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Ensino em Re-Vista

versão On-line ISSN 1983-1730

Ensino em Re-Vista vol.28  Uberlândia  2021  Epub 29-Jun-2023

https://doi.org/10.14393/er-v28a2021-20 

Dossiê 2 - História da educação matemática

Uma história da Formação de Professores de Matemática na Universidade Federal de Rondônia - UNIR, em Ji-Paraná (1988-2012)

Una historia de la formación del profesorado de matemáticas en la Universidad Federal de Rondônia en Ji-Paraná (1988-2012)

Marlos Gomes de Albuquerque1 
http://orcid.org/0000-0002-3242-4823

José Luiz Magalhães de Freitas2 
http://orcid.org/0000-0001-5536-837X

1Doutor em Educação em Ciências e Matemática. Universidade Federal de Rondônia - UNIR, Ji-Paraná, Rondônia, Brasil. E-mail: marlos@unir.br.

2Doutor. PPGEduMat-UFMS e MECMAT-Uniderp, Campo Grande, Mato Grosso do Sul. E-mail: joseluizufms2@gmail.com.


RESUMO

Este artigo resulta de uma pesquisa de doutorado que teve como objetivo fazer uma construção histórica da trajetória do curso de Licenciatura Curta em Ciências com Habilitação em Matemática, desde sua criação, processo de consolidação até o atual curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), em Ji-Paraná. Ancorado metodologicamente na História da Educação Matemática, buscou-se vestígios para a construção das fontes por meio de: entrevistas com algumas testemunhas oculares, documentos oficiais e imagens fotográficas, dentre outras. Para a análise, foram utilizados recursos da pesquisa documental. Os resultados evidenciam que o curso se constituiu com um corpo docente vindo das diferentes regiões brasileiras, e saiu de uma formação polivalente em Ciências para uma formação mais conteudista em Matemática; porém, com a criação da Semana de Matemática (SEMAT) e a formação em nível de Pós-Graduação stricto sensu dos professores formadores, caminhou para uma forte tendência em Educação Matemática.

PALAVRAS-CHAVE: História da Educação Matemática; Ensino Superior em Rondônia; História da Licenciatura

RESUMEN

Este artículo es el resultado de una investigación doctoral que tuvo como objetivo hacer una construcción histórica de la trayectoria del Curso de Licenciatura en Ciencias con Calificación en Matemáticas, desde su creación, proceso de consolidación hasta la Licenciatura en Matemáticas actual en la Universidad Federal de Rondônia (UNIR) en Ji-Paraná. Anclados metodológicamente en la Historia de la Educación Matemática, buscamos rastros para la construcción de las fuentes a través de: entrevistas con algunos testigos oculares; documentos oficiales e imágenes fotográficas, entre otros. Para el análisis, se utilizaron recursos de investigación documental. Los resultados muestran que el curso se constituyó con un personal docente proveniente de diferentes regiones brasileñas y dejó una formación multipropósito en Ciencias, para una formación más polémica en Matemáticas, sin embargo, con la creación de la Semana de Matemáticas (SEMAT) y la formación en Stricto Sensu, nivel de posgrado de formadores de docentes, se ha movido hacia una fuerte tendencia en la educación matemática.

PALABRAS CLAVE: Historia de la educación matemática; Educación superior en Rondônia; Licenciatura en Historia

ABSTRACT

This article is the result of a doctoral research that aimed to make a historical construction of the trajectory of the Short Degree course in Sciences with Qualification in Mathematics, since its creation, consolidation process until the current Degree in Mathematics at the Federal University of Rondônia (UNIR) in Ji-Paraná. Anchored methodologically in the history of Mathematics Education, traces were sought for the construction of the sources through interviews with some eyewitnesses, official documents and photographic images, among others. For the analysis, documentary research resources were used. The results show that the course was constituted with a teaching staff coming from different Brazilian regions and left a multipurpose formation in Sciences, for a more contentious formation in Mathematics, however, with the creation of the Mathematics Week (SEMAT) and the formation in stricto sensu graduate level of teacher educators, has moved towards a strong trend in Mathematics Education.

KEYWORDS: History of Mathematics Education; Higher Education in Rondônia; Degree History

O passado é, por definição, um dado que nada mais modificará.

Mas o conhecimento do passado é uma coisa em progresso, que incessantemente se transforma e aperfeiçoa.

Marc Bloch

Introdução

Este artigo é decorrente da tese intitulada Da formação polivalente ao movimento da educação matemática: uma trajetória histórica da Formação de Professores de Matemática na Universidade Federal de Rondônia, em Ji-Paraná (1988-2012), que objetivou fazer uma construção histórica acerca do percurso do curso de Licenciatura Curta em Ciências com Habilitação em Matemática, perpassando por sua criação, processo de consolidação até o atual curso de Licenciatura em Matemática.

A construção histórica é suscitada quando possibilita compreender o passado e sua representação, entre o que foi e o que não é mais, de forma que permita o desenvolvimento de uma reflexão sobre a história (CHARTIER, 2010).

Quando se ultrapassa a ideia de que a história não é uma cópia do que ocorreu no passado, mas sim uma construção do historiador, a partir de vestígios que esse passado deixou no presente, passa-se a tratar a história como uma produção (VALENTE, 2013, p. 25).

