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Educação

Print version ISSN 0101-465XOn-line version ISSN 1981-2582

Educação. Porto Alegre vol.43 no.3 Porto Alegre Sept./Dec 2020

https://doi.org/10.15448/1981-2582.2020.3.31310 

Artigos

Práticas educativas na docência universitária: concepções na/da inovação pedagógica

Educational practices in university teaching: conceptions in the pedagogical innovation

Prácticas educativas en la docencia universitaria: concepciones en la innovación pedagógica

Fabrício Oliveira da Silva1 

Doutor em Educação pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB), em Salvador, BA, Brasil e pós-doutorando em Educação na mesma instituição; professor da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), em Feira de Santana, BA, Brasil.


http://orcid.org/0000-0002-7962-7222

1Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Feira de Santana, BA, Brasil.


Resumo:

O trabalho analisa os resumos expandidos escritos e apresentados ao evento denominado Seminário Pedagogia do Ensino Superior: Partilha de Práticas Inovadoras realizado pelo Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre Pedagogia Universitária (NEPPU) de uma instituição pública de Ensino Superior do Estado da Bahia. O objetivo do estudo foi analisar como os professores, autores dos resumos e participantes do referido seminário, concebem uma prática inovadora. A metodologia utilizada foi o desenvolvimento do Estado da Arte, que consiste em uma técnica de mapeamento de estudos já realizados em determinada área do conhecimento. A base teórica constituiu nas contribuições de Cunha (2001), Fullan (2007), Lucarelli (2005), entre outros. O estudo mostrou que os professores consideram suas práticas enquanto inovadoras, pois elas se fundamentam no paradigma da mudança caracterizada por uma variação de estratégias metodológicas que o professor desenvolve, tornando as aulas diferentes e atrativas para os estudantes.

Palavras-chave: práticas educativas; inovação; docência universitária

Abstract:

The paper analyzes the expanded abstracts written and presented to the event called Pedagogy Seminar of Higher Education: Sharing of Innovative Practices carried out by the Center for Studies and Research on University Pedagogy - NEPPU of a public institution of Higher Education of the State of Bahia. The objective of the study was to analyze how the teachers, authors of the abstracts and participants of the Seminar conceived an innovative practice. The methodology used was the development of the State of Art, which consists of a mapping technique of studies already performed in a certain area of knowledge. The theoretical basis was the contributions of Cunha (2001), Fullan (2007), Lucarelli (2005), among others. The study showed that teachers consider their practices as innovative because they are based on the paradigm of change characterized by a variety of methodological strategies that the teacher develops, making classes different and attractive for students.

Keywords: educational practices; innovation; university teaching

Resumen:

El trabajo analiza los resúmenes expandidos escritos y presentados al evento denominado Seminario Pedagogía de la Enseñanza Superior: Compartición de Prácticas Innovadoras realizado por el Núcleo de Estudios e Investigación sobre Pedagogía Universitaria - NEPPU de una institución pública de Enseñanza Superior del Estado de Bahía. El objetivo del estudio fue analizar cómo los profesores, autores de los resúmenes y participantes del referido Seminario concibe una práctica innovadora. La metodología utilizada fue el desarrollo del Estado del Arte, que consiste en una técnica de mapeo de estudios ya realizados en determinada área del conocimiento. La base teórica constituyó en las contribuciones de Cunha (2001), Fullan (2007), Lucarelli (2005), entre otros. El estudio mostró que los profesores consideran sus prácticas como innovadoras, pues ellas se fundamentan en el paradigma del cambio caracterizada por una variación de estrategias metodológicas que el profesor desarrolla, haciendo las clases diferentes y atractivas para los estudiantes.

Palabras clave: prácticas educativas; la innovación; docencia universitaria

Um dos grandes desafios a que o docente, a si próprio, se impõe na universidade é produzir a inovação em sua prática. Para a realização desse feito, desenvolve várias ações no sentido de tornar o seu fazer algo que seja atrativo para os estudantes, que os motive e que gere aprendizagem. Nesse contexto, a inovação está pensada e estruturada em objetivos que evidenciam resultados pragmáticos, que possibilitem ao estudante lograr êxito em sua aprendizagem a partir do que faz o professor para ensinar, o que, no campo da inovação, não pode estar dissociada do sentido de aprender. Assim, o ensino-aprendizagem se constitui como um processo relacional que se caracteriza, essencialmente, por ações da docência que evidenciem os modos como os estudantes aprendem.

É no contexto, sobretudo, de pensar sobre como os estudantes podem aprender, por diferentes estratégias pedagógicas desenvolvidas pelo professor, que a inovação emerge como possibilidade de transformação entre práticas produzidas por um mesmo sujeito em diferentes momentos, com intenções e proposições diferentes. Portanto, inovar na prática significa que uma ação educativa, já desenvolvida, se modifica e, de alguma maneira, ganha contornos distintos e tessituras outras. Neste sentido, o professor gera um novo modo de fazer, um novo jeito de operacionalizar a sua prática pedagógica, independentemente de como esta passa a ser feita. Lucarelli (2000, p. 63), ao abordar a inovação da prática educativa, considera que “quando nos referimos à inovação, fazemo-lo em associação a práticas de ensino que alterem, de algum modo, o sistema unidirecional de relações que caracterizam o ensino tradicional”. Assim, a prática inovadora, de alguma maneira, é o resultado de uma alteração dos modos de como uma prática educativa vinha sendo realizada no contexto do ensino.

