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Revista Educação Especial (Online)

versão On-line ISSN 1984-686X

Rev. Educ. Espec. vol.36  Santa Maria  2023  Epub 10-Nov-2023

https://doi.org/10.5902/1984686x74166 

Relato de pesquisa

Comunicação e socialização da criança com Transtorno do Espectro Autista: a tecnologia como instrumento de aprendizagem

Communication and socialization of children with Autism Spectrum Disorder: technology as a learning tool

Comunicación y socialización de niños con Trastorno del Espectro Autista: la tecnología como herramienta de aprendizaje

Tarcísio Figueiredo1 
http://orcid.org/0000-0003-1900-9454

Arilise Moraes de Almeida Lopes2 
http://orcid.org/0000-0002-0043-5982

Odila Maria Ferreira de Carvalho Mansur3 
http://orcid.org/0000-0002-6633-6776

1Escola Municipal Amaro Prata Tavares, Campos dos Goytacazes, RJ, Brasil. tarcinanda@gmail.com

2Instituto Federal Fluminense, Campos dos Goytacazes, RJ, Brasil. ariliselopes@gmail.com

3Instituto Federal Fluminense, Campos dos Goytacazes, RJ, Brasil. odilamansur@yahoo.com.br


RESUMO

A comunicação e o processo de ensino e aprendizagem das crianças com Transtorno do Espectro Autistaapontam para a necessidade de formação continuada de profissionais, tanto professores regentes quanto mediadores, tendo em vista a falta de estratégias, recursos tecnológicos e, muitas vezes, o despreparo dos profissionais para estimular os alunos desde os anos escolares iniciais.O objetivo deste trabalho é apresentar os resultados de um curso de formação continuada para professores regentes e mediadores, trazendo um recorte de uma pesquisa de mestrado com resultados da terceira unidade desenvolvida para o curso. A pesquisa apresenta uma abordagem qualitativa e investigação exploratória. Tem como procedimento a intervenção pedagógica baseada no aporte teórico sociointeracionista que traz a tecnologia como instrumento de mediação na aprendizagem e, além disso, a gamificação como uma possível estratégia de ensino e aprendizagem. Para coletar dados dessa unidade do cursoforam utilizados: fórum de discussão, atividade proposta aos cursistas e aplicativo de mensagens. O resultado das interações e respostas, assim como o uso e aplicação das ferramentas e ações propostas foram suficientes para identificar aprimoramentos e construção de conhecimentos que possibilitammelhorias na prática pedagógica inclusiva dos participantes. Taisaprimoramentos podem ser aproveitados por outros profissionais de Ensino que recebam em suas escolas crianças com transtorno do espectro autista.

Palavras-chave: Transtorno do Espectro Autista; Tecnologia; Aprendizagem

ABSTRACT

Communication and the teaching and learning process of children with Autism Spectrum Disorder point to the need for continued training of professionals, both regents and mediators, in view of the lack of strategies, technological resources and, often, the unpreparedness of teachers professionals to stimulate students from the early school years.The objective of this work is to present the results of a continuing education course for regents and mediators, bringing an excerpt from a master's research with results from the third unit developed for the course. The research presents a qualitative approach and exploratory investigation. Its procedure is the pedagogical intervention based on the socio-interactionist theoretical contribution that brings technology as a mediation instrument in learning and, in addition, gamification as a possible teaching and learning strategy. To collect data from this course unit, the following were used: discussion forum, activity proposed to course participants and messaging application. The result of interactions and responses, as well as the use and application of the tools and proposed actions were enough to identify improvements and construction of knowledge that provided improvements in the inclusive pedagogical practice of the participants. Such improvements can be used by other teaching professionals who receive children with autism spectrum disorder in their schools.

Keywords: Autism Spectrum Disorder; Technologies; Learning

RESUMEN

La comunicación y el proceso de enseñanza y aprendizaje de los niños con Trastorno del Espectro Autista apuntan a la necesidad de una formación continua de los profesionales, tanto rectores como mediadores, ante la falta de estrategias, recursos tecnológicos y, muchas veces, la falta de preparación de los profesionales para estimular alumnos desde los primeros años escolares.

El objetivo de este trabajo es presentar los resultados de un curso de formación continua para regentes y mediadores, trayendo un extracto de una investigación de maestría con resultados de la tercera unidad desarrollada para el curso. La investigación presenta un enfoque cualitativo y de investigación exploratoria. Su procedimiento es la intervención pedagógica basada en el aporte teórico sociointeraccionista que aporta la tecnología como instrumento de mediación en el aprendizaje y, además, la gamificación como posible estrategia de enseñanza y aprendizaje. Para la recolección de datos de esta unidad de curso se utilizaron: foro de discusión, actividad propuesta a los participantes del curso y aplicación de mensajería. El resultado de las interacciones y respuestas, así como el uso y aplicación de las herramientas y acciones propuestas fueron suficientes para identificar mejoras y construcción de conocimientos que propiciaron mejoras en la práctica pedagógica inclusiva de los participantes. Estas mejoras pueden ser utilizadas por otros profesionales de la enseñanza que reciben niños con trastorno del espectro autista en sus escuelas.

Palabras clave: Desorden del Espectro Autista; Tecnologías; Aprendizaje

Introdução

O termo “espectro” do Transtorno do Espectro Autista (TEA) se ampara na grande variação de casos existentes do transtorno, que são identificados por déficits persistentes na comunicação e na interação social em múltiplos contextos. O reconhecimento e diagnóstico também incluem a presença de padrões de comportamentos repetitivos e interesses restritos (APA, 2016; MANSUR, 2018).

Antes de tudo, aadoção do termo expressa a diversidade, tanto em habilidades quanto em dificuldades que essa população apresenta. Enquanto muitas crianças com TEA possuem um acometimento leve, podendo se desenvolver com estímulos adequados, possuir altas habilidades em determinadas áreas científicas ou artísticas; outras podem ser acometidas de forma mais severa, necessitando de constante apoio ou mediações em suas atividades (CAMINHA et al., 2016; MANSUR, 2018).

