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Jornal de Políticas Educacionais

versão On-line ISSN 1981-1969

J. Pol. Educ-s vol.16  Curitiba  2022  Epub 30-Maio-2023

https://doi.org/10.5380/jpe.v16i0.83313 

Artigos

A Reforma do Ensino Médio e os possíveis impactos no Instituto Federal do Paraná

High School Reform and the possible impacts on the Federal Institute of Paraná

Reforma de la Educación Secundaria y posibles impactos en el Instituto Federal de Paraná

Bianca Gomes de Souza1 
http://orcid.org/0000-0002-0607-0152

Sandra Regina de Oliveira Garcia2 
http://orcid.org/0000-0002-6684-181X

1Estudante de Pedagogia na Universidade Estadual de Londrina (UEL). Londrina, PR. Brasil. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-0607-0152. E-mail: biancasouzag@outlook.com

2Doutora em Educação. Professora da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Londrina, PR. Brasil. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-6684-181X. E-mail: sandragarcia@uel.br>


Resumo

O artigo analisa a Reforma do Ensino Médio (Lei 13.145/17) buscando compreender os possíveis impactos na educação brasileira, especificamente no Instituto Federal do Paraná (IFPR), apontando as divergências entre a lei 13.425/17 e os documentos em vigor que regem o Ensino Médio nessa instituição. Por meio de análise bibliográfica e pesquisa documental, buscou-se subsídio teórico em pesquisas que tratam do Ensino Médio no Brasil em análises já realizadas da lei e em leis e documentos produzidos em nível nacional e estadual acerca do Novo Ensino Médio. Destaca-se que até o momento não houve efetivação da reforma no IFPR, mas que há movimentos de resistência sendo manifestados. Evidencia-se que a reforma fragmenta a educação e se distancia da formação contextualizada que concilia conhecimentos técnicos e científicos, contradizendo a identidade dos Institutos, cujo principal objetivo é a formação integral.

Palavras-chave: Ensino Médio; Lei 13.145/17; Instituto Federal do Paraná; Educação Profissional

Abstract

The article examines the High School Reform (Law 13.145/17) seeking to understand the possible impacts on the Brazilian education, specifically on the Federal Institute of Paraná (IFPR), pointing out the divergences between the Law 13.425/17 and the existing documents, which establish the functions of the High School at this institution. Through bibliographic analysis and documentary research, the theoretical framework was found in researches, which investigate High School Education in Brazil, in studies already carried out about the aw, in other aws and in documents published nationwide and statewide about the New High School. It is noteworthy that, so far. this reform has not taken place at IFPR and there are resistance movements gaining strength against it. It is evident that the reform negatively impacts education and distances it from contextual learning,which reconciles technical and scientific knowledge, contradicting the Institute’s identity, which the main objective is integrative learning.

Keywords: High School; Law 13.145/17; Federal Institute of Paraná; Professional Education

Resumen

El artículo analiza la Reforma de la Educación Secundaria (Ley 13.145/17) buscando comprender los posibles impactos en la educación brasileña, específicamente en el Instituto Federal de Paraná (IFPR), señalando las divergencias entre la Ley 13.425/17 y los documentos vigentes. que gobiernan la escuela secundaria en esta institución. A través del análisis bibliográfico y la investigación documental, se buscó apoyo teórico en investigaciones sobre la Educación Secundaria en Brasil, en análisis ya realizados sobre la ley y en leyes y documentos producidos a nivel nacional y estatal sobre la Nueva Escuela Secundaria. Es de destacar que hasta el momento no ha habido una reforma efectiva en el IFPR, pero sí se están manifestando movimientos de resistencia. Es evidente que la reforma fragmenta la educación y se aleja de una formación contextualizada que concilia conocimientos técnicos y científicos, contradiciendo la identidad de los Institutos, cuyo principal objetivo es la formación integral.

Palabras Clave: Educación Secundaria; Ley 13.145/17; Instituto Federal de Paraná; Educación Profesional

Introdução

O Ensino Médio (EM) tem sido o foco, nas últimas décadas, de grandes disputas, constituindo-se com uma dualidade histórica, ora voltado à continuação dos estudos e ora voltado à preparação de mão de obra para o mercado de trabalho. Sob essa perspectiva, os idealizadores da Lei nº 13.415/17 apontam a crise do Ensino Médio como grande fator para a consolidação da reforma. Moll e Garcia (2020, p. 7-8) entendem essa crise como a “explicitação da ausência histórica dessa etapa educativa como possibilidade de todos, agravada por uma profunda perda de sentido identitário e pedagógico da instituição escolar”, acentuada pelo entendimento de que essa etapa é somente a preparação para a entrada na universidade e pela oferta de uma profissionalização vazia de formação humana integral.