Ao analisar o que dizem diferentes autores a respeito do conceito de inovação (a exemplo de Carbonell, 2002; Hannan & Silver, 2006; Libedinsnky, 2001; Lucarelli, 2000) é compreensível o consenso em torno das características polissêmicas do termo inovação, uma vez que fica evidente a natureza mutável dos sentidos que se atribui ao termo, pois o que se depreende sobre esse termo muda de acordo com o tempo, com os contextos socioculturais, com as conjunturas econômicas e políticas. Filologicamente, encontramos as raízes do termo inovação na base latina, que tem sua origem no termo innovatio. Nessa base etimológica, o vocábulo é formado por três componentes léxicos: innovação. Assim, o termo significa renovar, fazer de novo, mudar, introduzir alguma novidade na legislação, nos costumes, na ciência ou nas artes etc. Nos contextos mais contemporâneos, em que as tecnologias determinam um novo sentido para o termo, por inovação compreende-se, também, mudança, novidade, dinamismo, renovação.

Na situacionalidade específica deste trabalho, trilharemos por uma perspectiva analítica de entendimento do termo, que se aproxima do que defendem Cunha e Lucarelli (2005) ao conceberem a inovação enquanto uma ruptura das formas tradicionais de ensinar no contexto das práticas educativas que desenvolvem os professores para realizarem o ensino universitário. Para as referidas autoras, a inovação pedagógica implica ruptura com a forma tradicional de ensinar e aprender, o que gera a possibilidade de produção de um fazer reflexivo que demanda a necessidade do docente desenvolver estratégias metodológicas que promovam a gestão de aprendizagem de modo participativo. Isso implica reconhecer que a inovação na prática universitária favorece uma perspectiva dialógica, de reconfiguração dos saberes produzidos na universidade, na reorganização da relação entre teoria e prática, tendo em vista a funcionalidade desse processo para a promoção de ensino-aprendizagem. Neste contexto, a avaliação das experiências logradas pela inovação sugere a viabilidade de mediação e de protagonismo dos professores e dos estudantes na realização das práticas.

Este estudo se originou de uma pesquisa-ação colaborativa, desenvolvida por um grupo de professores de duas instituições públicas de Ensino Superior do estado da Bahia. A pesquisa-ação colaborativa, no seu terceiro ano de desenvolvimento, conta com 14 professores de duas universidades públicas estaduais, além de quatro estudantes da pós-graduação, quatro bolsistas de Iniciação Científica e alguns voluntários. Como descrito no seu projeto (Ribeiro & Mussi, 2014, p. 10), trata-se de um “desenho de pesquisa que envolve os próprios docentes enquanto sujeitos pesquisados e pesquisadores das suas próprias práticas pedagógicas, a fim de que possam transformá-las em práticas inovadoras”

A problemática sobre a qual a pesquisa se desenvolveu, demandou a compreensão de como os professores têm desenvolvido práticas educativas e as concebido como inovadoras. Assim, esse trabalho tem por objetivo analisar como os professores autores de trabalhos apresentados no Seminário Pedagogia do Ensino Superior: Partilha de Práticas Inovadoras concebem uma prática inovadora. Dentre algumas questões de pesquisa, o estudo foi norteado, principalmente, por duas, que são: quais práticas educativas são consideradas inovadoras na universidade? Como os professores têm concebido a inovação da prática nos trabalhos que apresentaram no Seminário Pedagogia do Ensino Superior: Partilha de Práticas Inovadoras?

Percurso metodológico

Durante os dias 21 e 22 de novembro de 2017, como parte da pesquisa-ação colaborativa, o Núcleo de Estudos e Pesquisa em Pedagogia Universitária (NEPPU) realizou o seu primeiro Seminário Pedagogia do Ensino Superior: Partilha de Práticas Inovadoras. O evento reuniu alguns professores e pesquisadores que têm se dedicado a estudar a inovação nas práticas pedagógicas dos professores universitários. O objetivo principal do evento foi possibilitar que docentes de diferentes áreas do conhecimento pudesse partilhar suas práticas, relatando suas experiências. A justificativa para a realização do evento evidencia que muitas experiências são realizadas por docentes da universidade, sobretudo pelos participantes da pesquisa ação-colaborativa desenvolvida pelo NEPPU, mas ficam adstritas às salas de aula dos professores e, por isso, não são partilhadas entre os pares, gerando o não conhecimento e disseminação das práticas entendidas como inovadoras.

O primeiro mapeamento metodológico que realizamos diz respeito ao quantitativo de trabalhos apresentados e as instituições de origem dos autores. O Gráfico 1 a seguir mostra as instituições participantes e o quantitativo de trabalhos em cada uma.

Fonte: Elaborado pelo autor com dados da pesquisa.

Gráfico 1 Distribuição dos trabalhos por instituição 

Uma análise inicial do Gráfico 1 evidencia que dos 30 trabalhos apresentados no evento, 26 são de instituições públicas e apenas quatro de instituições privadas. Dos 26 trabalhos oito são da instituição que sediou o evento, instituição à qual pertence o grupo de pesquisa que organizou e desenvolveu o seminário. Considerando o total de 26 trabalhos oriundos de instituições públicas, é possível perceber que esse tipo de instituição tem se inserido no contexto de eventos acadêmicos em que a docência universitária passa a ser foco das discussões acadêmicas. Esse dado sugere, ainda, que os professores das instituições públicas estão se mobilizando em torno das reflexões sobre sua prática, evidenciando uma autonomia reflexiva que os permita problematizar seu ensino e desenvolver novas estratégias que estão, neste tipo de instituição, delegadas à autonomia docente.

O seminário contou com trabalhos escritos por docentes universitários em formato de resumo expandido e que, consequentemente, foram aprovados pela comissão científica. O critério principal de aprovação se baseou em duas dimensões analíticas. Uma que considerou os trabalhos sobre prática inovadora escrita pelos próprios docentes que realizam a prática. Outra que congregou os trabalhos de pesquisa em torno da prática inovadora.

