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Ensino em Re-Vista

versão On-line ISSN 1983-1730

Ensino em Re-Vista vol.30  Uberlândia  2023  Epub 01-Ago-2023

https://doi.org/10.14393/er-v30a2023-9 

Artigos

Explicação oral para o ensino de construção de gráficos

Explicación oral para la enseñanza de la construcción gráfica

Rita de Cássia Gonçalves Muniz1 
http://orcid.org/0000-0002-8340-2587

Gilda Lisbôa Guimarães2 
http://orcid.org/0000-0002-1463-1626

1Mestre em Educação Matemática e Tecnológica. Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil. E-mail: ritadcgm@gmail.com.

2Pós-Doutorado pela Université Laval, Canadá. Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil. E-mail: gilda.lguimaraes@gmail.com.


RESUMO

Este artigo tem como objetivo analisar a explicação oral de professoras do 1º ano do Ensino Fundamental em aulas de construção de gráfico, considerando o domínio conceitual, concepção didática, linguagem oral e gestual das professoras, representações visuais e o contexto da aula (presencial e remota). Observamos que, independente do ambiente (remoto ou presencial), as professoras apresentaram propostas didáticas não desafiadoras e lacunas de domínio conceitual, observadas na linguagem oral e gestual utilizada. O estudo da enunciação da explicação oral contribuiu de maneira fundamental para compreendermos os processos de ensino dos professores, tanto remoto quanto presencial. Acreditamos que, para além de ser uma maneira de investigar o ensino, é importante que nós professores reflitamos sobre o que e como falamos na busca da aprendizagem de nossos alunos.

PALAVRAS-CHAVE: Explicação Oral; Construção de gráfico; Educação Estatística; Anos iniciais

RESUMEN

Este artículo tiene como objetivo analizar la explicación oral de los docentes de 1er año de Educación Primaria en las clases de construcción de grafos, considerando el dominio conceptual, el diseño didáctico, el lenguaje oral y gestual de los docentes, las representaciones visuales y el contexto de la clase (presencial -cara y remoto). Observamos que independientemente del entorno (remoto o presencial) los docentes presentaron propuestas didácticas no desafiantes y lagunas en el dominio conceptual, observadas en el lenguaje oral y de signos utilizado. El estudio de la enunciación de la explicación oral contribuyó de manera fundamental a comprender los procesos de enseñanza de los docentes, tanto a distancia como presencialmente. Creemos que, además de ser una forma de investigar la enseñanza, es importante para nosotros los docentes reflexionar sobre qué y cómo hablamos en la búsqueda del aprendizaje de nuestros alumnos.El resumen debe contener entre 100 y 150 palabras. La redacción debe basarse en la NBR6028 y mantener la estructura indicada en esta plantilla. El resumen debe contener la presentación del tema, los objetivos, la metodología adoptada, el análisis de los resultados finales o preliminares y la conclusión.

PALABRAS CLAVE: Explicación oral; Construcción de gráficos; Educación estadística; Primeros años

ABSTRACT

This article aims to analyze the oral explanation of teachers in the 1st year of primary school in graph construction, considering the conceptual domain, didactic design, oral and gestural language of the teachers, visual representations and the context of the class (in-person and remote). We observed that regardless of the environment (remote or in-person), the teachers presented non-challenging didactic proposals and gaps in conceptual mastery, observed in the oral and sign language used. Studying the enunciation of oral explanation contributed fundamentally to understanding teachers’ online and in-person teaching processes. We believe that, in addition to being a way of investigating teaching, it is important for us teachers to reflect on what and how we speak in the pursuit of learning for our students.

KEYWORDS: Oral explanation; Graph construction; Statistical education; Primary school

Introdução

A interação entre linguagem oral e matemática vem sendo estudada há alguns anos. Em sala de aula, em geral, o professor fala a maior parte do tempo. Mas... o que falam os professores? Essa fala contribui para a aprendizagem dos alunos? A conduta explicativa adotada pelo professor tem um papel fundamental na construção da aprendizagem dos estudantes, como apontam Proulx, Berdnaz e Kieran (2006) e Berdnaz (2005).

Considerando uma perspectiva Bakhtiniana de que a linguagem é uma atividade social, histórica e cognitiva desenvolvida interativamente pelos indivíduos em suas práticas, procuramos nesse artigo analisar a explicação oral de professoras do 1º ano do Ensino Fundamental em aulas de construção de gráfico, considerando o domínio conceitual, concepção didática, linguagem oral e gestual dos professoras, representações visuais e o contexto da aula (presencial e remota).

O papel da explicação oral em sala de aula

Na rotina de uma sala de aula, a explicação oral do professor torna-se um instrumento de grande relevância, pois sua conduta explicativa tem impacto na aprendizagem de seus alunos, construindo, estruturando e desenvolvendo o pensamento dos estudantes.

Bakhtin (2006) afirma que a fala é produto da interação de dois indivíduos e é socialmente organizada dentro de um contexto não verbalizado da vida corrente, que se amplia pela ação, pelo gesto ou pela resposta verbal dos outros participantes na situação da enunciação. Tomar como base a concepção interacionista de língua, implica trazer para a sala de aula os contextos significativos de produção de textos, que envolvem diferentes gêneros presentes no convívio social de alunos e professores. Enfatiza-se a necessidade de compreender a fala do professor em sala, considerando seus portadores, funções sociais, o contexto de produção, suas estruturas e características linguísticas, como os operadores argumentativos (Koch, 2010), os movimentos do corpo (MARCUSCHI, 2007) e a linguagem matemática (BERDNAZ, 2005). Dentre os diferentes gêneros orais (SCHNEUWLY e DOLZ, 1999), estamos interessados, neste trabalho, nos gêneros orais escolares como um meio de articulação entre as práticas sociais e os objetos escolares.