Com efeito, a carência de mediadores para trabalhar com as diferenças do espectro autista, a falta de estratégias no processo de ensino e aprendizagem e a ausência da família são dificuldades apresentadas pelo professor para que a inclusão prevista nas leis aconteça de fato (BARBOSA, 2018; SILVA et al., 2018).

A pesquisa de Silva e Moreira (2022) aponta a necessidade formativa dos profissionais de Ensino, pois o fato dos estudantes com TEA não reconheceremas metodologias usuais de ensino como um facilitador para permanência nos estudosrevela uma barreira com a prática pedagógica e uma dificuldade de se aproximarem de seus professores.

Da mesma maneira, outros trabalhos apontam para o desconhecimento dos profissionais de ensino em relação às estratégias e aos recursos tecnológicos que podem potencializar o processo de ensino e aprendizagem desse alunado (PEREIRA, 2018; ALMEIDA, 2019).

Diante das dificuldades que esses profissionais encontram, existe a possibilidade de incorporar recursos para a melhoria do processo de ensino e aprendizagem de crianças com TEA. As tecnologias possibilitam diminuir as diferenças e contribuir com a mediação no processo de aprendizagem de crianças com TEA (PROENÇA et al., 2019).

O presente artigo é um recorte de uma pesquisa de mestrado que buscou apresentar uma proposta aplicada de um curso de formação de continuada, intitulado “Formação Continuada para Professores e Mediadores: transtorno do espectro autista”.

O objetivo deste recorte (apresentar a terceira unidade do curso) foi estimular e ampliar a comunicação e a socialização por meio de abordagens baseadas nas interações sociais com o apoio de recursos tecnológicos. As interações e propostas nessa parte do curso, a partir de recursos oferecidos e elaborados, foram analisadas por meio de fórum de discussão, atividade realizada pelos cursistas e aplicativo de mensagens do WhatsApp.

Tecnologias na formação continuada: instrumento mediador na aprendizagem da criança com TEA

Na sala de aula, o potencial da criança deve ser investigado e conhecido. Para tanto, se faz necessário uma escuta sensível e uma observação minuciosa; conhecer as diversas maneiras de aprendizagem e as especificidades do aprender das crianças com TEA; aproveitar vivências individuais; observar os interesses da criança considerando suas potencialidades e incentivar suas habilidades (ALMEIDA, 2019).

Vale ressaltar a observação de Torres et al. (2020), quando consideram que além de frequentar a sala regular, a criança com TEA possua a mediação de profissionais qualificados e materiais pedagógicos que apoiem o desenvolvimento. Os autores complementam ser necessário também que os profissionais da escola tenham formação especializada, que lhes permitam conhecer as possibilidades de atuação com os estudantes neuroatípicos, bem como recursos estratégicos existentes.

Nota-se a importância de cursos que preparem profissionais do ensino para o conhecimento dos diferentes perfis de alunos e, assim, realizar um método direcionado para cada perfil de aluno. Muitos professores não se apropriam de nenhuma metodologia ou abordagem conjunta e sincronizada dirigida à inclusão dos estudantes com necessidades especiais, o que dificulta o processo de ensino e aprendizagem, pois uma abordagem apropriada é fundamental para o desenvolvimento cognitivo (YAMAGUCHI et al., 2020).

Novôa e Brito (2017) consideram que muitas experiências de mediações pedagógicas podem ser subsidiadas por tecnologias que auxiliam no processo de ensino e aprendizagem. As tecnologias, na perspectiva sociointeracionista, funcionam como instrumentos na mediação do ensino e aprendizagem.

Vygotsky defendeu que a relação humana com o mundo é uma relação mediada por instrumentos e signos. A tecnologia funcionaria como um instrumento mediador pela qual o homem transforma a sociedade e cria outra linguagem, o signo (VYGOTSKY, 2007).

Semelhantemente,o engajamento necessário para a aprendizagem de estudantes com TEA não ocorre de forma direta, é mediado por signos, que podem ser explicados como meios que auxiliam no controle da atividade psicológica dos indivíduos e representam algo diferente de si mesmos (SILVA, 2017).

Fundamentada neste aporte teórico, Pereira (2018) assegura que as tecnologias, digitais ou não, são instrumentos de mediação com vasto potencial para estudantes do espectro autista.

Após compreender o perfil do aluno com TEA é possível estabelecer habilidades e necessidades ao se indicar tecnologias que passam a ser Tecnologias Assistivas para o planejamento dos professores e mediadorespromovendo a aprendizagem da criança com TEA (PROENÇA et al., 2019).

O uso de Tecnologias Assistivas, de acordo com a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), em seu Art. 3.º, consiste em: produtos, dispositivos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que busquem promover funcionalidade relacionada à atividade e à participação da pessoa com deficiência, visando a sua autonomia, qualidade de vida e inclusão social (BRASIL, 2015).

A Comunicação Alternativa e Ampliada (CAA) é um relevante exemplo de Tecnologia Assistiva de comunicação que envolve gestos manuais e corporais, expressões faciais e símbolos visuais como: desenhos, fotografias, figuras, linguagem alfabética, e objetos variados (digitais ou não) de acordo com a necessidade e o contexto vivenciado pelo estudante com TEA (FRIZZARINI et al., 2018).

O aplicativo Matraquinha é um exemplo digital: disponível para Android e IOS, destinado para crianças que, em geral apresentam dificuldades na comunicação e, em especial, as crianças com TEA. A comunicação é feita basicamente por meio de cartões que quando clicados, reproduzem por meio da voz o que a criança deseja expressar. O objetivo é estimular a comunicação e motivarpara uma forma divertida de expressar a fala (ALVARENGA DIAS, et al., 2019).