A opção por esta investigação no campo da história ocorre pela escolha do primeiro autor deste artigo ter sido o primeiro professor concursado com formação específica em Matemática para atuar no curso que estava sendo implantado, em 1992, em substituição a Licenciatura Curta em Ciências, iniciado apenas quatro anos antes, em 1988. Este autor concebe, ainda, que “A história deve esclarecer a memória e ajudá-la a retificar os seus erros” (LE GOFF, 2003, p. 29), o que o fez optar em realizar a presente pesquisa e não se apoiar em suas memórias exclusivamente, mas buscar entender como, historicamente, o curso se constituiu no que é na atualidade.

A contextualização apresentada nos encaminha ao problema cerne desta pesquisa, que foi elaborado e dividido em duas dimensões: que modelos de formação de professores circularam e foram apropriados para a constituição do curso de Licenciatura em Matemática na UNIR, em Ji-Paraná? Como explicar as apropriações localmente desses modelos que circularam nacionalmente?

O tempo histórico, como o período abordado nesta pesquisa, é uma atribuição exclusiva do historiador. Os autores da Escola de Annales defendem isso com muita clareza, a exemplo de Bloch (2001, p. 150): “Na medida em que nos limitamos a estudar, no tempo, cadeias de fenômenos aparentados, o problema é, em suma, simples. É a esses próprios fenômenos que convém solicitar seus próprios períodos”.

A concepção empreendida por Bloch nos levou a definir o recorte temporal no período compreendido entre 1988 a 2012: o início, 1988, por ser o ano em que foi criado o curso objeto de estudo; o término, 2012, marca 10 anos após a implantação das Diretrizes Nacionais para Formação de Professores de Matemática. Com este marco temporal, debruçamo-nos em entender como ocorreu o processo de construção histórica do curso de formação de professores de Matemática em Ji-Paraná.

Da atuação de algumas IES no Território Federal de Rondônia à criação e interiorização da UNIR: um retrospecto histórico

A história se constrói entre permanências e rupturas de tal forma que demarcar a origem do curso objeto deste estudo, apenas a partir de sua criação no ano de 1988, seria, no mínimo, anacrônico, uma vez que existiram diversos movimentos que contribuíram para a sua existência. Não é objetivo, nesta pesquisa, buscar a origem como um ponto fixo condicionante para a licenciatura local, “Afinal, a origem de algo não justifica que, hoje, esse algo seja assim ou assado. A origem não justifica a permanência, pois o movimento histórico não pode ser apreendido linearmente” (GARNICA; SOUZA, 2012, p. 25-26), mas pressupondo a construção de vestígios e estudos intensivos para se entender de que forma foi construída uma cultura de formação de professores de Matemática no campus da UNIR em Ji-Paraná.

Os primeiros registros de Ensino Superior em Rondônia remontam à década de 1970, “Quando [...] no ano de 1973, foi viabilizado um convênio entre o Governo do Território Federal de Rondônia e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Assim foram instalados os primeiros cursos superiores no Território de Rondônia” (RUEZENNE, 2012, p. 59).

O processo desses cursos que compõem parte da história local tem conexão direta com a história nacional/global. Seria um erro conceber que tudo foi se constituindo localmente no isolamento:

Indiscutivelmente, o erro não está em considerar as parcialidades, o erro não está na busca da compreensão do que se dá no nível local, regional ou nacional, mas em cair no que costumo chamar de visão focalista da realidade de acordo com a qual perdemos a compreensão da totalidade (FREIRE3, 2000 apudSILVEIRA FILHO, 2003, p. 8).

Houve, no ano de 1967, por todo o Brasil, a implantação do Projeto Rondon, com o objetivo de executar ações paliativas no sentido de minimizar problemas sociais nas regiões mais carentes do interior brasileiro. O projeto chega em Rondônia via celebração de convênio entre o Governo do Território e a UFRGS para a instalação de uma extensão desta IES em Porto Velho.

Os cursos oferecidos foram de licenciatura curta nas áreas de Artes Plásticas, Ciências, Estudos Sociais e Letras. O curso de Ciências era de formação polivalente, aspecto comum à época de sua criação, em que urgia por todo o país a necessidade dos serviços de um professor que transitasse entre as áreas de matemática, física, biologia e química.

No dia 22 de fevereiro de 1975, colaram grau, ao todo, 81 alunos dos quatro cursos. A solenidade ocorreu no salão de atos da Escola Carmela Dutra, e também marcou o encerramento desta IES em Rondônia (ALBUQUERQUE; MAIA, 2008). As ações desenvolvidas por este projeto se espalharam pelo país e duraram 22 anos, sendo encerrado em 1989.

O término das atividades do Projeto Rondon, em Rondônia, levou o Governo local, em 18 de maio de 1976, celebrar um convênio com o Núcleo de Educação pertencente ao Centro de Educação da Universidade Federal do Pará (UFPA), tendo por finalidade implantar o Núcleo de Educação da UFPA, em Porto Velho (ALBUQUERQUE; MAIA, 2008).

Os cursos executados foram: Licenciatura em Letras, Estudos Sociais e Ciências Naturais. Este último formava o professor para atuar com as disciplinas de Ciências e Matemática no primeiro grau. As atividades da UFPA foram encerradas, em Rondônia, no ano de 1985.

Outras Universidades da região amazônica também atuaram em Rondônia, ainda na condição de Território Federal: Escola Superior de Educação Física do Pará (ESEF), que iniciou sua trajetória em 1976 e encerrou em 1982; Fundação Universidade Federal do Acre (FUFAC), entre o período de 1977 e 1979; e, Faculdade de Ciências Agrárias do Pará, que tão logo concluiu as turmas teve o convênio encerrado.

