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Revista Brasileira de Política e Administração da Educação

versão impressa ISSN 1678-166Xversão On-line ISSN 2447-4193

Revista Brasileira de Política e Administração da Educação vol.38 no.1 Goiânia  2022  Epub 02-Out-2023

https://doi.org/10.21573/vol38n002022.122763 

Seção temática: Políticas, gestão e direito à educação superior: novos modos de regulação e tendências em construção

Políticas de avaliação e regulação da educação superior para as IES estaduais: interfaces entre os conselhos estaduais de educação e o SINAES

Higher education evaluation and regulation policies for state IES: interfaces between the state education councils and SINAES

Políticas de evaluación y regulación de la educación superior para las IES estatales: interfaces entre los consejos estatales de educación y el SINAES

MARY ÂNGELA TEIXEIRA BRANDALISE1 
http://orcid.org/0000-0003-3674-5314

REGILSON MACIEL BORGES2 
http://orcid.org/0000-0001-6115-364X

MARIA ELIZA NOGUEIRA OLIVEIRA3 
http://orcid.org/0000-0002-1771-1488

NADJA FONSÊCA DA SILVA4 
http://orcid.org/0000-0002-6517-5886

1Universidade Estadual de Ponta Grossa Programas de Pós-graduação em Educação e Ensino de Ciências e Educação Matemática Grupo de Estudos e Pesquisas em Política Educacional e Avaliação Ponta Grossa, PR, Brasil

2Universidade Federal de Lavras Departamento de Educação Programa de Pós-Graduação em Educação Lavras, MG, Brasil

3Universidade Federal de Alfenas Instituto de Ciência Humanas e Letras Alfenas, MG, Brasil

4Universidade Estadual do Maranhão Departamento de Educação e Filosofia Programa de Pós-Graduação em Educação São Luís, MA, Brasil


Resumo

Este artigo tem por objetivo analisar o processo de normatização das políticas de avaliação e regulação da educação superior das IES no âmbito dos Conselhos Estaduais de Educação (CEE), em interface com a política nacional de avaliação da educação superior definida pelo SINAES. A pesquisa, de abordagem qualitativa do tipo estudo de casos múltiplos, aborda por meio da análise documental, como os CEE traduzem e recontextualizam a política de avaliação e regulação da educação superior para as IES a eles jurisdicionadas. Embora atendam o SINAES, a trajetória e composição dos CEE pesquisados apresentam características distintas, revelando ações próprias em seus processos avaliativos e regulatórios no âmbito da educação superior estadual.

Palavras-Chave: Avaliação; Conselhos Estaduais de Educação; Educação Superior; Regulação; SINAES

Abstract

This article aims to discuss the process of standardizing higher education evaluation and regulation policies in HEIs within the scope of the State Education Councils (CEE) in interface with the national higher education evaluation policy defined by SINAES. The research, with a qualitative approach of the multiple case study type, addresses, through document analysis, how the CEE translate and recontextualize the evaluation and regulation policy of higher education for the HEIs under their jurisdiction. Although they attend SINAES, the trajectory and composition of the CEE surveyed have distinct characteristics, revealing their actions in their evaluation and regulatory processes within the scope of state higher education.

Key words: Evaluation; State Boards of Education; College education; Regulation; SINAES

Resumen

Este artículo tiene como objetivo discutir el proceso de normalización de las políticas de evaluación y regulación de la educación superior en las IES en el ámbito de los Consejos Estatales de Educación (CEE) en interfaz con la política nacional de evaluación de la educación superior definida por el SINAES. La investigación, con un enfoque cualitativo del tipo estudio de casos múltiples, aborda, a través del análisis documental, cómo los CEE traducen y recontextualizan la política de evaluación y regulación de la educación superior para las IES de su jurisdicción. Si bien asisten al SINAES, la trayectoria y composición de los CEE encuestados tienen características diferentes, revelando acciones propias en sus procesos de evaluación y regulación en el ámbito de la educación superior estatal.