Determinados aplicativos podem potencializar a aprendizagem das crianças com TEA. São apontados como ferramentas efetivas para aprendizagem de habilidades fundamentais, que vão desde as comunicativas e sociais às acadêmicas (NOVÔA; BRITO, 2017).

Os dispositivos móveis como tablets e smartphones permitem a aprendizagem com os aplicativos em qualquer lugar e qualquer hora, dinamizando quaisquer estratégias e otimizando o processo educacional (ARAGÃO, 2019).

Os ambientes virtuais também possibilitam, por intermédio das tecnologias digitais, beneficiar crianças com TEA na socialização, pois estimulam a comunicação e valorizam suas potencialidades. Exemplo são os jogos educativos, pois motivam e estimulam as áreas em que os indivíduos com TEA apresentam maior dificuldade: comunicação e socialização (KANASHIRO; SEABRA JÚNIOR, 2018).

Logo, para Souza e Loureiro (2020) é de vital importância oferecer formação continuada que possibilite a aptidão dos profissionais de ensino para lidar com instrumentos e abordagens estratégicas para a mediação da aprendizagem do estudante com TEA.

Abordagens para a aprendizagem da criança com TEA e o Sociointeracionismo

Algumas abordagens educacionais visam mediar a aprendizagem de crianças com TEA, mediante ensaios, treinamentos ou interação social. São utilizadas para estimular a atenção compartilhada, a comunicação e a modificação de comportamentos. Destacam-se dois tipos distintos de abordagens: as comportamentais e as desenvolvimentistas.

As abordagens comportamentais têm sido realizadas por intervenções influenciadas pelo Behaviorismo, ou seja, programas que utilizam o “treinamento discreto”. Este consiste num método de aumentar a probabilidade de acertos e respostas desejadas com uso de reforços e por meio de ensino sistemático (MANSUR, 2018).

O Programa ABA, traduzido como Análise do Comportamento Aplicada, é uma abordagem comportamental que fundamenta a sua aplicação no behaviorismo de Burrhus Frederic Skinner. É um conceito oriundo da corrente científica do behaviorista que analisa a conexão entre aprendizagem, ambiente e comportamento humano (SOUZA; LOUREIRO, 2018).

O TEACCH, traduzido como ‘Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Déficits Relacionados à Comunicação’, foi desenvolvido pelo professor Eric Schopler, na década de 1970, na Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos (SOUZA; LOUREIRO, 2020).

A abordagem comportamental TEACCH preconiza, de acordo com Mansur (2018), a aprendizagem em espaços pedagógicos de maneira individualizada, com uso de mesa de trabalho, computador, brincadeiras e área transitória, que consiste em acrescentar o componente coletivo com vistas à socialização, por meio de atividades coletivas que partem sempre da individualização das tarefas.

A abordagem Denver ou ESDM (Early Start Denver Model) é conhecida como Modelo Denver para Intervenção Precoce. Segundo Löhr (2016), é mais indicada para crianças e se baseia em algumas técnicas de ABA em contextos naturais, estimulando habilidades sociais, cognitivas e de linguagem. Nesse caso, a linguagem e a comunicação devem ser estimuladas por meio de uma relação afetiva e tendo como princípios a interação e a atenção compartilhada.

Com relação às abordagens desenvolvimentistas, Mansur (2018) salienta que estas priorizam a interação social e buscam a comunicação através de relações espontâneas, menos hierarquizadas e em ambientes naturais. Entre elas se destacam o DIR e o Son Rise.

O DIR é um programa que se sustenta em relacionamento e na diferença individual das crianças. Foi elaborado pelo psiquiatra infantil estadunidense Stanley Greenspan e tem como objetivo o desenvolvimento saudável da criança com autismo, por meio de interações sociais afetivas, engajamento em comunicações significativas, no simbólico e cognitivo.

O Programa usa como estratégia o FloorTime (tempo no chão), em que a criança passa um tempo brincando e interagindo com seus mediadores em atividades com objetivos definidos (GREENSPAN; WIEDER, 2006).

O Programa Son-Rise foi desenvolvido nos Estados Unidos, na década de 1970, geralmente, praticado e conduzido em casa pelos pais e facilitadores. Schmidt et al. (2015) expõem que a formação é desenvolvida entre a família e se utiliza um quarto modificado para ser o “quarto de brincar”.

A adaptação é feita estrategicamente para facilitar a organização e a previsibilidade, minimizando distrações e obtendo um maior controle sobre possíveis imprevistos, buscando maximizar a interação e o engajamento com a criança com autismo.

O alicerce teórico do programa é robusto. Fundamenta-se em vastas evidências empíricas e tem como base a interação social para promover laços afetivos, motivação, empatia e comunicação. A atenção compartilhada é promovida a partir de suas preferências e abordando a criança na maior parte do tempo de forma responsiva, ou seja, dando a oportunidade para a criança com TEA liderar a atividade lúdica e estar no centro de sua aprendizagem (SCHMIDT et al., 2016).

A interação social, diante das abordagens apresentadas, demonstra ser o elemento-chave das intervenções educacionais no TEA na busca de objetivos como comunicação, autonomia e habilidades sociais. Por isso, é oportuno, segundo Santana et al., (2016) refletir sobre as abordagens pedagógicas não mais focadas na perda, na limitação e na deficiência da criança; mas no potencial, na diversidade e na criatividade. Isso demonstra ser possível somente via interação social e cultura.

As abordagens comportamentais têm apresentado alguma eficácia nos relatos aqui expostos, todavia, é necessário reconhecer e enfatizar que crianças ou adultos do espectro autista precisam, sobretudo, de uma inserção cultural nas relações sociais, pois é na linguagem (significado e não somente fala) e na sua função social, que se pode mediar a aprendizagem. (Trevizan; Pessoa, 2018). Quando se acena para a inserção cultural nas relações sociais, há de se fazer uma abordagem sobre a teoria sócio-histórica-cultural de Vygotsky. As influências sociais e culturais no desenvolvimento da criança foram apontadas por Vygotsky (2011) em seus estudos sobre defectologia.

