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Regae: Revista de Gestão e Avaliação Educacional

versão On-line ISSN 2318-1338

Regae: Rev. Gest. Aval. Educ. vol.11 no.20 Santa Maria  2022  Epub 12-Set-2023

https://doi.org/10.5902/2318133871374 

Artigo

Resolução Cne N. 7/2018 E A Burocratização Da Educação Superior: Apontamentos Sobre A Diretriz Relativa Apenas À Extensão Universitária

Resolution Cne N. 7/2018 And The Bureaucratization Of Higher Education: Notes On The Guidelines Regarding Just To Community Outreach Programs

Darlan Pez Wociechoski¹  , professor substituto
http://orcid.org/0000-0002-6766-4405

Afrânio Mendes Catani²  , professor
http://orcid.org/0000-0003-0656-3931

¹Darlan Pez Wociechoski é professor substituto no Departamento de Políticas Públicas e Gestão da Educação de Educação da Universidade de Brasília, Brasília, DF, Brasil. darlan.wociechoski@unb.br.

²Afrânio Mendes Catani é professor na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil. amcatani@usp.br.


Resumo

Neste artigo, apresenta-se estudo acerca da burocratização da educação superior, no que tange a extensão universitária, pela análise da resolução CNE n. 7/2018 e de outros materiais relacionados à mesma. A resolução CNE n. 7/2018 foi elaborada por docentes ligados à causa extensionista, mas sem uma participação perceptível de representantes estudantis e da sociedade em geral. O conteúdo da resolução está fundamentado numa concepção crítica de extensão, mas existe uma limitação e um caráter burocrático inerentes à mesma: foi regulada a extensão de forma apartada de outros pontos do PNE 2014-2024, como a controlada expansão do acesso aos cursos superiores pela meta 12.

Palavras-chave: extensão universitária; curricularização da extensão; burocracia; políticas educacionais; educação superior

Abstract

This article studies the bureaucratization of higher education through the analysis of resolution 7/2018 of the National Council of Education concerning the community outreach programs - and other materials related to it. Resolution CNE 7/2018 was elaborated, mainly, by professors linked to the community outreach programs cause, as well as without a noticeable participation of student representatives neither society in general. The content of the resolution is based on a critical conception of community outreach programs, however there is a limitation and a bureaucratic character inherent to it: the extension was regulated separately from other points of the National Education Plan from 2014 to 2024, such as the controlled expansion of access to higher education courses by goal 12.

Key-words: community outreach; curricularising; bureaucracy; education policies; higher education

Introdução

Recentemente, as instituições de ensino superior - IES - do Brasil têm procurado atender à resolução n. 7, de 18 de dezembro de 2018, a qual estabelece as diretrizes para a extensão na educação superior brasileira (Brasil, 2018a), emitida pelo Conselho Nacional de Educação - CNE -, que regulou a Estratégia 12.7, da lei n. 13.005/2014, cuja redação prevê “assegurar, no mínimo, 10% (dez por cento) do total de créditos curriculares exigidos para a graduação em programas e projetos de extensão universitária, orientando sua ação, prioritariamente, para áreas de grande pertinência social” (Brasil, 2014). Trata-se da chamada curricularização da extensão, que já fora prevista na meta 23 do Plano Nacional de Educação 2001-2010 (Brasil, 2001), com outra redação e de forma restrita às IES. A referida diretriz visa a orientar o processo de curricularização da extensão nos cursos de graduação das IES brasileiras, uma vez que o texto da estratégia 12.7 do PNE 2014-2024 não é autoexplicativo e, reafirmando a percepção de Sousa (2001), ainda existe uma longa discussão sobre as concepções de extensão na educação superior brasileira.

Em paralelo, entendemos que a emissão da diretriz de curricularização da extensão está implicada ao fenômeno de burocratização da educação. Amiúde, a extensão - de modo análogo às considerações de Maurício Tragtenberg (1977) sobre as teorias da administração de empresas - também pode fazer parte de um complexo fenômeno burocrático, porque atua em nível ideológico e operacional. No plano ideológico, os agentes do campo acadêmico deformam a realidade com suas representações sociais, como assinalou Bourdieu (2004). Assim, “a burocracia protege uma generalidade imaginária de interesses particulares” (Tragtenberg, 1977, p. 24).

No plano operacional, esse mesmo movimento se realiza quando as atividades de extensão aparecem como metodologias, técnicas e práticas com o objetivo de harmonizar as relações entre universidade e sociedade. A extensão universitária, assim como as teorias de administração analisadas por Tragtenberg (1977), adapta-se conforme a realidade histórica e geográfica, mas obedece a um princípio primordial: o de dirimir conflitos e manter separados hierarquicamente os planejadores - administradores, professores -, dos executores - operários, alunos e não-alunos -, além de conferir legitimidade à divisão entre os poucos brasileiros que têm acesso ao ensino superior e o contingente ‘fora-de-campo’, para nos valermos do termo de Bernard Lahire (2002). É importante atentar para esse mecanismo, porque os enfoques participativos, nos dois casos, podem procurar encobrir a dominação por meio de seus discursos e práticas.