A crise do Ensino Médio é consequência das diversas influências que o neoliberalismo vem exercendo na educação nas últimas décadas, principalmente após os anos 1990, desempenhando interferências diretas sobre a educação brasileira. Enquanto teoria de orientação para o Estado, o neoliberalismo se constitui como uma ideologia fortemente disseminada ao longo do século XIX, que valoriza ideais de direitos no âmbito individual, mercado livre, livre comércio e direito à propriedade privada, influenciando instituições jurídicas, religiosas e educacionais (EISENBACH NETO; CAMPOS, 2017).

A educação sempre se configurou como um campo de disputas ideológicas, gerando conflitos no que se refere às políticas públicas e aos programas adotados nos diferentes contextos sociais nas últimas décadas. Constata-se que o EM no Brasil tem passado por diversas transformações que demonstram o embate nesse campo, como a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) em 1996; mudança do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (FUNDEF) para o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), com a promessa de garantir a universalização do Ensino Médio (Lei Nº 11.494/2007); Lançamento do Plano de Ações Articuladas pelo Ministério da Educação (MEC); e o entendimento de que o EM é parte da Educação Básica.

Conforme apontado por Hernandes (2019, p. 4), o Brasil conta com a participação importante de intelectuais orgânicos de direita, ligados à classe dominante e ao empresariado, que influenciam “na formulação, na orientação e na elaboração de prescrições de um ‘quase ensurdecedor pensamento’ único dito neoliberal”. Desse modo, o neoliberalismo atua no Brasil exercendo seu poder na educação por meio de organizações empresariais que financiam pesquisas, fóruns, produzem marketing e preparam o caminho para a elaboração e implantação de alterações que visam o mercado: “Itaú [Unibanco], Bradesco, Santander, Gerdau, Natura, Volkswagen, entre outras — além de Fundação Victor Civita, Fundação Roberto Marinho, Fundação Lemann, CENPEC, Todos pela Educação, Amigos da Escola.” (MACEDO, 2014, p. 1540).

A mudança mais recente foi a Reforma do Ensino Médio, que alterou essa etapa da educação básica por Medida Provisória (MP). A ação do governo federal, por meio da aprovação da MP nº 746/2016 (que posteriormente foi consolidada com a Lei nº 13.415/2017), foi realizada em caráter de urgência e entre muita resistência, pois professores entendiam a lei como um “atropelamento” do Plano Nacional de Educação 2014–2024 e de todo o debate acerca da elaboração de metas e de políticas públicas em relação à educação brasileira (COSTA; SILVA, 2019).

Na Exposição de Motivos para a apresentação da MP nº 746/16, é apontado como objetivo da reforma “dispor sobre a organização dos currículos do ensino médio, ampliar progressivamente a jornada escolar deste nível de ensino e criar a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral” (BRASIL, 2016, s.p.). Essas justificativas confirmam o que Moll e Garcia (2020) já apontavam como as “previsíveis” soluções para esta etapa da Educação Básica.

Ainda na justificativa, é constatado que a intenção da MP era organizar o currículo e ampliar gradativamente a jornada escolar, propondo a criação de uma Política de Fomento à implantação de escolas em tempo integral com o objetivo de adequar o EM à qualidade do Ensino dos outros 20 países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). No entanto, para Hernandes (2020), tal justificativa desconsidera que esses países possuem elevados investimentos no campo da Educação, além de possuírem maior Produto Interno Bruto (PIB) e Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

Como constatado, o ponto central da reforma foi criar um currículo nacional para o EM tendo como pano de fundo a implantação da escola em tempo integral, além do aumento da carga horária e alteração curricular com a criação dos itinerários formativos. Essas alterações, para Kuenzer (2020), apontam para um aligeiramento da formação, o que contradiz uma proposta de formação integral. Nesse sentido, o conteúdo do EM, sobretudo em instituições públicas, será minimizado com a organização do currículo por áreas de conhecimentos, no qual o estudante terá que definir por um dos itinerários. Uma vez que fica a critério da mantenedora a indicação dos itinerários que cada escola poderá oferecer, essa “escolha” a ser realizada pelo discente, na prática, dependerá de outros fatores.

Os Institutos Federais seguem um modelo de EM distinto do empregado na maioria das instituições públicas que oferecem essa etapa da educação básica devido a sua autonomia didático-pedagógica e por oferecerem cursos técnicos integrados. Isso pode se constituir em espaço de resistência e ressignificação do proposto na lei que alterou a LDB 9394/96, uma vez que pode impactar diferentemente essas instituições, que obrigatoriamente ofertam o Ensino Médio integrado à Educação Profissional, um dos itinerários formativos propostos pela reforma.