A deficiência, então, foi vista para além das causas orgânicas, incluindo as questões sociais e culturais. A partir desse viés vygotskyano, as crianças que têm o curso de desenvolvimento diferenciado, a exemplo daquelas do espectro autista, demandam uma reorganização no seu meio social para atender às suas necessidades.

Vygotsky (2007) defende que a criança se desenvolve, antes de tudo, por nível social. Dessa forma, o desenvolvimento da cultura no convívio social possibilitará a criança, em especial a do espectro autista, a se socializar e se adaptar à sociedade. Na perspectiva sociointeracionista, o chamado desenvolvimento das funções psicológicas superiores, que são processos mentais que produzem o comportamento consciente e a aprendizagem, se dão na interação da pessoa com o meio social (VYGOTSKY, 2007).

Procedimentos Metodológicos

Desenvolveu-se uma pesquisa qualitativa e, quanto ao procedimento,intervenção pedagógica que, de acordo com Damiani (2012), é usada para denominar um tipo de pesquisa educacional, cujas práticas de ensino inovadoras são realizadas na prática pedagógica, buscando promover melhorias e um avanço da construção do conhecimento dos envolvidos no processo.

Inicialmente foi desenvolvida uma pesquisa bibliográfica, que constitui o início dapesquisa exploratória. Para Gil (2008), a pesquisa bibliográfica se torna indispensável nos levantamentos históricos e visa propiciar maior familiaridade com o problema, com a intenção de torná-lo mais explícito ou a constituir hipóteses.

Na pesquisa exploratória, a investigação, por meio de questionários, ocorreu em dois momentos: antes da abertura do curso de formação continuada proposto aos professores e mediadores e ao final do mesmo.

Enquanto pesquisa exploratória, o questionário inicial, teve por objetivo investigar a atuação dos professores e mediadores, no que se refere as propostas didáticas voltadas às necessidades educacionais individuais dos alunos com autismo. Os dados levantados levaram ao planejamento e desenvolvimento do curso de formação continuada. O público-alvo foi composto por 20 profissionais de Ensino da Educação Infantil e dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, sendo oito professores e doze mediadores da rede municipal de São Fidélis-RJ, local em que este pesquisador reside.O intuito dessa composição foi abranger um grupo de profissionais de Ensino que manifestaram interesse em melhorar suas práticas pedagógicas voltadas aos estudantes com TEA.

A faixa etária majoritária dos participantes se apresentou, de acordo com o questionário inicial, acima dos 39 anos (69,2% dos profissionais). Pressupondo-se uma maioria dos participantes com maturidade no exercício de suas funções docentes.

Como instrumentos de coleta de dados foram utilizados: i) questionário inicial e questionário final, ambos online, aplicados aos profissionais de Ensino; ii) respostas dos participantes nos fóruns de discussões propostos nas unidades do curso proposto; iii) respostas dos participantes nas atividades, também propostas nas unidades; iv) diálogos no aplicativo de mensagens WhatsApp.

Resultados e Discussões

O curso planejado no AVA Schoology (2021) buscou como objetivo a melhoria das práticas pedagógicas inclusivas dos professores e mediadores para o processo de ensino e aprendizagem de alunos com TEA. Foi denominado: “Formação Continuada de Professores e Mediadores: Transtorno do Espectro Autista”.

O quadro 1 apresenta o planejamento do curso, contendo as unidades, o conteúdo programático por unidades e os objetivos específicos planejados.

Quadro 1 Planejamento do curso 

Unidade Ambientação Conteúdo Programático Objetivos específicos
Leitura Vídeos Fóruns Duração: duas semanas Carga horária:10h . Apresentação do curso . Fórum de apresentação: destinado à apresentação dos participantes. . Fórum de dúvidas: destinado à postagem de dúvidas relacionadas a procedimentos, prazos e conteúdo do curso. 1. Ambientação entre professores, mediadores, pais, convidados e o organizador do curso. 2. Conhecer a proposta do curso, as ferramentas de interação e os recursos da plataforma.
Unidade 1 Conhecendo o TEA Conteúdo Programático Objetivos específicos
Palestra Leituras Vídeo Atividades Fórum Duração: duas semanas Carga horária: 10h . O Transtorno do Espectro Autista: . O que é o TEA? . Incidência . Desafios . Potencialidades 1. Conhecer as características e complexidades do TEA. 2. Reconhecer os desafios e as potencialidades desse público no processo de ensino e aprendizagem.
Unidade 2 As Questões Sensoriais Conteúdo Programático Objetivos específicos
Leituras Vídeo Atividade Fórum Duração: duas semanas Carga horária: 10h . Perfis Sensoriais. . Sistemas Sensoriais. . Estímulos inibitórios ou ativadores. 1. Conhecer as questões sensoriais no TEA. 2.Analisar possíveis soluções para a acomodação sensorial do aluno com TEA.
Unidade 3 Comunicação e Socialização Conteúdo Programático Objetivos específicos
Leituras Vídeo Atividade Fórum Duração: duas semanas Carga horária: 10h . Comunicação: possibilidade ampla. . Socialização pelas Interações sociais. . Abordagens baseadas nas interações sociais. 1. Examinar a comunicação em seu amplo aspecto. 2. Reconhecer as interações sociais como ferramentas da socialização. 3. Compreender as abordagens ao TEA baseadas nas interações sociais.
Unidade 4 Construindo uma Sequência Didática: possibilidades. Conteúdo Programático Objetivos específicos
Leituras Vídeo Atividade Fórum Duração: duas semanas Carga horária: 10h Construção de uma sequência didática para o estudante com TEA. 1.“Brainstorming” entre os participantes para as possibilidades de construção de uma sequência didática. 2. Construção de uma sequência didática de cada grupo.

