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Práxis Educativa

versão impressa ISSN 1809-4031versão On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.17  Ponta Grossa  2022  Epub 27-Ago-2022

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.17.19393.085 

Dossiê: Relações étnico-raciais: práticas e reflexões pedagógicas em contextos, espaços e tempos

Inclusão de pessoas negras e de saberes afrodiaspóricos em Universidades brasileiras: a diversidade epistêmica como estratégia

Inclusion of black people and Afro-diasporic knowledge in Brazilian Universities: epistemic diversity as a strategy

Inclusión de personas negras y saberes afrodiaspóricos en Universidades brasileñas: la diversidad epistémica como estrategia

Érika de Sousa Mendonça* 
http://orcid.org/0000-0003-0031-3608

Amilson de Carvalho Gominho Filho** 
http://orcid.org/0000-0001-8403-378X

Ana Letícia Cordeiro de Melo*** 
http://orcid.org/0000-0002-6791-7644

*Doutora em Psicologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Professora adjunta do curso de Graduação em Psicologia da Universidade de Pernambuco (UPE). Professora do Mestrado Profissional em Culturas Africanas, da Diáspora e dos Povos Indígenas da UPE

**Graduando em Psicologia pela Universidade de Pernambuco (UPE).

***Graduanda em Psicologia pela Universidade de Pernambuco (UPE).


Resumo

Este artigo discute como a diversificação no perfil de ingressantes em Universidades brasileiras tem provocado tensionamentos políticos acerca da racialidade, bem como, em diálogo com autores afrodiaspóricos e decoloniais, reflete acerca das bases epistemológicas que permanecem privilegiadas na produção de conhecimento nesses espaços. Observou-se, a partir de uma revisão integrativa de literatura, que a inclusão racial promovida, principalmente, pelas políticas de ação afirmativa, não é acompanhada de reformas estruturais, do ponto de vista epistêmico, pedagógico e metodológico, de modo a acolher a ontologia do estudante negro, com a inclusão de saberes e de expressões afrodiaspóricas. Nessa direção, considerou-se a Universidade, também, como um espaço desalojante para essas existências, mas que pode abrigar insurgências negras, bem como ventilar possibilidades de incentivo a uma atividade intelectual, de fato, representativa e emancipadora.

Palavras-chave: Raça; Universidade; Diversidade epistêmica.

Abstract

The article discusses how the diversification in the profile of newcomers to Brazilian Universities has provoked political tensions about raciality, as well as, in dialogue with Afro-diasporic and decolonial authors, reflect about the epistemological bases that remain privileged in the production of knowledge in these spaces. It was observed, from an integrative literature review, that racial inclusion, promoted mainly by affirmative action policies, is not accompanied by structural reforms, from an epistemic, pedagogical and methodological point of view, that embrace the ontology of a black student, with the inclusion of Afro Diasporic knowledge and expressions. In this way, the University was also considered as a dislodging space for these existences, but it may shelter black insurgencies, as well as ventilate possibilities to encourage a truly emancipatory and representative intellectual activity.

Keywords: Race; University; Epistemic Diversity.

Resumen

El artículo discute cómo la diversificación en el perfil de los que ingresan a las universidades brasileñas ha provocado tensiones políticas sobre la racialidad, así como, en diálogo con autores afrodiaspóricos y decoloniales, reflexiona sobre las bases epistemológicas que permanecen privilegiadas en la producción de conocimiento en estos espacios. Se observó, a partir de una revisión integrativa de la literatura, que la inclusión racial, impulsada principalmente por las políticas de acción afirmativa, no se acompaña de reformas estructurales, desde un punto de vista epistémico, pedagógico y metodológico, de modo a abrazar la ontología del estudiante negro, con la inclusión de saberes y de expresiones afrodiaspóricos. En esta dirección, se consideró a la Universidad también como un espacio desalojador de estas existencias, pero que puede acoger insurgencias negras, así como ventilar posibilidades de incentivo a una actividad intelectual, de hecho representativa y emancipadora.

Palabras claves: Raza; Universidad; Diversidad epistémica.

Reflexões disparadoras ou inquietações como pontos de partida

As proposições e as reflexões aqui tecidas emergiram a partir da experiência em um componente curricular do curso de Graduação em Psicologia intitulado “Psicologia, Questões Étnico-Raciais e de Gênero”, por meio do qual foi possível estabelecer críticas às epistemologias europeias/ocidentais, até então preponderantemente estudadas, ampliando-as. Nesse sentido, os referenciais teóricos decoloniais e afrodiaspóricos inspiraram questionamentos quanto ao racismo epistêmico no estudo das Ciências Humanas e Sociais, bem como a persistência do racismo institucional no âmbito das Universidades brasileiras.

O Brasil compõe oficialmente, desde 2013, o grupo de Estados considerados territórios da diáspora pela União Africana - confederação internacional que objetiva a integração entre os povos originários do continente, dentro e fora dele. Em parceria com representantes de diversos países que possuem um contingente de população negra e forte influência cultural africana, a organização determinou a diáspora como o sexto território de África (ITAMARATY, 2013). Por diáspora africana, compreendemos o processo de saída forçada de negros africanos de sua terra de origem, rumo a diversas regiões do mundo, em virtude do processo de colonização, tráfico e escravização promovido por potências europeias a partir do século XV (SILVA; XAVIER, 2018).

É preciso, nesse ínterim, situarmos que a diáspora submeteu esses povos ao que Ani (1994) chama de estado de Maafa - um processo de captura e de aprisionamento físico e mental, produzido pela experiência do sequestro, da objetificação, da escravização e da guetificação, que se estabelece desde a saída da África até o surgimento forçado da chamada Afrodiáspora, mantendo-se na contemporaneidade. Entendemos, inspirados em Fanon (2020) e Nobles (2009), que viver na diáspora opera uma experiência de desidentificação, de deslocamento e de adoecimento à subjetividade negra, gerando a necessidade de aderência a referenciais simbólicos e culturais dominantes como forma de sobrevivência ontológica. Todavia, na diáspora, as existências negras também formulam suas estratégias de resistência e encontram caminhos para preservar, enunciar e legitimar suas experiências.

De forma análoga, neste artigo, a partir da observância das bases epistemológicas e metodológicas que estruturam a produção acadêmica, do histórico de formação de Universidades brasileiras e do acesso dos negros afro-brasileiros a elas, argumentamos no sentido de ser a Universidade um ambiente também diaspórico a estudantes e pensadores negros que, por sua vez, experienciam deslocamentos e guetificação subjetivos e intelectuais, haja vista a manutenção de uma lógica de branquitude (BENTO, 2014) e colonialidade do saber (MALDONADO-TORRES, 2008) nesses espaços. Ressaltamos, contudo, que também, nesse ambiente, discentes e docentes/pesquisadores negros vêm desenvolvendo estratégias para pautar suas experiências na construção de outras narrativas.