Dadas as considerações, a pesquisa buscou compreender como a Reforma do Ensino Médio, concretizada pela lei 13.415/2017, pode impactar a formação dos jovens, tendo como recorte o Instituto Federal de Educação Profissional e Tecnológica do Paraná (IFPR). Para isso, utilizou-se da pesquisa documental (GIL, 2008), que se baseia na análise de materiais que ainda não receberam um tratamento analítico, como a legislação aprovada no Congresso Nacional que alterou a LDB, documentos do Conselho Nacional de Educação que normatizam a referida lei e documentos orientadores do Ministério da Educação, e da análise bibliográfica (GIL, 2008), que consiste na pesquisa realizada a partir de um material elaborado previamente, como livros e artigos científicos que tratam tanto do EM no Brasil como análises já realizadas da Lei 13.415/2017.

Para fins de inclusão e exclusão dos artigos selecionados, foram considerados somente artigos em português publicados no período entre 2015 e outubro de 2020 na base de dados Scientific electronic library online (Scielo) com as palavras-chave “reforma ensino médio” ou “lei 13.415”. Dentre os 45 artigos encontrados, 14 foram descartados após a leitura dos resumos, 11 descartados por aparecerem de forma replicada nas duas buscas, e 20 selecionados para a leitura completa, fichamento e análise. Foi também realizada uma busca, na mesma base de dados e considerando os mesmos critérios, com as palavras-chave “Instituto Federal lei 13.415”; “Instituto Federal reforma ensino médio” e “Instituto Federal MP 746”, não sendo encontrados resultados em nenhuma dessas buscas.

A origem da Lei nº 13.415/17 e a Reforma do Ensino Médio

A Lei nº 13.415/17 se originou do Projeto de Lei (PL) nº 6840/13, proposto por uma Comissão formada por deputados federais no Congresso Nacional. A comissão foi composta por deputados de diversas siglas partidárias que começaram o processo de discussão em 2011, durante o primeiro mandato de Dilma Rousseff, paralelamente à aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio, do Parecer nº 05/2011 da Câmara de Educação Básica (CEB) do Conselho Nacional de Educação (CNE) e da Resolução nº 02/2012, homologada pelo Ministério da Educação em 2012. O PL já apontava o mesmo diagnóstico do EM brasileiro, apresentado na Medida Provisória nº 746/16, assim como a formação por itinerários formativos.

O Movimento Nacional em defesa do Ensino Médio, criado em 2014, constituído por diversas instituições de representação nacional, dentre elas a Associação Nacional de Pesquisa e Educação (ANPED) e a Confederação Nacional de Trabalhadores em Educação (CNTE), realizou uma intensa discussão com o relator do PL, que culminou na apresentação de um substitutivo. O substitutivo foi apresentado no período do processo eleitoral de 2014, o que levou ao engavetamento do PL, uma vez que passou a não ser mais um projeto de consenso na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados. No entanto, o Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED) continuou o processo de discussão com um grupo de consultores contratados, dentre eles a profª Maria Helena Guimarães Castro, que após o impeachment da presidente Dilma Rousseff, passou a fazer parte do governo de Michel Temer assumindo a Secretaria Executiva do MEC.

Isso propiciou que logo após assumirem o MEC fosse apresentada a MP 746/16 que, por ser medida provisória, passou a ter validade imediata. Apesar de produzir efeitos imediatos, precisou da posterior apreciação para se converter definitivamente em lei. Paralelamente, foi apresentada a Emenda Constitucional nº 95, que congelava os gastos públicos por vinte anos, limitando o investimento em diversas áreas sociais, entre elas a educação.

Garcia e Czernisz (2017, p. 570) afirmam que as redefinições curriculares do EM “têm sido realizadas em momentos bastante estratégicos para direcionamento da sociedade brasileira, explicitando os interesses governamentais acoplados aos intentos de perpetuação capitalista”. Os argumentos apresentados dizem respeito à quantidade de disciplinas no currículo que, conforme os proponentes, no caso o governo federal, não traria benefícios para os jovens que precisam definir sua carreira profissional com mais liberdade. Segundo as autoras, essas afirmativas dão a entender que havia um engessamento curricular, impossibilitando a inserção dos jovens no mercado de trabalho.

Outros argumentos apontados para a justificativa da reforma estão presentes na Exposição de Motivos para a apresentação da MP nº 746/16. O texto aponta como problemas do ensino médio atual o desempenho insatisfatório em avaliações internacionais e o número elevado de jovens fora da escola, afirmando que a função social deste nível de ensino, prevista no artigo 35 da LDB nº9394/96, não atingiu os resultados previstos:

Isso é reflexo de um modelo prejudicial que não favorece a aprendizagem e induz os estudantes a não desenvolverem suas habilidades e competências, pois são forçados a cursar, no mínimo, treze disciplinas obrigatórias que não são alinhadas ao mundo do trabalho, situação esta que, aliada a diversas outras medidas, esta proposta visa corrigir, sendo notória, portanto, a relevância da alteração legislativa. (BRASIL, 2016, s.p.).