Há uma relação indissociável entre presente e passado, isto é, entre estas IES que atuaram em Rondônia e os vestígios que foram perscrutados nesta pesquisa. Por este passado, ou “Nesta devoção pelo passado há, no entanto, fendas através das quais se insinuam a inovação e a mudança” (LE GOFF, 2003, p. 217), de maneira que tais mudanças desencadearam um movimento que levou a sociedade a reivindicar o oferecimento de ensino superior por uma instituição rondoniense.

A primeira IES criada genuinamente neste Território Federal foi a Fundação Centro de Ensino Superior de Rondônia (FUNDACENTRO), que estava localizada em Porto Velho, período em que a capital passava por plena expansão urbana. Sua criação se deu através da Lei nº 108, datada de 08 de julho de 1975, e assinada pelo Prefeito Sr. Antônio Carlos Cabral. Dada a morosidade das tramitações burocráticas, seu funcionamento não ocorreu logo após a assinatura da lei, sendo que, durante este período, outras IES atuaram localmente, a exemplo da UFPA.

A aula inaugural só foi realizada no dia 08 de agosto de 1980, tendo como conferencista o então Governador Sr. Jorge Teixeira de Oliveira, que, em sua fala, destacava o apoio ao projeto de criação da UNIR.

Rondônia foi emancipada para a condição de Estado através da Lei Complementar nº 47, de 22 de dezembro de 1981. Advinda da luta dos pioneiros deste que era o mais novo Estado da União, e com apoio das autoridades locais, no dia 08 de julho de 1982, pela Lei nº 7011, enfim, foi criada a Universidade Federal de Rondônia - UNIR.

O professor Euro Tourinho Filho, que anteriormente presidia a comissão de estudos para a criação da UNIR, foi nomeado pelo então Presidente da República, João Batista de Figueiredo, em setembro de 1982, como o primeiro Reitor. Desta forma, teve a responsabilidade de consolidar esta IES em Rondônia, tarefa árdua tendo em vista que os primeiros recursos orçamentários só saíram em 1983.

Ressalta-se que em anexo a Resolução do Conselho Diretor nº 04/CD, de 1982, a comissão esclarece que os cursos de Administração, Ciências Contábeis e Ciências Econômicas, que eram ministrados pela FUNDACENTRO, foram assumidos pela UNIR por força da Lei n° 7.011.

Os demais cursos indicados na lista proposta para realização do primeiro vestibular, realizado em 1983, foram: Administração, Ciências Contábeis, Ciências - Habilitação em Matemática, Educação Física, Geografia, História, Letras e Pedagogia. Faz-se relevante destacar que eles já estavam em funcionamento no Estado, e eram ministrados pela UFPA, tendo sua absorção, mais tarde, pela UNIR.

Considerando a grande extensão territorial de Rondônia (237.590,864 quilômetros quadrados)4, e que centralizar todas as atividades da UNIR apenas na capital Porto Velho impossibilitaria que boa parte da população rondoniense pudesse ter acesso ao curso superior, o Conselho Diretor da Universidade, em 1988, passa por uma ruptura em sua estrutura organizacional e aprova a expansão para outras regiões do Estado, iniciando a interiorização da universidade. As primeiras unidades, denominadas de campi avançados, foram escolhidas priorizando uma divisão geográfica de modo que atendesse a população em todo o Estado. A figura 1 traz, no mapa de Rondônia, a indicação de cada campi da UNIR, com as cores representando o ano de criação de cada um deles.

Fonte: Autoria própria.

FIGURA 1: Expansão da UNIR para o interior do Estado.  

Todos os cursos eram de licenciatura curta e tinham como objetivo formar mão de obra para atender à crescente demanda na área de Educação.

O Campus da UNIR em Ji-Paraná: construindo identidade para a formação de professores de Matemática

A UNIR, enquanto instituição educacional, “Reorganiza-se de facto, dando corpo as características mais genuínas da monografia historiográfica e intenta construir uma identidade histórica, tomando em atenção as coordenadas de tempo e do espaço” (MAGALHÃES, 1999, p. 64). Assim, é imbuídos desta relação de tempo e espaço enquanto variável histórica que trazemos à tona uma história do campus e do curso objeto deste estudo.

Dentro do processo sistêmico de interiorização, após o término dos cursos iniciados pela UFPA, a cidade de Ji-Paraná, distante 370 quilômetros da capital Porto Velho, recebe um campus da UNIR. O primeiro curso implantado foi o de Licenciatura em Ciências, com habilitação em Matemática. Sua criação foi oficializada via Convênio 001, de 24 de junho de 1988, celebrado entre a UNIR e o Município de Ji-Paraná, assinado pelo Reitor Álvaro Lustosa Pires e pelo Prefeito Roberto Jotão Geraldo.

O convênio teve como objetivo a cooperação financeira e administrativa do “Campus Urupá”, denominação que aparece no convênio e também em atas do Conselho de Campus e do Conselho de Departamento, além de vários documentos referentes aos primeiros anos de implantação do curso. Urupá é o indígena pertencente aos povos urupás, hoje considerado extinto e que habitou Rondônia no século XIX (HOUAISS, 2001); porém, tal informação não é conhecida da maioria dos ji-paranaenses.