Fonte: Elaborado pelos autores

Neste artigo será abordada a Unidade 3, que enfatizou a “Comunicação e Socialização”, cujos objetivos da aprendizagem visaram:

  1. Examinar a comunicação em seu amplo aspecto;

  2. Reconhecer as interações sociais como meios espontâneos para a socialização;

  3. Compreender as abordagens ao TEA baseadas nas interações sociais.

Tais objetivos ao serem apresentados aos professores e mediadores, são fundamentais para o processo de ensino e aprendizagem dos estudantes com TEA.

As abordagens expostas no referencial teórico e estudadas na unidade 3, em diversas situações, utilizam recursos tecnológicos (digitais ou não) como instrumentos que, segundo Vygotsky (2007), viabilizam a mediação da aprendizagem em consonância com os signos.

Nesta terceira unidade foram abertos: um (1) fórum de discussão e uma (1) atividade propondoa criação de mapa mental colaborativo sobre cinco abordagens de ensino para alunos com TEA.

Para que os professores e mediadores realizassem a discussão no fórum e a atividade proposta, materiais foram disponibilizados para que pudessem se fundamentar.

Os materiais disponibilizados foram:

um arquivo contendo uma apresentação sobre comunicação e socialização;

uma pasta contendo sete artigos científicos que abordaram

  1. Teoria da mediação de Vygotsky,

  2. Linguagem sobre Autismo no contexto educativo,

  3. Abordagem SON-RISE na escola,

  4. Abordagem DIR/FLOOR TIME na escola,

  5. Abordagem ABA na escola,

  6. Abordagem TEACCH na escola e

  7. Abordagem DENVER e PRT.

Como material de aprofundamento foram propostos mais três artigos para leitura, a saber:

  1. Dispositivos Móveis para aplicativos TEA,

  2. Possibilidades de Jogos para TEA e

  3. Jogos de Tabuleiro AEE para TEA.

Foi pesquisado e inserido na unidade um vídeo abordando jogos de Turn Taking e um tutorial sobre Mapa Mental no CANVA.

Por fim, enquanto recursos pedagógicos, foi disponibilizada uma página apresentando alguns recursos pedagógicos concretos para se aplicar com estudantes com TEA (massa de modelar, material dourado, jogo de memória, jogo de quebra-cabeças, entre outros) e links com sugestão para se trabalhar com por exemplo (i) Comunicação Alternativa e (ii) aplicativos como Let Me Talk, Matraquinha, Jade Autism, MITA, ABC Autismo e jogos educativos online explorando letras do alfabeto, adição e subtração, formas geométricas, corpo humano e por último esporte de arremesso.

Inicialmente a figura 1 apresenta o fórum de discussão proposto pelo pesquisador, após os participantes acessarem o material disponibilizado.

Elaborado pelos autores

Figura 1 Fórum de discussão da Unidade 3 

Do total de cursistas, participaram deste fórum 14 profissionais entre professores e mediadores e foi proposto aos participantes destacar pontos fundamentais da mediação da aprendizagem, observando a Teoria de Vygotsky disponibilizada na pasta Material de Leitura. Após a aula gravada e a leitura,foi proposto que comentassem sobre a percepção da relação entre esses pontos fundamentais destacados na Teoria e os objetivos da Formação, descritos anteriormente no início desta unidade e apresentados na pasta “Ambientação/Planejamento do Curso”.

Para analisar os dados foi utilizada a análise de conteúdo proposta por Bardin (2016).O quadro 2 apresenta a pré-análise das postagens dos participantes. Essa é a fase que organiza os dados para a manipulação e a sistematização, visando a posterior elaboração de indicadores para a análise de conteúdo do fórum (BARDIN, 2016).

Quadro 2 Categorias extraídas das respostas do fórum de discussão da unidade 3 

Categorias Fragmentos comuns das respostas
1- Interação Social P2: (...) Segundo Vygotsky, o desenvolvimento cognitivo é a conversão de relações sociais em funções mentais. (...) P3: Concordo com a colega, para Lev Vygotsky é de suma importância a relação social para o processo de desenvolvimento pessoal e intelectual. (...) P4: (...) interagindo socialmente num envolvimento ativo de ambos os participantes, propiciando o desenvolvimento. (...) P5: (...) Nessa perspectiva, para ocorrer a aprendizagem, a interação social deve acontecer. (...) P6: (...) os processos mentais e cognitivos do ser humano não podem ser entendidos sem referência ao meio social. (...) P7: Instrumentos sempre mediam as nossas relações com o outro (...) o nosso curso remete a essa questão do trabalho coletivo. (...) P8: (...) observa-se que a aprendizagem é uma experiência que ocorre no contexto social e por meio de interação. (...) M1: (...) valorizando a importância da interação com o contexto social. (...) M4: (...) O funcionamento psicológico tem como base as relações sociais dentro de um contexto histórico. (...) M5: (...) sua questão central é a aquisição de conhecimentos pela interação do sujeito com o meio. (...) M6: (...) O texto discorre que o conhecimento é uma construção social, fruto de interação entre sujeitos. (...) M7: (...) estabelece suas primeiras relações com a linguagem a partir da interação com os outros. (...) M8: (...) A interação social dentro de uma sala de aula é capaz de operar verdadeiros milagres, pois a criança se sente capaz de aprender, de ensinar e fica motivada. (...) M11: (...) sendo assim, a interação entre os indivíduos os modifica para a vida social. (...)
2- Mediação por meio de Instrumentos e Signos P2: (...) Para Vygotsky, é com a interiorização de instrumentos e sistemas de signos, produzidos culturalmente, que se dá o desenvolvimento. (...) P4: (...) o indivíduo utilizará de instrumentos e signos, nas suas construções sócio-históricas e culturais. (...) P5: (...) o processo de aprendizagem é uma experiência social, a qual é mediada pela interação entre a linguagem e a ação. (...) M1: (...) Outro ponto chave é a mediação, toda relação do indivíduo com o mundo é feita por meio de instrumentos técnicos. M6: (...) Quanto mais o indivíduo vai utilizando signos, tanto mais vai se modificando. (...) M7: (...) Essa relação é mediada por instrumentos e signos que levam ao aprendizado. (...)
3- Processos Mentais Superiores P2: (...) é na socialização que se dá o desenvolvimento dos processos mentais superiores. (...) P4: (...) o desenvolvimento cognitivo do ser humano se torna capaz, por meio da socialização que desenvolve os processos mentais superiores. (...) P6: (...) Segundo Vygotsky, os processos mentais e cognitivos do ser humano não podem ser entendidos sem referência ao meio social. (...) M4: (...) com o aprendizado da cultura e as experiências adquiridas, essas funções tornam-se funções psicológicas superiores, que são o comportamento consciente, ação proposital, capacidade de planejamento e pensamento abstrato. (...)
4- Zona de Desenvolvimento Proximal P5: (...) a interação social deve acontecer dentro da zona de desenvolvimento proximal, que seria a distância entre aquilo que o sujeito já sabe (seu conhecimento real) e aquilo que o sujeito possui potencialidade para aprender, seu conhecimento potencial. M4: (...) A Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) mede exatamente a distância entre esses dois níveis, o efetivo e o potencial. M6: (...) A mediação é um recurso útil e necessário para criança. O professor identifica o que ela consegue fazer sozinha e o que ela está perto de conseguir fazer. (...) M8: (...) a área proximal de hoje será o verdadeiro nível de desenvolvimento amanhã. (...)