O texto afirma, ainda, que o currículo do ensino médio é extenso, superficial e fragmentado, de modo que não há diálogo com a juventude, com o setor produtivo e com as demandas do século XXI. Dessa forma, é proposto que parte das treze disciplinas obrigatórias sejam dispensadas, afirmando, sem fontes, que o Brasil é o único país do mundo com somente um modelo de EM, sob o argumento de que “os jovens de baixa renda não veem sentido no que a escola ensina” (BRASIL, 2016, s.p.). Essa ação regulamenta uma fragmentação da escola ainda mais acentuada ao invés de propor soluções que conciliem o currículo com a realidade dos estudantes.

Ferretti e Silva (2017) indicam que o principal foco da reforma está centrado no currículo. A respeito disso, a primeira ação de intervenção da lei foi a instituição da obrigatoriedade apenas das disciplinas de português, matemática e inglês em todos os anos, estabelecendo que as disciplinas de Sociologia, Filosofia, Artes e Educação Física podem ou não ser ofertadas como disciplinas ou estudos e práticas, desvalorizando os componentes curriculares e colocando-as junto com todas as outras num limbo.

A lei prevê também a ampliação da carga horária do EM, que atualmente é de 800 horas anuais, para 1000 horas anuais em um prazo de cinco anos, a partir de março de 2017. Progressivamente, deve-se ampliar até se tornarem escolas em tempo integral, com carga horária de 1400 horas anuais. Entretanto, uma vez que o tempo da progressividade da ampliação da carga horária não foi definido, “a Lei nº 13.415 (BRASIL, 2017) abre a possibilidade de estabelecer um tempo longo, progressivo, indeterminado, para sua efetivação na prática, que, no entanto, pode nunca se concretizar” (HERNANDES, 2020, p. 582).

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do Ensino Médio, documento que rege essa etapa da educação, foi aprovada abruptamente em 8 de novembro de 2018, no Conselho Nacional de Educação, após ter sido interrompida em razão da MP nº 746. Esse documento explicita como deve ser organizado o currículo do EM, definindo direitos e objetivos de aprendizagem em quatro áreas do conhecimento: I - linguagens e suas tecnologias; II - matemática e suas tecnologias; III - ciências da natureza e suas tecnologias; e IV - ciências humanas e suas tecnologias (BRASIL, 2017).

Além do currículo organizado por áreas de conhecimento, no caso do Ensino Médio deverá conter itinerários formativos, organizados em diferentes arranjos curriculares, conforme a relevância para o contexto local e possibilidades dos sistemas de ensino, compreendendo: I - linguagens e suas tecnologias; II - matemática e suas tecnologias; III - ciências da natureza e suas tecnologias; IV - ciências humanas e sociais aplicadas; V - formação técnica e profissional (BRASIL, 2017). Esses itinerários devem organizar-se a partir de quatro eixos estruturantes: Investigação Científica, Processos Criativos, Mediação e Intervenção Sociocultural e Empreendedorismo (BRASIL, 2018). Os currículos deverão, ainda, considerar “a formação integral do aluno, de maneira a adotar um trabalho voltado para a construção de seu projeto de vida e para sua formação nos aspectos físicos, cognitivos e socioemocionais” (BRASIL, 2017, s.p.).

Os idealizadores da reforma apontam a crise do EM como o grande fator para se criar o que denominam de Novo Ensino Médio, objetivando flexibilizar essa etapa de ensino. Para Kuenzer (2020, p. 58), essa flexibilização tem o sentido de superficialidade e simplificação, afastando-se da possibilidade de uma educação integral:

a carga horária destinada à formação geral fica reduzida a 1800 horas no máximo, com apenas dois componentes curriculares obrigatórios em todo o percurso: língua portuguesa e matemática; os demais componentes curriculares têm carga horária reduzida, contradizendo a proposta de educação integral, eixo das DCNEM/2012.

A flexibilização também pode significar redução de custos, uma vez que a oferta de todos os itinerários não é obrigatória, tornando dispensável um professor para todas as áreas que não as duas obrigatórias (matemática e língua portuguesa). Hernandes (2020) aponta que essa não obrigatoriedade de todos os itinerários está em desacordo com os artigos 206 e 211 da Constituição Federal, que determinam o princípio da igualdade na oferta e manutenção de padrão de qualidade de ensino.

Outros pontos a serem destacados referem-se à possibilidade de convênios com instituições privadas para oferecerem formação técnica e profissional de modo presencial ou à distância; o conceito de “notório saber” e a retomada de competências e habilidades, simplificando os conhecimentos ao saber fazer, ao presentismo e ao praticismo. Essas alterações, segundo Kuenzer (2017), resultam na fragilização e minimização da formação do estudante, que deveria ter o direito de receber uma formação integral e de qualidade.

