baixa qualidade do desempenho de professores e estudantes, devida, principalmente, à falta de um currículo único norteador obrigatório. Ganha força em diferentes esferas (sociedade civil, pesquisadores, gestores e empresários) um movimento reformador da escola pública brasileira, crítico a sua reconhecida resistência às mudanças, questionador do seu papel social na contemporaneidade, e em defesa de uma educação que ajude as novas gerações a se capacitarem para uma vida profissional produtiva e adequada. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN, 1998) foram considerados insuficientes como base curricular comum, porque traziam liberdade para organizar os conteúdos.

Assim, em 2013 o Ministério da Educação (MEC) lançou as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), que agruparam os componentes curriculares em cinco áreas do conhecimento: linguagens, ciências da natureza, ciências humanas, ensino religioso e matemática. A partir desse momento, se articulou e ganhou força, de maneira organizada, a defesa de uma Base Nacional Comum Curricular obrigatória, através do MEC, do Conselho Nacional de Secretários da Educação (Consed), da União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e do Movimento Pela Base5. Em 2014, então, o Plano Nacional de Educação estabeleceu o prazo de dois anos para que o MEC elaborasse, com a participação de estados e municípios e em consulta pública, uma base nacional comum curricular para a educação básica, organizada em direitos e objetivos de aprendizagem. O processo foi atravessado, desde o início, por muitas disputas políticas, ideológicas e econômicas. Em julho de 2015, foi lançado um Portal na web com a primeira versão e coleta de contribuições da sociedade, para revisão e produção do documento final.

O ofício 01/2015, intitulado Exposição de Motivos sobre a Base Nacional Comum Curricular, escrito por pesquisadores do GT Currículo da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), e da Associação Brasileira de Currículo (ABdC), e entregue ao Conselho Nacional de Educação, avaliou o texto como problemático e impróprio para sua finalidade. Segundo os pesquisadores, o documento reforçava “uma descaracterização do estudante em sua condição de diferença, bem como da desumanização do trabalho docente em sua condição criativa e desconsideração da complexidade da vida na escola”, e ainda “a conversão do direito a aprender dos estudantes numa lista de objetivos conteudinais a serem aprendidos, que retira deste direito seu caráter social, democrático e humano”. Por fim, os estudiosos de currículo denunciavam o silenciamento das vozes dissonantes, cedendo “às tendências internacionais de uniformização/centralização curricular + testagem larga escala + responsabilização de professores e gestores” (Anped, Ofício 01/2015).

Só para termos a dimensão da polêmica, então instaurada, Rocha e Pereira (2016) realizaram um mapeamento analítico com 34 artigos científicos produzidos no Brasil, de 2010 a 2015, discutindo a BNCC. Os pesquisadores resumiram três posicionamentos gerais nessas produções: aqueles em oposição completa à criação e implementação de uma BNCC; aqueles que criticam o processo de produção textual e aprovação do documento, mas não se opõem à ideia de uma base comum em si, e problematizam pontos a serem aprimorados; e aqueles que apoiam a BNCC como documento oficial brasileiro. Triches e Aranda (2016) também realizaram um mapeamento, analisando 25 artigos científicos sobre a BNCC, publicados de 2014 a 2016, com foco na alfabetização. O artigo conclui que há um esforço dos autores em identificar as vozes que atuam em favor da hegemonização do currículo e da educação, com um claro protagonismo do setor privado. Aponta também, que grande parte dos autores questiona as contribuições e reais necessidades de uma base nacional comum curricular.