Fonte: Elaborado pelos autores

A fase de tratamento das respostas do fórum de discussão proposto, segundo Bardin (2016), segue após a etapa de exploração do conteúdo e expõe a interpretação dos dados.

Na categoria 1 (Interação Social), foram agrupadas quatorze respostas que abordam esse ponto central do arcabouço teórico de Vygotsky (2007) na prática pedagógica. Em conformidade com a perspectiva sociointeracionista do clássico autor, na ausência de interação com o seu semelhante, o estudante com TEA não se desenvolve, pois o mesmo aprende sua cultura, somente nela inserido, por meio das interações mediadas. A escola tem papel fundamental nessa inserção cultural.

A categoria 2 relacionou seis respostas que destacam a (Mediação por meio de Instrumentos e Signos). Sob o prisma sócio-histórico, somente pela via cultural e por intermédio desses dois elementos é possível haver mediação. Corroborando com Pereira (2018), a tecnologia, no contexto escolar, é vista pelos profissionais de Ensino participantes do curso, como recursos pedagógicos que funcionam como instrumento mediador que viabiliza a mediação na aprendizagem dos estudantes com autismo. Nesse processo cria-se a linguagem, um signo que permite a comunicação e o simbolismo, imprescindíveis para o desenvolvimento das habilidades sociais desses estudantes.

A categoria 3 (Processos Mentais Superiores) trouxe quatro posicionamentos, cujos extratos das respostas constatam o mesmo que Braga e Rossi (2016), quando asseveram que o desenvolvimento das funções psicológicas superiores depende da inserção do homem na cultura e, para tornar-se humano, o homem necessita do outro desde o nascimento. Diante disso, os profissionais de Ensino compreendem os processos mentais superiores dos alunos com TEA como a própria aprendizagem, na sua forma mais complexa, como exemplos, a capacidade de planejamento e o pensamento abstrato.

Na categoria 4 (Zona de Desenvolvimento Proximal), foram correlacionadas quatro respostas que se respaldam em Vygotsky (2011), pois asseveram o dever docente de promover processos de mediação para o estudante com autismo na direção de seu potencial. Utilizando com o estudante, abordagens e estratégias que estimulem o engajamento em sua Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), zona intermediária entre o que sabe fazer sem mediação e aquilo que ainda não domina, mas tem potencial para dominar (VYGOTSKY, 2011).

Na mediação deste fórum, o pesquisador observou alguns pontos relevantes como: i) tecnologias, digitais ou não, funcionando como recursos pedagógicos e, consequentemente, como instrumentos na mediação da aprendizagem do aluno com TEA; ii) A importância da linguagem como um signo e seu simbolismo na mediação da aprendizagem do aluno com autismo; iii) As relações mediadas e constituídas pelas interações sociais que envolvem o estudante com TEA, por meio dos signos e instrumentos.

Destaca-se que as discussões promovidas neste fórum, com base nos materiais pedagógicos propostos para leitura trouxeram reflexões bastante relevantes sobre a importância de como vivenciar as relações, as interações sociais com crianças com TEA, a mediação para o desenvolvimento de habilidades e comunicação com os alunos. Tudo isso resultou em um fórum de debates com ricas contribuições para reflexões de professores que atuam com alunos com TEA.Ressalta-se que estas reflexões e todo conteúdo do curso estarão disponíveis para profissionais de outras instituições, bastando inserir o código do curso.

Após o fechamento do fórum, os participantes realizaram a atividade proposta da unidade 3. A atividade buscou aprofundar a temática das cinco abordagens de ensino aos estudantes com TEA.Tais abordagens educativas estão entre as mais utilizadas e efetivas à criança com TEA. Se adaptadas à sala de aula podem promover um maior engajamento e motivação deste aluno impactando positivamente sua aprendizagem.

Foi proposta uma leitura dos textos sobre as abordagens e os recursos pedagógicos oferecidos na unidade. A atividade foi realizada em duplas, desenvolvendo mapas mentais em produção colaborativa e assinalou, conforme a figura 2, o término da terceira unidade.