No que tange aos eixos do evento, os trabalhos foram inscritos e distribuídos em sete eixos: o primeiro congregou aqueles que envolviam ensino com prática de pesquisa. Neste eixo se verificou a submissão de quatro trabalhos. O segundo eixo foi ensino envolvendo experiência de extensão, que contou com cinco trabalhos. O terceiro eixo, denominado de ensino que oportunize a formação de atitudes nos estudantes, contou com quatro. A questão das tecnologias foi contemplada no quarto eixo, que se denominou de ensino que use tecnologias digitais voltadas para aprendizagens, que teve três trabalhos. Ensino que envolva a prática de avaliação centrada na aprendizagem dos estudantes foi o quinto eixo e contou com apenas um único trabalho. No sexto eixo, a ideia foi reunir os trabalhos que envolvessem ensino contemplando o corpo, a arte e a ludicidade, que teve, também, apenas um único trabalho submetido. O sétimo e último eixo, que se denominou ensino envolvendo estratégias de aprendizagens em diferentes contextos educativos, foi o que obteve o maior número, chegando a 12 trabalhos. O Gráfico 2, a seguir, mostra o quantitativo de trabalhos distribuídos pelos sete eixos.

Fonte: Elaborado pelo autor com dados da pesquisa.

Gráfico 2 Número de trabalhos por eixos 

Nesta perspectiva, o presente estudo se desenvolveu apoiado na metodologia Estado da Arte, realizada considerando os dados de 30 resumos expandidos, constantes no banco de dados do NEPPU. A partir dessa condição, realizamos a leitura de todos os textos, mapeando em uma planilha organizada no programa Excel alguns elementos que integram os trabalhos. Dentre vários, consideramos o objeto dos estudos, o objetivo, os sujeitos envolvidos, a metodologia empregada em cada trabalho, a instituição lócus e os resultados alcançados.

O Estado da Arte tem sido desenvolvido por vários pesquisadores que se dedicam a mapear outros estudos com o objetivo de trazer à baila o que se tem feito em diversos campos do conhecimento. Neste aspecto, as pesquisas dessa natureza, que se dedicam a mapear a produção científica, se iniciam por uma revisão de investigações que têm caráter bibliográfico, e são denominadas “Estado da Arte” ou “Estado do Conhecimento” (Ferreira, 2002). Para alguns autores, há variações no termo. No campo da educação, destacam-se os estudos da professora e pesquisadora Marli André. Para essa pesquisadora, o Estado da Arte é chamado de “síntese integrativa” (André, 2002) ou por outra estudiosa do campo da biologia, a Ionê Inês, que denomina o Estado da Arte de “pesquisas que estudam pesquisas” (Slongo, 2004).

Neste sentido, o Estado da Arte acaba sendo uma metodologia interessante, que permite ao pesquisador encontrar o que se tem estudado em um determinado campo do conhecimento, bem como o modo como os estudos têm sido feitos, gerando outras aprendizagens. No contexto específico desse estudo, o trabalho se volta para mapear a compreensão dos docentes em torno do conceito de prática inovadora, possibilitando o conhecimento do que tem sido considerado como uma prática inovadora, favorecendo as discussões e as problematizações em torno do tema, sobretudo para os pesquisadores interessados em conhecer como o tema tem sido tratado no contexto de inovação da prática em se considerando o contexto do que propôs o Seminário Pedagogia do Ensino Superior: Partilha de Práticas Inovadoras.

A fim de que o leitor entenda e melhor acompanhe os resultados que evidenciaremos no estudo, as análises apresentam considerações sobre três dimensões básicas de inovação, a parir do mapeamento realizado. Na primeira dimensão serão tratados os objetos e os objetivos dos trabalhos, promovendo reflexões sobre como a inovação da prática se caracteriza nos diferentes textos socializados no evento. Na segunda dimensão, consideraremos os principais aportes metodológicos de que lançam mãos os autores para desenvolver seus trabalhos, analisando como as metodologias evidenciam um entremeio de entendimento entre dois polos: um do que seja pesquisar uma prática inovadora e o outro do que seja desenvolvê-la na docência universitária. Por fim, analisaremos os conceitos de inovação da prática pedagógica que se revelam pelas discussões que os autores fazem.

Objetos e objetivos de uma prática educativa inovadora na universidade

No conjunto dos trabalhos, os autores variam muito sobre o objeto da prática que estão se propondo desenvolver. Há trabalhos em que o objeto aparece bem demarcado, focando a própria prática como elemento de estudo. Nesta direção, os trabalhos evidenciam uma prática que o professor desenvolve e que considera ser inovadora. No conjunto dos 30 trabalhos analisados, destacamos seis que aparecem com essa proposição, tendo o objeto de estudo uma prática realizada no contexto da docência universitária e um trabalho que reflete a prática pedagógica do professor no contexto da Educação Básica.

A Tabela 1 apresenta o número de trabalhos mapeados por eixo e por categoria dos objetos.

Tabela 1 Quantitativo de trabalhos por eixo e por natureza de objetos 

Eixos Quantitativos Trabalhos sobre a própria prática Trabalhos que refletem pesquisa sobre a prática
01 – Ensino envolvendo prática de pesquisa 04 01 03
02 –Ensino envolvendo experiência com extensão 05 00 05
03 – Ensino que oportunize a formação de atitudes nos estudantes 04 00 04
04 – Ensino que use tecnologias digitais voltadas para a aprendizagens 03 02 01
05 – Ensino que envolva prática de avaliação centrada na aprendizagem dos estudantes 01 01 00
06 – Ensino contemplando o corpo, a arte e a ludicidade 01 01 00
07 – Ensino evolvendo estratégias de aprendizagem em diferentes contextos educativos 12 02 10
TOTAL 30 07 23

Fonte: Elaborado pelo autor.