Nessa mesma linha, Proulx et al. (2006) defendem que as explicações dadas em sala de aula têm a função de regulação das aprendizagens e permitem o desenvolvimento dos conhecimentos dos alunos. A maneira como o professor “fala” matemática, o que valoriza implicitamente através da maneira de expor, de explicar, de argumentar, etc., descreve a maneira de fazer matemática na classe. Nesse sentido, Burges (2012) enfatiza que desenvolver a compreensão matemática dos alunos depende da escuta e do conhecimento do professor.

De modo específico, no ensino de estatística, foco desse artigo, o desafio é ainda maior, uma vez que a natureza do pensamento estatístico é de incerteza e carregado de contexto. O gráfico é uma das possíveis representações de informações sistematizadas, uma vez que mostra de forma sintética o perfil dos dados, as tendências e as relações entre as variáveis. Assim, a estatística é uma importante ferramenta para a realização de projetos e investigações em diversos campos. Além disso, exerce um papel essencial na educação para a cidadania, com o propósito de apoiar afirmações em diversas áreas do conhecimento humano. Assim, o ensino de Estatística, desde os primeiros anos de escolaridade, tem um importante papel na formação social e científica das pessoas, conforme afirmam Guimarães e Gitirana (2013).

Nesse mesmo sentido, a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017) afirma que, desde o 1º ano do Ensino Fundamental, os alunos devem ser estimulados a interpretar gráficos e construir registros pessoais de dados coletados. Porém, Guimarães, Cavalcanti e Evagelista (2020) afirmam que alunos, desde o 1º ano, são capazes de construir e interpretar pictogramas e gráficos de barras com escala unitária.

O conhecimento da estatística requer uma contextualização com dados reais que permita ao aluno, através da realização de pesquisas, a compreensão de sua realidade e a construção do pensamento crítico. A representação em gráficos não é uma ferramenta mental intuitiva. Todavia, é preciso definir dados, elencar ordens, atribuir sentidos, além de classificar dados (CAZORLA e CASTRO, 2009).

Diante disso, a postura adotada pelo professor durante o ensino de estatística dentro da situação comunicativa em sala de aula torna-se fundamental na construção dessa contextualização e promoção do letramento estatístico. Diferentes estudos têm como foco as representações em gráficos e evidenciam o papel fundamental do professor (PEÇA, 2012; GUIMARÃES; OLIVEIRA; MOTTET, 2013; CAZORLA, RAMOS; JESUS, 2015; MARTINS, CURI; NASCIMENTO, 2018).

Método

Esse trabalho concentra-se na análise de aula de duas professoras do 1° ano do Ensino Fundamental que participaram de forma voluntária dessa pesquisa. Cada professora preparou e realizou com sua turma uma aula sobre construção de gráfico, a qual foi solicitada pelas pesquisadoras com antecedência de 15 (quinze) dias. Para análise das aulas, foi utilizado um quadro analítico dividido em cinco grandes tópicos: concepção didática - como os professoras iniciam suas aulas, quais atividades propõem, quais tipos de comando utilizam nessas proposições, como desenvolvem as atividades; quais os tipos de questionamentos realizam; se utilizam diferentes exemplos; se apoiam ou desafiam os estudantes; quais sistemas semióticos utilizam; como lidam com o erro dos alunos; quais estratégias interativas desenvolvem; como propõem a resolução da atividade e, por fim, diante dessas características, qual o tipo de aula desenvolvem.

No segundo tópico, domínio conceitual, observamos o domínio do conteúdo abordado e como ele é desenvolvido em sua explicação oral, se realizam conexões entre os conceitos, se explicam as etapas do pensamento, se combinam recursos verbais com visuais e se contextualizam os conceitos (MARCUSCHI, 2007; PROULX et al., 2006).

Na gestualização, terceiro tópico, analisamos como os gestos, olhares e a entonação da voz podem contribuir ou não no desenvolvimento da explicação oral professora durante o processo comunicativo (MARCUSCHI, 2007).

No quarto tópico, linguagem utilizada, buscamos compreender como a linguagem escrita e oral adotada pelas professoras contribuiram no desenvolvimento de sua explicação (MARSCUCHI, 2007; KOCH, 2010, 2011). Para isso, consideramos a natureza social de desenvolvimento da linguagem, analisando os possíveis eventos que podem causar descontinuidades na explicação oral (repetições, truncamentos, anacolutos, atividades metacognitivas, uso excessivo de advérbios de lugar).

Por fim, no tópico representações visuais, verificamos como os diferentes recursos didáticos podem contribuir na construção e desenvolvimento da explicação oral professora.

Resultados

Marta3 tem 29 anos, é Pedagoga e Especialista em Psicopedagogia, trabalha em redes municipais há 5 anos e afirmou nunca ter participado de formação continuada sobre estatística, apesar de vir propondo atividades que envolvam estatística, as quais estão propostas nos livros didáticos.

Ela inicia sua aula com uma roda de conversa, explicando tudo o que irá ocorrer na sala naquele dia e enfatizando que os estudantes irão realizar uma atividade muito legal. Propõe duas atividades (Figura 1) retiradas da internet, as quais não contemplam a temática de construção de gráficos que fora solicitada, uma vez que caberá aos alunos realizarem apenas uma correspondência quantidade/quadradinhos pintados na Atividade 1, e o preenchimento do gráfico da atividade 2, pois o mesmo já está estruturado (MUNIZ; GUIMARÃES, 2021).