Em maio de 2016, o MEC publicou a segunda versão da BNCC, propagandeando ter recebido “mais de 10 mil contribuições” no website de consulta pública, e apresentou as demais políticas que deveriam seguir as orientações da Base: Política Nacional de Formação de Professores, Política Nacional de Materiais e Tecnologias Educacionais, Política Nacional de Avaliação da Educação Básica e Política Nacional de Infraestrutura Escolar. Isso é essencial para entendermos os desdobramentos e o amplo impacto desse documento. Em 2017, a terceira versão da BNCC foi aprovada, cercada de polêmicas, denunciada por pesquisadores e entidades da educação como tendo sido forjada a portas fechadas pelo Ministério da Educação, anulando todo o trabalho de consulta pública anterior (inúmeras audiências públicas, seminários e relatórios técnicos de avaliação). A Anped e a Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope) se posicionaram radicalmente contra os rumos da BNCC, publicando notas oficiais de repúdio, tanto ao processo de construção quanto ao documento final. Instituições de áreas que integram o currículo escolar, a exemplo da Associação Nacional dos Professores Universitários de História (Anpuh), também publicaram manifestos.

Para críticos humanistas e pesquisadores, a questão da qualidade da educação é muito mais complexa do que prescrições curriculares. Ela tem relação com as deficiências da formação inicial dos professores em exercício6, com a formação continuada a que os docentes têm acesso, com a infraestrutura das escolas, com os métodos e práticas adotadas, bem como com as condições sociais e econômicas das famílias dos estudantes. A baixa atratividade da carreira de professor da educação básica no país também é um empecilho para a melhoria da qualidade do ensino público, pois os salários são ruins, as condições de trabalho idem, e a profissão, de modo geral, não goza de prestígio social. Além de tudo isso, os críticos destacam que não se deveria perder a premissa de que a escola constitui-se como campo de desenvolvimento humano integral, com a função moralmente constituída de educar crianças e jovens para viverem harmoniosamente em sociedade, e não apenas de prepará-los para uma vida produtiva no mercado de trabalho. Por outro lado, os que defendem a BNCC repousam seus argumentos na necessidade de operacionalizar as Diretrizes Curriculares e afirmam que as avaliações nacionais e internacionais tornam imperativo um conteúdo comum obrigatório. Para eles, ignorar isso é relegar muitos estudantes à exclusão, dificultando sua ascensão econômica e social. Nesse contexto, houve um fortalecimento da expressão “direitos de aprendizagem”, visando à equidade escolar.

Há uma situação consolidada, não apenas no Brasil, mas também em outros países da América Latina, Europa e América do Norte, de fortalecimento e influência das correntes que demandam a uniformização dos currículos, dando margem cada vez menor às especificidades. Nessa propaganda, fazem uso de termos com legitimidade inquestionável como equidade educativa, direitos de aprendizagem, conteúdos mínimos, desenvolvimento de competências e aquisição de habilidades, empreendedorismo e cultura maker. Nesse quadro, quem protesta, deixando de participar das discussões de elaboração desses currículos, acaba simplesmente recebendo, de igual forma, um currículo pronto sobre o qual não pôde ter qualquer ingerência. Trazendo a questão para nosso contexto, se nos debruçarmos sobre o discurso construído e o texto da BNCC propriamente dito, encontraremos muitas contradições, entre as quais destacamos as duas mais evidentes: utiliza-se o termo objetos de conhecimento para fugir do estigma de conteudismo, mas o que se percebe é que o documento traz um excesso de “conteúdos mínimos”, deixando pouco espaço para regionalismos e especificidades; e há uma falta de clareza no uso do conceito de habilidades, traduzidas como listas de tarefas para o professor executar. Sobre os conteúdos que devam compor os currículos da educação básica, vale trazer à discussão a perspectiva de Saviani (2016), que propõe que o trabalho seja referência na escola elementar, por ser intrínseco ao viver em sociedade, mas com abordagens distintas. No ensino fundamental, segundo o autor, esta relação deve ser implícita e indireta, enquanto no ensino médio deve ser explícita e direta, com uma dimensão prática, porém geral, diversificada e politécnica, ou seja, o oposto de um ensino médio profissionalizante.