A Tabela 1 permite inferir que os eixos dois e três, um que demanda o trabalho a partir de atividades de extensão e o outro que envolve atitudes dos estudantes, não congregam trabalhos que sejam oriundos da reflexão da prática do próprio professor. No conjunto desses trabalhos, os sujeitos são sempre os estudantes e a reflexão que os estudos evidenciam parte do pressuposto de que os professores refletem sobre práticas desenvolvidas com os alunos, mas que necessariamente não são práticas que o docente desenvolve e nem sobre as quais reflete a partir do seu feito. Assim, as análises que os docentes fazem se estruturam em torno de uma avaliação sobre a contribuição das oficinas que realizam, do curso de extensão, sobre a etnopesquisa, ou qualquer outra técnica sobre a qual o trabalho é desenvolvido. Assim, os professores realizam conclusões nesses nove estudos dos eixos dois e três abordando objetos que são fruto da pesquisa, tais como, o ensino além do técnico: ensinando e aprendendo espiritualidade, práticas pedagógicas inclusivas na educação superior, sentidos materializados na sala de aula como inovação curricular, procedimentos de leitura e análise textual de prosa e poesia, entre outros.

Com base nos dados apresentados na Tabela 1, discorreremos sobre os sete trabalhos que têm por natureza a discussão da inovação a partir dos objetos que evidenciam reflexões sobre a própria prática que os professores desenvolvem. Assim, analisando as discussões que os autores fazem nos resumos expandidos, é possível depreender os seguintes objetos; i) contação de histórias e relação interdisciplinar entre diferentes componentes; ii) uso de dispositivos móveis em sala de aula; iii) roda de conversa no fazer docente universitário: o lugar das reflexões de si; iv) uso de cartas pedagógicas, as quais constituíram em dispositivo de formação, pesquisa, aprendizagem e interlocução entre Universidade e Escola Básica; v) o seminário Temático como estratégia de ensino; vi) prática pedagógica em ambiente virtual – Letramento; e vii) trigonometrizando na roça.

O primeiro trabalho desse grupo evidencia como objetivo proporcionar a interdisciplinaridade no desenvolvimento da disciplina formação do contador de história. Neste sentido a prática educativa do professor se constitui por meio de contação de histórias como estratégia metodológica de oportunizar aos professores em formação a vivência interdisciplinar em diferentes componentes curriculares no curso de Pedagogia. Assim, o trabalho traz para o centro do debate as práticas de realização de oficinas enquanto modo operativo que o docente tem para desenvolver reflexões e aprendizagens sobre a arte de contar histórias. Nessa lógica, as discussões partem do pressuposto de que o trabalho com a contação de história se constitui como uma prática interdisciplinar, em que as licenciandas, sujeitos do estudo, têm a oportunidade de aprender a docência utilizando a contação de histórias como estratégia educativa que o professor desenvolve para ensinar.

No segundo trabalho o objetivo do estudo é apresentar uma forma de introduzir novas tecnologias no contexto de aprendizagem a partir da prática que o próprio docente faz para demonstrar como as tecnologias potencializam o fazer do docente na universidade. Esse é o único trabalho que traz uma concepção de que as tecnologias potencializam o processo de aprendizagem na docência universitária, evidenciando o debate de que a inovação, conforme preconiza Masetto (2000), tem uma estreita relação com as tecnologias da comunicação e da informação. A tessitura do texto concebe a inovação pelo uso dos dispositivos móveis na sala de aula, reforçando o discurso de que as tecnologias corroboram com o desenvolvimento de fazeres na universidade no campo das práticas educativas, possibilitando a compreensão de que a inovação advém da tecnologia e da competência de poder utilizá-las no contexto das atividades docente.

O terceiro texto em destaque revela um objetivo de desenvolvimento da prática enquanto elemento inovador no contexto da docência universitária. Assim, o autor objetiva usar as rodas de conversa em uma dupla função: a de tomá-las como estratégias de aprendizagem sobre o lugar da reflexão e do diálogo no fazer docente, bem como de tê-las como instrumento avaliativo sobre a sua prática docente na universidade. Essa perspectiva concebe o dialogismo como um elemento da base de inovação, gerando uma compreensão de que a inovação demanda uma prática de gestão em que o processo de ensino-aprendizagem figure como um dos elementos fundantes do processo de rupturas. Em uma primeira análise a roda de conversa emerge apenas como uma técnica que o docente elege para desenvolver sua aula. Entretanto, ao observarmos os objetivos e o desenvolvimento metodológico, torna-se evidente que a prática inovadora se configura pelos elementos da reflexão de uma prática que vai além da própria reflexão e gera, em quem participa da aula, uma prática fruto de transformação de outra mais tradicional, que supostamente não considera o diálogo como a base da produção de conhecimento. Essa compreensão assenta-se na lógica de inovação que defendem Cunha e Lucarelli (2005) ao conceberem a inovação enquanto uma ruptura das práticas tradicionais de ensinar que os professores fazem no contexto das práticas pedagógicas desenvolvidas na universidade.

O quarto texto aborda a prática como elemento de análise para a reflexão do próprio fazer do docente no contexto de suas práticas pedagógicas na sala de aula. Tem como objetivo oportunizar às licenciandas em formação vivenciar o cotidiano de uma classe de estudantes dos anos iniciais do Ensino Fundamental e possibilitar um aprendizado mais significativo da Didática e seus conteúdos, a partir da vinculação direta com o seu objeto de estudo, que é o ensino e os processos a esse relacionados. Nesse contexto, o uso de cartas pedagógicas se apresenta como estratégia de desenvolvimento de apreensão dos conhecimentos didáticos, dos quais o professor na universidade utiliza com estudantes a fim de que elas possam transpor esse conhecimento para o contexto de crianças que estão nas séries iniciais na Educação Básica. Assim, a concepção de inovação também visa a uma lógica de rompimento, ruptura com as formas tradicionais, favorecendo condições para que as professoras em formação inicial criem estratégias de ensino e de aprendizagem a partir das que seus professores na universidade utilizam.