Fonte: As autoras

FIGURA 1: Atividades propostas por Marta 

Para a realização das atividades pelos alunos, Marta vai descrevendo o passo a passo (Extrato 1) que os alunos devem realizar para chegarem na resposta correta, esperada por ela. Proulx et al. (2006) apontam que esse é um tipo de explicação do professor, que na verdade não explica, apenas descreve o processo, guiando os estudantes a partir de um passo a passo. Esse tipo de “explicação” não permite aos alunos a construção de um procedimento de solução, uma vez que cabe a eles apenas a cópia.

Extrato 1

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P: Oh, tem 10 quadradinhos aí, 10. Só que a gente tem onze votos (aponta para o número 11 escrito no quadro). Aí o que é que você vai fazer? EITA! AGORA, EU NUM SEI NÃO. PRESTA ATENÇÃO! Presta atenção! A gente disse que teve onze votos, só que aí só tem...

Aluno 1: 10.

P: 10 quadradinhos. O que é que a gente vai fazer para poder ficar igual a quantidade?

Alunos: Contar (Ela coloca a mão no rosto, como se não acreditasse que eles responderam isso.).

P: Vai contar, certo. Aí você vai ver que aí, na coluna...

Aluno 2: Só tem 10.

P: Só tem 10. Eu vi já que só tem dez (constrói o pictograma com escala unitária e conta). Pronto. Aí, agora o que é que eu vou fazer pra ficar igual a 11? Ó (desenha mais um quadrado). (...)

P: - O que é que eu vou fazer para ficar com onze votos? Se só tem dez quadradinhos (aponta para os quadrados que ela desenhou, indicando que faltava um quadrado).

Aluna 1: Faz um quadradinho em cima, tia.

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Verificamos, ainda, excesso de repetições (Extrato 2) com o objetivo de obter a resposta correta. Marta lembra aos alunos a escolha de uma única fruta (uma vez que deseja que cada aluno só vote uma vez), mas não explica o porquê. A repetição tinha também o intuito de chamar a atenção dos estudantes para que acompanhassem seu raciocínio, restringindo aos alunos a repetição da sua resposta, focando na condução da resolução e não na aprendizagem e dificuldades dos alunos, ignorando o erro e reforçando a resposta correta. Esta maneira de interagir é denominada por Proulx et al. (2006, p. 272) como “padrão de elicitação”, descrito como, após propor uma tarefa a ser realizada pelos alunos, as falas são “para guiá-los, dirigindo-os constantemente para feedbacks regulares de suas performances - para o que é determinado e exigido como objetivo a ser alcançado”, não promovendo discussões e problematizações em sala de aula.

Extrato 2

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P: - tem que ter 16, porque cada criança vai ter que escolher só uma fruta, não é isso? Você já escolheu morango....Então...O voto.. Então, o que foi que eu disse? QUE SÓ PODE ESCOLHER UMA FRUTA! Até porque a quantidade de votos aqui tem que ser igual a quantidade de... (ela aponta para o número 16 escrito no quadro). Esse número é a quantidade de quê?

Aluna: ALUNOS! (...)

P: Você já escolheu. Você já votou. Por isso que eu disse: É UMA FRUTA SÓ. Vou colocar. Alguém mais que não votou e gosta de laranja.

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Assim, Marta, durante a aula, não apoia nem desafia os estudantes. Proulx et al. (2006) e Rodrigues, Menezes e Ponte (2018) afirmam que esse é um tipo de condução de aula que restringe-se à compreensão instrumental do processo de aprendizagem, sendo entendida como a possibilidade de conhecer como fazer, mas sem saber o porquê fazer.

A ausência de questionamentos aos estudantes para desenvolvimento dos conceitos durante a aula revela uma lacuna de aprofundamento dos conhecimentos a serem discutidos dentro de suas explicações orais. Para a construção de sentido de um conceito, conhecimentos ou simbolismo são fundamentais. Porém, o único elemento semiótico utilizado por Marta foi a reprodução do gráfico que auxiliou na condução de sua explicação oral, tendo em vista que sempre se reportou a ele durante o desenvolvimento do raciocínio.

Com base em Schneuwly e Dolz (2004), trata-se de uma aula instrutiva e prescritiva, pois há um controle das atividades respondidas pelos alunos, além do excesso de repetições de comandos, sem muitas explicações, tampouco argumentações.

Em relação às estratégias interativas, verificamos que Marta utiliza verbos conjugados na primeira pessoa do plural (nós), buscando inserir os interlocutores na ação que está sendo desenvolvida. Ela tenta familiarizar a atividade atual com outras anteriores, sempre dizendo que “será uma atividade legal”, evidenciando seu forte envolvimento com a atividade proposta e também dos estudantes, que sempre estão atentos a tentativa de situação comunicativa.

Essa forma de conduzir a aula, dizendo como os alunos devem pensar, como devem começar a atividade e como resolvê-la, contrapõe-se a atitude de evidenciar elementos-chave de um conceito, colocar em palavras raciocínios importantes, desenvolver a capacidade de formular um conceito dado de diferentes maneiras, utilizar a linguagem corrente para explicar os conceitos matemáticos e os raciocínios adaptados aos alunos e, finalmente, diminuir a distância entre a linguagem técnica (formal) da matemática, como argumentam Proulx et al. (2006) .

Marta considera apenas as respostas corretas emitidas pelos estudantes com o objetivo de dar continuidade à atividade. Proulx et al. (2006) analisam que essa postura reflete uma característica importante da explicação oral que é o não estar aberta à múltiplas possibilidades, promovendo poucas reformulações e retomadas, encaminhando quase nada a discussão de ideias e articulação de diferentes informações e diferentes exemplos. Desse modo, a explicação torna-se frágil para o desenvolvimento do processo de ensino que vise a aprendizagem.