Com relação ao processo de construção do documento, é importante ainda destacar que a BNCC do Ensino Médio teve sua publicação em separado e editada por meio de Medida Provisória (transformada na Lei 3.415, de 16/12/2017) - sob justificativa de urgência ante a “realidade trágica” retratada nas avaliações nacionais, segundo website do MEC. E além de ter sido combatida por especialistas, angariou a oposição dos estudantes secundaristas, em um movimento nacional de resistência que varreu o país em 2016 (GIRARDELLO; LAPA, 2018). As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (MEC, 2012), atualizadas em 2017 e homologadas em 2018, estabeleceram que o currículo passasse a contemplar uma formação geral básica (1800h) e itinerários formativos (1200h), sendo organizado em áreas do conhecimento e da formação técnica e profissional (Linguagens e suas tecnologias; Matemática e suas tecnologias; Ciências da natureza e suas tecnologias; Ciências humanas e sociais aplicadas; Formação técnica e profissional). Estipulou, ainda, que atividades realizadas a distância pudessem contemplar até 20% da carga horária total, desde que haja suporte tecnológico (digital ou não) e pedagógico, com acompanhamento/coordenação de docente da unidade escolar, podendo ser expandido em até 30% no ensino médio noturno, uma novidade na educação pública brasileira que também desagradou pesquisadores. Na modalidade de educação de jovens e adultos, é possível oferecer até 80% da carga horária a distância.

4 A CULTURA DIGITAL NA BNCC

A BNCC tem a pedagogia das competências como sua matriz oficial, e define competência como “a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e sócio-emocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho” (BNCC, 2017, p. 8). O documento estabelece dez competências gerais a serem desenvolvidas na Educação Básica, por meio dos componentes curriculares, definidas a partir dos direitos éticos, estéticos e políticos estabelecidos pelas DCN. A cada competência geral estão ligados conhecimentos, habilidades, atitudes e valores. O termo digital aparece genericamente nas competências gerais 1 e 4, colocando os conhecimentos do mundo digital como parte da sociedade atual e a linguagem digital como uma das linguagens que devem ser utilizadas para expressão, partilha de informações e experiências (BNCC, 2017, p 9). De forma mais direta, a quinta competência coloca como atribuição da escola, logo de seus currículos e professores, contribuir no desenvolvimento de competências e habilidades relacionadas ao uso e à criação de Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDIC). O texto é o seguinte:

5. Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva (BNCC, 2017, p. 9).

Passando do geral ao específico, a BNCC detalha as áreas e seus componentes curriculares. No Ensino Fundamental, a Área de Linguagens (Língua Portuguesa, Arte, Educação Física e, no Ensino Fundamental - Anos Finais, Língua Inglesa), de igual forma, apresenta o digital como uma das linguagens da contemporaneidade, ao lado da verbal, da corporal, da visual e da sonora (idem, p.65). Em relação à utilização e produção com as TDIC, define a necessidade de:

6. Compreender e utilizar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares), para se comunicar por meio das diferentes linguagens e mídias, produzir conhecimentos, resolver problemas e desenvolver projetos autorais e coletivos (BNCC, 2017, p.65).

O texto do componente curricular Língua Portuguesa é o que dá mais destaque e detalhamento sobre os usos das tecnologias digitais nas práticas curriculares, fazendo uma longa justificativa para a ampliação dos letramentos, para além das linguagens oral e escrita. São mencionadas as novas ferramentas de edição de textos, áudios, fotos, e vídeos como recursos da atualidade, destacando não apenas o acesso, mas também a produção de conteúdos multissemióticos. Destacam-se produções da cultura digital, tais como playlists, vlogs, vídeos-minuto, fanfics, e-zines, e a circulação/ação na web e nas redes sociais. Problematiza-se o fato de o uso de tais ferramentas não significar a inclusão das “dimensões ética, estética e política”, tampouco implicar automaticamente uma recepção crítica dos conteúdos que circulam. Pontua, ainda, a dificuldade para estabelecer critérios editoriais e de seleção de conteúdo, e a dependência de uma curadoria que supõe habilidades específicas, mencionando o fenômeno da pós-verdade, o embaçamento das fronteiras entre o público e o privado, a superexposição nas redes sociais e o fenômeno das bolhas, ressaltando a importância da escola garantir, pois, o trato com a diversidade (BNCC, 2017, p. 67-68). O documento coloca a escola como espaço não apenas para novas práticas de linguagem e produções, convergindo para o uso qualificado e ético das TDIC no mundo do trabalho, do estudo e da vida cotidiana, mas também para fomentar o debate sobre essas práticas e usos. O texto conclui: “É preciso saber reconhecer os discursos de ódio, refletir sobre os limites entre liberdade de expressão e ataque a direitos, aprender a debater ideias, considerando posições e argumentos contrários” (idem, p. 69).