Palabras-clave: Evaluación; Juntas Estatales de Educación; Educación universitaria; Regulación; SINAES

INTRODUÇÃO

As universidades brasileiras, mantidas pelos governos estaduais, têm papel relevante no âmbito regional no qual cada uma está inserida, tanto nos aspectos políticos, econômicos, sociais e de inovação, bem como sobre os fluxos de renda e emprego locais, devido à repercussão da produção de conhecimento científico, tecnológico e cultural que delas emergem. Em consequência, a regionalização das Instituições de Ensino Superior (IES), à luz das normativas dos Conselhos Estaduais de Educação (CEE) e das Secretarias/ Superintendências de Ensino Superior locais, dialoga com o princípio da equalização de oportunidades educacionais a que se refere o Art. 211 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988).

Considerando que a organização federativa do Brasil, sob a égide de um Estado Democrático de Direito, é constituída por vinte e seis estados mais o Distrito Federal, pesquisadores do Eixo 3 da Rede Universitas/Br propuseram uma pesquisa que objetiva analisar as influências modeladoras da atuação dos CEE nas políticas de avaliação e regulação das universidades públicas estaduais, financiada pela chamada Universal CNPQ/2018.

A proposição da pesquisa, da qual este artigo é oriundo, considera a importância das IES estaduais para o desenvolvimento regional e de suas particularidades, quanto à forma como se organizam, em relação à legislação nacional e estadual do Ensino Superior que ofertam, e, também, ao papel atribuído aos CEE nos processos avaliativos e regulatórios da Educação Superior dos estados brasileiros.

De natureza qualitativa, a investigação caracteriza-se como estudo de casos múltiplos (ANDRÉ, 2013), com os CEE dos estados de Goiás, Maranhão, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Pará, Piauí e Tocantins, os quais se constituíram como unidades de análise para busca de respostas à questão problematizadora da pesquisa: Como os CEE traduzem e recontextualizam a política de avaliação e regulação da educação superior instituída pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) para as IES a eles jurisdicionadas?

O estudo de caso tem a finalidade de “focalizar um fenômeno particular, levando em conta seu contexto e suas múltiplas dimensões. Valoriza-se o aspecto unitário, mas ressalta-se a necessidade da análise situada e em profundidade” (ANDRÉ, 2013, p. 970). Assim sendo, a distribuição dos CEE nos estados da federação brasileira foi considerada para a seleção daqueles que integram o estudo. Optou-se pela seleção dos CEE por meio de uma amostra não-probabilística para atendimento à proposição da pesquisa, e dentre elas escolheu-se a técnica de amostragem intencional ou por julgamento (OLIVEIRA, 2001). O planejamento amostral para seleção dos CEE constitui-se das seguintes etapas:

  • 1ª) Identificação da população definida como os CEE dos estados da Federação e do Distrito Federal, a qual totaliza 27 conselhos estaduais.

  • 2ª) Agrupamentos dos CEE conforme as regiões do Brasil nas quais eles se inserem.

  • 3ª) Seleção dos CEE para representação das regiões brasileiras conforme os seguintes critérios: seleção de aproximadamente 25% dos CEE, proporcionalmente ao número deles em cada região; disponibilidade de acesso aos documentos dos CEE de forma online; identificação de normativas (atualização) dos CEE quanto aos processos de avaliação e regulação da educação superior a partir do SINAES.

  • 4ª) Composição da amostra para o estudo de casos múltiplos: aplicaram-se os critérios definidos no item anterior à amostra da pesquisa, que ficou constituída por 8 (oito) CEE: Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraná, Piauí, São Paulo e Tocantins.

A análise documental foi o procedimento adotado para a produção dos dados. As fontes que integram a análise documental deste artigo foram documentos coletados nos sites dos CEE amostrados: regulamento, regimento, resoluções, pareceres, entre outros.

Neste artigo, cujo objetivo é analisar o processo de normatização das políticas de avaliação e regulação da educação superior das IES no âmbito dos CEE, são trazidos os primeiros resultados da pesquisa, que buscou evidenciar como os conselhos traduziram e recontextualizaram a política de avaliação e regulação da educação superior, instituída pelo SINAES para as IES a eles jurisdicionadas, com o recorte temporal das duas últimas décadas (2002-2022).