A partir da observação de que a disciplina então referida e cursada tem caráter eletivo, e se configura como uma proposta isolada no curso - submersa em uma grade curricular composta por 69 componentes, entre obrigatórios e facultativos, que não discutem a questão racial como foco, identificamos o alerta evidenciado por Ribeiro (2017), segundo o qual se podem perceber questões de cunho racial ainda comumente estudadas como “recortes”, tendo, na linguagem, um pilar de manutenção do privilégio epistêmico. Dessa forma, o racismo não é visto como estruturante das epistemologias amplamente difundidas, mas as vozes das minorias têm sua difusão dificultada pelo discurso acadêmico. Nesse sentido, é importante observarmos, também, como a discursividade, principal instrumento de trabalho das Academias, não se limita ao uso das palavras, mas se expressa em práticas cotidianas de silenciamento e de manutenção da dominação racial no âmbito universitário.

Para Ribeiro (2017), a própria noção ocidental e branca de intelectualidade precisa ser revista, estabelecendo-a como uma ligação dialética entre pensamento e prática, que desemboca em compreensões da realidade concreta. Suas ideias inspiram-se em Hooks (1995) que denuncia a limitação do conceito predominante de intelectual, o qual ela nomeia ocidental, que o segrega da experiência e o desloca da realidade da vida social.

No diálogo com essas autoras, compreendemos que todo intelectual desenvolve seu pensamento a partir de uma lente que lhe é conferida pela sua experiência no mundo, permitida pelo lugar histórico, político e social que ocupa, ao passo que nenhuma intelectualidade é neutra. Dessa forma, a intelectualidade não só é entendida como uma atividade ideológica, mas fundamentalmente como um exercício crítico e provocador de transformações da realidade coletiva. Assim sendo, a intelectualidade é vista com estranheza e estigmatizada, especialmente quando desenvolvida por corpos politicamente subalternos.

A partir dessa compreensão e diante da escassez de alternativas epistemológicas, metodológicas e pedagógicas descentralizadas dos cânones anglo e eurocêntricos que sustentem a produção intelectual nas Universidades, questionamos: Quais estratégias podemos fortalecer para que a participação de sujeitos não brancos na atividade acadêmica não seja uma mera representatividade quantitativa? Como criar condições para a potencialização de mentes negras, na direção do desenvolvimento de uma intelectualidade e de uma produção acadêmica emancipatórias? Seria a proposição e a instauração de uma diversidade epistêmica, incluindo uma perspectiva afrodiaspórica, uma estratégia político-pedagógica potente?

Na tentativa de traçar possibilidades e apontamentos para tais questionamentos, em um primeiro momento, foi realizada uma revisão integrativa, haja vista a necessidade de entender o ponto de partida e o locus social, ou seja, as condições sociais que impõem determinados lugares a grupos específicos (RIBEIRO, 2017). Nesse sentido, entendermos o locus social implica traçar o que há de comum nas experiências de jovens negros na Universidade - ponto de partida desse trabalho - e, na estratégia adotada, a partir de uma óptica decolonial, analisarmos o que tem sido debatido acerca da temática na produção científica da área.

De acordo com Souza, Silva e Carvalho (2010), o objetivo de uma revisão bibliográfica é reunir conhecimentos sobre um tópico de discussão, de forma a identificar e produzir bases que sustentarão estudos futuros. No que diz respeito aos aspectos referentes à revisão integrativa, para os autores, esta se caracteriza como um modo compreensivo de análise em que há o esforço em articular estudos científicos diversos com uma dada perspectiva teórica, articulando-os a conceitos e bibliografias que versam sobre a temática estudada. Para tanto, são realizadas etapas de busca, seleção, categorização e análise.

Isso posto, sente-se a necessidade de realizar uma incursão histórico-político- epistemológica, a fim de propor reflexões acerca da predominância de epistemologias anglo-europeias, e alternativas teórico-metodológicas nas Universidades ocidentalizadas, em especial em países afrodiaspóricos como o Brasil, considerando as ressonâncias dessas hegemonias na experiência e na atividade intelectual de acadêmicos negros. Em contraposição, pretendemos visibilizar insurgências teórico-metodológicas que se levantam no ambiente acadêmico, no sentido de fomentar diversidades epistêmicas a partir de cosmovisões não-brancas, e a reivindicação de uma noção de intelectualidade que valide o lugar da experiência na produção de conhecimento em Ciências Humanas e Sociais, visando à instrumentalização e à potencialização de uma intelectualidade negra autodeterminada na diáspora.

A inserção de minorias nas Universidades: tensionamentos entre tradições e rupturas

De acordo com Bertolanza (2017), o Brasil foi o último país do continente latino-americano a aderir à implementação das Universidades. Isso aconteceu no século XX e atendia apenas a uma demanda da elite, que até então enviava seus herdeiros para estudarem na Europa. Dessa forma, em seus primeiros passos, ingressavam nas Universidades brasileiras estudantes representativos dessa classe socioeconômica e política, que se apropriaram do espaço como mais um dispositivo voltado à manutenção dos privilégios. Contudo, da implementação ao modelo experienciado atualmente, houve modificações administrativas e ideológicas, as quais seguem sendo ampliadas (BORTOLANZA, 2017).

O maior período de expansão das Universidades brasileiras apenas viria a acontecer entre os anos de 2003 e 2013, quando se presenciou um aumento de 94% nas ofertas de cursos. Isso se deveu ao Plano Nacional de Educação (PNE) que vigorou desde 2001 até 2010 (SESU, 2014). Algumas das mudanças que proporcionaram a consolidação das Universidades foi a busca por inserção de minorias políticas, que até então não tinham amplo acesso ao Ensino Superior, devido ao projeto social-liberal da época, que pretendia unir desenvolvimento social e econômico. Um exemplo disso é a Lei No 12.711, de 29 agosto de 2012 (BRASIL, 2012), conhecida como Lei de Cotas, que estabelece a reserva de vagas para minorias socioeconômicas.

Em função da Lei No 12.711/2012 e de outras políticas de ação afirmativa, o perfil dos estudantes universitários, que até então praticamente se mantinha no padrão da elite, passou a se diversificar. Isso se faz presente como dado da V Pesquisa Nacional de Perfil Socioeconômico e Cultural dos Graduandos das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) que traz, como informação relativa à racialidade nas IFES, que 51,2% dos estudantes são negros (pretos e pardos), seguidos dos 43,3% brancos, 2% de amarelos, e apenas 0,9% dizem respeito à presença dos povos indígenas (ANDIFES, 2019). O perfil econômico também variou significativamente já que, mesmo que apenas 2% tenham uma renda familiar mensal bruta de até meio salário-mínimo, o maior índice (23,5%) é daqueles cujas famílias recebem entre um e dois salários-mínimos (ANDIFES, 2019). Para entendermos melhor esses dados acerca da inserção de minorias na Universidade, realizamos uma pesquisa, na plataforma Scientific Electronic Library Online (SciELO), para investigar a produção acadêmica nacional acerca da temática, utilizando os descritores “raça” e “Universidade”.