Com efeito, o objetivo deste trabalho é analisar a resolução CNE n. 7/2018, referente às diretrizes para a extensão na educação superior brasileira (Brasil, 2018a), com base nas contribuições de Maurício Tragtenberg e de outros autores de estudos organizacionais, extensão universitária e educação superior. Quanto à metodologia, lançamos mãos de uma abordagem qualitativa. Foram coletados os documentos - minuta, parecer e resolução - e o áudio da audiência pública referentes à produção da diretriz e eles foram submetidos à análise interpretativa.

Esta resolução já foi desígnio de outros trabalhos (Serafim; Mascia, 2022; Serva, 2019), mas estas pesquisas não contemplaram, por exemplo, a análise do áudio da audiência pública, nem dos textos ulteriores que subsidiaram a elaboração da resolução. Nesse sentido, trata-se de um estudo pertinente, uma vez que contemplou mais materiais de pesquisa e ao mesmo tempo inovou ao trazer para discussão as contribuições de Maurício Tragtenberg e de outros autores para as discussões da extensão universitária e, por conseguinte, da educação superior brasileira.

Burocracia e concepções de extensão universitária

O objetivo desta seção é estabelecer algumas relações entre as concepções de extensão descritas por Maria das Graças Martins da Silva (2001) e as críticas das principais teorias administrativas realizadas por Maurício Tragtenberg (1977) em sua época e de outra, mais recente, inspirada em sua obra (Paes de Paula, 2002).

Antes, porém, é oportuno enfatizar que Maurício Tragtenberg, em sua principal obra, Burocracia e ideologia (1977), se dedicou a explicar a gênese da Teoria Geral da Administração e, portanto, a tratar os administradores no comando de empresa capitalista ou de coletivismo-burocrático. Em nosso caso, consideramos que atualmente o domínio dos agentes do campo universitário pode ser visto das duas formas: ora como coletivismo burocrático cultural, ora como empresa capitalista de bens simbólicos, pois eles podem, tanto ser assimilados pela sociedade burguesa, quanto deter coletivamente os meios de consagração social - produção do conhecimento legítimo - e o monopólio do poder político no seu microcosmo.

No que diz respeito à extensão, Silva (2001) sistematizou três concepções principais, quadro 1, e, assim, definidas: tradicional ou funcionalista, processual e crítica, as quais estão intimamente implicadas a diferentes ideias de universidade. Embora não tenha sido elaborada pela autora uma concepção mercantil de extensão, entendemos que a mesma pode se fazer mais intensa junto à tradicional.

Quadro 1 Concepções de extensão. 

Concepção tradicional ou funcionalista A universidade é vista como um complemento do Estado, desempenhando o papel de mera executora das políticas educacionais. A extensão é entendida como uma função específica, autônoma, sendo a desarticulação com o ensino e a pesquisa praticada e considerada natural. A extensão baseia-se no atendimento das carências imediatas da população, em uma perspectiva apolítica e assistencialista. Há um discurso inflamado que a coloca na condição de representar a saída para a universidade, no sentido de desenvolver o vínculo com a sociedade, mas contraditoriamente, na prática, ela acaba reduzindo-se a ações esporádicas, eventuais e secundárias.
Concepção processual Esta concepção aparece como uma reação à anterior pelo caráter de politização imprimido (sic) às ações e de combate ao assistencialismo. A extensão não mais representa a terceira função - desprestigiada -, mas a articuladora entre a universidade e as necessidades sociais, passando, então, a ter uma tarefa: a de promover o compromisso social da instituição. Sendo assim, adquire um espaço próprio na sua estrutura sob a forma de pró-reitoria, coordenação, etc., justificando-se tal aparato por garantir que as demandas da sociedade sejam absorvidas. É a extensão representando a “consciência social da universidade”. Para superar a visão fragmentária que eventualmente se formasse, propõe-se a articulação da extensão com o ensino e a pesquisa, o que fica consagrado em lei. Atualmente, a concepção aqui exposta é a oficial na maioria das instituições universitárias.
Concepção crítica Esta tendência surge como uma nova leitura de extensão, que se diferencia das anteriores. Nela, a extensão está intrinsecamente ligada ao ensino e à pesquisa, é sua essência, sua característica básica, apenas efetivando-se por meio dessas funções. Portanto, passa a ser entendida como matéria de currículo. Não se justifica, assim, sua institucionalização, pois não se concebe que esta tenha vida própria, autonomia. Daí dizer-se que “a extensão é duas, não é três. Do raciocínio nós eliminamos a extensão. Ela se transforma em ensino e pesquisa” (apud Azambuja, 1997, p, 43)1. Transforma-se em um conceito ocioso, porém exige que o ensino e a pesquisa sejam comprometidos com a realidade, que o conhecimento produzido e transmitido seja inserido e contextualizado nesta realidade.

Fonte: Silva (2001, p. 97-98).