Além desta introdução e das considerações finais, apresenta-se uma breve discussão sobre a avaliação e regulação da Educação Superior no Brasil e o papel dos CEE na primeira seção. Em seguida, na segunda seção, são apresentados o resultado e a análise das fontes documentais que constituíram o corpus empírico selecionado, destacando a singularidade da trajetória de cada CEE pesquisado, bem como revelando ações próprias em seus processos avaliativos e regulatórios no âmbito da educação superior estadual e em suas interfaces com o SINAES.

AVALIAÇÃO E REGULAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL: O PAPEL DOS CEE

No contexto brasileiro, os CEE são os órgãos responsáveis pela definição das normas que devem ser seguidas na área educacional estadual, tanto na Educação Básica quanto na Educação Superior, em consonância com as diretrizes propostas pelo Ministério da Educação (MEC) e pelo Conselho Nacional de Educação (CNE).

A criação dos CEE surgiu da ideia de descentralização sobre os sistemas de ensino, com o objetivo de orientar a política educacional do estado, com a tarefa de regulamentar, por atos normativos, as bases e diretrizes emanadas do CNE e com a função de ordenar o Sistema de Ensino nos níveis pertinentes ao estado (MENEZES, 2001). Segundo Bordignon, os conselhos de educação são concebidos “como assessoramento superior ao respectivo Executivo, ora como órgãos de deliberação e controle dos respectivos Sistemas de ensino” (BORDIGNON, 2009,p. 79), exercendo funções estratégicas “que dizem respeito às políticas e diretrizes gerais” (BORDIGNON, 2009, p. 79) dos sistemas e funções operacionais de atendimento às instituições de ensino. Em geral, os conselhos se organizam em duas câmaras: uma câmara de educação básica e outra de educação superior. Dentre as atividades, são essas câmaras que deliberam sobre os processos de regulação, a avaliação e a supervisão do ensino.

As políticas de avaliação e regulação da educação superior implementadas no Brasil referem-se “ao conjunto de propostas e ações governamentais destinadas a avaliar as instituições e definir a relação com o Estado” (ALMEIDA JÚNIOR, 2005, p. 10). Sguissardi (1995) assinala que foi no final dos anos 1950 e nos anos 1960 que se localizam as origens do atual processo de avaliação no Ensino Superior. Zandavalli (2009) destaca um conjunto de documentos publicados naquele período que subsidiaram o sistema de avaliação brasileiro: o Plano Atcon (1965/66), o Relatório Meira Matos (1967/68) e o Relatório do Grupo de Trabalho Universitário (1968).

Almeida Júnior (2005) pontua que a partir de 1980 a avaliação passou a chamar a atenção do governo brasileiro para a construção de uma agenda da avaliação da educação superior. Nesse período, destacam-se três experiências sistematizadas de avaliação para este nível de ensino: o Programa de Avaliação da Reforma Universitária (PARU/1983), o Relatório da Comissão Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNRES/1985) e o Grupo de Estudos da Reforma da Educação Superior (GERES/1986). Mas, foi durante a década de 1990 que a avaliação ganhou amplitude e consistência no país, com destaque para a criação do Programa de Avaliação Institucional da Universidade Brasileira (PAIUB/1993) e do Exame Nacional dos Cursos (ENC/Provão/1995), período conhecido como a “década da avaliação” no Brasil (DIAS SOBRINHO, 2003).

O SINAES foi implementado em 2004, pela Lei n° 10.861. O sistema tem o propósito de assegurar o processo nacional de avaliação das instituições de educação superior, dos cursos de graduação e do desempenho acadêmico de seus estudantes. O Art. 1º da referida Lei menciona em seu parágrafo 2º que “§O SINAES será desenvolvido em cooperação com os sistemas de ensino dos estados e do Distrito Federal” (BRASIL, 2004). Os termos de cooperação entre os Sistemas Federal e Estadual, definidos na Lei, remetem aos CEE a responsabilidade de definição dos processos de regulação, supervisão e avaliação das IES estaduais, em sintonia com a legislação nacional da educação superior.