Foram encontrados 241 artigos, mas, devido à grande concentração deles no campo das Ciências Agrárias e Biológicas - haja vista as amplas possibilidades contidas no termo “raça” -, o tema precisou ter sua investigação restrita aos campos de produção: Ciências Humanas, Ciências Sociais Aplicadas e Linguística, Letras e Artes. Nesse interim, também foi excluído o campo das Ciências da Saúde, pois seus artigos versavam sobre doenças, possíveis tratamentos ou contextos em que essas doenças estavam difundidas. Dessa forma, chegou-se a 44 produções, publicadas entre os anos de 2002 e 2021. Desse total, a partir da leitura dos resumos, 19 foram selecionadas por relacionarem-se ao problema de pesquisa, a saber: as discussões acerca das políticas de ação afirmativa, já que estas se apresentaram mais recorrentemente quando se discute a racialidade na Universidade.

Nesse sentido, observamos uma mudança gradativa no teor das discussões, em que os artigos mais antigos tratam, sobremaneira, da temática das ações afirmativas no viés da inclusão, retratando os conflitos em volta dessa política (Lei No 12.711/2012) ainda como projeto de lei e iniciativa estadual (AZEVEDO, 2004; BRANDÃO; MARINS, 2007; GUIMARÃES, 2003). Já os artigos mais atuais produzem mais discussões sobre as limitações de tais políticas para a real inserção de minorias nas Universidades, tendo como base êxitos ou fracassos experienciados com implementações anteriores (ARAÚJO, 2019; HAAS; LINHARES, 2012; MENDES, 2020; TURGEON; CHAVES; WIVES, 2014).

No entanto, já em 2004, Assis e Canen (2004, p. 711) partiram da pergunta: “Como ir além de posturas de denúncia do preconceito contra a identidade negra e incorporar elementos para sua construção positiva, em políticas e práticas educacionais?”. Nesse caminho, estreitam a relação entre raça e etnia na sociedade brasileira, em que a constituição da identidade racial está intimamente ligada às percepções sociais e discriminações baseadas em fenótipos, então o fator cultural (ligado à etnia) adquire centralidade na identificação racial brasileira. E, a partir disso, desenvolvem possibilidades em uma perspectiva crítica do multiculturalismo, propondo ementas transformadoras, que incorporem estudos sobre as identidades negras, visando à afirmação identitária dessa população e a diminuição dos preconceitos raciais.

Quanto às políticas de ação afirmativa, destacamos os escritos de Guimarães (2003), nos quais é narrada a trajetória do movimento negro na luta pela garantia de acesso dessa população às Universidades. Para o autor, após a Constituição de 1988, que finalmente estabelecia o racismo como crime, esses movimentos ganharam força e puderam se organizar em torno de outras demandas, dentre elas o acesso às Universidades. Simultaneamente, vociferava-se o racismo por meio do discurso de intelectuais, que temiam uma queda no rendimento das Universidades, e da classe média, que reclamava que seus herdeiros agora eram ameaçados na disputa de vagas acadêmicas.

Vale ressaltarmos que as ações afirmativas são entendidas por Haas e Linhares (2012, p. 844) como “[...] políticas públicas que dão preferência a segmentos sociais marginalizados no acesso aos direitos sociais”. Também destacamos que as iniciativas estaduais incentivaram a criação do Projeto de Lei Nº 3.627, de 20 de maio de 2004, aprovado em 2008 pelo Congresso Nacional (BRASIL, 2004), que viria a se tornar, depois de alguns ajustes, a Lei de Cotas - Lei No 12.711/2012, esta que já era alvo de críticas por parte dos segmentos da sociedade citados anteriormente, desde suas primeiras implementações.

Presenciamos, nesse contexto, uma série de denúncias que apontavam, em tais políticas, a institucionalização de uma divisão racial, quando no imaginário popular ainda reinava o mito da democracia racial. A exemplo disso, temos o artigo de Azevedo (2004), que se opõe à implementação das cotas, utilizando como pilar de argumentação a “desracialização dos espíritos e das práticas sociais” (AZEVEDO, 2004, p. 235), em uma tentativa de se alinhar com o princípio da igualdade da Constituição Federal. Entretanto, analisamos que esses mesmos argumentos podem ser utilizados de forma conivente às políticas de branqueamento e ao discurso de meritocracia, visto que este ignora o contexto de desigualdade brasileira.

Acerca disso, Bento (2014) argumenta que o silêncio e a cegueira em torno das problemáticas raciais trazem benefícios concretos e simbólicos para os sujeitos identificados como brancos. Isso, pois, o que é estabelecido como humanidade nas sociedades ocidentais, nada mais é do que uma série de características típicas da cultura europeia e branca. Assim sendo, negar a raça de uma determinada pessoa é apagar seus processos de socialização e de racialização, desfazendo-se, na contramão, das responsabilidades históricas e materiais da branquitude no lugar subalterno ocupado pelos corpos racializados.

Com o intuito de inibir estudantes negros a utilizarem de seus direitos políticos, assistimos a uma deslegitimação da aprovação universitária, quando esta se dá por meio de ações afirmativas. As ressonâncias de tal movimento aparecem como dados na pesquisa de Brandão e Marins (2007), que encontram certa relutância quanto à adesão de possíveis candidatos no último ano do Ensino Médio. Algo semelhante foi encontrado por Turgeon, Chaves e Wives (2014) ao identificarem que, quando perguntados de forma indireta e com garantia do anonimato, estudantes universitários elegíveis às cotas (pretos, pardos e indígenas) indicaram apoio à política de cotas em 68,3%. No entanto, quando perguntados diretamente, apenas 29% dos estudantes elegíveis apoiavam a implementação de ações afirmativas. Isso indica um efeito de inibição, no qual se omite o apoio por vergonha ou medo de ser mal interpretado. Os dados realçam, pois, conflitos provenientes da ideologia da meritocracia e/ou ao mito da democracia racial, na subjetivação de pessoas negras, coibidas à utilização de “máscaras brancas”, como defende Fanon (2020).

Também na pesquisa de Crisostomo e Reigota (2010), três docentes negras em uma Universidade no Estado de São Paulo mostram-se relutantes às políticas por medo destas colocarem negros em posição de inferioridade. Em contrapartida, narram a escolarização, em suas trajetórias, como uma espécie de enfrentamento às discriminações raciais. Entretanto, tais discriminações continuam presentes ainda durante a docência, por meio de um maior questionamento e desconfiança quanto às suas habilidades, mostrando que a intelectualidade de pessoas negras é invalidada independentemente do mérito ou da qualificação apresentadas.