No quinto texto os autores discorrem sobre o Seminário Temático como uma estratégia de desenvolvimento da docência, considerando-a uma inovação. No referido estudo evidencia-se o seminário sobre pensadores da Educação Infantil enquanto foco metodológico do conceito de inovação. Esse trabalho destaca-se entre os demais, pois toma uma prática de realização de seminário, em que os estudantes estudam diferentes pensadores, apresentam em aula, e isso significa a inovação da prática para os autores. A considerar que a inovação é uma modificação, ruptura de práticas tradicionais, como asseveram Cunha e Lucarelli (2005), o seminário é a ruptura de uma aula tradicional e gera, pelas discussões que fazem no trabalho, o conceito de inovação.

Em perspectiva semelhante, o sexto estudo em destaque trata de uma pesquisa que tem por objeto a prática pedagógica em ambiente virtual – Letramento. Neste sentido, o estudo adota a perspectiva tecnológica de se trabalhar no ambiente virtual de aprendizagem como exemplo de prática educativa inovadora. Esse trabalho concebe que a ideia de desenvolver uma aula em outro formato, no caso no ambiente virtual, como uma possibilidade de favorecer aos estudantes a apreensão de conhecimentos sobre os mecanismos e estruturas tecnológicas que envolvem a aula em um ambiente virtual. Daí a ideia de favorecer o letramento do estudante para que ele possa saber utilizar a tecnologia a partir do AVA.

Por fim, o sétimo texto em destaque discorre sobre uma abordagem de inovação da prática, mas não é desenvolvida no contexto da docência universitária. O trabalho apresenta como objetivo a realização de uma prática educativa por meio da qual se possa vivenciar os processos de planejamento e de avaliação referentes à área da Matemática, utilizando a contextualização de conteúdos para possibilitar aos estudantes, que moram em áreas rurais, uma experiência que desencadeie o desenvolvimento de uma aprendizagem significativa. Mesmo não estando no contexto da docência universitária, o referido trabalho se inscreve no campo daqueles que permitem a visualização de práticas que são inovadoras, como defendem Cunha e Lucarelli (2005), e que por isso, de algum modo, revelam uma transformação de velhas práticas tradicionais do ensino de matemática. Assim, trigonometrizando na roça aponta para uma prática educativa do ensino de matemática que é feita no contexto das questões rurais, em que o ensino de trigonometria é desenvolvido no próprio campo de vivências e de experiências dos estudantes, ou seja, na roça. O espaço rural, suas tessituras e características emergem como o grande cenário que possibilita ao educador desenvolver suas estratégias de ensino para além da sala de aula e do uso de materiais didáticos.

No que tange aos objetos e objetivos dos outros 25 trabalhos, logo um quantitativo que representa 83% dos 30 que foram submetidos, não há uma evidência de que a prática educativa do professor tenha sido objeto de seu escrito para pensar o conceito de inovação na prática. Desse universo, há trabalhos que analisam a prática enquanto elemento metodológico para o fazer docente, e, não necessariamente do fazer docente, pois não revelam práticas que o próprio professor desenvolve uma prática na universidade sobre a qual reflete e problematiza. Nesse conjunto, evidencia-se as técnicas de pesquisa enquanto elementos de inovação, tema que será desenvolvido na próxima sessão desse texto.

Tramas metodológicas: caminhos para a construção de práticas inovadoras

A escolha metodológica que os autores fazem para refletir sua prática, em determinados momentos, é concebida como prática inovadora, uma vez que o que se toma como inovação é a própria técnica utilizada pelo docente. Neste contexto, se uma prática educativa se desenvolve por meio de uma técnica de realização de seminário ela é considerada por quem a realiza enquanto inovadora. Neste campo analítico, os docentes defendem como prática inovadora a alternância de técnicas que realizam para produzir uma atividade pedagógica. Assim, alterar as estratégias pedagógicas no contexto da aula significa produzir uma prática pedagógica inovadora. É o caso do trabalho que considera o Seminário Temático, em que os estudantes estudam e apresentam um determinado tema, enquanto trabalho que se circunscreve no campo daqueles que desenvolvem uma prática inovadora.

Ao se considerar que um professor pode ter o hábito de desenvolver práticas pedagógicas dentre as quais o seminário não está presente, ao incorporá-lo, e passando a desenvolver o seminário como uma atividade pedagógica, esse professor inova, pois ele passa a utilizar outros mecanismos que possibilitam aos estudantes um movimento diferente no que tange aos procedimentos de estudo. Estudar para fazer um seminário, de algum modo, é diferente de preparar-se para a realização de outra atividade educativa. Assim, ao se considerar o conceito de inovação no conjunto de trabalhos analisados, percebemos que, em sua maioria, a mudança de uma técnica à outra revela a transformação de práticas e revela o modo como os professores têm concebido a inovação.

Nessa perspectiva podemos perceber uma constante referência da relação de que a realização de uma determinada técnica de aprendizagem configura-se no campo de mudanças no que tange à mediação pedagógica através, sobretudo, na inserção de novas maneiras, novas técnicas no âmbito da ação/prática pedagógica, visando alcançar novos objetivos e/ou resultados. Percebemos que, em determinados trabalhos analisados, o professor vê na técnica que desenvolve uma forma de fazer a mediação pedagógica, entendida como atuação do professor como ponte entre o aluno/aprendiz e sua aprendizagem no processo de produção de conhecimento. Nessa lógica, a prática educativa, concebida pela estratégia que o professor utiliza, visa, sobretudo, possibilitar uma relação dialógica entre professor e estudante, com vistas a lograr aprendizagem. Assim, algumas práticas pedagógicas, como a da realização de um seminário, ainda que não revelem uma ruptura, uma transformação da prática do professor, consagram-se como uma possibilidade de desenvolvimento de aprendizagens nos estudantes, por meio de uma intermediação pedagógica, que Segundo Masetto (2000):