Nessa conjuntura, as IES estaduais estão jurisdicionadas tanto às Secretarias Estaduais de Ensino Superior e/ou órgãos equivalentes quanto à Secretaria de Educação Superior (SESu), responsável por planejar, orientar, coordenar e supervisionar o processo de formulação e implementação da Política Nacional de Educação Superior. Desse modo, os processos de regulação e avaliação das IES Estaduais são normatizados pelos CEE nos quais essas instituições se inserem, considerando as características regionais e autonomia dos estados na esfera da Educação Superior que ofertam, ao mesmo tempo em que atendem às diretrizes definidas pelo MEC e pelo CNE, sobretudo os processos de avaliação e regulação previstos no SINAES.

No âmbito do SINAES, os processos de avaliação são definidos pela Comissão de Avaliação de Educação Superior (CONAES), que é um órgão colegiado com 13 membros designados pelo Ministro de Estado da Educação, conforme dispõe o Decreto 5.262/2004 (BRASIL, 2004). Os processos de avaliação do desempenho estudantil, dos cursos e das instituições são executados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Edu¬cacionais Anísio Teixeira (INEP). No caso dos processos de regulação, Verhine ressalta que é preciso considerar a distinção existente “entre o sistema federal de educação, que abrange instituições e cursos de instituições federais e, também, privadas” (VERHINE, 2015, p. 608) e os “sistemas estaduais e municipais, que, de acordo com a LDB de 1996, são ambos regulamentados através de seus respectivos Conselhos Estaduais de Educação” (VERHINE, 2015, p. 608). Em relação ao Sistema Federal de Educação, “[...] a regulação das suas instituições (federais e privadas) é de responsabilidade da Câmara de Educação Superior (CES) do Conselho Nacional de Educação (CNE)” (VERHINE, 2015, p. 608).

A partir de 2012, Verhine menciona que com o Decreto nº 7.690/2012, a regulação de todos os cursos superiores de graduação que compõem o sistema federal de educação, “passou a ser de responsabilidade exclusiva de uma nova secre¬taria, denominada a Secretaria de Regulação da Educação Superior (SERES)” (VERHINE, 2015, p. 608). A SERES absorveu competências de outras secretarias do MEC, como SESu, Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC) e Secretaria de Educação a Distância (SEED), cabendo a ela “autorizar, reconhecer e renovar o reconhecimento de cursos de graduação (bacharelado, licenciatura e tecnológico) e de pós-graduação lato sensu, todos na modalidade presencial ou a distância” (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2022, on-line). O gerenciamento do sistema e-MEC também é feito pela SERES (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2022, on-line).

No caso dos Sistemas Estaduais de Educação, a LDB 9394/96 define em seu inciso IV do Art. 10 que compete aos estados “autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino” (BRASIL, 1996), assim como aos Municípios cabe “V - autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de ensino” (BRASIL, 1996). Além disso, deve-se considerar a diversidade de instituições que compõem o ensino superior brasileiro, suas categorias administrativas (públicas, privadas e comunitárias) e organização acadêmica (faculdade, centro universitário, universidade, institutos). Neste cenário, cabe aos CEE a responsabilidade de definição dos processos de regulação, supervisão e avaliação das IES estaduais, em sintonia com a legislação nacional da educação superior que regulamentam o sistema de avaliação e regulação da educação nacional.

Entende-se que as IES estaduais estão vinculadas e são regidas pelos Sistemas de Educação Federal e Estadual. No que se refere aos processos de regulação, credenciamento, recredenciamento, autorização, renovação e reconhecimento de cursos de graduação, as IES respondem aos órgãos normativos e executivos do sistema estadual, CEE e Secretarias Estaduais de Ensino Superior, com exceção dos cursos ofertados na modalidade a distância (EaD), que são regulados pelo sistema federal. Quanto à participação das IES nos processos avaliativos realizados pelo SINAES, a adesão depende das normativas dos CEE de cada estado e das próprias IES.