Para Araújo (2019), a própria naturalização dos vestibulares como estratégia de recrutamento também é algo questionável, visto que asseguram a monopolização de vagas e servem de apoio ao mito da escola única. Nessa concepção, há a crença de que apenas um investimento no ensino básico colocaria todos em situação de igualdade para disputar as vagas para a Universidade, ignorando as dimensões socioeconômicas que possibilitam a qualidade das experiências. Nesse sentido, a autora também produz críticas sobre a homogeneização do perfil docente, afirmando que o fato de a maioria dos professores serem brancos é tão naturalizado que sequer é visto como uma questão institucional, e pode ter colaborado, inclusive, para a adesão tardia ao sistema de cotas nas Universidades paulistas.

Em seus argumentos, Araújo (2019) concentra-se principalmente no olhar voltado às cotas como atos benevolentes, que colocam no cotista o problema institucional. Assim, esse paradigma se expande no sentido da domesticação de corpos considerados incapazes, fazendo com que eles se adaptem às instituições normatizantes, em vez de alterarem as normativas racistas, uma vez que eles já seriam supostamente favorecidos por esta questionável inclusão. Portanto, “[...] o racismo institucional opera a partir de mecanismos rotineiros, assegurando a dominação e a inferiorização do negro sem explicitação ou publicização, pelo contrário o racismo institucional opera de modo velado” (ARAÚJO, 2019, p. 2193). Para a autora, isso dificulta a superação do racismo, na medida em que estigmatiza o negro como receptor de políticas públicas. Assim, é necessário refletirmos sobre a função da Universidade no capitalismo globalizado, redefinindo horizontes.

“Se as políticas afirmativas para acesso materializada pelas cotas - raciais e sociais - foi um grande avanço, tratar pontualmente acesso como ingresso é desperdiçar a oportunidade de tratar as políticas de permanência igualmente como políticas afirmativas” (MENDES, 2020, p. 4). Dessa forma, a autora alerta para a necessidade de pensar o Ensino Superior como um direito que vai além das “capacidades individuais” como prevê o sistema seletivo baseado em meritocracia. A inclusão de povos marginalizados resulta na

[...] celebração da diversidade racial e/ou cultural como um valor afirmado pela instituição que passa a admitir este “Outro”, convivendo ao mesmo tempo com discursos e práticas de deslegitimação e discriminação, pelo fato de este “Outro” ser alguém que até pouco tempo sequer era pensado pela Universidade como sujeito epistemológico (MENDES, 2020, p. 7).

Assim, as exigências de adaptação são maiores e é preciso se pensar políticas para além de bolsas e transferência de rendas - sem negar a importância destas para a manutenção de estudantes vulneráveis socioeconomicamente - mas reconhecendo sua incompletude. Algo a ser refletido é o falso reconhecimento, visto que a dominação cultural presente nas Academias revela uma violência simbólica difícil de ser combatida e que categoriza os estudantes em status que determinam quem são os “Outros”.

De modo semelhante, Araújo (2019, p. 2204-2205) conclui que os discursos de “diversidade como potência criativa” têm por essência a utilização de povos marginalizados no sistema de organização capitalista a partir de “gestão e controle da diversidade”. Isso está presente na criação de uma imagem da Universidade como espaço democrático de direito, quando a avaliação da qualidade das produções é, ainda, responsabilidade do intelectual burguês.

Nesse sentido, a análise de Rodrigues (2021), a partir das narrativas de um estudante negro e migrante haitiano, Jean, traz algumas contribuições. O estudante sente-se invisibilizado e passa a acreditar que quanto mais dominar o português, mais será ouvido. No entanto, diferentemente dos profissionais que têm permissão para circular livremente entre idiomas, Jean tem suas práticas de linguagem silenciadas ao ponto de esquecer que foi aprovado na avaliação pelo domínio da Língua Portuguesa. A experiência desse estudante realça as linhas abissais, definidas pela autora como “[...] divisórias invisíveis que fundamentam divisões visíveis nas sociedades” (RODRIGUES, 2021, p. 115). Tais linhas desenham o homem branco ocidental como detentor epistêmico e coloca do outro lado as demais epistemologias, impactando na forma em que o estudante negro se percebe na Universidade.

Para dialogar com essas pesquisas, é necessário trazer a ideia de Césaire (2020), pois, segundo o autor, atualmente o colonizado não vê outro destino a não ser aquele possibilitado pelo colonizador e, ao clamar por avanços, também é inibido por ele. Assim, quando a emancipação intelectual é dificultada - uma vez que só é aceitável a reformulação das mesmas epistemologias eurocêntricas -, se preserva a colonialidade no cerne constitutivo do pensamento intelectual e da construção do conhecimento. Então, a tendência é de que se torne cada vez mais difícil a identificação de opressões no âmbito intelectual, devido ao refinamento e à preponderância dos mecanismos coloniais atualizados.

Apesar desses dados, que indicam uma maior abertura à diversidade de públicos, a estrutura epistemológica predominante nas Universidades mantém-se fortemente alicerçada em bases do pensamento europeu-ocidental. Contribuindo com a discussão, Fanon (2020) discorre sobre a experiência de ser negro em um mundo de brancos: um estudante que sai da Martinica - uma colônia francesa - para estudar na Metrópole. Segundo o autor, sua experiência é marcada pela coerção constante ao branqueamento, e ele busca, então, entender seu lugar de desalojamento no mundo, já que, nesse processo, sente a perda gradativa de sua ligação ancestral, ao passo em que constantemente é lembrado de que não faz parte do mundo branco ao qual está inserido.

Tal desalojamento é ilustrado na pesquisa de Rosa e Alves (2020), ao constatarem a solidão intelectual em um lócus eurocêntrico e a autocobrança advinda das necessidades de ajustamento experienciadas por estudantes negros. Nesse sentido, a dificuldade de negros e de negras de se enxergarem no âmbito acadêmico, leva as autoras a trazerem para a discussão o conceito de “altericídio” de Achille Mbembe (2014), ou seja, a exterminação do outro, dada a incapacidade de conviver com as diferenças.

Ainda sobre a temática, Santos (2018), a partir de sua experiência como docente em uma Universidade, relata o seu contato tardio com epistemologias decoloniais e descoloniais, produzindo uma crítica ao que foi estudado durante sua formação, bem como ao que ela própria levava para a sala de aula. Assim, a autora e pesquisadora conclui que:

Não é mera coincidência desconhecermos o pensamento Ianomâmi, Guarani, Aymara mesmo sendo brasileiras/os - latino-americanas/os - e que nossas referências advindas de outros continentes sejam europeias, enquanto que os saberes alicerçados nas epistemologias africanas são, sequer, considerados científicos, mesmo sabendo da influência de povos deste continente na constituição da sociedade brasileira, esta que ainda repousa sobre o mito da democracia racial. (SANTOS, 2018, p. 8).

Desse modo, povos não-brancos, ao serem inseridos em um território que anuncia, a partir de símbolos distintos, que estes não podem fazer gozo de expressão dos próprios direitos civis, são convidados a adquirir conhecimentos de povos que não dialogam com os seus, ajustando-se a padrões eurocêntricos de construção de conhecimentos. Sendo a intelectualidade um lugar de atividade historicamente negado aos corpos negros, compreendemos, pois, a relevância de uma maior inserção destes nos espaços privilegiados de produção de saber, ao passo em que também se considera que, no Brasil, a educação se configura como o meio mais efetivo e seguro de ascensão econômica e social (CARNEIRO, 2005).