É possível, portanto, perceber na BNCC um grande destaque em Língua Portuguesa para as TDIC, numa perspectiva crítica e ampliada que deve ser materializada nos currículos escolares em construção. É potencialmente uma porta que se abre para que passemos a considerar as TDIC como elemento intrínseco à nossa cultura, com epistemologia própria e não apenas como ferramental para produção de gêneros textuais. Nota-se, no texto, uma preocupação com a possível rejeição dessa abordagem e uma eventual disputa por espaço nos currículos, como fica evidente na nota de rodapé número 30, que transcrevemos a seguir:

O espaço maior nesse trecho introdutório destinado aos novos letramentos e à cultura digital é devido tão somente ao fato de que sua articulação ao currículo é mais recente e ainda pouco usual, ao contrário da consideração dos letramentos da letra já consolidados. Os quadros de habilidades mais adiante atestam ainda a primazia da escrita e do oral (BNCC, 2017, p. 69).

O texto segue com a descrição das práticas de linguagem oralidade, leitura/escuta, produção (escrita e multissemiótica) e análise linguística/semiótica, e dentro delas as habilidades as serem desenvolvidas. No Eixo Leitura há um espaço considerável para os gêneros da cultura digital, que também aparecem nos Eixos Produção de Textos e Análise Linguística/Semiótica. Descendo mais um nível no detalhamento, são apresentados os campos de atuação dos anos iniciais e finais, que se propõem a ilustrar onde as práticas de linguagem se realizam, visando à contextualização do conhecimento escolar. O campo jornalístico-midiático está presente tanto nos anos finais do Ensino Fundamental quanto no Ensino Médio. No Ensino Médio sugere-se que a leitura/recepção e produção sejam complexificadas, visando a “autonomia e pensamento crítico para se situar em relação a interesses e posicionamentos diversos (BNCC, 2017, p. 510). Nas demais áreas de conhecimentos (Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Ensino Religioso) e seus respectivos componentes curriculares também são abordadas as TDIC. O artigo de Fuza e Miranda (2020) analisa como elas aparecem nos conteúdos dos Anos Finais do Ensino Fundamental, e estabeleceram a presença de quatro concepções, a saber: como “espaço ou mundo”, como “ferramenta ou técnica”, como “linguagem ou objeto discursivo” e como “TDIC para se agir socialmente (p. 14).

A presença de gêneros da cultura digital nos documentos educativos brasileiros não é novidade, a exemplo dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN, 1998), que faziam menção às TIC. Mas, na BNCC esses gêneros ganham centralidade nos processos educativos, e têm ampliadas suas significações em relação ao que se tinha anteriormente. Para alguns analistas, contudo, a BNCC só estará realmente implementada quando estiver retratada nos conteúdos do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Não obstante, ainda que seus impactos diretos possam parecer distantes a um primeiro olhar, a BNCC é hoje, juntamente com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB, 1996), o documento mais importante da educação brasileira, porque, apesar de não ser currículo - e isso está dito no documento -,tem o poder de orientar as políticas de toda a cadeia educativa - formação inicial e continuada de professores, investimentos em infraestrutura educacional e modelos de avaliação de escolas, professores e estudantes -, e está orientando os novos currículos em construção pelas redes estaduais e locais, que devem ser, obrigatoriamente, publicados até 2020.