O professor Eudes Barroso Junior foi nomeado pelo reitor Álvaro Lustosa Pires através da Portaria nº 183, de 1° de junho de 1988, para coordenar o curso de Ciências com habilitação em Matemática, e prestar assessoramento no tocante à implantação e estruturação do Campus Urupá.

Após a realização do primeiro vestibular, a aula inaugural foi realizada no prédio do antigo supletivo. Os alunos foram notificados pelo rádio, sendo que a expectativa era imensa a ponto de não acreditarem que, agora, a Universidade Federal era uma realidade. O professor Eudes Barroso Junior, que ministrou a aula inicial, acrescenta:

Quando marquei a noite, sete horas da noite no Supletivo, eu tinha acabado de estruturar a parte de secretaria, na parte de cima. Os alunos foram chegando, e eu fui olhando e eles chegavam e diziam: É aqui que vai funcionar a Universidade? Você que é o professor? Falei sim. Você representa a Universidade? Sim, sou eu que estou representando a universidade (JUNIOR; SOUZA, entrevista concedida em 15 de novembro de 2012).

Coube também ao professor Eudes proceder com a seleção dos professores. O evento ocorreu em duas etapas: inicialmente, procedia-se com a análise de currículo e, em seguida, de posse dos dados analisados anteriormente, era realizada uma entrevista, na qual era apresentada a proposta da instituição e percebia-se o interesse do candidato. O professor selecionado seria cedido temporariamente pelo Estado ou pelo Município para a Universidade.

Dentre os docentes selecionados, poucos tinham experiência com o Ensino Superior, a exemplo da professora Maria Leopoldina Froes Yague, que nos falou sobre a seleção para docentes:

eu era funcionária do Território, mas tinha um contrato de 20 horas com o Estado. Então foi com meu contrato de Estado, que me cederam para a UNIR. Antes, eu havia trabalhado aqui, com o Campus da Universidade Federal do Pará, eu fui a coordenadora do Campus da Universidade Federal do Pará. Depois que esses cursos acabaram já criou a Universidade Federal de Rondônia, mas só foi em Porto Velho [...]. Quando vieram para Ji-Paraná, eles me procuraram para trabalhar com esta perspectiva de cedência. Para isso houve essa seleção (YAGUE, entrevista concedida em 5 de março de 2013).

O curso ficou por pouco tempo nas instalações emprestadas pelo Supletivo, sendo que, em 1989, passou para o local onde funciona na atualidade. As reuniões entre a gestão da UNIR, representada pelo professor Eudes, com prefeito e vereadores de Ji-Paraná eram constantes. Para a instalação do curso, ficou acordado entre as partes que a Prefeitura cederia o local para instalação dos cursos e, consequentemente, do campus; a ação foi efetivada via Lei Municipal nº 448, em 18 de setembro de 1992.

A pesquisa em voga requer alguns recortes temporais, que antes mesmo de justificá-los, trazemos os escritos de Bloch que, sabiamente, afiança:

O rio das eras corre sem interrupção. Nisso, também, todavia, é preciso que nossa análise pratique recortes. Pois a natureza do nosso espírito nos proíbe de apreender até mesmo o mais contínuo dos movimentos, se não o dividirmos em balizas. Como fixar, ao longo do tempo, as da história? Elas serão sempre, num escrito, arbitrárias. Além disso, é importante que coincidam com os principais pontos de inflexão da eterna mudança (BLOCH, 2001, p. 147).

Entendemos como Bloch, que nosso olhar deve centrar para determinados pontos de inflexão que foram estabelecidos pelas modalidades de curso.

A formação em Ciências com habilitação em Matemática (1988-1994)

O Curso de Ciências Licenciatura de 1º grau com habilitação em Matemática foi autorizado via Parecer nº 1.050, do Conselho Federal de Educação. O relator tece elogios pela louvável iniciativa da instituição, centrada nos elevados propósitos de reduzir a carência de recursos humanos qualificados para o ensino, fazendo referência que o curso na sede já estava reconhecido pelo então Ministro de Estado da Educação Jorge Bornhausen, através da Portaria MEC nº 322, de 11 de maio daquele mesmo ano.

Enquanto o curso era autorizado localmente, havia uma movimentação nacional contrária a este modelo de formação polivalente em cursos de curta duração. Algumas universidades já não mais aceitavam esse método de formação de professores, que surgiu de forma autoritária ainda no regime militar.

O curso foi implantado como extensão do Campus de Porto Velho. A primeira matriz curricular correspondia aos seis primeiros semestres do mesmo curso que funcionava na capital na modalidade de licenciatura plena, com 8 semestres. O egresso era habilitado para trabalhar com as disciplinas de Matemática e Ciências no 1º grau e, em casos excepcionais, lecionava a disciplina de Matemática no 2º grau.

No tocante aos professores, os primeiros concursos destinados ao preenchimento de vagas para carreira docente do Magistério Superior foram autorizados pelo primeiro Reitor eleito, José Dettoni, via Portaria nº 6/CONSUN, de 05 de setembro de 1989. Apesar do concurso, o curso permaneceu, durante muito tempo, recebendo a contribuição de professores cedidos pelo Estado e município.