É a forma de se apresentar e tratar um conteúdo ou tema que ajuda o aprendiz a coletar informações, relacioná-las, organizá-las, manipulá-las, discuti-las e debatê-las com seus colegas, com o professor e com outras pessoas (interaprendizagem), até chegar a produzir um conhecimento que seja significativo para ele, conhecimento que se incorpore ao seu mundo intelectual e vivencial, e que o ajude a compreender sua realidade humana e social, e mesmo a interferir nela. (p. 145)

De algum modo, os trabalhos analisados se desenvolvem a partir de técnicas, estratégias que os professores fazem, ou que sobre elas pesquisam, que têm por prerrogativa favorecer o desenvolvimento de aprendizagem do estudante, ao tempo que representam as escolhas que cada docente faz baseadas na reflexão que determina o melhor caminho, maneira de ensinar. Nisso, há um entendimento sobre práticas que evidenciam inovação, tendo em vista que esse é um conceito polissêmico e que demanda de algum modo uma ação que faz o professor tendo em vista mudar e transformar a sua prática.

A Tabela 2 apresenta uma relação das principais metodologias utilizadas pelos professores.

Tabela 2 Metodologias dos resumos expandidos 

METODOLOGIA QUANT. METODOLOGIA QUANT.
Oficinas 03 Pesquisa intervenção 01
Seminário Temático 01 Estudo dirigido 02
Estudo de caso 03 Entrevistas semiestruturadas 01
Uso do AVA 02 Método de simulação 01
Rodas de conversa 01 Relato (auto)biográfico 01
Encontros 04 Exposição dialogada 01
Curso de extensão 01 Trabalho de campo 01
Círculo de leitura 01 Diário de aula 01
Pesquisa-formação 01 Relato de experiência 01
Dinâmica 01 Pesquisa intervenção 01

Fonte: Elaborado pelo autor.

O critério adotado para identificar a metodologia do estudo foi o mapeamento realizado no próprio trabalho, buscando identificar como os próprios autores consideravam a metodologia utilizada e de que forma falavam dela. Observa-se que o total de trabalhos que a Tabela 2 evidencia são 29. Isso aconteceu, pois em um dos trabalhos o autor não menciona em parte alguma sobre a metodologia utilizada. Há reflexões teóricas sobre o PIBID no trabalho e a informação de que o estudo foi feito com os estudantes de Pedagogia em aulas. Mas, não diz como isso foi feito, apenas traz as experiências dos licenciandos com o foco no objetivo que é o de socializar as ações desenvolvidas no subprojeto do PIBID de Geografia, denominado Formação docente e Geografia escolar: das práticas e saberes espaciais à construção do conhecimento geográfico. Como as autoras não afirmam qual metodologia utilizam, esse trabalho não foi contabilizado na Tabela 2.

No que tange às metodologias, há algumas que evidenciam a natureza de se constituir como método de pesquisa, tais como pesquisa-intervenção, pesquisa-formação, método de simulação, enquanto outras revelam dispositivos utilizados em algum outro método que não é claramente enunciado no trabalho. Assim, há trabalhos que na metodologia se desenvolvem a partir de dinâmicas, seminários, diário de aula, exposição dialogada, estudo dirigido etc. Neste aspecto, esse conjunto é maior e mais frequente, revelando uma tendência de que os trabalhos, que são reflexões da prática ou evidenciam estudos sobre a prática, adotam metodologias que se confundem com estratégias metodológicas para o desenvolvimento da aula.

Para o caso dos trabalhos em que o professor analisa sua própria prática, fica evidente que os dispositivos são os que o professor desenvolve para ministrar a aula. E, a partir dos dispositivos, concluem sobre os resultados que a prática gera, tanto para os estudantes, como para o docente do ponto de vista da reflexão/problematização que desenvolve. Isso pode ser evidenciado no trabalho que utiliza a roda de conversa como elemento metodológico para o desenvolvimento da prática. As rodas são concebidas como elementos de formação dialógica, em que o conceito de inovação é visto pelo viés da reflexividade de si e da produção de narrativas que se fundamentam na experiência formativa. Esse resultado é concebido tanto para se pensar a prática docente e seus atributos colaborativos na formação, como resultado da perspectiva dialógica que evidencia o modo como a formação inicial de professores acontece.

Concepções de inovação: da variação metodológica à mudança de paradigmas

O conceito de inovação é polissêmico e se apresenta em diferentes áreas do conhecimento. No campo dos estudos educacionais, o termo tem uma acentuada variação semântica, mas se situa em uma compreensão comum de que a inovação implica sempre a ideia de mudanças. O conceito de inovação, em diferentes áreas do conhecimento, continua em destaque nacional, sendo debatido nas instâncias políticas, econômicas e, consequentemente, na universidade, sobretudo quando são focalizadas as questões sobre a prática educativa que os professores desenvolvem. No entanto, é bom que se diga que o termo obteve ênfase, primeiramente, nos campos das ciências econômicas e empresariais (Mota, 2011). Especificamente, na educação, a inovação ganha espaço nos debates a partir da década de 1960. Veiga (2003) analisa, em seus estudos sobre o projeto político-pedagógico, dois significados sobre inovação: como ação regulatória ou técnica, e como ação emancipatória ou edificante. Nos interessa, no contexto deste trabalho a compreensão do segundo significado, pois ele tem direta relação com a ideia de que a prática inovadora, de algum modo, transforma as práticas e emancipa as ações, gerando sensação de autonomia do professor ao refletir e ao transformar sua prática na universidade.

Nesta acepção, segundo o que preconiza Veiga (2003), a inovação enquanto ação emancipatória constitui-se em bases epistemológicas da ciência emergente, em que o sujeito deixa de ser objeto e passa a ser autor de sua própria prática. Isso abre um espaço significativo para que professores e pesquisadores focalizem a sua própria prática como objeto de reflexões, logo, como um objeto que interessa a ciência. Esse movimento faz superar as dicotomias da ciência conservadora, organizando-se a partir do cotidiano, dos processos comunicativos na universidade e das interações entre os sujeitos, professores e estudantes, ultrapassando as meras questões técnicas.