Na maioria dos estados brasileiros, as IES participam do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE) para a avaliação dos cursos de graduação que ofertam, e realizam os processos de autoavaliação institucional, conforme define o SINAES, porém os processos de avaliação de cursos e a avaliação externa das IES estaduais é realizada pelas Secretarias Estaduais de Ensino Superior, conforme normatização dos CEE. No entanto, toda regulação realizada em âmbito estadual acontece em função dos resultados dos processos avaliativos conduzidos no âmbito federal: avaliação dos estudantes (ENADE), avaliação de cursos de graduação, avaliação externa e interna da instituição, considerando a publicação do INEP dos conceitos do ENADE, dos cursos de graduação (CC) e de instituição (IGC).

Em razão disso, muitas vezes se sobrepõem os papéis dos diferentes órgãos normativos e executivos, justificando a necessidade de melhor compreensão do papel dos CEE nas políticas de avaliação e regulação das IES estaduais. Soma-se a esta vinculação que todas as IES Estaduais prestam, anualmente, informações ao Censo da Educação Superior, realizado INEP, o qual reúne informações sobre as IES, seus cursos de graduação presencial ou a distância, cursos sequenciais, vagas oferecidas, inscrições, matrículas, ingressantes e concluintes e informações sobre docentes nas diferentes formas de organização acadêmica e categoria administrativa; e, dependendo da organização de cada estado da Federação, informações similares à Secretaria Estadual de Educação do Ensino Superior.

INTERFACES DA NORMATIZAÇÃO DOS PROCESSOS DE AVALIAÇÃO E REGULAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR DOS CEE A PARTIR DA LEGISLAÇÃO DO SINAES

Nesta seção, o objetivo é discutir a incorporação das diretrizes avaliativas do SINAES nas orientações legais aprovadas no âmbito dos CEE. Conquanto os CEE tenham plena autonomia para deliberar a respeito das normas de seus respectivos sistemas de avaliação, em leituras preliminares de documentos, disponibilizados para acesso nas páginas eletrônicas dos CEE, constata-se a influência do sistema nacional de avaliação na elaboração das normas referentes aos processos regulatórios das IES. Diante disso, foi realizado um mapeamento de todos os documentos referentes à avaliação e à regulação dos oito estados escolhidos como campo da pesquisa - Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraná, Piauí, São Paulo e Tocantins -, compreendendo as duas últimas décadas, com o objetivo de investigar esta influência, cujos documentos do período especificado estavam disponíveis para acesso on-line1.

O primeiro documento encontrado foi a Resolução nº 450, de 26 de março de 2003. Trata-se de lei que altera e consolida normas relativas à educação superior do Sistema Estadual de Educação de Minas Gerais e dá outras providências (MINAS GERAIS, 2003). A publicação da Resolução nº 450 coincide com o cenário nacional de consolidação de políticas de avaliação da educação superior, por meio de sucessivas experiências vivenciadas entre as décadas de 1980 e 1990, com destaque ao PAIUB/1993 e ao ENC/1995, conhecido popularmente como “Provão”.

Além de reforçar o papel do CEE/MG na coordenação dos processos de autorização, credenciamento e recredenciamento, a resolução estabeleceu as finalidades das IES, as condições necessárias ao seu funcionamento e os critérios básicos que compõem os processos avaliativos. Destaca-se, no conteúdo da lei, a exigência inédita feita às IES para que tornassem públicos “os resultados das avaliações realizadas pelos Sistemas de Educação competentes” (MINAS GERAIS, 2003), indicando o início da incorporação de critérios avaliativos estabelecidos nacionalmente, ainda que mantida a autonomia do sistema estadual na elaboração de critérios próprios.

Após o SINAES, em 2004, o CEE/PI criou uma Comissão pela portaria ADM/CEE/PI nº 001/2004, com a finalidade de definir um documento normativo sobre a organização, operacionalização e avaliação do Ensino Superior no Sistema Estadual de Ensino do Estado do Piauí (PIAUÍ, 2004).