Em 1989, o campus passa a oferecer dois cursos: Ciências e Pedagogia. As atribuições inerentes ao cargo de Coordenação de Cursos foram lembradas por Irmgard Margarida Theobald, docente desta IES desde 1990, e uma das primeiras professoras do campus a exercer o cargo:

A coordenação cuidava da parte discente, acompanhava a matriz curricular, não importava o curso que fosse: Ciências ou Pedagogia, a gente tinha que cuidar disso, acompanhar a matriz curricular, acho que era em 91 ou 92. Naquele tempo, a gente tinha que ter a ficha dos alunos em mãos, o pessoal da secretaria digitava alguns documentos, os alunos preenchiam todas as fichas, tudo manualmente. A gente usava ainda aquela máquina de datilografia para fazer os memorandos, os documentos, o carbono para fazer em duas vias. A matrícula dos alunos era tudo feito manualmente. Tinham as pastas com as ementas, de cada disciplina. O primeiro computador, quem me apresentou foi o professor Artur Moret, ele era o único professor que sabia mexer com computador aqui (THEOBALD, entrevista concedida em 23 de maio de 2013).

As últimas turmas de Licenciatura curta em Ciências foram abertas em 1993 e 1994, todavia seu reconhecimento só ocorreu em 21 de julho de 1995, através da Portaria 873/MEC. Entretanto, durante a realização da pesquisa não foram encontradas informações que explicassem a morosidade no reconhecimento do curso.

Promover uma formação que habilitasse o professor a trabalhar apenas com o 1º grau, contudo, já não atendia as expectativas na época. Assim, a licenciatura curta sai de cena para dar lugar à Licenciatura em Matemática.

A Licenciatura em Matemática (1992-2012)

O Conselho Universitário da UNIR (CONSUN), em 06 de maio de 1992, aprovou, por meio da Resolução nº 071, o Projeto Integrado de Qualidade Educacional (PIQUE), que foi definido como um conjunto de ações com o intuito de abranger todos os campi do interior, buscando melhor qualidade didático-pedagógico-administrativa, redimensionando o oferecimento dos cursos e otimizando os recursos, propondo, ainda, criar polos de concentração por área de conhecimento nos campi. Dentre as ações do PIQUE, foi criada em Ji-Paraná a Licenciatura em Matemática, uma vez que já existia neste município o curso de Ciências.

Identifica-se neste ponto de inflexão um período em que houve uma interseção de duas licenciaturas funcionando concomitantemente no campus (1992-1994). De acordo com Bloch (2001, p. 151), “Não é de modo algum impossível, a priori, que, com a experiência, as fases naturais de fenômenos de ordem aparentemente bem diversas venham a se superpor”. A justificativa dos dois cursos funcionando ao mesmo tempo ocorreu em virtude de que o primeiro estava concluindo suas turmas ingressantes em 1990 e 1991, enquanto o segundo estava apenas iniciando.

Com a implantação da Licenciatura em Matemática, no ano de 1992, só depois de quatro anos de existência do curso que formava professores de Matemática para atuar no 1º grau, é que a UNIR promove o primeiro concurso para contratação de professor de Matemática; outros concursos vieram, porém em número pequeno e em tempo mais espaçado.

Destarte, a implantação deste curso veio atender as solicitações dos licenciandos de Ciências ao perceber que a formação, apenas em nível de 1º grau, não atendia a demanda de profissionais habilitados no Estado. Os estudantes apresentaram à coordenação um documento da Secretaria de Educação do Estado (SEDUC) comprovando a necessidade, imediata, de contratação de 238 professores para atuar no 2º grau em Rondônia, 18 deles em Ji-Paraná. Em seu percurso, esta licenciatura foi sendo consolidada por suas diversas ações realizadas ao longo de sua existência.

A Complementação/plenificação de Curso (1993-1995)

Na iminência de possibilitar aos egressos do Curso de Ciências atuarem também no ensino de Matemática do 2º grau, foi criada a Complementação de Estudos. A matriz curricular para a plenificação foi aprovada com 990 horas e autorizada pelo CONSEPE via Portaria nº 101, de 13 de outubro de 1993. As disciplinas correspondiam ao bloco final, sendo que, em geral, são ministradas nos últimos períodos em cursos de licenciatura plena.

Por ser um projeto especial, e considerando que o número de professores que estava na expectativa de plenificação de seus cursos era grande, o Departamento de Ciências Exatas aprovou a abertura de duas turmas para a complementação de estudos, oferecidas de 1993 a 1995. A colação de grau da primeira ocorreu em 17 de dezembro de 1994.

A emancipação do curso em relação à sede na capital (1999)

Desde a sua implantação, esta licenciatura funcionava em Ji-Paraná como extensão do curso da sede, em Porto Velho, inclusive tendo a mesma matriz curricular. A reformulação do Projeto Político Pedagógico local, realizada em 1999, firmou-se como mudança significativa na história do curso. O projeto foi fruto de discussão junto a todos os professores e configurou-se como a primeira matriz curricular elaborada pelos docentes do curso.

A vivência in locus com a primeira matriz curricular, e sua adequação à realidade local, já proporcionavam espaços de reflexões entre docentes e licenciados, na perspectiva de mudança curricular. Todavia, o elemento cerne foi a publicação da Lei nº 9.394, denominada L.D.B., de 20 de dezembro de 1996, que desencadeou uma série de mudanças na Educação brasileira.

Na mesma época, já havia movimentação em nível nacional para a reformulação de vários cursos de formação de professores, os quais caminhavam para a apropriação de novos perfis e características para as Licenciaturas em Matemática. Concomitantemente a estas mudanças, crescia o movimento da Educação Matemática, com estreita ligação com a formação inicial de professores.