Elaborado pelos autores

Figura 2 Atividade da Unidade 3 

O propósito desta atividade foi construir conhecimentos sobre as abordagens e de forma colaborativa produzirem Mapas Mentais, utilizando os recursos da plataforma Canva, enquanto estímulo de recurso tecnológico a ser utilizado em atividades na sala de aula. Foram formadas duplas para o desenvolvimento de um esquema com uma das cinco abordagens estudadas na unidade (DIR FLOORTIME, SON-RISE, ABA, TEACCH e DENVER) e suas respectivas estratégias. A seleção das duplas foi feita de forma aleatória e cada uma das cinco abordagens foi apresentada por duas duplas, totalizando dez duplas, conforme abaixo:

DIR FLOORTIME: M3/M10 e M4/M6

SONRISE: P5/M9 e P4/M7

ABA: P7/M13 e P1/P2

TEACCH: P8/M11 e P6/M1

DENVER: M2/M5 e P3/M8

Foi solicitado que as abordagens, juntamente com as estratégias, trouxessem pelo menos um recurso pedagógico dentre aqueles disponibilizados nos recursos da unidade como: CAA, materiais concretos, aplicativos e jogos educativos digitais, de forma a estimular o uso desses recursos em sala de aula.O recurso pedagógico selecionado deveria combinar com a abordagem da dupla visando o objetivo deste trabalho: reconhecer e ampliar a comunicação e a socialização por meio de abordagens baseadas nas interações sociais com o apoio de recursos da plataforma CANVA.

Para a elaboração da atividade foi disponibilizada uma estrutura como modelo, do que deveria conter no Mapa Mental: nome da abordagem; tipo de abordagem (desenvolvimentista ou comportamental); características; objetivos e exemplo de recurso pedagógico compatível com a abordagem em contexto escolar. Foi fornecido também um tutorial sobre Mapas Mentais no Canva.

Foram criados e distribuídos pelo pesquisador os links das duplas, para facilitar o acesso e permitir a intervenção pedagógica durante e após a produção. As cinco abordagens foram propostas no material da unidade, as quais as duplas puderam aprofundar conhecimentos e o pesquisador esteve à disposição para esclarecer eventuais dúvidas, fazendo as intervenções pedagógicas necessárias, quando da elaboração dos mapas mentais.

Na mediação, intervenção e retorno das produções na atividade, conclui-se que os participantes atingiram o objetivo proposto. Sendo assim, desenvolveram soluções importantes dentro de suas abordagens, de forma que cada dupla compreendeu e atendeu, mediante intervenção do pesquisador, cada caso específico com estratégias e recursos pedagógicos efetivos no ensino de alunos com autismo.

Durante o desenvolvimento da atividade, os participantes puderam manusear a ferramenta colaborativa e sedimentar suas aprendizagens na prática de produção em nuvem.A maioria passou a editar a ferramenta digital Canva com mais desenvoltura para o trabalho colaborativo em prol das estratégias de ensino em equipe. Para exemplificar as abordagens e as estratégias desenvolvidas na atividade proposta, sãoapresentados a seguir os Mapas Mentais de cinco duplas, sendo uma de cada abordagem proposta na unidade.

Na figura 3, a dupla (M3e M10) apresentou o mapa mental da abordagem DIR Floortime, sua estratégia e recurso pedagógico.

dupla (M3 e M10)

Figura 3 Exemplo da abordagem DIR Floortime com o Canva 

O mapa mental da dupla (M3 e M10) foi produzido sob a observação das possibilidades de interação com o estudante do espectro autista que a abordagem desenvolvimentista DIR Floortime oferece aos profissionais de Ensino. Não somente dentro de uma sala, mas em qualquer espaço físico escolar.

A partir da construção do mapa, observa-se que a dupla se apropriou oportunamente da gamificação promovendo desafios e seguindo o emocional da criança (estilo responsivo de interação) e incentivando a autonomia (estudante agente de sua aprendizagem).

Foi observado pelo pesquisador que a dupla internalizou a proposta da atividade e apresentou estratégias pertinentes quanto à abordagem DIR Floortime.

A expressão inglesa Floortime remete a ideia de “tempo no chão” e pode ser feita em qualquer ambiente. A abordagem busca a promoção da autonomia, das habilidades sociais e cognitivas, através de desafios, ludicidade e interações que observam os níveis de desenvolvimento do indivíduo.

Na figura 4, a dupla (P5 e M9) apresentou o mapa mental da abordagem SONRISE, sua estratégia e recursos pedagógicos.

dupla (P5 e M9)

Figura 4 Exemplo da Abordagem SONRISE com o Canva 

O mapa da dupla (P5 e M9) foi construído enfatizando as características desenvolvimentistas da abordagem SONRISE. Esta também se fundamenta nas interações sociais responsivas na maior parte do tempo, pois busca a motivação, celebra o engajamento e encoraja a autonomia da criança com autismo. Os participantes compreenderam a versatilidade da abordagem ao propor recursos pedagógicos que privilegiam a atenção compartilhada e as variadas interações que podem ser produzidas por meio deles. A dupla soube trazer em seu mapa, exemplos de estímulos sociais e cognitivos.

Por ser tratar de uma abordagem naturalística, isto é, flexível quanto ao ambiente, oferece aos professores e mediadores, diversas oportunidades de estimular social e cognitivamente seus alunos em qualquer espaço escolar.

Na figura 5, a dupla (P1 e P2) apresentou o mapa mental da abordagem ABA, sua estratégia e recurso pedagógico.

dupla (P1 e P2)

Figura 5 Exemplo da abordagem ABA com o Canva 

O mapa mental da dupla (P1 e P2) apresentou a abordagem ABA, Análise Aplicada do Comportamento. Diferentemente das duas primeiras apresentações, trata-se de uma abordagem Behaviorista, que se baseia no condicionamento comportamental. Ao invés de ser responsiva com a criança com TEA, atua de maneira diretiva, pois é o adulto que conduz o processo e não a criança. Se for aplicada adequadamente, permite aos profissionais de Ensino condicionar e registrar o progresso do aluno e, para isso, requer técnicas de modificação comportamental, coleta e análise de dados.