As duas primeiras concepções descritas pela autora (Silva, 2001), surgem na mesma ordem das teorias administrativas criticadas por Tragtenberg. As técnicas de Frederick Winslow Taylor, Jules Henri Fayol e George Elton Mayo procuram criar harmonias administrativas (Tragtenberg, 1977) e são alicerçadas no paradigma funcionalista (Burrell; Morgan, 1979)2, isto é, “os modelos administrativos Taylor-Fayol” enquanto ideologia “correspondem à divisão mecânica do trabalho (Durkheim), em que o parcelamento de tarefas é a mola do sistema”, e que, posteriormente, são continuadas por Mayo “na sua preocupação em evitar os conflitos e promover o equilíbrio ou um estado de colaboração definido como saúde social” (Tragtenberg, 1977, p. 78). Tal promoção de consenso no plano educativo-organizacional é em igual medida a base da extensão universitária brasileira em suas concepções tradicional/funcionalista e processual. Ou seja, são manifestações do paradigma funcionalista enraizado no positivismo junto ao seu instrumental derivado das Ciências Naturais. Esse paradigma tem a particularidade de preocupar-se com questões da ordem social, tais como consenso, integração social, solidariedade e satisfação das necessidades através do viés realista, determinista e nomotético (Burrell; Morgan, 1979).

Por conseguinte, entendemos que a extensão e o acesso ao ensino superior formal precisam ser vistos conjuntamente, porque permitem desvelar um sistema de dominação organizacional semelhante ao taylorista, que perdura até a atualidade. Dito de outra forma, opera-se a separação entre os responsáveis pela produção de conhecimentos legítimos, pelo planejamento e criação de tecnologias e, do outro lado, os executores. Em detalhe: por um lado, estimula-se a raridade do diploma universitário ou, diga-se, a restrição aos meios de consagração social; por outro, pode-se reconhecer que atividades de extensão - como cursos livres e prestação de serviços da concepção tradicional/funcional - acabam, indiretamente, por ampliar o número de pessoas que identificam os possuidores desta distinção social - não há rei sem súditos - e, diretamente, para capacitar - no sentido estrito da palavra - pessoas para colocar em prática tais conhecimentos desenvolvidos por esta casta.

Essa separação entre planejadores e executores se assemelha as defesas feitas por Taylor, o qual

estudou o trabalho pesado, não qualificado, com a pá, trabalho de fundição, e de pedreiro, daí a sua preocupação com a fadiga muscular, o seu desconhecimento da fadiga nervosa. Alie-se a uma visão negativa do homem, onde os indivíduos nascem preguiçosos e ineficientes, infantilizados e com baixo nível de compreensão. Com essa visão do homem, ele define o papel monocrático do administrador. (Tragtenberg, 1977, p. 77)

Cabe ainda observarmos que as críticas de Maurício Tragtenberg à teoria de Taylor incidem no processo de objetificação dos operários pelos administradores das indústrias. Nessa mesma linha, Fayol aprofundou o estudo sobre esse processo e apregoou que o trabalhador braçal deve ficar restrito ao seu papel “na estrutura ocupacional parcelada (...). Daí ser importante nesse sistema que o operário saiba muito a respeito de pouca coisa” (Tragtenberg, 1977, p. 77).

Em nossas analogias entre as concepções de extensão universitária e as teorias administrativas, abarcam-se ainda os aportes de Elton Mayo à Escola de Relações Humanas. O participacionismo e a cooperação defendidos pelo teórico aproximam-se da concepção de extensão processual, em nossa análise. Mayo foi influenciado pelo behaviorismo, no que se refere às técnicas que promovem a adaptabilidade dos trabalhadores à empresa, e através da promoção de metodologias participacionistas, que procuram dirimir conflitos nas relações de trabalho, nota-se a sua associação com Durkheim (Tragtenberg, 1977)3.

No que concerne à extensão universitária brasileira, tanto a concepção tradicional -também chamada de funcionalista -, quanto a processual possuem, cada qual a sua maneira, esses mesmos elementos que constituem a Escola das Relações Humanas. Isso porque as ações de extensão tradicional/funcionalista, em sua maioria, eram, e em alguns casos ainda hoje são, práticas assistencialistas orientadas por uma educação pedagógica diretiva para prestação de serviços.

E, após a abertura política brasileira no final dos anos de 1980, com o fortalecimento dos movimentos populares e de sindicatos, a extensão processual levada a cabo pelas universidades surgiu preocupada em superar os traços de assistencialismo. O difusionismo da extensão tradicional/funcionalista - embora passe a valorizar a participação dos sujeitos não acadêmicos no processo de produção e compartilhamento do conhecimento -, não conseguiu democratizar os meios de consagração do saber, ficando restrita à própria extensão, isto é, não conseguiu modificar a estrutura elitista universitária. Ressoa, enfim, na concepção processual a explicação de Tragtenberg (1977):

A burocracia age antiteticamente: de um lado responde à sociedade de massas e convida a participação de todos, de outro, com sua hierarquia, monocracia, formalismo e opressão afirma a alienação de todos, torna-se jesuítica (secreta), defende-se pelo sigilo administrativo, pela coação econômica, pela repressão política. (p. 190)

Ou, visto de outra forma, se “a Escola das Relações Humanas só examina as relações homem x grupo na área da empresa, (mas) não as ultrapassa” (Tragtenberg, 1977, p. 84), a universidade pela extensão, pelo avesso, faz o mesmo: atém-se aos conflitos exteriores, sem espaço para autocrítica. Nesse aspecto, a análise de Tragtenberg foi incisiva:

A universidade dominante reproduz-se mesmo através dos “cursos críticos”, em que o juízo professoral aparece hegemônico ante os dominados: os estudantes. (...) Essa apropriação da crítica pelo mandarinato universitário (...) constitui-se numa farsa, numa fábrica de boa consciência e delinquência acadêmica, daqueles que trocam o poder da razão pela razão do poder. Por isso é necessário realizar a crítica da crítica-crítica, destruir a apropriação da crítica pelo mandarinato acadêmico. (...) Não se trata de discutir a apropriação burguesa do saber ou não-burguesa do saber, mas sim a destruição do “saber institucionalizado”, do “saber burocratizado” como único “legítimo”. (Tragtenberg, 2009 (1979), p. 2)

Dessa forma, é válido englobar analogias entre a concepção crítica de extensão - que se destaca por buscar sua efetivação por meio das atividades de ensino e pesquisa e sem estrutura administrativa especial - com o toyotismo -, visto que “a universidade dominante reproduz-se mesmo através de cursos críticos”, e, possivelmente, tanto esta concepção, quanto as novas teorias administrativas responderam às mudanças surgidas no interior do paradigma funcionalista4. Para isso, nos valemos do trabalho de Ana Paula Paes de Paula (2002), sobre o toyotismo e as ideias contemporâneas de desburocratização e flexibilização. Segundo a autora, que revisita a obra de Tragtenberg, “as atuais teorias administrativas refletem a lógica do capital flexível, herdam características das antigas escolas de administração e continuam validando a ideologia da harmonia administrativa” (Paes de Paula, 2002, p. 134).

O toyotismo surge da impossibilidade japonesa de seguir o modelo fordista, desenvolvendo-se em um modelo organizacional enxuto e influenciado pela teoria dos sistemas e alicerçado na flexibilidade, baixo custo e qualidade (Paes de Paula, 2002, p. 135). Esse processo recorreu às técnicas de harmonia nas relações de trabalho da escola de relações humanas e soma aos processos participativos às ideias de busca por “qualidade total e melhoria contínua” (Paes de Paula, 2002, p. 135). Com relação à flexibilidade, a autora descreve a falácia da desburocratização da atualidade, isto é, “no clima das grandes mudanças socioeconômicas, estão surgindo teorias administrativas que tentam demonstrar, utilizando o tipo ideal (weberiano de burocracia) como parâmetro, que as organizações estão se desburocratizando” (Paes de Paula, 2002, p. 137).

Diante disso, percebemos que a extensão, em sua concepção crítica, pode assemelhar-se, mesmo que involuntariamente, às ideias de desburocratização e de flexibilidade quando as suas atividades são concebidas como intrínsecas às de ensino e pesquisa e sem estrutura acadêmico-administrativa específica para sua operacionalização. Com isso, e aproveitando-se das palavras de Paes de Paula (2002, p. 138), pode ocorrer novamente uma “operação ideológica, que oculta novas relações de poder e dominação”, pois se distancia de uma real democratização dos meios de produção e reprodução do conhecimento. Em outros termos, é possível promover extensão através do ensino e da pesquisa em IES elitistas.

Nesse sentido, anuímos à concepção crítica de extensão, mas procuramos assinalar a necessidade de se garantir o direito à educação superior a todos os brasileiros e à democratização da gestão das universidades com a participação da comunidade interna e externa, devolvendo para a sociedade o controle de seus mercados culturais. Tal defesa visa a acabar com as desigualdades e injustiças locais e intranacionais.

Resolução CNE n. 7/2018: apontamentos sobre concepções de extensão e burocratização da educação

Como afirmado anteriormente, a curricularização da extensão, prevista no atual PNE e no anterior, não possui uma redação autoexplicativa e ensejou a criação das diretrizes para a extensão na educação superior brasileira pela resolução CNE n. 7, de 18 de dezembro de 2018 (Brasil, 2018a).

O parecer n. 608/2018, da Câmara de Educação Superior - CES - do CNE, fornece um relato detalhado do processo de construção da resolução n. 7 de 2018 (Brasil, 2018b). A CES, em fevereiro de 2017, instituiu uma comissão a fim de “estudar e conceber o marco regulatório para a extensão na educação superior brasileira”, que foi composta pelos conselheiros Arthur Roquete de Macedo, presidente5, Gilberto Gonçalves Garcia, relator6, Luiz Roberto Liza Curi7 e Paulo Monteiro Vieira Braga Barone8, membros (Brasil, 2018b).

Além disso, para colaborar com a elaboração da resolução também foi criada uma subcomissão, com representantes dos fóruns de extensão dos segmentos público, comunitário e particular e com outros convidados9, quais sejam: Daniel Pansarelli, presidente do Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Instituições Públicas de Educação Superior Brasileiras - Forproex -; Wilson de Andrade Matos, pró-reitor de Extensão do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo; Sônia Regina Mendes dos Santos, presidente do Fórum de Extensão das Instituições de Educação Superior Particulares - Forexp -; Josué Adam Lazier, presidente do Fórum Nacional de Extensão e Ação Comunitária - ForExt -; Malvina Tania Tuttman10, Conselheira da Câmara de Educação Básica do CNE; e a Professora Maria Mello de Malta, pró-reitora de Extensão da UFRJ (Brasil, 2018b, p. 1).

Os trabalhos foram iniciados no primeiro semestre de 2017, com o compartilhamento de textos sobre os principais conceitos orientadores da política de extensão, em seus distintos segmentos, e se coadunaram na elaboração de uma proposta inicial de estrutura de parecer e resolução, em setembro do mesmo ano (Brasil, 2018b). A primeira minuta enalteceu as principais questões e os conceitos-chave da extensão e foi oportunizado tempo para discussão dos representantes com os seus respectivos fóruns, bem como entre os especialistas da subcomissão do CNE (Brasil, 2018b).