Todavia, tendo o perfil dos estudantes se alterado, já se presenciam movimentos de busca por diferenciação epistêmica, mas ainda engendrados nas velhas estruturas e nas normas que materializam privilégios e conservam hierarquias. Por fim, compreendemos que uma mera inserção quantitativa não se faz suficiente para dar conta dos silenciamentos e das violências que o abuso cultural e psicológico colonial perpetrou às mentes não-brancas.

A colonização intelectual e o desafio à diversidade inclusiva, representativa e diaspórica

Narra a mitologia do povo Dogon, tradicional etnia da região do Mali, na África Ocidental, a existência de um ser insensível e limitado, fragmentado e conflituoso, que se impunha como uma ameaça à humanidade. Nomeado “Yurugu”, este ser do caos nasceu contrariando a ordem do criador “Amma”, que determinara que todas as criaturas deveriam nascer sob o princípio da “complementaridade” ou “gemelaridade”, contendo uma alma feminina e outra masculina. A alma masculina do Yurugu, entretanto, não esperou o tempo da gestação e descolou-se apressadamente do útero. Incompleto, com sua própria placenta, em um ato de autocriação, Yurugu criou a Terra e, a partir dela, todos os seus filhos foram igualmente condenados à incompletude, carentes da harmonia e da complementaridade gerada da união de pares distintos (ANI, 1994).

É a partir dessa narrativa alegórica que Ani (1994) desenvolveu uma crítica afrocentrada acerca da natureza do que ela nomeia de Utamawazo europeu. Em outras palavras, diz respeito à estruturação do pensamento cultural que organiza o logos, matriz ideológica - ou, no termo utilizado em seu texto, o asili - europeu-ocidental. Trata-se de algo muito próximo do conceito de cosmovisão, uma maneira de ver o mundo que sustenta e modela o pensamento dos membros de uma cultura, oferecendo modos de interpretação da realidade que se manifestam em comportamentos, valores e atitudes. Nesse caminho, a autora afirma que a essência cultural, por sua vez, produz como manifestação o Utamaroho que, em síntese, seria a força vital que se posiciona como um ethos, uma tonalidade moral, estética e afetiva, que anima, orienta e motiva o comportamento coletivo de um povo.

Em outras palavras, a autora propõe-se a desnudar a substância de tal pensamento e a explorar as matrizes ideológicas que o compõem, para compreender de que modo ele se faz capaz de produzir um comportamento - ou Utamahoro - tão fortemente dominador, aniquilador e discricionário, expresso no investimento colonial/imperialista engendrado a partir do século XV, que autoriza a violência, o genocídio e a subtração simbólica perpetrados sobre povos não-brancos. Para Ani (1994), o processo de constituição desse pensamento dá-se a partir de pilares epistemológicos ancorados em princípios platônicos de dicotomização, fragmentação, materialização, objetivação e desespiritualização da realidade, impostos a partir da noção de existência de um mundo das ideias, transcendente, verdadeiro e perfeito, mais elevado que o mundo sensível, de meras representações.

Assim, a autora confronta tais fundamentos com os pilares gnosiológicos de civilizações tradicionais não-europeias, as quais, nesse sentido, ela denomina “povos majoritários”, que tendem a comungar de uma noção do “cosmos”, como uma unidade sagrada e orgânica, da qual ser humano e natureza fazem parte, se relacionam e se complementam de forma harmônica. Nesse viés, destacam-se como expressões dessa tendência as concepções de Ubuntu e Ukama, sendo - de modo extremamente reduzido em significado - sinônimos de coletividade, de alteridade e de humanidade transcendente (além do ego), de ancestralidade e de irmandade. Ambas carregam a dimensão biocêntrica do pensamento tradicional africano subsaariano, que valoriza todas as formas de vida, em oposição ao antropocentrismo ocidental, que privilegia a vida humana e sua capacidade cognoscente, como ápice da evolução da vida (NEGREIROS, 2019).

Sob tais cosmovisões, corpo e espírito ou razão e emoção não se distinguem, e há um forte caráter simbólico e metafórico na representação da experiência sensível com o mundo. Nessa direção, orientado por um pensamento afrocentrado, Fanon (2020, p. 141) é categórico ao afirmar que “a emoção é negra, como a razão é helênica”. Também Ubuntu é um pensamento abrangente, que une razão e sensibilidade, de modo que o sujeito não só enxerga o objeto, mas, ao conhecê-lo, também o sente, é afetado por ele, estando tal compreensão na contramão da filosofia ocidental, que enxerga o corpo como uma armadilha ou obstáculo para o exercício da racionalidade ou do conhecimento.

O Utamawazo europeu, ao contrário, uma vez ancorado em Platão (428 a.C.-348 a.C.), tem sua base epistemológica fortemente ideológica, centrada na “ideia” e no exercício da razão, concebendo um universo objetificado, profundamente dicotomizado, em que os símbolos viram objetos, corpo e espírito são desagregados e hierarquizados, a razão e a intelectualidade são elevadas como mecanismo de superação e de controle da natureza e dos instintos, assumindo-se a experiência sensível, emocional e corporal consideradas inferiores.

Compreendemos, assim, que é por meio do processo de desespiritualização do corpo, de dessacralização da natureza e da transformação de símbolos em objetos, que o “Utamaroho” ou ethos europeu, engendra um comportamento justificado de genocídio de povos não-brancos, permitida pela objetificação de tudo o que anteriormente era tratado como humanidade e se encontrava espiritualizado. Concomitante ao genocídio, vem o epistemicídio, o aniquilamento simbólico, cosmológico e ontológico de povos não-brancos, postos como o outro cultural, em relação à hegemonia do pensamento europeu no mundo (ANI, 1994; GROSFOGUEL, 2016).

Nessa direção, Grosfoguel (2016) informa que a filosofia cartesiana, inspirada no platonismo, concebe um dualismo ontológico que, por sua vez, inaugura uma egopolítica do conhecimento, por intermédio de um monólogo não situado e universalizante, deslocado de qualquer materialidade, superando (ou subestimando) particularidades de qualquer existência. Dessa forma, o cientificismo rompe com o império do pensamento religioso, e o universalismo idolátrico da tradição do pensamento ocidental masculino é inaugurado por Descartes em 1637, pretendendo substituir Deus e produzir um conhecimento que seja equivalente a ele.

É assim que, gradativamente, o “penso, logo existo”, se tornou o “conquisto, logo existo” ou, de modo mais ousado e agressivo, é possível pensar-se na construção do “extermino, logo existo”, uma vez que são localizados genocídios e epistemicídios que se expandem sob a autorização velada dos âmbitos social e político. Tal dominação se viabiliza, principalmente, a partir da construção da concepção de raça e do engendramento de uma retórica que desumaniza e racionaliza para objetificar essas populações. Em Grosfoguel (2016), a remoção da categoria humana, por meio da negação da presença de alma nos povos colonizados, coloca-se, pois, como o protótipo do sistema-discurso de classificação racial dos grupos humanos, até mesmo anterior ao racismo de cor.