A linguagem desenvolvida por Marta evidencia o uso excessivo de expressões como “bom, vamos lá, pronto, né”, para entusiasmar a turma a participar, garantindo o desenvolvimento da aula. Anacolutos e linguagem metaenunciativa são raras. Identificamos o uso de operadores argumentativos (por exemplo, por isso etc.), não para anteceder um argumento, mas para enfatizar a ação a ser realizada pelos estudantes e promover a continuidade da atividade.

Ressaltamos o uso recorrente de advérbios de lugar (ali, aqui, aí, lá) com o intuito de indicar os locais em que as respostas deveriam ser colocadas ou em substituição de termos ou conceitos estatísticos. Esse tipo de substituição é um problema para a verbalização estatística, pois compreendemos que o conhecimento das terminologias é um aspecto fundamental na promoção do letramento das informações estatísticas pelos estudantes, como já argumentavam Berdnaz (2005) .

Proulx et al. (2006) destacam que, para o desenvolvimento de uma boa explicação oral de modo a promover a aprendizagem, é imprescindível que o processo de ensino tenha como objetivo a promoção da verbalização matemática dos estudantes.

Marta faz referência a alguns elementos estatísticos como “controle da população, gráfico, tabela, pesquisa”, mas não desenvolve nenhuma explicação para os alunos sobre eles. Faz registros simbólicos, como os desenhos de frutas para a realização da votação, que se tornam um complemento para sua explicação oral, em decorrência da ausência de vocabulário específico sobre elementos do gráfico. Da mesma forma, usa gestos, entonação da voz e olhares para reforçar sua fala ou em substituição de conceitos ou termos estatísticos.

A ausência do desenvolvimento dos termos estatísticos pode decorrer de uma lacuna no conhecimento da professora sobre a temática solicitada. Entretanto, Marta apresentou um bom domínio conceitual, quando solicitada a construir um gráfico a partir de uma tabela (Figura 2). Ela o fez de maneira correta, com escala de 5 em 5 e considerando os valores mínimos e máximos, inclusive com registro de valores implícitos, apesar da ausência de alguns elementos, como: título, nomeação de eixos e fonte.

Fonte: As autoras

Figura 2: Gráfico construído por Marta 

Assim, a explicação oral de Marta é marcada desde o início pela escolha das atividades fora da temática, pela carência de explicação conceitual com lacunas na explicação e desenvolvimento de conceitos, ausência de exemplos, questionamentos; analogias; desafios; excesso de marcadores de repetições; utilização de advérbios de lugar em substituição da definição de conceitos ou uso adequado da linguagem estatística; resolução das atividades de maneira coletiva para ser reproduzida pelos alunos.

Nossa segunda professora é Paula. Ela tem 33 anos, formada em história, especialista em História do Brasil e em Gestão Educacional (ainda em conclusão). Possui 14 anos de experiência nas diferentes turmas do Ensino Fundamental, em diferentes redes (pública e privada). Trabalha em uma escola privada da Região Metropolitana do Recife. Todavia, devido à pandemia da Covid-19, tanto a entrevista como a aula foram realizadas de maneira remota. A professora afirma que vem desenvolvendo em suas aulas atividades que envolvam estatística, propostas no livro didático que utiliza. Sobre atividades de construção de gráficos, afirma que “a gente faz muito baseada nessa sala de aula com esses alunos, preferência de esporte, preferência de comida (....) tipos de receitas favoritas deles.

Paula inicia sua aula, apresentando slides (Figura 3). Relembra aos alunos que eles já haviam realizado uma pesquisa para saber as sobremesas preferidas da turma e solicita que digam qual é a função de um gráfico. Em seguida, apresenta outro slide que contém quatro tipos de gráficos: gráfico de barras horizontais, gráfico de barras verticais, gráfico de setor e gráfico de linhas. Diz que os dois primeiros são gráficos de barras, que aparecem muito no livro deles e que podem aparecer de duas formas, como apresentado na Figura 3. Posteriormente, cita o gráfico de setores, que tem o formato de uma pizza, e o gráfico de linhas, que está aparecendo muito na televisão para apresentar os dados da Covid-19.

Fonte: Ss autoras

FIGURA 3: Slides de início da aula 

Paula utiliza diferentes exemplos que contribuem na exposição do conceito/conteúdo que desenvolve naquele momento da aula. A professora os utiliza para explicar a função, formato ou tipo de dados que apresenta. Além disso, busca associar o conteúdo exposto ao conhecimento de vida dos alunos, como no caso do gráfico de linhas que relaciona aos índices da covid-19 .

Extrato 3

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P: (...) Olha gente, excelente! O gráfico ele traz uma informação. E essa informação geralmente é em forma de quantidade. Como falou (sic) muito bem os alunos (cita o nome das crianças que participaram), tá certo, gente! Então, aqui, tia trouxe a imagem de vários tipos de gráficos. (Retoma a imagem anterior), tá?! Só para vocês conhecerem um pouquinho, tá. Esse gráfico aqui, ó. Esse gráfico aqui que vai vir muito no livrinho de vocês, esse gráfico vem muito aqui. Eu tenho um gráfico que vai falar da fruta preferida do 1° ano. Olha que legal, gente! Eu tenho aqui o gráfico que se chama gráfico de barras. Porque ele vem nesse formatozinho aqui, gente, em formato de barrinha. (Abre o dedo com a mão do tamanho da barra). Lembra da barrinha que a tia mostrou no material dourado?! Esse gráfico vem em formato. Aqui eu tenho as frutas (aponta para o eixo horizontal). E aqui eu tenho as quantidades (aponta para o eixo Vertical) que vai (sic) me indicar cada consumozinho, cada fruta preferida no primeiro ano, tá bom?! Tia , esse daqui também é um gráfico de barras, tia?! É (faz legal com a mão). É um gráfico de barras também. Só que a barra aqui não está na vertical, está na horizontal, gente. Ó, na horizontal. A barrinha deitadinha, tá?! Mas não deixa de ser um gráfico de barras também, tá?! Eita! Tia tem um gráfico aqui bem diferente. Olha, gente! Ele é redondo, ele tem várias partezinhas pintadas aqui, num é gente?! E aí? Como é o nome desse gráfico, ó: “gráficos de setores”, que ele é muito conhecido com esse nome aqui, oh: pizza. Por que ele tem esse nome, Aluna?! Tu sabe porque ele se chama gráfico de pizza?!