Ao passo que, com o retorno das contribuições dos fóruns, foram enriquecido o marco teórico da extensão e produzida a segunda versão da minuta, a qual passou a incluir “temas como ensino a distância, requisitos legais obrigatórios, modalidades de atividades de extensão e parcerias interinstitucionais em atividades de extensão” (Brasil, 2018b, p. 2).

Em meados de 2018, a comissão, composta por representantes dos fóruns de extensão dos segmentos público, comunitário e particular e outros convidados, finalizou o texto da minuta e apresentou-a em audiência pública, em 17 de setembro do mesmo ano, aos representantes “do campo da extensão, entre os quais dirigentes de instituições de ensino, pró-reitores, coordenadores, professores, estudantes, associações de mantenedores e associações de instituições de ensino” (Brasil, 2018b, p. 3). Em verdade, a minuta não foi apresentada somente aos representantes, pois, na parte das considerações finais da audiência, a professora Maria Mello de Malta destacou que achou

muito interessante (...) descobrir o espaço democrático que é uma audiência pública onde nós todos podemos falar o que quisermos, o que a gente não pode é se arrogar mandato que a gente não tem, falar por quem a gente não... que a gente tá dizendo que a gente é, mas não deu mandato pra gente, isso é uma delicadeza que a gente tem que pensar, e nesse momento como eu estou falando pela comissão, não vou falar como Pró-Reitora da UFRJ e identificar quem que pode falar ou quem não pode falar pela UFRJ.

Essa manifestação foi, provavelmente, uma crítica velada a alguns participantes da UFRJ, o que indica como uma contenda local pode ser levada ou elevada a uma escala nacional de disputa do campo acadêmico. Apesar desse episódio, e a partir dos materiais analisados11, concluímos que se tratou, em suma, de uma discussão de agentes acadêmicos brasileiros em geral, pois a quase totalidade dos envolvidos foram docentes ou dirigentes universitários de diversos lugares do país. Foi tão emblemática a restrição da reunião aos docentes que um dos presentes, o professor Márcio Florentino Pereira12, num discurso claramente assentado na perspectiva de Boaventura Sousa Santos (2011), destacou, entre outros aspectos, que estava

sentindo a falta dos protagonistas da extensão. Os estudantes e a comunidade poderiam estar mais presentes neste debate conosco. Acho que é fundamental a gente avançar, é um passo importante que a gente está dando, mas nós precisamos nos desafiar pra passos mais arrojados, porque o mundo e o tempo estão nos exigindo isso.

O presidente da comissão, em pronta resposta, disse que a ausente representante da União Nacional dos Estudantes - UNE - foi convidada, mas não explicou a falta dos de fora-do-campo. As intervenções dos participantes na audiência sobre o texto referência foram diversas, entretanto, nos detivemos em três pontos básicos modificados a partir daquele encontro. O primeiro ponto refere-se à questão da gratuidade da extensão para o público externo participante presente no art. 21, a qual foi questionada com base em outra legislação referente às empresas júnior, no testemunho de experiências cotidianas de algumas IES e na argumentação de que não se tratariam de atividades com fins lucrativos. A retirada deste ponto foi atendida no texto final.

O segundo questionamento atendido foi relativo à mudança da imposição da extensão como elemento de progressão funcional de docentes, pois isso acarretaria problemas com a legislação trabalhista para as IES. Por fim, como terceiro ponto, destacamos o alterado e amplamente protestado propósito de estabelecer ‘as diretrizes para extensão do sistema federal de educação nas instituições de educação superior brasileira’, pois no entendimento dos envolvidos isso extrapolaria o propósito da resolução ao legislar sobre o sistema federal, bem como deixaria de fora as IES de outros sistemas. Passou, então, consoante ao papel do CNE, a estabelecer somente ‘as diretrizes para a extensão na educação superior brasileira’. Em nossa interpretação, os três pontos destacados dão a proeminência da visão do Forproex sobre a resolução, a qual foi parcialmente superada13. Após algumas reuniões da subcomissão de especialistas, o texto final foi encaminhado e apreciado pela Câmara do CNE, que o aprovou por unanimidade (Brasil, 2018b).

Quanto ao parecer CES n. 608/2018, o seu marco teórico possui três partes. A primeira, ‘Das concepções sobre extensão na educação superior brasileira’, assevera a ideia da existência de múltiplas concepções e práticas de extensão ao longo da história da educação superior e de que elas ainda são recorrentes no cotidiano das diversas IES brasileiras (Brasil, 2018b). Reconhecia-se, portanto, a necessidade de “uma diretriz nacional que promova a unicidade e a consensualidade de concepções e propostas” a fim de institucionalizar a extensão universitária (BRASIL, 2018b, p. 4). Ademais, é importante perceber o posicionamento do texto na direção de uma extensão universitária de concepção crítica, que pudesse escamotear desde concepções e práticas assistencialistas até as mercantilistas de venda de serviços.