É, pois, no cenário do colonialismo - na expressividade de uma colonialidade que persiste - de hegemonia do pensamento europeu, desespiritualizante e objetificante, que o discurso moderno promove a ruptura sob a prerrogativa teocrática do pensamento medieval, permitindo o advento do racionalismo como doutrina filosófica moderna que admite a razão como único modo válido de conhecer. Sob a lente eurocêntrica, ela representa uma saída da imaturidade irracional, rumo ao processo crítico. Assim é que, em associação ao discurso científico, a racionalidade moderna prospecta o cientificismo - como uso ideológico da ciência -, atribuindo autoridade máxima à ciência e ao método científico, em detrimento da ética religiosa como fonte de resposta para as questões do mundo (SOARES, 2003).

Nesse viés, o imperativo da razão e da objetividade consolidam um modo de pensar calcado na filosofia cartesiana, orquestrada por um dualismo ontológico que divorcia o corpo da mente, favorecendo a um solipsismo epistêmico, que somente legitima um único modo de produzir saberes e de perceber o mundo, como reflete Grosfoguel (2016). É nessa seara que as Universidades, na qualidade de égide do conhecimento científico, começam a se desenhar.

Segundo Fanon (2020), um processo de colonização só é eficaz se o povo colonizado sente a necessidade de ser dominado. Na medida em que se opera o domínio de saberes e de elementos culturais e cosmológicos, pondo em dúvida a capacidade de pensar, analisar e compreender o mundo a partir de referenciais que não sejam os do algoz, se gera um complexo de dependência e de necessidade tutelar, que limita as possibilidades de pensar por si e assumir a centralidade de organização de qualquer reação à opressão. Nessa perspectiva, Ani (1994) reitera:

O segredo que os Europeus descobriram cedo em sua história é que a cultura traz regras para o pensamento, e que se você puder impor a sua cultura em suas vítimas, você pode limitar a criatividade de sua visão, destruindo sua capacidade para agir com vontade e intenção e em seu próprio interesse. A verdade é que nós todos somos “intelectuais”, todos visionários potenciais. (ANI, 1994, p. 1).

Nesse sentido, somente a descolonização intelectual permitiria a descolonização política, pois a dominação do pensamento, pela cultura, é muito mais eficaz que qualquer estratégia bélica de captura. Para Carneiro (2005), o epistemicídio é um processo, sobretudo, de produção de indigência cultural, na medida em que desqualifica as formas de conhecer dos povos subalternizados, depreciando seus sujeitos, individual e coletivamente, enquanto seres cognoscentes e racionais. A dominação torna-se, assim, mais efetiva e durável que qualquer imposição bélica, ao passo que não somente se subjuga física e materialmente os povos racializados, mas os fragiliza e desarticula sua identidade cultural coletiva.

É nessa direção que Hooks (1995) defende a atividade intelectual como um instrumento importante de luta e denuncia as limitações para o exercício de uma intelectualidade calcada na experiência, no âmbito acadêmico. Na qualidade de uma intelectual negra, em muitos de seus escritos ela se preocupou com a situação dos intelectuais comprometidos com a transformação social, na medida em que, para ela, mesmo nos espaços progressistas, o trabalho intelectual não é comumente visto como uma forma de ativismo. Tal como Carneiro (2005), ela aponta a busca por mobilidade social e elevação da raça como principais razões que fazem negros escolherem dedicar-se à atividade intelectual, embora muitos se mantenham distantes por acreditar que esta em nada se conecta com a experiência de sua vida cotidiana.

A partir do exposto, argumentamos ser a Universidade - como lócus privilegiado de uso e divulgação de um saber eurocentrado - um espaço diaspórico para estudantes negros que limita uma expressividade intelectual apropriada, apesar de um aumento quantitativo da presença desses corpos nesses espaços, em virtude, sobremaneira, das políticas afirmativas étnico-raciais mencionadas. Utilizamos a concepção de “efeito diáspora”, introduzida por Veiga (2019, p. 246), a fim de refletir a experiência do estudante negro na Academia e as reverberações desse trânsito em sua consciência ontológica, como ser negro, e em sua autoestima, como sujeito cognoscente. O termo expressa a sensação de não pertencimento, da ausência de mecanismos de acolhimento e de inclusão, e equanimidade em relação aos demais, experienciada pelo sujeito negro em uma sociedade ocidentalizada, forjada pela aberração colonial, que promove o branqueamento estético e ontológico como meta.

Nesse sentido, Fanon (2020) narra os artifícios utilizados pelos negros martinicanos em busca de embranquecer-se, justamente em vistas de alcançar certa passabilidade em meio aos brancos, sendo esses artifícios principalmente ligados à assimilação da linguagem. O autor observa que

[...] todo povo colonizado - isto é, todo povo em cujo seio se originou um complexo de inferioridade em decorrência do sepultamento da originalidade cultural local - se vê confrontado com a linguagem da nação civilizadora, quer dizer, da cultura metropolitana. O colonizado tanto mais se evadirá da própria selva quanto mais adotar os valores culturais da metrópole. Tão mais branco será quanto mais rejeitar sua escuridão, sua selva. (FANON, 2020, p. 32).

Apesar de seu investimento em formular um pensamento complexo, embasado em um vasto aporte, inclusive de pensadores ocidentais, em adotar uma linguagem rebuscada e culta, no idioma francês e, também, referenciais brancos para tratar de sua experiência, tudo isso não foi suficiente para a inclusão social de Fanon ou para sua passabilidade acadêmica em seu doutoramento, tendo sua tese de Doutorado rejeitada pela comunidade científica, sob o argumento de não enquadramento nas exigências positivistas da época. Nessa direção, Hooks (1995, p. 472) alerta: “[...] mesmo que escrevamos pelas linhas do estilo acadêmico aceito, não há nenhuma garantia de que vão respeitar nosso trabalho”.

Para Carneiro (2005), o processo de inferiorização da intelectualidade de sujeitos negros na diáspora brasileira vem desde a base, a partir da negação do acesso à educação primária de qualidade e a espaços de produção cultural, além das condições macroestruturais que reverberam na evasão - ou expulsão - escolar. Negam-se ou reduzem-se ferramentas e condições de desenvolvimento intelectual, ao passo que, perversamente, se reforça a incapacidade e a ideia de que a intelectualidade não é uma instância que caiba às existências negras. Reforça-se essa condição, na medida em que são ocultadas possibilidades de acesso à história do povo negro e do continente africano, sob outras perspectivas históricas, que não pautem exclusivamente no processo de escravização, bem como que visibilizem as inúmeras contribuições do povo negro à filosofia, às ciências, às artes e aos mais diversos âmbitos da produção humana.