Para Moll e Garcia (2020), não existe saída simples, apenas o enxugamento de disciplinas ou de uma customização, oferecendo um novo “cardápio”, não poderá resolver os problemas da educação brasileira, ou especificamente do EM. Para as autoras, é preciso muito mais do que mudanças curriculares ou o aumento do tempo do jovem na escola:

As respostas exigem, também, disposição para mudanças – não meras “reformas”, tão conhecidas e mal-fadadas – mas implicam diálogo entre professores, gestores, funcionários, estudantes, pais e reinvenção das escolas como efetivas comunidades de convivência onde cada um e todos podem dizer a sua palavra e, dizendo-as possam construir novos conhecimentos, habilidades, experiências que permitam uma inclusão emancipatória nesta sociedade, que cabe a todos transformar (MOLL; GARCIA, 2020, p. 8-9).

As alterações da Lei nº 13.415 e o chamado “Novo Ensino Médio” serão implementados em todas as instituições de ensino privadas, públicas estaduais, municipais e federais, sendo esta última composta por Centros Federais de Educação Tecnológica, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, escolas técnicas vinculadas às universidades federais, Colégio Pedro II e os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia.

Os Institutos Federais e a busca pela formação humana integral

Historicamente, a educação brasileira é marcada pela dualidade do ensino, termo que compreende a diferença na qualidade da educação oferecida aos filhos da elite e dos pobres, estabelecendo diferentes objetivos para cada uma das partes dessa divisão: “caberia à instituição escolar apenas instrumentalizar crianças e jovens filhos do proletariado para os trabalhos manuais, conforme necessidade do mercado, preparando, ao contrário, os filhos da elite para os cargos de comando que envolvem o trabalho intelectual (PEREIRA; MELLO; SANTOS, 2019, p. 268). Consequentemente, a elite dominante tinha acesso à continuidade dos estudos e à construção de carreiras acadêmicas, enquanto os trabalhadores recebiam somente instrução básica e algum tipo de ofício (NASCIMENTO; CAVALCANTI; OSTERMANN, 2020).

É nesse contexto que surge a educação profissional no século XIX, sob uma perspectiva assistencialista, além de justificar-se pela necessidade de retirar crianças abandonadas da rua, para que não se tornassem futuros desocupados (GARCIA et al., 2018). Após a Proclamação da República, foi instaurada uma rede de 19 Escolas de Aprendizes e Artífices por meio do Decreto nº 7.566, de 23 de setembro de 1909, assinado por Nilo Peçanha. A instauração dessa rede é entendida como o marco inicial da Rede Federal (GARCIA et al., 2018), resultando nas escolas técnicas e, posteriormente, nos CEFETs, que foram os precursores dos Institutos Federais.

É preciso registrar que no período da ditadura militar, o 2º Grau – que equivale ao Ensino Médio atual – passou a ser profissionalizante de forma compulsória para todos. No entanto, a reforma não se concretizou, pela falta de condições humanas e de infraestrutura, seja de professores da área técnica, de laboratórios e pela força das escolas privadas, que não aceitavam a profissionalização, pois o objetivo das mesmas era a formação para o ingresso no Ensino Superior. Em 1982, a lei 7.044/82 altera a lei nº5692/71, retirando a obrigatoriedade da profissionalização.

Nos anos de 1990, o decreto nº 2.208/97 separou o EM da formação técnica profissional. Essa ação significou um retrocesso, principalmente para a rede federal, composta pelo Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET) e Escolas Técnicas federais, pois o ponto central do referido decreto era de fragmentar a formação que a rede federal vinha conseguindo realizar, muito próximo do que é compreendido como formação integral e até mesmo o caminho da politecnia:

Entre tantos impactos gerados pelo Decreto no 2.208/1997 na formação profissional do técnico de nível médio, podemos destacar a evasão e a reprovação acentuadas, a fragilidade na formação dos profissionais que chegavam ao mercado de trabalho e o descrédito da sociedade com a educação profissional. (NASCIMENTO; CAVALCANTI; OSTERMANN, 2020, p. 123).

Este vácuo criado pela legislação persistiu até 2004 quando, pelo decreto nº 5154/04 e posteriormente realizada a alteração na LDB, foi retomada a possibilidade da formação integrada, no que foi denominado como Ensino Médio Integrado à Educação Profissional em toda Rede federal de ensino como também na Rede estadual e municipal. A revogação do Decreto nº 2.208/1997, na gestão do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, possibilitou a integração entre o Ensino Médio e a Educação Profissional. No entanto, ainda havia poucas matrículas na educação profissional, de modo que se tornou necessário ampliar a oferta de vagas “com a garantia da qualidade de uma educação unitária, destinada à superação da dualidade entre cultura geral e técnica” (NASCIMENTO; CAVALCANTI; OSTERMANN, 2020, p. 123).