Com relação à flexibilização de que parte da educação pública possa ser ofertada na modalidade a distância, inicialmente não extensiva ao Ensino Fundamental, vivemos novos capítulos em 2020, durante a crise do Covid-19, com muitas redes educativas, públicas e privadas, sob os auspícios do MEC7, recorrendo às mídias e aos ambientes online, diante da paralisação das aulas presenciais em todo o país. Esse movimento, ainda em curso, pode se constituir em iniciativas-piloto ricas em termos pedagógicos, ou então em experiências frustrantes devido ao improviso de ações encaminhadas "a toque de caixa" para cumprirem os calendários escolares e que encontram grande resistência de professores, pais e estudantes. Pode, ainda, se delinear como uma face do movimento político e mercadológico voltado à flexibilização da educação pública, com vistas ao corte de recursos. Desdobramentos incertos para currículos, formação de professores e práticas educativas, que, como pesquisadores, precisamos acompanhar.

5 A CULTURA DIGITAL EM UM CURRÍCULO REGIONAL

Em 2019, o estado de Santa Catarina publicou o Currículo do Território Catarinense para as escolas estaduais, que poderá ou não ser adotado nos municípios, com a opção de construir currículos próprios. O Currículo do Território Catarinense não detalha a competência digital a ser desenvolvida, tampouco traz especificações sobre o trabalho com as mídias e tecnologias digitais nas escolas, posto que este não se constitui um componente curricular. O texto apresenta as Competências Gerais da BNCC, as áreas do conhecimento e os componentes curriculares, destaca que “as escolas do Território Catarinense ainda precisam avançar na definição de um currículo que aponte para o trabalho com tecnologias para a aprendizagem para todos os estudantes da Educação Infantil e do Ensino Fundamental” e propõe que “os elaboradores e partícipes dos Projetos Político Pedagógicos das escolas sintam-se convidados a buscar essa ampliação e implementação”, apresentando como referência para as escolas de Santa Catarina o Currículo em Tecnologia e Computação, desenvolvido pelo Centro de Inovação para a Educação Brasileira (Cieb), dedicado à aquisição de habilidades técnicas de programação de computadores (CURRÍCULO DO TERRITÓRIO CATARINENSE, 2019, p. 18-19).

Considera-se importante que o Currículo Catarinense destaque os Projetos Políticos Pedagógicos das escolas como instrumento de ampliação e implementação de estratégias de desenvolvimento da competência digital, uma vez que são idealmente produzidos por professores, coordenadores pedagógicos e gestores, conhecedores da realidade de suas escolas e estudantes. Por outro lado, nos parece que o currículo de programação de computadores seria adequado para um projeto especial, realizado por adesão com pequenos grupos, e que sua condução exigiria dos professores conhecimentos aprofundados em programação, o que está fora do escopo da formação inicial das carreiras do magistério, e ainda é incipiente nas formações continuadas. Tal implementação demandaria um esforço das redes educativas para a formação profissional especializada ou de contratação, o que é viável. No entanto, há que se ter o domínio de técnicas de programação como uma das possibilidades educativas em um universo muito amplo de linguagens relacionadas à cultura digital (ex: audiovisuais, podcasts, memes, e-books, comunidades virtuais, comunidades de jogos) e suas variadas dimensões (éticas, estéticas, técnicas, críticas, políticas). Estas, podem e devem ser trabalhadas de forma mais amplamente possível no contexto escolar com os estudantes, em sua vivência cotidiana, não perdendo de vista a perspectiva politécnica da Educação Básica, defendida por Saviani (2016) e outros pesquisadores. Os multiletramentos são um direito dos estudantes na cultura digital, ainda mais relevantes nesse momento de grave crise ética e moral, no qual religião, crenças pessoais e interesses políticos tentam ser validados como conhecimento escolar.