É desse pensamento, e observando o conjunto de conceitos que apresentam diferentes perspectivas de inovação nos trabalhos analisados, que consideramos que a natureza epistemológica do fazer docente, no contexto da inovação de práticas universitárias estão no cerne das experiências inovadoras. Conforme Cunha (2001, p. 37), “a ruptura necessária propõe a atitude epistemológica que permite reconfigurar conhecimentos para além das regularidades propostas pela modernidade”. Ao analisarmos as perspectivas de autores que concebem a inovação enquanto mudanças necessárias, nos deparamos com o que Masetto (2003) considera, ao conceber que a inovação acontece à medida que as concepções antigas não sustentam as demandas da sociedade atual, pois

inovação e mudança andam juntas, mas só acontecem de fato quando as pessoas nelas envolvidas se abrem para aprender, para mudar, para adquirir novos conhecimentos, para alterar conceitos e ideias trabalhadas, às vezes, durante muitos anos, para assumir novos comportamentos e atitudes não comuns até aquele momento, para repensar a cultura pessoal e organizacional vivida até aquele momento, para mudar suas próprias crenças e aderir a novas e fundamentais maneiras de pensar e de agir. (p. 200-201)

Nesse sentido, a inovação nas práticas educativas dos professores universitários se desenvolve, necessariamente, a partir das discussões e disposições que cada docente tem para pensar em sua prática, entendendo e defendo que, de uma maneira ou de outra, ela revela mudanças e disposição para fazer algo diferente, que demande algum tipo de inovação. Assim, discussões sobre as questões epistemológicas que sustentam as discussões sobre a inovação na prática de docentes universitários, evidencia certas particularidades que emergem dos contextos específicos em que cada prática é desenvolvida. Isso tem a ver com o modo como cada professor concebe a inovação, gerando, nesse conceito, como assevera Fullan (2007), a utilização de materiais, estratégias e recursos que promovam aprendizagens que estejam relacionadas às mudanças que advém disso.

Nesta direção, as inovações na prática educativa de docentes universitários, ainda que seja adotando um seminário temático como elemento basilar para promover a prática inovadora, tem por prerrogativa tornar os alunos protagonistas no processo de ensino-aprendizagem. Além disso, pensar em diferentes estratégias faz com que os professores se mobilizem a buscar a constantemente formas outras para possibilitar as implementações inovadoras, tornando-as uma realidade motivacional no seu fazer pedagógico.

Porém, conforme assegura Fullan (2007) há de se considerar diferentes dimensões quando se fala em inovação pedagógica, entendida nesse trabalho como práticas educativas que os professores realizam no contexto da docência universitária. Segundo o autor, são três as dimensões: primeiro a utilização de novos materiais ou recursos tecnológicos; segundo o uso de reformadas estratégias ou atividades; e a terceira é a modificação de crenças por parte dos partícipes. No entanto, todas as dimensões só serão possíveis de serem analisadas no contexto das práticas educativas dos professores se eles se dispuserem ao processo de aprendizagem e de efetivação dessas práticas a partir de uso dos novos recursos, estratégias, meios e comportamentos. Ainda segundo o referido autor, é muito difícil inovar na prática, pois isso envolve mudanças nas concepções e nos comportamentos dos docentes, que precisam se dispor para utilizar recursos e estratégias que demandem uma adequação às realidades educacionais dos estudantes, “daí que seja tão difícil de obter” (Fullan, 2007, p. 32).

Ao se observar o que aparece enquanto inovação na prática defendida no conjunto dos trabalhos, percebemos uma variação grande de significados, revelando uma polissemia do conceito de inovação. Em alguns textos, vê-se como inovação a ação de realização de oficinas promovendo interdisciplinaridade entre diferentes componentes curriculares. De algum modo, essa ideia se assenta em uma relação de usar estratégias interdisciplinares para promover a inovação no que tange ao ensino de um determinado componente curricular. Como pondera Fullan (2007), ao realizar as oficinas de modo interdisciplinar, o docente promove a realização de estratégias e até de recursos didático-metodológicos para promover a inovação. Mas, de fato, não se vê uma inovação postulada nas três dimensões que o autor considera, mesmo porque não se evidencia nesse significado de inovação o fato de se alterar a crença dos estudantes para conceberem uma prática interdisciplinar e inovadora.

Em um outro trabalho, percebemos que o conceito de inovação significa o uso do Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) por deficientes visuais. Trata-se de uma estratégia metodológica que desenvolve o professor para transformar sua prática, permitindo que deficientes visuais logrem êxito no uso de uma plataforma de ambiente virtual de aprendizagem. Ao considerar esse significado de inovação que aparece no trabalho analisado, vimos que a inovação está de acordo o que preconiza Lucarelli (2005), pois a prática gerou uma ruptura, uma transformação de modos de fazer que permite ao professor desenvolver uma estratégia que garanta a um deficiente visual poder participar de um ambiente AVA, que, de certo modo, exige a habilidade de visão dos estudantes. Ademais, é possível dizer que esse significado de inovação está em sintonia com o que Fullan (2007) defende nas dimensões que discorre para conceber a amplitude da prática inovadora.

Ao desenvolver a estratégia para que os cegos participem, o professor atende ao que preconiza as dimensões analisada por Fullan (2007), ou seja, o professor utiliza materiais e recursos tecnológicos para garantir que haja uma reforma das estratégias, antes utilizadas, para promover aprendizagens nos estudantes, o que leva à ratificação da possibilidade de cegos utilizarem o ambiente AVA, portando confirmando que houve uma modificação da crença dos próprios estudantes em torno das possibilidades de se utilizar o AVA para desenvolvimento de aprendizagens de estudantes com deficiência visual.