Assim, paralelamente à aprovação da nova matriz curricular por meio da Resolução 334/CONSEPE, de 14 de janeiro de 2000, o campus e o curso adquirem autonomia. A luta pela emancipação foi árdua, uma vez que a periodização que a antecedeu foi construída por conflitos da comunidade acadêmica local exigindo maior atenção ao curso. Desde o início do funcionamento, até a publicação da Resolução 334, foram necessários 12 anos para que esta licenciatura se tornasse emancipada do curso que o originou em Porto Velho e adquirisse independência, tendo, a partir de então, Projeto Político Pedagógico (PPP) e corpo docente próprios.

As ações do corpo docente passam a trilhar envolto às discussões e reflexões crescentes pelo país acerca da melhor maneira - ou maneira ideal - para a formação de professores.

A Especialização em Educação Matemática (2000-2006)

Em 1999, o curso já havia formado 8 turmas de professores (Ciências e Matemática). Todavia, os egressos, já vivenciando o exercício do magistério, entravam em contato com os docentes formadores do curso e buscavam novas alternativas metodológicas de ensino para suas aulas nas escolas.

Atitudes similares a estas levaram o corpo docente a refletir sobre o papel de professores formadores nesta licenciatura. Em reunião realizada, conjecturou-se que a formação inicial deveria contemplar aspectos de Educação em conexão com a Matemática, e que o curso oferecesse aos futuros professores momentos de experienciação de estudo e pesquisa no tocante ao ensino desta disciplina.

O momento era oportuno, pois o curso de licenciatura estava passando por mudanças e poderia se apropriar de alterações curriculares que estavam circulando nacionalmente. Como encaminhamento, o corpo docente decide então criar a Especialização em Educação Matemática, e sua aprovação nos Conselhos Superiores da UNIR se deu via Resolução nº 009/CONSEA, de 17 de abril de 2000; o curso teve início no mesmo ano.

Houve 3 entradas (2000, 2003 e 2006), com 15 vagas por turma. Em 2007, o departamento lançou outros editais para abertura de novas turmas, as quais não foram preenchidas e o curso foi encerrado.

Para a conclusão do curso e a obtenção do título de Especialista em Educação Matemática, o pós-graduando tinha que redigir e realizar a defesa pública de uma monografia. Estes trabalhos de conclusão foram precursores da I Semana de Matemática do curso.

Semana de Matemática: interlocução do curso com outros pesquisadores brasileiros (2001-2012)

Considerando que as defesas das monografias eram públicas, a então coordenadora do Curso de Especialização, professora Aparecida Augusta da Silva, propõe que seja realizado um evento para a socialização destas pesquisas com a comunidade acadêmica e demais interessados.

Advém dessa iniciativa, então, a criação da I Semana de Matemática (SEMAT), tendo como objetivo cerne contribuir com a formação inicial dos seus alunos e com a formação continuada da comunidade externa. A ela foram agregadas outras atividades (defesas das monografias, palestras, minicursos, oficinas, exposição de vídeos) que compuseram a programação do evento ocorrido de 27 de agosto a 9 de setembro de 2001.

A Figura 2 é um registro fotográfico que eternizou a I SEMAT. Eternizou porque:

Pinturas, estátuas, publicações e assim por diante permitem a nós, posteridade, compartilhar as experiências não verbais ou o conhecimento de culturas passadas. Trazem-nos o que podemos ter conhecido, mas não havíamos levado tão a sério antes. Em resumo, imagens nos permitem “imaginar” o passado de forma mais vívida (BURKE, 2004, p. 17. Grifo dos autores).

A SEMAT demarca uma ruptura com o modelo de formação anterior, que se limitava estritamente ao espaço da sala de aula. Salienta-se que o evento foi realizado a céu aberto no primeiro dia por não existir auditório no campus.

Fonte: Arquivo pessoal da professora Renata Gonçalves Aguiar

FIGURA 2: I Semana de Matemática 

Desde a sua primeira edição era perceptível, por meio da programação, que as atividades emergentes eram relacionadas à Educação Matemática. As temáticas das monografias apresentadas já davam sinal de que havia uma forte tendência presente ao evento, bem como que tais tendências eram reflexo do trabalho docente realizado em sala de aula.

A Licenciatura em Matemática - objeto deste estudo - precisava sair do isolamento, sendo imprescindível que promovesse articulação dos seus licenciandos com outros cursos de Matemática, rompendo, desta forma, os limites geográficos regionais: “A vida é muito breve. Isolado, nenhum especialista nunca compreenderá nada senão pela metade, mesmo em seu próprio campo de estudos” (BLOCH, 2001, p. 26). Imersos nessa concepção, docentes do curso, em contato com a Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM), criaram a Regional Rondônia da SBEM. No dia 06 de outubro de 2003, durante a realização da III SEMAT, a então Presidente, professora Célia Maria Carolino Pires, presente ao evento, proferiu palestra e institucionalizou a regional.

A SBEM contribuiu com o curso como elo com aquilo que estava sendo desenvolvido no âmbito da Educação Matemática em níveis nacional e internacional. Essa busca de sintonia com expoentes da Educação Matemática, manifestada por suas presenças em eventos locais, foi fundamental para a consolidação do perfil do curso. Isso porque, o corpo docente foi se apropriando dos saberes que eram socializados pelos palestrantes, promovendo reflexões e mudança de atitudes, contribuindo, assim, com a construção da identidade do curso com tendência à Educação Matemática.