Aluna: Porque ele é redondo.

P: Porque ele é redondo (Faz o sinal de legal). Tem o formato, né aluna, de pizza. Muito bem! E, agora, tia também trouxe esse gráfico aqui, oh, que é o gráfico de linhas. Esse aqui, eu acho que alguém já viu na televisão. Alguém já viu mostrando aqui esse gráfico na televisão?! Alguém já viu mostrando na televisão?! Já viu?!

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Dessa maneira, observamos uma diversidade de marcas (exemplos, analogias, conexões) em sua explicação oral. A professora apresenta aos alunos diferentes maneiras de apresentar os dados em gráficos. Apesar disso, de acordo com Proulx et al. (2006) , se restringe à exposição dos gráficos e suas características, sem maiores aprofundamentos, apenas apresentações e descrições.

Assim, retoma os dados levantados na aula anterior e registrados em uma tabela (Extrato 4).

Extrato 4

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P: (...) Presta atenção! Pra (sic) gente chegar nesse gráfico aqui, primeiro a gente fez o quê? (...) isso muito bem, aluna! A gente fez uma pes.... Uma pes... Quem lembra? A gente fez uma...

Alunos: Pesquisa (mais de um falou isso, em tempos diferentes).

P: Uma pesquisa! (palmas). Muito bem. (...)

P: Isso, a gente pesquisa, a gente fez uma enquete. Lá no livro trazia essa palavra, né gente?! Enquete. Eu perguntava a vocês qual era a sobremesa preferida de vocês e ia anotando cada voto de vocês numa... O quê?! Eu anotei numa o quê?! Eu anotei em uma ta... Quem lembra?! Em que eu anotei o voto de vocês?! Eu anotei em uma ta....

Aluno: Tarefa

Professora: Tabelaaaaa. Aquela tabela (abre as mãos em sinal de quadro) que a tia Paula ia anotando cada votozinho, foi ou não foi aluno?! Cada voto de vocês, foi ou não foi?! (Fazendo o sinal de legal para a câmera). Foi ou não foi?

Aluno: Foi.

P: Foi. A tia Paula primeiro fez uma pesquisa, uma entrevista com vocês. Anotou cada voto de vocês, para depois dessa tabela a gente fazer um gráfico. Então, pra (sic) que serve um gráfico?! Alguém saberia me dizer para que serve um gráfico?! Pra (sic) que que serve um gráfico?! Por que a gente usa um gráfico?! Pode ligar o microfone. Pra (sic) que que serve? O que é que o gráfico me mostra?

Aluno: Pra (sic) medir as coisas.

P: Pra (sic) quantificar? Seria isso, aluno? (A criança responde que sim) Legal, muito bem!!! Pra (sic) me dá uma quantidade sobre alguma coisa, num é ?! (...) Legal! Quem acha que é uma coisa diferente?! Pode ligar o microfone e falar. Pra (sic) que que serve um gráfico também?! Liga o microfone (vai chamando os alunos para participar das respostas) também. Acho que quer falar. Liga, Aluna, diga pra que que serve. (...)

Aluna 1: Para representar quantidade.

P: Para representar quantidades. (Faz um sinal de legal para a câmera), muito bem (...)! (...)

P: É o que Aluna?!

Aluna: Quantificar.

P: Isso, meu amor! Quantificar, mostrar a quantidade. Dá uma informação, num é gente?! Em forma de quantidade. Muito bem gente!!! (Faz sinal de legal). Excelente. (...)

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Observamos que a professora realiza muitos questionamentos aos alunos, para que se lembrem de informações de outras aulas, chegando a apresentar sílabas como dicas para as respostas, não se configurando como uma situação desafiadora. Pergunta de formas diferentes: “Então, pra (sic) que serve um gráfico? Alguém saberia me dizer para que serve um gráfico? Pra (sic) que serve um gráfico? Por que a gente usa um gráfico?”, mas os alunos não respondem da maneira esperada e a professora acaba apresentando a definição do que é um gráfico para ela.

Berdnaz (2005) e Proulx et al. (2006) apontam diferentes tipos de questionamentos que podem ser realizados dentro das explicações orais em matemática, dentre eles os que conduzem a respostas pré-determinadas, realizando questionamentos de algo já vivenciado, como os realizados por Paula.

Além disso, verificamos que Paula repete várias vezes o mesmo comando para que os alunos acompanhem a atividade que está sendo realizada por ela. Proulx et al. (2006) apontam que essa característica na explicação oral indica a falta de abertura a diferentes possibilidades, sendo um reflexo da ausência de domínio conceitual que restringe-se a desenvolver o que é esperado para a situação, bem como sua concepção de ensino, que evita respostas inesperadas e o confronto de diferentes respostas ou a ausência de questionamentos que levem à problematizações ou desafios a serem vivenciados.