Um dos trabalhos que o professor reflete sobre sua própria prática concebeu a inovação a partir da ideia de inserção de dispositivos móveis no contexto da aprendizagem dos estudantes. Assim, utilizar os dispositivos móveis e o que eles oferecem em torno dos aplicativos, permite-nos entender que o autor concebe uma dupla dimensão do conceito de inovação. Uma que encontra respaldo no próprio uso da tecnologia em sala de aula, acreditando que a inovação é a tecnologia que representa a possibilidade de a universidade incorporar os recursos tecnológicos a serviço do desenvolvimento das aprendizagens dos estudantes. Outra que também se aproxima das concepções de Cunha (2001) e Fullan (2007) quando entendem a inovação no campo das estratégias que faz o professor e gera aprendizagens, mudanças paradigmáticas do modo de como o trabalho educativo acontece para gerar novas aprendizagens, logo para possibilitar a transformação da prática.

Portanto os significados sobre inovação que aparecem nos trabalhos voltam-se para um tronco comum de concebê-la enquanto possibilidade de modificação de práticas tradicionais, revelando modos de compreensão de um fazer que se justifique pela necessidade de desenvolver aprendizagens nos estudantes. A reflexão se instaura como princípio norteador da prática, mas não revela, diretamente, movimentos de problematização da prática que justifiquem rupturas e mudanças de paradigmas no campo da docência. Apesar da evidência de transformação de uma e outra prática educativa, no conjunto delas vemos o foco na alternância de estratégias como concepção de inovação. Assim, o docente deixa de fazer uma aula expositiva e a desenvolve enquanto estudo dirigido, realização de seminários, dinâmicas, círculo de leitura, exposição dialogada entre outras, como forma de concebê-las enquanto práticas inovadoras.

Há, em alguns trabalhos, a ideia de que a inovação se estrutura como uma pesquisa que se desenvolve a partir de estudos sobre a prática. Tal significação se justifica pela condição que se impõe ao docente de realizar pesquisas sobre seu fazer docente. Neste sentido, vemos o significado de inovação sendo veiculado por práticas que se originam de aulas desenvolvidas a partir de pesquisa-intervenção, rodas de conversa, pesquisa-formação, método de simulação de problemas, estudo de caso, entre outros, que trazem para o debate das práticas educativas na universidade o papel do professor pesquisador enquanto inovador de sua própria prática.

Considerações finais

Escrever as considerações finais de um trabalho sempre se apresenta como um elemento desafiador para quem escreve um texto reflexivo como é o caso deste texto. É no movimento de pensar o que ainda dizer, o que não foi dito ou o que dizer além do que já foi dito, que encaminho a discussão para fechar a discussão refletindo as contribuições que a elaboração dele nos favoreceu. Assim sendo, e não desejando nos repetir, passamos a considerar alguns elementos que se fazem necessários se presentificar, ainda que nesta parte final.

Inicialmente, o estudo nos permitiu concluir que o conceito de inovação é, como o conceito de conhecimento, polissêmico, e até mesmo polêmico, uma vez que cada trabalho aqui analisado, logo, para cada autor que os escreveu, existe um conceito de inovação, uma abordagem sobre a qual cada autor se debruçou e se permitiu tratar, não dando ao outro a condição de negar a sua ideia da inovação impressa em cada texto escrito. Assim sendo, o caráter polêmico advém de uma condição contextual em que se insere a questão da inovação na universidade, sobretudo quando tratamos de práticas educativas, que são eleitas por alguém que a concebe inovadora, exatamente por entendê-la diferente e transformadora e por considerá-la, sobretudo, como uma prática que se caracteriza pela quebra de paradigmas.

Ao definirmos o parâmetro analítico de considerar o conceito de inovação pelo que preconiza Cunha (2001), Cunha e Lucarelli (2005), Fullan (2007) nos colocamos em uma prerrogativa qualificadora, sobre a qual seria possível definir e identificar qual trabalho foi inovador e qual não foi. No entanto, a dinâmica adotada na reflexão que se fez neste trabalho não nos permitiu considerar uma classificação de adequação ou não dos trabalhos. O que de fato fizemos foi buscar mapear quais são as compreensões que os autores revelam sobre uma prática inovadora quando escrevem suas práticas e submetem a um evento que tem como título Seminário Pedagogia do Ensino Superior: Partilha de Práticas Inovadoras.

Neste sentido, o estudo mostrou que de um modo ou de outro todas as práticas são inovadoras, pois se enquadram em uma lógica de que essa é uma prática diferente de outras que os professores já realizaram. Assim, a mudança na prática já determina uma forma dos autores conceberem que a mudança aponta para uma perspectiva de que a inovação atende, no contexto da docência universitária, uma outra forma, uma outra estratégia de promover a aprendizagem dos estudantes.

Assim, os professores têm concebido a inovação da prática como uma forma de fazer diferente o que já fazem no contexto de suas aulas, buscando criar novas estratégias e novas formas de potencializar a aprendizagem dos estudantes. Os professores entendem, quando escrevem e submetem o texto ao evento, que a prática inovadora não é aquela que tem só recursos tecnológicos ou que gera a quebra de paradigmas, que provoca rupturas do fazer docente, mas que, de algum modo se constitui na diferença, na alternância dos fazeres na universidade, que acontece para cada um de modo peculiar, tendo em vista a realidade que cada docente vivencia com seus alunos no cotidiano das atividades pedagógicas que desenvolve.

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Recebido: 03 de Agosto de 2018; Aceito: 13 de Setembro de 2020; Publicado: 08 de Março de 2021

Endereço para correspondência Fabrício Oliveira da Silva, Universidade Estadual de Feira de Santana, Av. Transnordestina S/N, Novo Horizonte, 44100-000, Feira de Santana, BA, Brasil. fosilva@uefs.br

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