A cultura digital vem sendo abordada nas redes educativas brasileiras desde a década de 1990. Inicialmente tivemos a implantação das salas informatizadas nas escolas públicas, a criação dos Núcleos de Tecnologias Estaduais (NTE) e Municipais (NTM) e, mais recentemente, as iniciativas de descentralização dos usos nas escolas com a aquisição de dispositivos móveis. Nesse ínterim, profissionais ocuparam a função de mediadores pedagógicos, muitas formações presenciais e a distância foram organizadas, práticas variadas foram desenvolvidas. Podemos, por conseguinte, dizer que a cultura digital já faz parte do currículo de inúmeras redes educativas há anos e por vezes décadas, mesmo que não esteja representada nas escritas curriculares oficiais, apenas manifesta nos currículos em ação, nos atos de currículo (MACEDO, 2013; SAVIANI, 2016), nas práticas instituintes, não organizadas e difusas, pouco avaliadas e quase não compartilhadas entre as redes.

Pensando na produção curricular, tendemos a nos alinhar ao que propõe Young (2013), na defesa de currículos escolares baseados no que ele denomina conhecimento poderoso, fundamentado por assuntos recontextualizados - seleção, sequenciamento e dosagem em coerência com a disciplina e com os alunos. Concordamos, ainda, com sua ressalva de que currículos ou diretivas nacionais sejam limitadas a conceitos-chave de temas centrais, estabelecendo uma base comum de conhecimentos que permita o intercâmbio entre docentes, países e gerações, garantindo autonomia às escolas e professores (p. 20-21). É claro que o conteúdo escolar precisa dialogar com a sociedade, e para isso deve ser forjado em uma dimensão mais ampla. Mas nenhum agente externo, por mais especialista que seja, conhece cada escola como os agentes que a compõem, e são capazes de, por eles mesmos, produzir e selecionar conteúdos que sejam plenamente adequados para as escolas e estudantes, em suas especificidades.

6 PARA ALÉM DO CURRÍCULO

Ao defender currículos próprios, elaborados com a participação de professores, conhecedores de seu campo de atuação, não estamos afirmando que teremos a solução definitiva para o quê e o como ensinar (GIMENO SACRISTÁN, 2007), mas sim que teremos um elemento norteador validado e consensuado. Importante sempre ter em mente que a docência na e da cultura digital passa tanto pela formação inicial - hoje insuficiente porque professores raramente saem das licenciaturas com uma formação crítica e técnica mínima para o trabalho com as mídias e tecnologias digitais na escola -, quanto pela formação continuada, pela avaliação de práticas, pela construção de um banco de conhecimento compartilhado. Além de tudo isso, é imprescindível um fornecimento tecnológico adequado e uma postura inovadora e democrática do professor, requisito para a ação autônoma e criativa dos estudantes. Há todo um ecossistema educacional a ser trabalhado para alcançar uma prática cultural que abarque as dimensões teóricas e práticas, exerça o uso e a produção, proceda a análise e a crítica contextualizada. Assim como “nenhum currículo pode, por si só, reduzir significativamente as desigualdades educacionais” (YOUNG, 2013, p. 26), nenhum currículo é capaz de, sozinho, determinar o que se ensina e o que se aprende. Esta é uma equação complexa.