Identificamos algumas situações em que Paula sempre incentiva a participação dos alunos, parabenizando: “Isso, meu amor!”, “Muito bem gente!!!”, “Excelente”, “tá vendo que você sabe, é só ter calma”, faz o sinal de legal. Diante disso, compreendemos que a professora busca apoiar seus alunos com relação ao que está sendo exposto e sempre considera o que é dito por eles, contudo, sempre os direcionando para o que deseja naquele momento. Entretanto, não há provocação de ideias, o que acarreta a não construção de discussões, a não apresentação de argumentos, o não compartilhamento de ideias, sem haver uma legitimação do conteúdo exposto.

Em seguida, Paula apresenta a primeira atividade que envolve a construção de um gráfico. As outras duas atividades consistem em interpretação de um gráfico com dados fictícios e adição de números, respectivamente. Todas as atividades propostas estão na apostila adotada pela escola, a qual não foi avaliada pelo PNLD 2019 (Figura 4).

Fonte: Martins (2019, p. 57).

FIGURA 4: Atividades do livro didático utilizadas por Paula 

Durante a atividade de construção de gráfico proposta no livro, observamos que Paula realiza um passo a passo da atividade, como verificaremos no trecho a seguir.

Extrato 5

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P: Presta atenção, presta atenção. Nessa linha aí de título, a gente vai criar um título. O que é que a gente falou aí para fazer essa essa entrevista?! Tia Paula fez uma entrevista sobre o quÊ? Hein, gente?! A entrevista que eu fiz fala sobre o quê?

Aluna: Esporte Preferido.

P: Isso, Flavinha! Esportes preferidos. Bora escrever aí no título? Esportes preferidos? Quem aí concorda em dizer?

Aluna: eu. (...)

P: E agora, Tia Paula, o que é que eu vou fazer? A gente vai fazer só uma representação do nosso jeitinho. Daquela entrevista que eu fiz com vocês, que eu anotei na tabela, a gente vai transformar agora em um gráfico. No gráfico de quê?! DE BARRAS. Então, eu venho embaixo do último quadradinho e ohh... Do último não, desculpa, do primeiro quadradinho. Procura aí o primeiro quadradinho aqui, ó, igual ao da tia Paula. Põe a letrinha F aí, põe a letrinha F no primeiro quadradinho. Olha, Aluno igual ao meu. Não precisa fazer o desenho da bolinha não. (...)

P: Não é embaixo, igual ao que está mostrando o de tia Paula. Lá embaixo, na parte debaixo da parte quadriculada, você vai pegar o primeiro quadradinho e colocar o F, tá bom? No primeiro, embaixo do primeiro quadradinho. É igual. O de tia Paula é igual ao de vocês. Vocês só vão fazer igual a mim. Coloca a letrinha F, coloca a letrinha F, tá bom?! Depois, para não ficar emendado, gente, as colunas, o que vocês vão fazer? Vocês vão deixar dois quadradinhos aqui, ó, na frente do F. Vocês deixam dois quadradinhos. Deixa esse espaço de 2 quadradinhos, vem pro terceiro quadradinho e coloca “N”, N de natação. Deixa os 2 quadradinhos aqui de espaço, tá? Deixa esses dois quadrados e coloca o N, N de natação, ok?! Acompanha aí, que não tem dúvida. Faz como tia Paula tá (sic) explicando que não tem como dá errado não, tá?! Depois que eu coloco a letra N, eu deixo mais 2 quadradinhos na frente do N. Deixa 2 quadradinhos sem fazer nada, só para dar o espaçozinho, aí eu coloco a letrinha V de vôlei, coloco a letrinha V de vôlei, tá certo?! Coloquei a letrinha V de vôlei, vou deixar 2 quadrados aqui na frente, ó, só para não deixar tudo emendado. Eu deixo 2 quadradinhos e coloco a letrinha B de basquete. Terminei meu gráfico. Terminei aí o formato do meu gráfico.

Emily: É para colocar a letra onde a senhora colocou?

P: Isso, coloca a letrinha bem aí onde a tia Paula colocou aí. Lembrando de deixar 2 quadradinhos de espaço entre as letrinhas. Deixa 2 quadradinhos de espaço, tá certo?!. Todo mundo colocou as letrinhas? Sim ou Não? (Nesse momento, faz sinal de legal).

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Como pode ser observado, a professora realiza uma verdadeira instrução de como deve ser construído o gráfico e não promove discussões ou reflexões sobre ele.

Por fim, a professora apresenta um vídeo com 5 situações fictícias de interpretação de gráficos e, a cada situação, pausa o vídeo para sortear um aluno(a) que responde o que está sendo perguntado na imagem.

Fonte: as autoras

FIGURA 5: Interpretação de gráficos proposta por Paula 

Durante essa aula, são utilizados diferentes elementos semióticos, como réplica do livro, gráficos e vídeos. Entretanto, esses elementos são colocados como um suporte para sua exposição. O estudo de Berdnaz (2005) destaca a importância do uso dos diferentes elementos semióticos na construção e desenvolvimento de conceitos matemáticos, que acreditamos serem fundamentais também nos estatísticos.

Paula escuta tudo o que é dito pelos estudantes, mas considera apenas as respostas corretas e direciona as incorretas, sem problematizar o erro, nem compreender as dificuldades apresentadas. Esse tipo de atitude também foi encontrado por Proulx et al. (2006) , que afirmam que, para o professor contribuir com as discussões promovidas em sala, torna-se necessária a compreensão das estratégias utilizadas pelos estudantes de modo a torná-las explícitas, procurando suscitar discussões e reflexões sobre essas estratégias.

Dessa maneira, com base no quadro de agrupamentos de gêneros criado por Dowlz e Schneuwly (2004), verificamos que a explicação oral de Paula está fortemente marcada pela transmissão e construção de saberes do expor, com apresentação textual de diferentes formas, por meio de questionamentos que promovem o resgate informações já estudadas, diferentes exposições, com diferentes exemplos colocados nos slides.