Os participantes se apropriaram adequadamente dos conceitos e métodos da abordagem e demonstraram pertinência em apresentar uma possível aplicação em contexto educacional e interdisciplinar, apesar de detalharem pouco os recursos pedagógicos que seriam compatíveis com a abordagem, de acordo com a intervenção pedagógica efetuada junto à dupla.

Na figura 6, a dupla (P8 e M11) apresentou o mapa mental da abordagem TEACCH, sua estratégia e recursos pedagógicos.

dupla (P8 e M11)

Figura 6 Exemplo da abordagem TEACCH com o Canva 

A dupla (P8 e M11) apresentou o mapa mental sobre o TEACCH. As estratégias e recursos pedagógicos demonstrados pela dupla foram pertinentes para a aprendizagem escolar e evidenciaram uma compreensão acertada quanto à abordagem. Sugeriram ambientes organizados e ensino estruturado; instruções visuais fortemente presentes; rotina e atividades individualizadas bem definidas; previsibilidade nas atividades por ordem cronológica para reduzir a ansiedade; ampliação do repertório comunicativo por meio de cartões para Comunicação Alternativa ou Ampliada (CAA) e a possibilidade de utilização do aplicativo educativo ABC Autismo.

Na figura 7, a dupla (P3 e M8) apresentou o mapa mental da abordagem DENVER, sua estratégia e recurso pedagógico.

dupla (P3 e M8)

Figura 7 Exemplo da abordagem Denver com o Canva 

O trabalho da dupla (P3 e M8) trouxe um mapa mental apresentando o Denver. O diferencial marcante dessa abordagem consiste em mesclar características desenvolvimentistas e comportamentais. Também se fundamenta nas interações sociais, pois foca na linguagem (verbal e não verbal), por meio de jogos interativos e atividades que estimulam o simbólico da criança com TEA.

A dupla construiu conhecimentos relevantes quanto à abordagem, pois pensaram em elaborar com coerência entre as características e os recursos pedagógicos sugeridos, acessíveis aos professores e mediadores, tais como: massas de modelar, bolhas de sabão, fantoches e jogos de tabuleiros.

Algumasintervenções foram feitas mediante diálogos na própria ferramenta colaborativa em tempo real, outras por meio do aplicativo de mensagens. Um exemplo abaixo exibe uma intervenção numa produção de mapa mental de uma das duplas da abordagem Sonrise.

P5: “Professor, como consigo colar uma figura do meu arquivo no mapa mental da plataforma Canva?”

Pesquisador: “Basta ir à coluna da direita, clicar na opção Uploads. Isso irá levá-la a seus arquivos. Estando lá, escolherá aquele que irá ‘subir’ para o Canva.”

P5: “Consegui! Obrigada, professor!”

Apesar de algumas dificuldades, alguns participantes relataram vivenciar uma rápida evolução na aprendizagem em utilizar a tecnologia digital colaborativa durante o curso de formação continuada. Dois relatos por meio do aplicativo de mensagens são apresentados abaixo.

M2: “Eu não conhecia o Canva. Estou aprendendo aqui.”

M6: “Foi muito bom conhecer essa ferramenta de trabalho! Contribuiu para uma nova maneira de trabalhar.”

Tais evidências corroboram a pesquisa de Novôa e Brito (2017), quando alegam que os profissionais de Ensino devem conhecer e se envolver com os recursos tecnológicos digitais, de forma que, antes da escolha desses instrumentos e das abordagens, reconheçam qual deles se enquadra melhor no perfil de aprendizagem do aluno com autismo.

Considerações finais

Considerando a discussão do resultado da unidade, foi evidenciado que para promover a mediação defendida pelo sociointeracionismo é fundamental dominar as ferramentas tecnológicas para o ensino e aprendizagem. Como observado nesse aporte teórico, as tecnologias funcionam como instrumentos na mediação. Não lançar mão delas é tornar inviável esse processo.

O planejamento em equipe foi a maior das dificuldades encontradas,pelos profissionais de ensino,tanto pela falta de domínio da ferramenta tecnológica colaborativa quanto pelo excesso de carga horário de trabalho informado por alguns profissionais, mesmo em tempos de pandemia da Covid-19.

A detecção de lacunas na sincronia entre os professores e mediadores, no que se refere ao planejamento em equipe, reforça os estudos do referencial teórico. Tal lacuna tem provocado na docência sensações de angústia, impotência e frustração diante das limitações dos discentes e das próprias limitações, por não conseguirem mediar a aprendizagem desse público, em especial, dos estudantes com autismo nos primeiros anos da vida escolar.

Essa necessidade pode ser suprida ou minimizada por meio de abordagens específicas que trazem estratégias lúdicas e gamificadas, combinadas com recursos pedagógicos, que além de funcionarem como tecnologias assistivas, também podem ser instrumentos na mediação da aprendizagem.

Dos recursos tecnológicos ofertados pela pesquisa, os mais efetivos foram aqueles que exploraram a ludicidade e as dicas visuais, pois facilitam a compreensão desse público que, em geral, sente dificuldades e distrações com o uso exclusivo de estímulos auditivos.

Após compreender o perfil do aluno com TEA, se faz necessário estabelecer em equipe as abordagens estratégicas, reconhecer habilidades e dificuldades da criança e selecionar os recursos tecnológicos para um planejamento conjunto entre professores e mediadores, visando comunicação, socialização e aprendizagem desse estudante.

Como proposta de ações futuras, sugere-se a replicação do curso e sua adaptação para outros profissionais de ensino que almejam receber em suas escolas alunos com transtorno do espectro autista.

A pesquisa nesta área de Ensino buscou a renovação do “olhar” e das práticas pedagógicas inclusivas de professores e mediadores. Esta importante parceria pode promover consideráveis avanços no processo de ensino e aprendizagem do aluno com TEA.

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Recebido: 13 de Fevereiro de 2023; Aceito: 04 de Julho de 2023; Publicado: 13 de Julho de 2023

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