É praticamente consenso que devemos levar para a escola as mídias e tecnologias digitais que utilizamos correntemente em nosso cotidiano - e estamos falando de estudantes e de professores -, tratando-as não como ferramentas, mas como interfaces de conexão com o mundo. Mas, a transposição da dimensão pessoal para as práticas pedagógicas é mais complexa do que a princípio possa parecer, e não se resume a superar as resistências pessoais de docentes que não querem perder a prerrogativa da transmissão do conhecimento. A mediação docente precisa ser pensada amplamente. Não basta ensinar os alunos a utilizar o mouse, a fazer pesquisa na internet ou mesmo a programar jogos, ainda que a instrumentalização dos usos seja importante, tendo em vista que, com bastante frequência, a escola oferece a muitos alunos a única oportunidade de uma iniciação tecnológica. Há que se proporcionar práticas integradoras entre professores e estudantes, experiências significativas na cultura digital e contribuir para que esses atores as compreendam amplamente. Se, anteriormente, tínhamos como norte que a escola fosse espaço de discussão e exercício da cidadania, nada mais elementar que hoje ela problematize a cidadania digital (o existir e atuar nos ambientes virtuais). Essa nova docência, além de uma óbvia predisposição a sair da zona de conforto, requer do professor conhecimentos especializados, planejamento, vivências práticas e sua constante avaliação, enfim, toda uma dedicação. Os letramentos midiáticos são um processo, que pela natureza evolutiva das tecnologias nunca estará concluído porque ao dominarmos um dispositivo, uma plataforma, outras estarão sendo implementadas ou atualizadas, e novas formas de relacionamento social sendo estabelecidas. Inovação é movimento e a escola precisa acompanhá-la.

7 CONCLUSÃO

No que se refere à cultura digital, consideramos que temos uma mudança em curso, que pode ganhar força a partir de 2020. Como a cultura digital foi entendida até o momento como uma dimensão transversal, não foi definida como um componente curricular, mas pulverizada em competências e habilidades mais gerais, tanto nos ciclos educativos na BNCC (2017), como do Currículo do Território Catarinense (2019). Este último sugere que a questão seja melhor aprofundada nos Projetos Políticos Pedagógicos das instituições educativas, o que deixa grandes brechas para a participação de professores nessas escritas, ou seja, na construção de currículos próprios, adequados às suas realidades imediatas. Porém, a aquisição de conhecimentos e habilidades no campo da cultura digital está sendo considerada necessária para a preparação dos estudantes para o mercado de trabalho e estratégica para o desenvolvimento econômico das nações. Esse protagonismo ganha holofotes com a crise do Covid-19, que exigiu das redes educativas, dos professores, pais e alunos o desenvolvimento de competências e habilidades tecnológicas digitais relacionadas aos processos pedagógicos nunca antes demandadas. Isso mexe com a relativa liberdade que se teve até o momento para o trabalho pedagógico nas redes educativas. E pode acarretar que em um futuro próximo a prescrição dos conteúdos para a cultura digital também aconteça, seja dentro de cada componente curricular ou como um currículo que deverá ser trabalhado transversalmente por todos os professores.

Por isso, defendemos um posicionamento político e pedagógico de gestores escolares, coordenadores pedagógicos e professores, que passa, inevitavelmente, pela construção de currículos próprios da e na cultura digital, consistentes e embasados, adequados às realidades escolares. Há um vazio que tende a ser ocupado por especialistas do mercado educativo e da cadeia editorial, se os professores não assumirem como papel de sua docência a participação nas escritas curriculares oficiais. Importante é que nesse momento de defesa de currículos práticos, concordemos ou não com isso, nos municiemos de referenciais que considerem que a cultura digital não tem relação apenas com a inclusão digital- com as devidas ressalvas que se faz ao termo (BONILLA; PRETTO, 2011) -, com a competência digital ou com o letramento midiático, mas com a correlação dessas três dimensões em uma mediação pedagógica histórica e cultural, na qual se tenha no horizonte a cidadania digital.

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NOTAS:

1 Este artigo foi produzido no âmbito de uma pesquisa de doutorado (COUTINHO, 2020), com apoio da CAPES.

2 As competências a serem adquiridas ao longo da vida aparecem nos documentos internacionais relacionadas a questões comportamentais e construtivistas: educação humanista e problematizadora; aprendizagem colaborativa e alicerçada em comunidades de investigação, grupos de trabalho; flexibilidade, habilidades de comunicação; predisposição ao diálogo; criatividade e liderança; dentre outras.