É nesse contexto de tentativa de superação da dicotomia entre o EM e a educação profissional e a necessidade da ampliação de matrículas na rede profissional que ocorre a promulgação da Lei nº 11.892/08, também no governo Lula, criando o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, uma instituição de ensino básico, profissional e superior, organizada em diversos campi nos estados brasileiros. De acordo com o exposto na lei, as finalidades dos Institutos Federais são

[...] V - constituir-se em centro de excelência na oferta do ensino de ciências, em geral, e de ciências aplicadas, em particular, estimulando o desenvolvimento de espírito crítico, voltado à investigação empírica; VI - qualificar-se como centro de referência no apoio à oferta do ensino de ciências nas instituições públicas de ensino, oferecendo capacitação técnica e atualização pedagógica aos docentes das redes públicas de ensino; [...]. (BRASIL, 2008, s.p.).

Conforme Melo e Duarte (2011, p. 235), a lei possibilitou a continuidade da “política iniciada na gestão anterior e a ênfase dada à melhoria desses tipos de ensino”, de modo a ressignificar a Educação Profissional e Tecnológica (EPT) no Brasil. Os 38 institutos espalhados pelos estados brasileiros oferecem licenciaturas (no mínimo 20% das vagas), graduações tecnológicas, especializações, mestrados profissionais, doutorados e, principalmente, cursos técnicos (no mínimo 50% das vagas), em sua maioria na forma integrada com o EM (PACHECO, 2010), o que se constitui como essencial na contribuição da EPT no Brasil.

A formação integral em cursos técnicos integrados ao ensino médio é uma das principais atribuições definidas no documento de criação dos Institutos Federais (IFs), objetivando que o estudante do EM seja formado integralmente em todas as dimensões, sendo elas trabalho, ciência, tecnologia e cultura, o que posteriormente, em 2012, se constituiu nos eixos das Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio (DCNEM). Neste sentido, o IFPR apresenta no seu Regimento o conceito de formação integral:

A educação escolar no IFPR está fundamentada na formação omnilateral do ser humano, visando seu pleno desenvolvimento histórico nas dimensões intelectual, cultural, política, educacional, psicossocial, afetiva, estética, ética e ambiental, tendo o trabalho como princípio educativo e a pesquisa como princípio pedagógico. (INSTITUTO FEDERAL DO PARANÁ, 2012, p. 25).

No Paraná, após a aprovação da lei nº 11.892/08, a Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná (ET-UFPR) foi transformada no Instituto Federal do Paraná (IFPR), que hoje possui 26 campi presentes em diversas cidades do estado, oferecendo mais de 70 cursos superiores e técnicos, dentre os quais estão os cursos técnicos integrados ao Ensino Médio, planejados para que o discente conclua o EM juntamente com uma habilitação profissional técnica. Conforme o Regimento Geral do Instituto Federal do Paraná, a instituição é vinculada ao Ministério da Educação e “possui natureza jurídica de autarquia, sendo detentora de autonomia administrativa, patrimonial, financeira, didático-pedagógica e disciplinar” (INSTITUTO FEDERAL DO PARANÁ, 2012, p. 6), estando domiciliada na sede de sua Reitoria, em Curitiba.

Diante disso, entende-se que estudar o processo de reformas da educação no Brasil é imprescindível para compreender o futuro da formação da juventude brasileira, principalmente a grande parcela que utiliza o sistema público estadual de ensino. Desse modo, faz-se importante investigar como se darão as mudanças a partir da Lei nº 13.415 nos Institutos Federais, que foram criados com o objetivo de oferecer uma educação pública de qualidade, já que as suas condições se diferem da maioria das escolas públicas por possuírem autonomia didático-pedagógica, pela estrutura física das escolas, carreira dos docentes, por oferecerem o curso técnico integrado, pela forma de contratação dos professores e pela autonomia no desenvolvimento do currículo, o que torna os IFs instituições pluricurriculares. A respeito disso, destaca-se o conceito de currículo presente na resolução nº 56, de 03 de dezembro de 2012, que expressa o posicionamento teórico da instituição:

Art. 28. O currículo no Instituto Federal está fundamentado em bases filosóficas, epistemológicas, metodológicas, socioculturais e legais, expressas no seu projeto político institucional, sendo norteado pelos princípios da estética, da sensibilidade, da política da igualdade, da ética, da identidade, da interdisciplinaridade, da contextualização, da flexibilidade e da educação como processo de formação na vida e para a vida, a partir de uma concepção de sociedade, trabalho, cultura, educação, tecnologia e ser humano. Art. 29. As diretrizes curriculares e a norma didática do Instituto Federal do Paraná serão fundamentadas em bases filosóficas, psicológicas, pedagógicas, socioculturais e legais, e estarão expressas no seu Projeto Político Institucional - PPI. (INSTITUTO FEDERAL DO PARANÁ, 2012, p. 19).