Considerando as características interativas apontadas por Marcuschi (2007), observamos que há na aula um grande envolvimento da professora devido a algumas características, como as várias tentativas de contextualização do conteúdo, caracterizando um forte envolvimento da professora com a atividade posta. Também identificamos uma constante citação do nome dos estudantes, além de diferentes questões formuladas e marcadores conversacionais que evidenciam uma situação de interação, caracterizando o envolvimento do falante com o ouvinte. E, por fim, verificamos, também, a forte presença de redundâncias (repetições) e exageros do falante durante a explicação oral da professora, caracterizando, assim, o envolvimento do falante com o assunto.

A resolução das atividades de Paula tende a focar nas resoluções. Apesar de estar mais sensível a ouvir o que o estudante tinha a dizer, não buscava compreender suas dificuldades e refletir sobre elas, mas direcionava o que o estudante tinha que fazer para obter a resposta correta. De acordo com Rodrigues, Menezes e Ponte (2018), isso ocorre devido a característica profissional do professora.

Ao retomarmos a entrevista realizada com a professora, identificamos que, ao construir o gráfico, apresentou alguns equívocos, pois não conseguiu fazer um gráfico com barras de mesma largura e espessura, o que dificulta a comparação dos dados.

Além disso, escolheu uma escala unitária para o gráfico, o que dificulta ainda mais a análise dos dados. Também não apresentou eixos e nomes correspondentes. Durante a análise de protocolo, identificou os erros e acertos das crianças, mas não soube justificar, nem explicar o que o levou ao erro, sem apontar caminhos para sua superação. Destaque-se que acredita que todas as atividades podem ser propostas a partir do 2° ano.

Fonte: As autoras

Figura 6: Gráfico construído por Paula 

Nessa aula analisada, percebe-se que a professora apresenta alguns termos como: pesquisa, tabela, gráfico, título (sem explicar), escala (relaciona a escala ao quadrado da malha). Contudo, apresenta pesquisa, enquete e entrevista como sendo a mesma coisa (extrato 3). Observamos o enorme empenho dessa professora em buscar diferentes elementos semióticos para contribuir na aprendizagem dos alunos. Entretanto, observa-se que sua descrição dos conceitos estatísticos é superficial e, por vezes, equivocada.

A ausência de domínio conceitual não permite que o professor seja capaz de desenvolver uma explicação oral dentro do processo de ensino que promova a aprendizagem, como afirmam Proulx et al. (2006) . Os elementos gráficos foram apenas descritos e não analisados, discutidos ou problematizados.

Verificamos que Paula promove retomada, definições e conclusão do conceito que está sendo exposto, como verificado quando a professora vai retomando o que foi realizado na aula anterior para que culminasse no preenchimento da tabela. Assim, podemos afirmar que o movimento de retomada e sistematização são essenciais para uma boa explicação oral, tendo em vista que organizam tanto o pensamento do locutor quanto o dos interlocutores, pois há o fechamento/conclusão do conceito que está desenvolvendo.

Apesar disso, observamos que essas retomadas e sistematizações não ocorrem de modo a favorecer a apresentação das múltiplas possibilidades explicativas, o que é destacado também por Proulx et al. (2006) , Berdnaz (2005). Reforça para que os alunos construam o gráfico da maneira que quer, levando os alunos a acreditarem que construir gráficos é “pintar quadrados”. Assim, as etapas do pensamento não foram propostas pela professora, escolhendo estratégias para serem desenvolvidas pelos alunos.

Assim, não basta apenas descrever os processos para a realização da atividade. É necessário adaptar as respostas dos alunos, de modo a aproveitar tudo aquilo que possa ter contribuição para discussão, além de esclarecer para os demais alunos o que foi dito pelos colegas, como afirmam Proulx et al. (2006). Durante a aula, Paula buscou relacionar os conceitos que são expostos nos exemplos do cotidiano dos estudantes e com outras atividades por eles vivenciadas, como ao relacionar o gráfico de barras recorrente no livro com o material dourado utilizado em aulas anteriores, o gráfico de setores com a pizza, devido ao seu formato, por exemplo. De acordo com Proulx et al. (2006), a analogia e conexão são fundamentais para a verbalização de conceitos, tornando-se também essenciais no desenvolvimento de uma linguagem estatística clara e coerente.

No que se refere aos gestos, analisamos que os da professora surgem em complemento de sua explicação. Enquanto a entonação e qualidade de sua voz apresentam-se como artifícios para chamar a atenção dos alunos para o que está sendo exposto na explicação.

Identificamos a presença de alguns marcadores de repetição, como: “bom, hein, vê só, eita, tá”, sendo um recurso para convidar os alunos a participar da aula. Paula repete diversas vezes o “tá”, para chamar a participação dos estudantes, tendo em vista que o ambiente remoto favorece a falta de interação face a face entre alunos e professor. Verificamos, também, que a professora utiliza verbos indicados normalmente para exprimir raciocínio, conforme Koch (2010). Todavia, no contexto utilizado por Paula, reforçam ações vivenciadas por eles, apenas. Nesse trecho, por exemplo: “(...) Acompanha aí, que não tem dúvida. Faz como tia Paula tá explicando que não tem como dá errado não, tá?! Depois que eu coloco a letra N, eu deixo mais 2 quadradinhos na frente do N, (...)”, a professora diz que estar explicando o preenchimento da malha quadriculada, porém, na verdade, promove um verdadeiro passo a passo de como deve ser preenchida aquela etapa da atividade (Extrato 5). Isso apenas reforça o quanto a explicação oral da professora está centrada na resolução e conclusão da atividade, sem promoção de discussões, problematizações e controvérsias, o que é importante no processo de ensino que se encaminhe para aprendizagem.