Apesar do recorte temporal dessa pesquisa ser limitado ao ano 2012, a SEMAT vem sendo realizada ininterruptamente tendo, em média, a presença de 300 participantes. Em 2020 será realizada a sua 20ª edição.

A reformulação curricular ocorrida em 2006

Com a consolidação da Educação Matemática pelo Brasil, o corpo docente, em sua quase totalidade, se apropriava localmente dessa tendência globalizada. A matriz curricular em vigor se contrapunha a esta tendência, pois, até então, o curso oferecia uma formação de professores com perfil de Bacharelado e distante de uma Licenciatura. O corpo docente não ficou preso ao PPP, mas, a partir das suas práticas, promoveu uma ruptura com o modelo de formação que estava posto e, por meio dessa práxis, foi se desenhando um novo currículo reformulado em 2006:

[...] a necessidade de uma reformulação do curso de Licenciatura em Matemática de Ji-Paraná é fruto de discussão iniciada em 2004, entre professores do antigo DCEN - Departamento de Ciências Exatas e da Natureza. Participaram também dessa discussão alunos de graduação e professores que atuam no Ensino Fundamental e Ensino Médio, que juntos perceberam um grande distanciamento entre o curso de formação e a realidade no ensino de matemática da Educação Básica. Estes, na sua grande maioria, afirmavam que um curso de formação de professores deve, além de desenvolver outras competências, destinar atenção especial às necessidades da atuação docente no ensino básico (BASTOS; OHSE; ALBUQUERQUE, 2008, p. 100).

A história local, portanto, se constituiu dialogando com outros saberes que circulavam por outras regiões do país, não no isolamento; “Toda ciência, tomada isoladamente, não significa senão um fragmento do universal movimento rumo ao conhecimento” (BLOCH, 2001, p. 50). A partir do local, então, encontrou respaldo em ações que estavam circulando pelo país, a exemplo da implantação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, por meio da Resolução CNE/CP 1/2002 e da Resolução CNE/CP 2/2002, que instituíram a duração e a carga horária nos cursos de formação de professores da Educação Básica. A legislação em tela foi um marco de mudança e melhoria para a reformulação do Curso de Formação de Professores de Matemática.

Ademais, os cursos de licenciatura em Matemática estavam sendo discutidos em fóruns estaduais e nacional, promovidos pela SBEM, que, em 2002, publicou um número especial de sua revista trazendo como tema de capa: Licenciatura em Matemática, um curso em discussão5. Por meio desta publicação, foi disponibilizada uma coleção de diferentes artigos resultantes das discussões ocorridas até aquela data e que, junto com outros documentos, serviram para orientação do corpo docente na elaboração da nova matriz curricular, rompendo com um paradigma de formação estritamente conteudista e caminhando para uma tendência em Educação Matemática.

O novo projeto, implantado em 2006, caracterizou-se como uma ruptura com o antigo modelo, a exemplo da inclusão do Seminário de Pesquisas e o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), que incentivaram a formação de professores pesquisadores mais reflexivos. O TCC, que começa a ser construído a partir dos Seminários de Matemática - portanto, um ano antes de sua defesa pública -, tem o acompanhamento de um professor orientador que, além de promover a iniciação à pesquisa científica, possibilita ao futuro professor, ainda, ampliar os conhecimentos sistematizados no tocante à escrita, leitura, interpretação, concatenação de ideias, argumentação.

A colação de grau da primeira turma ocorreu em 2010, após a implantação do novo PPP, sendo que, até 2012, 25 trabalhos de TCC haviam sido apresentados. É possível inferir que houve uma mudança consubstancial de objeto de pesquisa entre estes trabalhos, ficando evidente a intencionalidade dos autores de permearem por processos de ensino que dialogassem melhor com a aprendizagem de Matemática. As pesquisas analisadas trilharam por caminhos que relacionavam a Educação Matemática com: História da Matemática, Educação de Jovens e Adultos, Educação Especial, Interdisciplinaridade, Política Docente, Movimento Social e Livro Didático.

O perfil do docente formador no curso (1988-2012)

Até o ano de 2012, o curso havia passado por três matrizes curriculares diferentes, sendo a primeira implantada em 1988 e suas duas reformulações ocorridas em 2000 e 2006, sendo que o perfil docente, enquanto ideário pedagógico, mudou no decorrer da trajetória desta licenciatura. De fato, se “discutimos com nossos pares, se pesquisamos e buscamos continuamente novas fontes teóricas e novas alternativas de ação em sala de aula, então, é de se esperar que nosso ideário também esteja em permanente mutação” (FIORENTINI, 1995, p. 29).

Durante o funcionamento do Curso de Ciências, iniciado em 1988, não havia um quadro completo de professores efetivos, uma vez que a licenciatura permaneceu recebendo a contribuição de professores substitutos e conveniados, mas sem formação em nível de pós-graduação stricto sensu; a quase totalidade era de professores de ofício, havendo entre eles um engenheiro. A contribuição desses personagens foi ímpar para a criação e para o desenvolvimento dos primeiros anos do curso.

Considerando que entre o corpo docente havia licenciados, mas também engenheiros e outros bacharéis, bem como que os professores que tinham pós-graduação stricto sensu eram, em sua grande maioria, de fora da área de Educação, conclui-se que a perspectiva formativa no período (1992-1999) caminhava para uma formação de professores de Matemática com fortes tendências ao Bacharelado em Matemática.