Os IFs seguem um modelo de EM distinto do empregado na maioria das instituições públicas e privadas que oferecem essa etapa da educação básica. Isso poderia se constituir em um espaço de resistência ou de ressignificação do que está proposto na lei que alterou a LDB 9394/96, uma vez que ela pode impactar diferentemente os IFs que obrigatoriamente ainda ofertam o de EM integrado à Educação Profissional, apesar de não se constituir como o itinerário formativo da Educação Profissional proposta pela reforma, que minimiza a formação dos estudantes, há uma expectativa que os IFs consigam ser um espaço de resistência do ensino médio integrado à Educação Profissional no sentido da formação integral, omnilateral.

Uma vez que oferecem o EM integrado à formação técnica, a estrutura curricular das instituições federais privilegia uma formação contextualizada e que concilia conhecimentos técnicos e científicos. Desse modo, o ensino oferecido pelos IFs propõe “derrubar as barreiras entre o ensino técnico e o científico, articulando trabalho, ciência e cultura na perspectiva da emancipação humana” (PACHECO, 2010, p. 14), buscando uma formação integral:

A formação integral prevista nesta modalidade significa priorizar uma educação cujos objetivos são a criatividade, autonomia intelectual e formação política, não especificando capacidades, habilidades e/ou competências intelectuais e humanas mais importantes para o estudante, aspecto bastante reforçado quando se viabiliza a formação do aluno para as necessidades do mercado. (HEREEN; SILVA, 2019, p. 10).

No entanto, a Lei nº 13.415/2017 apresenta contradições com a proposta de formação integral defendida pelos IFs, e esses princípios poderão ser afetados e modificados a partir da lei, causando impactos negativos na formação dos estudantes dessas instituições.

Caminhos do IFPR a partir da Lei 13.415 e a nova lei do FUNDEB

O IFPR, assim como os demais Institutos e seus campi localizados em todos os estados e o Distrito Federal, trouxeram um impulsionamento na oferta do Ensino Médio Integrado à Educação Profissional. No entanto, a reforma proposta começa aparecer no interior dos Institutos num primeiro momento com a definição pelo Programa Nacional dos Livros Didáticos (PNLD), que organiza os conteúdos da Educação Básica por áreas de conhecimentos, engessando o material pedagógico que será disponibilizado para toda a rede pública de ensino.

Outro fator preocupante com o futuro do trabalho realizado pelos IFs é o artigo 25 do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB), determinando que os Institutos deverão oferecer, anualmente, vagas para a formação técnica e qualificação profissional, que serão disponibilizadas para a rede estadual com recursos do FUNDEB. Essa ação resultaria nos IFs serem apenas executores de uma parte da formação dos estudantes, de modo que a educação integral defendida pelos IFs seria comprometida. Além disso, pode gerar a contratação precária de profissionais para atuar nesses cursos.

O artigo 1º da Lei 13.415 prevê a ampliação progressiva da carga horária do EM para até 1400 horas. Essa alteração, por si só, não indica nenhuma modificação para os IFs, que possuem a carga horária entre 3000 e 4200 horas para a integralização do curso, conforme apontado na Resolução nº 6 CNE/CEB (BRASIL, 2012). Entretanto, a lei informa que a carga horária destinada ao cumprimento da BNCC não poderá ser superior a 1800 horas, reduzindo a formação geral dos estudantes e contradizendo o princípio de educação integral dos IFs.

Frigotto (2021, p.12) faz um alerta e um desafio aos IFs:

Os IFs por sua abrangência nacional e pela formação dos seus quadros têm um potencial nesta luta extraordinária. Trata de ter a decisão política para não sucumbir ao poder da plutocracia que não seja de valer-se dos métodos fascistas para se eternizar. É pela persistência de luta da classe trabalhadora e seus intelectuais.

Nesse sentido, constata-se que no interior dos próprios IFs há um movimento que vem se constituindo como resistência. Um desses movimentos que está sendo manifestado pelos Institutos Federais é a análise das novas Diretrizes Curriculares da Educação Profissional e os impactos na rede federal, documento organizado pelo Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional Científica e Tecnológica (CONIF), conselho de dirigentes que representa os IFs. O documento objetiva analisar as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Profissional e Tecnológica (DCNGEPT), associando-as ao conjunto de instrumentos legais e normativos que instituem a Reforma do Ensino Médio.

O documento inicia assumindo uma posição discordante às DCNGEPT, por entender que elas apresentam-se como contrárias à identidade da Educação Profissional em sua perspectiva integrada e integral, desconsiderando princípios inalienáveis dos IFs, dentre os quais destaca-se:

a lógica das Diretrizes Indutoras do Ensino Médio Integrado da Rede Federal, cujo currículo integrado pressupõe a integração indissociável entre formação geral e a formação técnica, numa perspectiva politécnica. Assim, cada componente e cada conteúdo curricular deve ser planejado num todo e não como uma matriz de disciplinas fragmentadas. (CONIF, 2021, p. 11)

Posteriormente, o documento apresenta 19 ações que considera importantes a serem adotadas pela Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, salientando a importância de reconhecer que a identidade da EPT é “integrada, politécnica, focada no pleno desenvolvimento humano e fundamentada em conhecimentos socialmente referenciados” (CONIF, 2021, p. 11). Além disso, constata que o “notório saber”, previsto da lei nº 13.415, é um processo grave e irreversível de desvalorização de profissionais da educação, afirmando que a lei desconsidera a Educação e o Ensino como campos da ciência composta por saberes imprescindíveis no processo de ensino e aprendizagem.