Em oposição a tal conjuntura, ressalta-se a contribuição de iniciativas legislativas voltadas para o ensino escolar, em especial à Lei Nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que altera a Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, determinando a inclusão de história e cultura afro-brasileira nas diretrizes e bases da educação nacional, estabelecendo a obrigatoriedade do ensino da temática (BRASIL, 2003). Todavia, não se desconsidera a dificuldade de garantia do exercício da lei, ao passo que, para além de determinações legais, faz-se fundamental a ampliação e a complexificação do debate racial nas mais diversas esferas sociais, bem como a garantia também de uma revisão crítica nas bases formativas dos cursos de Licenciatura que habilitem e instrumentalizem os professores, a fim de que legitimem e salvaguardem o cumprimento da lei em suas salas de aula.

Ademais, como apontam Barzano, Sampaio e Melo (2022), a inserção desses conteúdos não pode ser uma mera formalidade, mas deve promover justiça cognitiva/social, incentivando transformações subjetivas a crianças e a jovens negros. Assim, a partir de uma perspectiva pedagógica que considere elementos subjetivos que se entrelaçam no processo compartilhado do fazer escolar e em articulação com especificidades dos territórios onde estão situadas as escolas e com as narrativas e as experiências dos estudantes e de suas comunidades, o encontro com o passado por meio do ensino de história pode possibilitar a projeção de um futuro antirracista possível.

Na ausência do contato com perspectivas pedagógicas antirracistas e com educadores muitas vezes omissos diante de opressões cotidianas, as realidades escolar e universitária mantêm-se hostil e produtoras de processos de auto ódio, sendo a insegurança intelectual uma realidade que acompanha estudantes negros. É sob esse selo de incapacidade cognoscente que o corpo-existência negro se insere no âmbito acadêmico, de modo subordinadamente integrado, e uma vez “aceito”, para manter-se nele, aceitam-se as regras do jogo, ficando a sobrevivência cognitiva e intelectual do dominado à mercê dos parâmetros da epistemologia ocidental.

Diversidade epistemológica e afrocentricidade como estratégias de reconhecimento ontológico

Figueiredo (2020) revela que, diante do cientificismo, as escritas que busquem driblar essa dinâmica de dependência, reivindicando um saber situado e corporificado, pautadas na apropriação da experiência, em oposição ao universalismo ocidental, são frequentemente desautorizadas sob o rótulo do senso comum, indicadas como menos científicas ou como militantes, ao passo que apostam nas epistemologias insubmissas feministas negras como caminho possível para driblar o crivo epismeticida do cientificismo colonial.

Na direção das epistemologias insubmissas, apontamos as escrevivências como aportes metodológicos e pedagógicos na Academia, pois, para Soares e Machado (2017), elas podem emergir como uma possibilidade de instrumentalização de pensadores negros também para a construção de um conhecimento situado e corporificado, permitindo a afirmação de uma produção que transpõe estereótipos, encarceramentos linguísticos e/ou epistêmicos. A proposta de escrevivência é cunhada pela escritora e poeta brasileira Conceição Evaristo, sendo compreendida por ela como “[...] experimento em construir um texto ficcional con(fundindo) escrita e vida, ou, melhor dizendo, escrita e vivência” (EVARISTO, 2013, p. 11). Então, a partir de uma via de mão dupla, a vida escreve a vivência em cada um, e cada um escreve o mundo em que vive.

Segundo Soares e Machado (2017), a escrevivência como ferramenta metodológica se articula no encontro de três elementos - corpo, condição, experiência - e se constitui como uma dentre inúmeras insurgências que corroboram para a desconstrução do universalismo epistêmico no meio acadêmico. Assim, essa proposta de escrita também pode conferir maior liberdade às escritas vivenciais, devolvendo a voz aos sujeitos subalternizados e tomando as experiências marginais que se costuram no cotidiano, sendo este um substrato de saberes transgeracionais.

Dessa forma, consideramos que a ciência é composta por narrativas ficcionais, já que os dados concretos de realidade não escapam à manipulação e à imaginação dos autores que os contextualizam. É assim que a utilização desse método pretende romper com a neutralidade e situar o local onde o conhecimento é produzido, explicitando a parcialidade na produção de todo conhecimento. Por parcialidade, não entendemos insuficiência, mas dialogicidade, já que, ao não se impor como verdade, mas trazer como princípio fundamental as limitações, é aberto um espaço para que a construção do conhecimento seja feita coletivamente.

Nessa direção, refletimos que a escrita de Fanon também se tratava de um manifesto de sua experiência, uma insubmissão epistêmica que reivindicava um lugar de sujeito, e não mais de objeto para si, visto que ele observa que “[...] aquilo que é chamado de alma negra é uma construção do branco” (FANON, 2020, p. 28). Desse modo, é importante pensarmos na reconstrução de uma consciência negra imanente a si própria, opondo-se à dependência, complexo de inferioridade e de necessidade de legitimação do ser negro pelo branco, a partir da recontação da história do povo preto e do estreitamento da relação com valores, saberes, ideologias, éticas e estéticas ocidentais e de reafirmação da prosperidade intelectual e filosófica ancestral africana, usurpada pelo colonialismo.

Inspirado no Sankofa - símbolo Adinkra que representa a sabedoria de aprender com o passado para construir o presente e o futuro - Nobles (2009) traz a reflexão de que é preciso voltar atrás e reconstruir o que se esqueceu, para compor novos significados para o sentimento de ser africano diaspórico, em um mundo pós-colonização. Destacando a relevância do resgate de preceitos, valores e conceitos que constituem a cosmovisão africana, ele aponta caminhos para a elaboração da experiência diaspórica e a libertação dos aprisionamentos mentais por meio do resgate de compreensões ancestrais, por intermédio da reconexão do orí (cabeça). Ele considera que a escravização e seus desdobramentos, operam um descarrilamento cultural no desenvolvimento africano, em termos de socialização, educação, pensamento filosófico e educação técnico-científica, na medida em que usa esse termo como menção à metáfora de um trem, que mesmo fora dos trilhos continua a se mover, ainda que desestabilizado.

É na tentativa de novamente encarrilhar o trem que insurgências negras vêm surgindo no âmbito acadêmico, a fim de resgatar referenciais ancestrais para pensar temáticas ligadas à experiência da diáspora africana em diversas partes do globo, em especial nas Américas. Para Asante (2016), importante compiladora do ideal afrocentrado na Academia, esse retorno tem sido o investimento de muitos pensadores afrocêntricos, que têm reivindicado, no campo das Ciências Humanas, um giro histórico e conceitual que permita reposicionar a história da África e de suas produções no mundo, na medida em que compreendem que interrogar fenômenos a partir de perspectivas filosóficas africanas poderá gerar novas informações, inflexões e revisões de padrões de comportamento.