Na segunda parte do parecer - ‘Breve histórico sobre as políticas de extensão na educação superior do Brasil’ -, nota-se a preocupação dos agentes envolvidos em destacar, a partir da legislação nacional, os trechos nos quais a extensão era contemplada ou valorizada (Brasil, 2018b). A descrição feita pelos autores põe como ponto de delimitação historiográfico a própria extensão com as suas concepções e práticas em relevo (Brasil, 2018b).

A terceira e última parte refere-se aos ‘Fundamentos teóricos do marco regulatório legal nacional da extensão’ e está subdividida em ‘Indissociabilidade entre ensino-pesquisa-extensão’, ‘Formação do estudante’ e ‘Transformação social’ (Brasil, 2018b). Nessa parte fica evidente a vinculação do parecer a uma concepção crítica de extensão, pois, como os próprios subtítulos indicam, há um entendimento de que a curricularização deva levar a promoção da indissociabilidade entre as atividades universitárias, tendo como foco a formação do estudante e com vistas a promover uma relação transformadora da instituição e da comunidade. Com isso, e antevendo elementos da resolução, nesse trecho do parecer - igualmente ao subsequente com as ‘considerações do relator’ - são apresentadas possibilidades concretas de efetivação das proposições teóricas estabelecidas.

Cabe, neste momento, focar na resolução CNE n. 7/2018 e reiteradas vezes recorrer ao parecer CES n. 608/2018 para esclarecer alguns pontos que mereçam maior atenção em nossa discussão. Tal resolução é o primeiro documento brasileiro voltado para definir os “princípios, os fundamentos e os procedimentos que devem ser observados no planejamento, nas políticas, na gestão e na avaliação das” IES sobre o assunto, e que deverão constar em seus respectivos planos de desenvolvimento institucionais, projetos políticos institucionais e projetos pedagógicos dos cursos (Brasil, 2018a, p. 12).

A presente resolução conseguiu, em primeiro lugar, situar a extensão universitária em destaque na formação do estudante de graduação e, inclusive, em parágrafo único do art. 2º, convidou e provocou a aplicação dessa resolução também na pós-graduação - uma vez que, como relembra o parecer, a inserção social passou a ser um dos itens obrigatórios das normas de avaliação da Capes (Brasil, 2018a, 2018b). Essa ênfase no papel formativo da extensão, que adveio desde a discussão das proposições do Fórum Nacional de Educação Superior, procurou superar equívocos de outras concepções que tiveram relevância em determinados períodos, mas descaracterizavam o papel da universidade na sociedade. Além disso, conforme advogado no parecer, “as atividades de extensão adquirem maior efetividade se estiverem vinculadas ao processo de formação de pessoas”, o que reafirma o papel acadêmico da mesma (Brasil, 2018b).

Entrementes, para que seja garantida a qualidade da formação discente através da extensão num projeto pedagógico de curso, três elementos são considerados essenciais: “(i) a designação do professor orientador; (ii) os objetivos da ação e as competências dos atores nela envolvidos; (iii) a metodologia de avaliação da participação do estudante” (Brasil, 2018b, p. 10). Com isso, a extensão aproxima-se ao que já é realizado nos estágios supervisionados - como o próprio parecer assinalou (Brasil, 2018b, p. 10) -, apontando para uma possível forma de integralização curricular.

Outros pontos vagos que a resolução busca dirimir são a importância da extensão na formação discente em seu art. 7º e que essas atividades devem ser direcionadas ao público externo das IES (Brasil, 2018a). Nesse sentido, as atividades quando direcionadas principalmente ao público interno - como cursos livres, por exemplo - precisam ser entendidas na alçada do ensino.

Esse desentendimento anterior, ainda recorrente em algumas instituições, possivelmente, deve-se ao peso da noção de ensino relacionado com disciplina, crédito e grade curricular, ou seja, dos antigos instrumentos de controle da burocracia universitária, cuja promoção da ideia de flexibilização curricular promovida pela LDB não conseguiu vencer ou substituir. Nessa velha perspectiva, qualquer atividade não enquadrada na estrutura disciplinar e do modelo de aula tradicional favorecido pela reforma de 1968 - lei n. 5.540, de 28 de novembro de 1968 - seria pelo inverso uma atribuição da extensão.

A rigor, quando a resolução CNE n. 7/2018 enalteceu a formação discente e o relacionamento com a comunidade, ela permitiu afirmar a proximidade da extensão com uma concepção crítica dessa atividade, que fica perceptível pelo detalhamento “da concepção, das diretrizes e dos princípios” no art. 3º:

A Extensão na Educação Superior Brasileira é a atividade que se integra à matriz curricular e à organização da pesquisa, constituindo-se em processo interdisciplinar, político educacional, cultural, científico, tecnológico, que promove a interação transformadora entre as instituições de ensino superior e os outros setores da sociedade, por meio da produção e da aplicação do conhecimento, em articulação permanente com o ensino e a pesquisa. (Brasil, 2018a, p. 1)

Ou seja, nesse caso, como defendeu Maria Isabel da Cunha,

a inserção da extensão como função acadêmica acena como uma nova epistemologia que estaria valorizando os contextos de práticas como ponto de partida do conhecimento cientifico. Derruba a tese da neutralidade da ciência e assume a relação entre os saberes de origens diversas como legítimos e necessários. Reconhece a dimensão política e cultural do conhecimento e de suas formas de produção. (Cunha, 2012, p. 21)