Observamos que a professora realiza atividades metaenunciativas durante a aula com o propósito de antecipar o que será vivenciado pelos estudantes apenas como uma estratégia para organização do tempo de aula, verificado durante a aula, quando antecipa que irão utilizar o livro, por exemplo. Dessa forma, com base nos estudos de Proulx et al. (2006) , não compreendemos que essa atividade utilizada por Paula contribui para a construção de um ensino desafiador, mas a um ensino descritivo e expositivo, como já vem sendo destacado.

Conforme os operadores argumentativos indicados por Koch (2010), a professora utiliza ‘então’ (com a frequência de 18 vezes) como apoio para realizar o fechamento de ideias durante sua explicação oral. Contudo, de acordo com a literatura, os operadores argumentativos auxiliam na construção de um ponto de vista. Desse modo, considerando o contexto de produção, o uso do operador não serviu para a defesa de um ponto de vista, como preconizado na literatura, mas como uma conclusão de algo anteriormente dito. É o que podemos verificar a seguir: “Olha, gente. Excelente! O gráfico ele traz uma informação, e essa informação geralmente é em forma de quantidade(...) Então, aqui tia Paula trouxe a imagem de vários tipos de gráficos”.

Assim, verificamos que não há a defesa/ apresentação, nem a utilização de argumentos na explicação oral da professora, o que acrescenta a ideia de uma explicação pautada na descrição de procedimentos a serem vivenciados.

Verificamos que o uso dos conectores “mas, então” viabilizou a comunicação sem problemas. O “então” utilizado, para concluir uma discussão, e o “mais” para complementar uma informação. Dessa maneira, compreendemos que os conectores utilizados pela professora viabilizaram sua explicação, de modo a comunicar o que queria. Uma vez que, na linguagem oral, há mais dificuldades para a reconstrução do que já foi dito, porque não se pode apagar as palavras ditas, mas pode-se reformula-las, eles são fundamentais nesse processo de reconstrução, como argumenta Koch (2010). O uso de “pra cá, aqui, lá” também está sempre associado aos gestos de localização da informação, utilizados em complemento da explicação oral. Entretanto, o uso deles acaba por substituir o nome de um conceito ou de uma informação, a qual deveria ser utilizada para aprendizagem dos alunos. Destaca-se, assim, uma lacuna no domínio conceitual do conteúdo da professora.

Identificamos, ainda, a utilização de alguns termos estatísticos, como: gráfico, pesquisa, entrevista, tabela, gráfico de barras, gráfico de setores, gráfico de linhas, título, fonte, dados, e distanciamento das barras. Porém, as definições utilizadas para eles apresentam muitos problemas, como afirmar que pesquisa é apenas uma enquete ou que a função de um gráfico é quantificar. Berdnaz (2005) destaca a importância da utilização dos termos na comunicação construída em sala, que, no nosso caso, é a comunicação estatística, como sendo fundamental na compreensão do conteúdo que se deseja desenvolver em sala.

No decorrer da aula, Paula faz uso da escrita de palavras que os estudantes precisam anotar, como título, por exemplo. Com relação aos recursos didáticos, utiliza: livro didático, slides, vídeos e malha quadriculada, o que permitiu uma aula mais diversificada e provavelmente mais motivadora para os alunos. Dessa forma, verificamos que tanto os recursos visuais quanto os recursos didáticos utilizados pela professora contribuíram para sua explicação oral da professora, de modo a apresentar conceitos, exemplificação de situações e descrever o que se estava apresentando, acarretando um trabalho que viabiliza o desenvolvimento das atividades propostas.

Contudo, no que diz respeito à utilização dos recursos tecnológicos, observamos que Paula não os explora como uma ferramenta didática, mas apenas como um suporte. Porém, é preciso relativisarmos o uso das tecnologias uma vez que os professores, diante pandemia da COVID 19, tiveram que adaptar suas aulas presenciais para remotas, sem tempo de se apropriarem desaas novas ferramentas, como argumenta Santos (2020).

Conclusão

Diante da importância da explicação oral de professores na aprendizagem dos estudantes, essa pesquisa teve como objetivo analisar a explicação oral de professores do 1º ano do Ensino Fundamental sobre construção de gráfico, considerando as influências do contexto de aula (presencial ou remoto), domínio conceitual, didático, linguagem oral e gestual.

Concluimos que, independente do ambiente de ensino remoto ou presencial, as professoras direcionaram o desenvolvimento e resolução das atividades, sem promover problemáticas que encaminhassem o ensino para um processo desafiador.

Observamos que as professoras apresentaram, além de uma proposta didática não desafiadora, lacunas em relação ao domínio conceitual sobre construção de gráficos, o qual pode ser explicitado diante da linguagem oral e gestual utilizada.

Assim, verificamos o quanto o domínio didático e conceitual são importantes na construção e desenvolvimento da explicação oral do professor. Dessa forma, fica explicita a necessidade de processos de formação inicial e continuada sobre estatística e/ou uma tomada de conciência dos professores sobre suas carências conceituais para que o ensino possibilite, de fato, a aprendizagem dos alunos.

O estudo da enunciação da explicação oral contribuiu de maneira fundamental para compreendermos os processos de ensino dos professores, tanto remoto quanto presencial. Acreditamos que, para além de ser uma maneira de investigar o ensino, é importante que nós professores reflitamos sobre o que e como falamos na busca da aprendizagem de nossos alunos.

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3Nome fictício.

Recebido: 01 de Abril de 2022; Aceito: 01 de Abril de 2023

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