Assim, a afrocentricidade é uma postura de afirmação de pensadores africanos em diáspora, e de negação da marginalidade e da noção de alteridade que privilegia a cosmovisão europeia como normativa e universal. Como atitude contra hegemônica, a afrocentricidade não tem o interesse de elevar a si própria como paradigma único, ou de exercer dominação cultural, mas de justamente pensar a abertura para a diversidade epistêmica e para a demarcação de outros centros à órbita do saber. Consequentemente, propõe-se um caminho para a maturidade intelectual na Academia, a fim de visibilização de conhecimentos através de outras lentes, incentivando a comunicação humana a partir de diferentes vozes (ASANTE, 2016).

À proporção que se aponta a inserção de paradigmas não-ocidentais em nossas grades curriculares como possibilidade de exercitar a diversidade epistêmica, iniciativas de superação da hegemonia do paradigma colonial coadunam-se como caminho possível para a efetivação do projeto trans-moderno - de superação da modernidade - como um movimento de passagem da uni-versidade para uma pluri-versidade, tal como proposto por Dussel (2005). Para o autor, esse movimento realiza-se por uma mútua fecundidade criadora entre a Modernidade e sua Alteridade negada. Não se pode apagar a história, mas se pode contá-la, desconstruindo o caráter mítico da intencionalidade salvadora do pensamento moderno.

Por fim, mas não menos importante, evocam-se as proposições do Quilombismo (NASCIMENTO, 2019) como um manifesto de auto-organização e autoemancipação do povo preto, e método de compreensão e análise da experiência de construção de estratégias e táticas de sobrevivência física e ontológica da comunidade de origem africana. Também, partindo da compreensão de que o desejo por legítima libertação vive em cada mente negra, compactuam-se desde o incentivo aos diálogos entre diferentes saberes até o estímulo à potência da criação de espaços de articulação e debates exclusivos para pessoas negras, propondo-se o aquilombamento como prática acadêmica de assocativismo e cooperativismo entre intelectuais negros. Tal colocação não vem, pois, como reforçamento da segregação desse corpo de pensadores nesses espaços, mas como apontamento para possibilidades de produção de cuidado e de fortalecimento mútuo diante da necessidade de enfrentamentos e da elaboração da experiência diaspórica na Academia.

Para Veiga (2019), espaços necessariamente pretos apresentam mais possibilidades de acolhimento do sofrimento e angústia exclusivamente negras, uma vez que as marcas da violência racial possuem especificidades que somente sujeitos pretos poderiam entender. Em Nobles (2009) também vemos que não se pode desconsiderar que a experiência psicológica de africanos em diáspora se dá a partir de uma particular experiência histórica, sendo por ela determinada. De um ponto de vista centrado em uma cosmovisão africana, a subjetividade é, desse modo, uma dimensão que se constitui a partir de noções de coletividade e de comunidade.

Em Akbar (1975), inclusive, a noção de self ou pessoa é compreendida sob a óptica do coletivo, que considera a singularidade de cada um, mas a enxerga inserida em uma coletividade. Após o processo de diáspora, para o autor, a experiência do Self negro (Black Self) está vinculada à experiência coletiva da opressão racial, algo que deve ser curado a partir da compreensão e do resgate do que significa ser africano, mesmo que em diáspora. Essa noção de coletividade, que transcende o ego individual, faz-se presente na filosofia Ubuntu, como já visto. Junto à Somé (2009), analisamos, ainda, que a ausência da comunidade fragiliza a psique e estagna os dons de pessoas brilhantes, uma vez que a comunidade existe para que os sujeitos sejam ouvidos e possam contribuir com seus dons e saberes.

O resgate de uma consciência própria, a partir da construção de espaços de cuidado e fortalecimento mútuo, bem como de produção e de divulgação de conhecimentos a partir de referenciais igualmente próprios, permite a estudantes e professores negros reivindicarem seu lugar de sujeito epistêmico e libertar-se da necessidade do uso de máscaras brancas para garantir sua passabilidade em espaços de atividade pensante, se assim for seu desejo.

Nesse sentido, compreendemos que o resgate da humanidade de pessoas negras a partir da valorização de sua atividade intelectual e a abertura para outras lentes compreensivas dos fenômenos humanos, além de permitir a esses intelectuais a possibilidade de pertencimento, de identificação e de elaboração de sua experiência também diaspórica na própria Universidade, corroboram, ademais, para a construção de outros caminhos possíveis na direção de novos pensamentos e paradigmas civilizatórios para a humanidade.

Reflexões finais ou uma esperança de novos começos

No presente artigo, propomos um olhar sobre o processo de formação das bases epistemológicas do conhecimento científico fomentado e divulgado tradicionalmente pela Academia, e que se afirma como égide do conhecimento socialmente validado. Para isso, traçamos um apanhado acerca da inserção das populações não brancas, especialmente da população negra, nas Universidades públicas, após a implementação de políticas afirmativas e de incentivo do acesso ao Ensino Superior voltada a essa camada majoritária da população.

Nesse sentido, devido à mudança de seu alunado, emerge a necessidade de que Universidades reorganizem estrutura, ementas, métodos e bibliografias de referência, a fim de estimular a abertura às epistemologias que vem sendo negligenciadas. Nesse âmbito, cargos de gestão e docência também devem ser alvo de revisões e de políticas públicas, visando à apropriação de minorias nesses espaços de/em transformação. Assim, a partir de deslocamentos estruturais dos métodos de ensino e de aprendizagem, e seus referenciais, talvez o projeto de colonização seja pausado e o colonizado não mais precisará pedir licença ao colonizador para avançar, pois será protagonista de tal avanço, projetando rotas em direção ao sul pluriversal.

A partir disso, ventilam-se possibilidades na direção de uma experiência menos desalojante para estudantes (e professores) negras e negros na instituição acadêmica que, como delineado, se constitui historicamente como uma ferramenta em que predominam epistemologias eurocêntricas. Portanto, reafirmamos a importância de que se possibilitem, aos acadêmicos negros, mais condições de reconhecimento ontológico do ser negro na diáspora acadêmica, reverberando na produção de um conhecimento e escrita mais emancipados, em sintonia com demandas de suas especificidades, de negação do solipsismo epistêmico, por intermédio da reivindicação de um conhecimento situado e corporificado.

Para construirmos caminhos à frente, como pássaro Sankofa, pensadores afrocêntricos apontam ser preciso voltarmo-nos para trás e esticarmos os ouvidos para que possamos captar o canto ancestral assobiado pelos ventos que ventilam as mentes de pensadores negras e negros na Academia hoje. Canto este, que o delírio colonizador julgou, erroneamente, ser capaz de silenciar. Desejamos, pois, requisitar a complementaridade ou empreender a “des-yuruguzação” - em referência ética, estética e política ao mito Dogon - das nossas formas de conhecer, e esse investimento passa invariavelmente por um resgate dos saberes negados, negligenciados e subalternizados pelo imperativo colonial que, afinal, persiste.

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Recebido: 10 de Agosto de 2021; Revisado: 25 de Junho de 2022; Aceito: 26 de Junho de 2022; Publicado: 07 de Julho de 2022

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