Em 2000, o curso passou a ter uma nova matriz curricular, que permaneceu válida até o ano de 2005, quando, então, não havia mais a presença de professores conveniados. O quadro passa a ser composto por professores efetivos e substitutos, a maioria de licenciados e poucos bacharéis. O Departamento agregava dois cursos: Matemática e Física. Quanto a formação em nível de pós-graduação, havia doutores, mestres e especialistas, com um perfil de formadores para licenciatura em matemática.

Com a nova reformulação curricular, em 2006, e a saída dos docentes da Física para outro Departamento em 2007, a nova unidade departamental, em 2009, agrega o Curso de Bacharelado em Estatística, passando por significativa mudança em seu corpo docente.

Considerando o perfil de 12 docentes que atuavam exclusivamente na licenciatura em Matemática, havia no grupo 10 licenciados em Matemática e dois bacharéis em outras áreas. Dentre estes, oito são professores formadores que vivenciaram o magistério na Educação Básica, exerceram seus ofícios nas mais longínquas localidades brasileiras, em escolas localizadas na zona rural, em escolas interioranas e em periferias de grandes centros urbanos.

O movimento migratório ainda era uma realidade presente no Estado, uma vez que nenhum docente do grupo é rondoniense. Outro aspecto relevante, tanto no que tange à naturalidade, quanto à formação de graduação, é que havia no grupo representantes das 5 regiões brasileiras.

Na trajetória do curso, os professores formadores se apropriaram das ações pedagógicas com perspectivas voltadas para a formação de educadores matemáticos. Essas práticas foram motivadoras para que os docentes ingressassem em cursos de pós-graduação, contribuindo para a mudança no perfil do corpo docente.

Apesar do recorte temporal para a presente pesquisa estar limitado ao ano de 2012, é importante ressaltar que a tendência de perfil voltado para a Educação Matemática se fortaleceu localmente com a qualificação stricto sensu. Em 2020, há nesse corpo docente 10 doutores, dos quais 7 com doutoramento nas áreas de: (a) Educação Matemática; (b) Educação, Ciências e Matemática; e, (c) Educação com investigações desenvolvidas na linha de pesquisa em Educação Matemática. Compõem o grupo, ainda, dois mestres em Matemática e um em Ciências da Computação.

Destaca-se que a partir da iniciativa do corpo docente desta licenciatura, a UNIR, em 05 de outubro de 2018, teve aprovado pela CAPES o primeiro Mestrado Acadêmico em Educação Matemática do Norte brasileiro, o qual já está em andamento com duas turmas de mestrandos em Ji-Paraná.

Conclusão

O curso foi criado com uma formação não específica, mais generalista, através da Licenciatura em Ciências (1988-1992). Este movimento transitou para a estruturação do curso de Licenciatura em Matemática, com um modelo próximo à formação do bacharelado em Matemática (1992-2005) e, a partir da reformulação ocorrida em 2006, se apropriou de tendências para a formação de Educadores de Matemática.

Os períodos 1988-1992, 1992-2005 e 2006-2012 marcaram as mudanças nas concepções de perfil esperado para a formação de professores. Entretanto, não é possível afirmar, arbitrariamente, que existe uma causa única que provocou a ruptura em detrimento das condições que se apresentaram, mas sucessivas razões levaram às várias mudanças na história do curso, uma vez que as escolhas foram feitas através de condições dadas por várias linhas de força, todas convergindo para o mesmo fenômeno.

A identidade do curso, que se encontra em permanente renovação, está sendo construída pautada na responsabilidade do seu corpo docente, não fechando espaço aos novos professores, mas caminhando para uma consolidação dessa licenciatura pelo coletivo.

Cabe ressaltar, ainda, a migração de professores formadores para Rondônia e, consequentemente, para o curso que tem o corpo docente composto por professores vindos das 5 regiões brasileiras, com um repertório de formações em diferentes tendências de licenciaturas. Assim, ocorria a circulação de diferentes modelos formativos, diversidade cultural essa que exerceu influências no curso. Diferentemente de alguns grupos existentes pelo país e que são resistentes à inovação, o grupo local se tornou mais aberto a mudanças e rupturas, permanecendo as ações que têm dado certo.

Ao visualizar a trajetória das mudanças mais expressivas que levaram à consolidação desta licenciatura, destacam-se as tendências discutidas pelo movimento da Educação Matemática de abrangência nacional, sendo apropriadas nas realidades locais presentes nas práticas de seus professores e no currículo elaborado para o curso. Tal apropriação se enraíza mais fortemente com a criação da Semana de Matemática e a formação em nível de pós-graduação stricto sensu dos professores formadores.

Vale destacar que essa cultura formativa não se fixou presa a um modelo formativo específico, mas tornou-se uma cultura bastante dinâmica, acompanhando o movimento que circulava pelo país. Sendo assim, cabe à comunidade acadêmica que compõe o curso continuar trilhando pelo caminho de permanente construção da identidade desta licenciatura, repensando suas práticas que incidirão na história de vida docente e no saber-fazer motivador do ensino e da aprendizagem da Matemática.

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3FREIRE, Paulo. A Educação na Cidade. São Paulo: Cortez, 2000.

4Fonte: http://www.brasilescola.com/brasil/aspectos-populacao-rondonia.htm. Acesso em: 15 de agosto de 2014

5Educação Matemática em Revista, ano 9, n. 11A - ed. esp., abr. 2002.

Recebido: 01 de Junho de 2020; Aceito: 01 de Novembro de 2020

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