3 As áreas e competências são as seguintes: Literacia de informação e de dados: 1.1 Navegação, pesquisa e filtragem de dados, informação e conteúdos digitais; 1.2 Avaliação de dados, informação e conteúdos digitais; 1.3 Gestão de dados, informação e conteúdo digital. Comunicação e colaboração: 2.1 Interação através de tecnologias digitais; 2.2 Partilha através de tecnologias digitais; 2.3 Envolvimento na cidadania através de tecnologias digitais; 2.4 Colaboração através de tecnologias digitais; 2.5 Netiqueta. Criação de conteúdo digital: 3.1 Desenvolvimento de conteúdo digital; 3.2 Integração e reelaboração de conteúdo digital; 3.3 Direitos de autor e licenças; 3.4 Programação. Segurança: 4.1 Proteção de dispositivos; 4.2 Proteção de dados pessoais e privacidade; 4.3 Proteção da saúde e bem-estar; 4.4 Proteção do meio ambiente. Resolução de problemas: 5.1 Resolução de problemas técnicos; 5.2 Identificação de necessidades e respostas tecnológicas; 5.3 Utilização criativa das tecnologias digitais; Identificação de lacunas na competência digital (DIGCOMP 2.1, 2017, p. 21).

4 Nóvoa, Schönn, Tardiff e Perrenoud são constantemente referenciados nesse discurso, muitas vezes de maneira simplista e por vezes até distorcida. Um exemplo é o texto clássico de Perrenoud (2001), que define entre as competências cruciais na profissão de educador do milênio a de “gerar sua própria formação contínua”, usado como referência para que se atribua ao professor a plena responsabilidade por seu aprimoramento profissional.

5 Apoiam o Movimento Pela Base ABAVE, CENPEC, Comunidade Educativa CEDAC, CONSED, Fundação Lemann, Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, Fundação Roberto Marinho, Instituto Ayrton Senna, Instituto Inspirare, Instituto Natura, Instituto Unibanco, Itaú BBA, Todos Pela Educação e UNDIME. Também consta uma lista de pessoas que compõem o movimento, atuantes nas instituições apoiadoras. Chama atenção a praticamente ausência de professores, diretores e gestores da rede pública de ensino e de suas entidades representativas; bem como de pesquisadores da educação de universidades públicas federais, estaduais e municipais - principais produtoras de dados científicos sobre a educação no Brasil. Destaca-se, em contrapartida, o domínio de Fundações de bancos privados, e de Fundações e Institutos ligados ao setor produtivo do Estado de São Paulo e universidades privadas sem fins lucrativos. É importante ressaltar a ínfima representatividade dos estados da Federação, com uma prevalência de São Paulo, o que põe em xeque a proclamada representatividade nacional do Movimento. Disponível em: http://movimentopelabase.org.br/quem-somos/ Acesso em: 15 abr. 2020

6 O Plano Nacional de Educação (PNE, 2014) prevê que todos os professores tenham formação específica de nível superior até 2024. Porém, o Plano se refere à área de formação, ou seja, um professor não precisaria de formação na disciplina. Segundo o Censo Escolar 2015, quase metade dos professores do Ensino Médio não possui formação específica na área em que ministra aulas.

7 A Medida Provisória 934 (1º de abril, 2020) “estabelece normas excepcionais sobre o ano letivo da educação básica e do ensino superior decorrentes das medidas para enfrentamento da situação de emergência de saúde pública”, flexibilizando o número de dias letivos, desde que se respeite o limite mínimo de horas-aula. Na prática, abre a possibilidade para que sejam utilizados recursos online para o cumprimento da carga-horária. Disponível em: http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=600&pagina=1&data=01/04/2020&totalArquivos=1. Acesso em: 15 abr. 2020.

Recebido: 15 de Abril de 2020; Aceito: 17 de Junho de 2020

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