Não satisfeitas às evidências que asseveram tal concepção de extensão, vale recorrer ao parecer para detalhar os fundamentos dessas definições, principalmente, quando descreve, em relação ao ensino-extensão, a emergência de

um novo conceito de “sala de aula”, que não mais se limita ao espaço físico tradicional de ensino-aprendizagem. Sala de aula, portanto, são todos os espaços, assim compreendidos, dentro e fora das instituições de ensino, em que se apreende e se (re)constrói o processo histórico-social em suas múltiplas determinações e facetas. O eixo pedagógico clássico, ou seja, a relação “estudante/professor”, é substituído pelo eixo “estudante/professor/comunidade”. O estudante e a comunidade, na qual se desenvolve a ação de extensão, deixam de ser meros receptáculos de um conhecimento validado pelo professor para se tornarem participantes do processo. Dessa forma, o estudante se torna também o tutor (aquele que apoia o crescimento possibilitado pelo conhecimento), o pedagogo (aquele que conduz, de mãos dadas, o processo de conhecimento) e o orientador (aquele que aponta a direção desse processo). (Brasil, 2018b, p. 9)

Essa visão, que põe o estudante no centro do processo educativo, está muito próxima das defesas de Tragtenberg e o descaso para com ela foi alvo de suas críticas. Conforme o autor, o aluno “é a última coisa que está importando, mesmo para a gente que é enquadrado numa pedagogia burocrática que chamam de carreira” (Tragtenberg, 2012, p. 120). É correto, porém, considerar que uma educação universitária permeada por uma perspectiva pedagógica libertária ensejaria a “aprendizagem baseada na indissolubilidade entre o trabalho e a pesquisa, teórica e prática, contrariamente às segmentações clássicas, tayloristas e produtivas” (Tragtenberg, 2012 (1980), p. 182). Mais do que isso, essa educação seria fundada na autonomia do indivíduo, na solidariedade e na autogestão - que “supõe a gestão da educação pelos envolvidos no processo educacional; isso significa a devolução do processo de aprendizagem às comunidades onde o indivíduo se desenvolve (bairro, local de trabalho)” (Tragtenberg, 2012 (1980), p. 183).

Nesse sentido, há que se destacar no parecer a indicação das formas de “organização da pesquisa” que estejam articuladas à extensão, a saber, as “metodologias participativas, no formato investigação/ação (ou pesquisa-ação), que priorizam métodos de análise inovadores, isto é, a participação dos atores sociais e do diálogo” (Brasil, 2018b, p. 9). Contudo, e coerente com seu desígnio legal, as proposições de ensino-extensão e pesquisa-extensão do parecer CES n. 608/2018 não são detalhadas na resolução CNE n. 7/2018 (Brasil, 2018a), nem houve a orientação de metodologias para fomentar a participação da comunidade interna ou externa na autogestão universitária na diretriz final - apesar de uma passagem no parecer recordar a meta 22, do PNE anterior, atinente à criação dos “conselhos sociais”14 (Brasil, 2018b).

Em compensação, no art. 8º da resolução CNE n. 7/2018, está previsto que “as atividades extensionistas, segundo sua caracterização nos projetos políticos pedagógicos dos cursos, se inserem nas (...) modalidades” de programas, projetos, cursos e oficinas, eventos e prestação de serviços (Brasil, 2018a, p. 2). As cinco modalidades são importantes indicativos para a implantação da política, pois poderão romper com a ideia de ações de extensão15 arraigada no cotidiano universitário e fortemente ligada às atividades pontuais de cunho assistencialistas que não favorecem uma conexão efetiva das universidades com as suas comunidades locais ou mais distantes. Nesse aspecto, vale destacar que o texto da resolução contemplou em seus princípios “o estabelecimento de diálogo construtivo e transformador com os demais setores da sociedade brasileira e internacional” (Brasil, 2018a, p. 13), ou seja, abriu espaço para a extensão crítica nas atividades de intercâmbio acadêmico16.

Em resumo, a diretriz parte de uma fundamentação extensionista crítica, mas tem um limite de democratização das IES definido pela sua própria dissociação da extensão em relação às demais atividades acadêmicas. Com isso, esmaeceu-se, por exemplo, o potencial de promoção de programas e projetos integrados de ensino-pesquisa-extensão - como os que vêm sendo desenvolvidos na Universidade Federal de Pelotas (UFPel, 2015). Em outros termos, os programas e projetos na forma da sua redação da resolução podem ser exclusivos de extensão, conforme está na própria estratégia 12.7. Ou seja, a delimitação da resolução foi certamente um reflexo da dissociação das atividades acadêmicas desde as construções dos PNEs de 2001-2010 e de 2014-2024, seguramente, por sua vez, provindas dos diversos campos acadêmicos locais do Brasil onde ocorrem segmentações administrativo-pedagógicas. Podemos igualmente conjecturar que se tratou de uma estratégia de agentes extensionistas em relação aos seus pares mais ligados à pesquisa, pois em qualquer uma das construções das políticas não foi possível perceber uma significativa interação dos dirigentes dos Forproex com os representantes de fóruns de pró-reitores de pesquisa e pós-graduação, embora a questão da pertinência social da educação superior seja um tema dividido por todos.