Por fim, defende ainda que a atual organização dos projetos pedagógicos institucionais não deveria ser negada a fim de adequar-se a “concepções que só trarão prejuízos para a RFEPCT e principalmente para a formação integral dos educandos, para os profissionais envolvidos e para a própria institucionalidade dos IFs, CEFETs e CPII” (CONIF, 2021, p. 17). Dessa forma, o CONIF compreende que a concepção de política educacional e de educação profissional presente na lei 13.415 e, consequentemente, nas DCNGEPT, representam retrocesso em relação ao avanço da EPT para a formação integral.

Outras ações que demonstram a resistência dos IFs são os cursos e palestras que estão sendo oferecidos objetivando analisar o texto da reforma e indicar os futuros impactos das alterações da lei na EPT. A exemplo disso, cita-se o Curso de Extensão do IFPR campus Paranaguá, apoiado pelo Sindicato dos Trabalhadores da Educação Básica, Técnica e Tecnológica do Estado do Paraná (SINDIEDUTEC), denominado “Impactos da contrarreforma do Ensino Médio na Educação Profissional e Tecnológica (EPT)", cujo objetivo é:

analisar os pontos em que a EPT é mais afetada pelas medidas do governo federal, além de identificar os mecanismos jurídico-políticos que levam à implantação do programa, situar estas medidas na conjuntura pós-golpe 2016 e discutir casos específicos de implantação da contrarreforma na EPT. (SINDIEDUTEC, 2021, s.p.).

Essas ações reafirmam o apontado por Frigotto (2021), que alerta que os Institutos devem ter clareza da gravidade atual, as forças de extrema direita estão atuando, destacando a importância de uma unidade. Ainda de acordo com o autor, o segundo desafio é construir a resistência por dentro para manter os avanços. Resistir por dentro no ensino, na pesquisa e na extensão. Coloca também como desafio o de unir-se à luta mais ampla dos movimentos sociais, sindicatos, organizações científicas, políticas, artísticas e culturais para enfrentar os retrocessos que estão se materializando.

Considerações finais

Os conflitos das políticas educacionais brasileiras dos últimos anos demonstram um embate nesse campo, principalmente no que se refere ao Ensino Médio, que é muitas vezes entendido apenas como um requisito necessário para que o aluno atenda às necessidades do mercado de trabalho. Os Institutos Federais procuram romper com esse tipo de educação, priorizando a criatividade, autonomia intelectual e formação política, em vez de competências e habilidades.

A lei nº 13.415 busca a flexibilização do EM, justificando que o aluno deve ter autonomia e não limitar-se à suposta rigidez dos cursos tradicionais. No entanto, o que se vê na prática é a fragilização desta etapa, desvalorizando a formação integral do estudante ao dispensar áreas do conhecimento que valorizam o senso crítico e a formação humana, submetendo a escola pública à lógica de competências e habilidades voltadas ao mercado de trabalho.

Apesar de se apresentarem com objetivos que contradizem à lei, os IFs estão submetidos a essas alterações e estão dentro das disputas a respeito das relações entre trabalho e educação e da concepção de formação humana. Até o momento, não houve movimento efetivo da reforma dentro dos institutos, provavelmente pelo fato de essas instituições já ofertarem o itinerário da formação técnica integrada ao Ensino Médio e já disporem da carga horária mínima determinada pela lei.

Salienta-se a fala de Pacheco (2010, p. 8), que aponta a recusa dos Institutos “a formar consumidores no lugar de cidadãos, a submeter a educação à lógica do capital, colocando o currículo como instrumento do simples treinamento de habilidades e técnicas a serviço da reprodução capitalista”. Nesse sentido, estão sendo apresentadas algumas resistências, como o documento redigido pelo CONIF, representante dos IFs. Especificamente sobre o IFPR não há nenhum objeto de análise, ele está compreendido dentro de todo o grupo dos Institutos Federais. Sugere-se que futuras pesquisas, se possível, analisem outros movimentos de resistência que eventualmente poderão ser manifestados. Essas resistências são importantes, uma vez que os IFs possuem autonomia e suas condições diferem-se de outras instituições públicas, tanto em questão de estrutura física quanto didático-pedagógica, que vai contra a formação fragmentada e subordinada à lógica do capital.

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Recebido: 01 de Outubro de 2021; Aceito: 01 de Dezembro de 2021; Publicado: 01 de Janeiro de 2022

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