Considerações finais

A partir desta análise foi possível avançar, tanto no detalhamento do processo de produção da referida resolução em relação a outros estudos da área de extensão (Serafim; Mascia, 2022; Serva, 2019), quanto em trazer de forma inovadora para essa discussão as contribuições de autores do campo de estudos organizacionais críticos (Tragtenberg, 1977; 2009; 2012; Paes de Paula, 2002).

A estratégia 12.7 do PNE 2014-2024 demandou a criação da resolução CNE n. 7, de dezembro de 2018, a fim de regular e orientar a inserção dos 10% de créditos nos cursos de graduação das IES brasileiras. Essa diretriz foi um produto do próprio campo acadêmico brasileiro em geral, composto por docentes ligados a causa extensionista, com destaques aos membros do Forproex e à participação da pró-reitora de Extensão da UFRJ.

Além disso, o texto foi direcionado somente à regulação da extensão e elaborado sem uma participação perceptível de representantes estudantis, de membros de comunidades de diversas partes do Brasil, de movimentos sociais e, provavelmente devido ao seu escopo, de docentes e dirigentes mais ligados à pesquisa e ao ensino.

Quanto ao seu conteúdo, a diretriz foi fundamentada em uma concepção crítica de extensão - dentro das suas possibilidades normativas dissociadas das demais atividades acadêmicas. Portanto, apesar da resolução CNE n. 7/2018 poder orientar claramente as universidades em direção à curricularização da extensão crítica, existe uma limitação e um caráter burocrático inerentes à mesma: a Câmara de Educação Superior do CNE regulou a estratégia 12.7 apartada de outros pontos do PNE 2014-2024, como a controlada expansão do acesso aos cursos superiores pela meta 12 e suas demais estratégias.

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1 AZAMBUJA, Leonardo. A extensão universitária na Unijuí. Cadernos da Avaliação Institucional. Ijuí: Ltnijuí, n. 12, 1997, p. 43.

2É preciso mencionar que Ana Paula Paes de Paula (2016) propôs para os estudos organizacionais o círculo das matrizes epistêmicas como uma alternativa ao trabalho de Gibson Burrell e Gareth Morgan. A heterodoxia de Maurício Tragtenberg também rompe com essas classificações. Não obstante, a simplificação didática dos autores anglo-americanos se impôs para esse cotejo de pensamentos da década de 1970.

3“Durkheim é o grande predecessor de Mayo na sua crítica à supressão dos grupos de referência, desencadeada pela Revolução Industrial, que promove a substituição de mão-de-obra estável por outra em contínua rotação, gerando a sensação de desenraizamento (anomia)” (Tragtenberg, 1977, p. 83).

4O paradigma funcionalista, além de receber influência massiva da sociologia positivista, recebeu também no século 20 influências do idealismo alemão e das teorias marxistas, gerando o surgimento de novas teorias no seio deste paradigma, entre as quais se somaram ao objetivismo a teoria dos sistemas, a teoria integrativa, o interacionismo e a teoria da ação (Burrell; Morgan, 1979).

5Professor emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual Paulista e ex-reitor da instituição, e Chanceler da Laureate International Universities em São Paulo.

6Foi reitor do Centro Universitário Franciscano do Paraná e da Universidade São Francisco. Atuou como presidente da Associação Brasileira de Universidades Comunitárias - Abruc - presidiu o Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras - Crub.

7Analista de Ciência, Tecnologia e Inovação do CNPq, desde 1987.

8Professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, desde 1986.

9Conforme o relator em seu texto, foram importantes as contribuições na pesquisa histórica da extensão os professores Romário Geraldo - UFJF - Maria das Dores Nogueira - UFMG - e Sônia Regina Mendes dos Santos, pró-reitora Comunitária da Universidade do Grande Rio.

10Professora da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.

11O texto referência de cinco páginas e da audiência gravada de quase quatro horas de áudio realizada em Brasília, estão disponíveis no portal do governo federal. Todos os arquivos estão no seguinte endereço: http://portal.mec.gov.br/component/content/article?id=15993:audiencias-e-consultas-publicas. Acesso em: 16 set. 2020.

12Segundo seu Currículo Lattes, foi professor da Universidade Federal de Goiás (1994-2002) e atua na Universidade de Brasília (2004 - atual) e na Universidade Federal do Sul da Bahia (2014 - atual), bem como foi orientado por Boaventura Sousa Santos e João Arriscado Nunes.

13Um ponto renitente a ser discutido é a não gratuidade de créditos de extensão para os estudantes que a levam a cabo em IES privadas.

14“Meta 22: Garantir a criação de conselhos com a participação da comunidade e de entidades da socieda-de civil organizada, para acompanhamento e controle social das atividades universitárias, com o objetivo de assegurar o retorno à sociedade dos resultados das pesquisas, do ensino e da extensão” (Brasil, 2001).

15Inclusive consagrada na versão da meta de curricularização do PNE 2001-2011.

16Nada de muito novo se considerarmos a extensão funcionalista promovida pelo “voluntary service over-seas (...) (cuja) finalidade era promover a cooperação com as nações subdesenvolvidas do Terceiro Mundo”, que originou os serviços de desenvolvimento na Inglaterra em 1958 (sousa, 2010, p. 62). Ou como organizações não governamentais de intercâmbio de estudantes que ainda hoje promovem trabalho voluntário - por exemplo, a Aiesec.

Recebido: 16 de Agosto de 2022; Aceito: 28 de Setembro de 2022

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