Em 2005, foram encontrados quatro documentos aprovados pelos CEE paranaense e paulista. Trata-se da Deliberação CEE/SP nº 48/2005, e das deliberações do CEE/PR nº 01/2005, nº 03/2005 e nº04/2005, aprovadas no contexto de publicação da Lei º 10.861/04, que institui o SINAES, as quais trouxeram indicativos de apropriação das diretrizes avaliativas nacionais. A Deliberação CEE/ PR nº 01/2005 orientou o processo de autoavaliação e da avaliação externa, definindo critérios básicos a serem utilizados como referência por comissões de avaliação constituídas pelo conselho (PARANÁ, 2005a). A Deliberação CEE/ PR nº 03/2005, por sua vez, foi mais explícita e, pela primeira vez, fez menção direta ao SINAES, alterando artigos da deliberação anterior, estabelecendo, no Art. 18, a observância por parte das comissões avaliativas, da Lei nº 10.861/2004 que institui o SINAES (PARANÁ, 2005b). Reforçando a tendência de alinhamento às diretrizes nacionais, a Deliberação paranaense nº 04/ 2005 estabeleceu prazos para a entrega dos relatórios de autoavaliação das IES, tendo em vista a observância das orientações regulamentadas pelo SINAES (PARANÁ, 2005c).

No caso paulista, não houve menção direta ao SINAES, mas, sob influência deste, pela primeira vez, definiu mais detalhadamente o processo avaliativo que passou a compreender diversas fases e etapas, com destaque à avaliação institucional e de cursos, permitindo inferir que a comissão externa indicada pela Câmara de Educação Superior do CEE/SP manteve preservada sua autonomia na elaboração de critérios próprios para a Avaliação e regulação das IES paulistas (SÃO PAULO, 2005).

Em 2006, foi publicada a Resolução 02/2006 pelo CEE do Estado de Goiás. Assim, como no caso do sistema paulista, as normas de avaliação e regulação do referido estado não se reportam ao SINAES, mas incorporaram diretrizes nacionais ao indicar o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) como referência na avaliação institucional e estabelecer a Comissão Própria de Avaliação (CPA) como órgão supervisor do processo de avaliação interna (GOIÁS, 2006).

No estado do Maranhão, a Resolução nº 298/2006 do CEE/MA, dispôs sobre o credenciamento e recredenciamento de instituição de educação superior, autorização de funcionamento, reconhecimento e renovação de reconhecimento de curso, porém não há menção ao SINAES no documento (MARANHÃO, 2006). Somente em 2018, por meio da Resolução nº 109/2018-CEE/MA, as normas regulatórias e avaliativas para a Educação Superior no Sistema Estadual de Ensino do Maranhão foram estabelecidas em alinhamento com o SINAES (MARANHÃO, 2018).

Dos oito conselhos investigados, o CEE paranaense foi o primeiro a aderir ao Conceito Preliminar de Curso (CPC) nos processos de renovação e reconhecimentos de cursos superiores, ofertados no âmbito do sistema estadual, ao dispensar os cursos com CPC superior a 3 (três) da avaliação externa realizada pelo conselho, a pedido da Comissão Estadual de Avaliação e da –Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI) (PARANÁ, 2009).

A resolução CEE/PI 045/2007 veio regulamentar o ensino superior do Piauí. Definiu a implementação gradativa da avaliação das IES do estado nos moldes do SINAES, manifestando-se favorável à celebração de Termo de Cooperação Técnica com a CONAES (PIAUÍ, 2007). Cabe ressaltar que a CONAES sinalizou no documento “Desafios, institucionalização e imagem pública da CONAES” que os presidentes da CONAES e do Fórum Nacional de Conselhos Estaduais de Educação (FNCE) “realizaram esforços conjuntos que culminaram com as assinaturas de um Protocolo de Intenções” (TRINDADE, 2007, p. 56), obtendo “um número significativo de Termos de Cooperação junto a um expressivo número de estados da Federação [...]” (TRINDADE, 2007, p. 56). No ano seguinte, 2008, foi publicada a Resolução CEE/PI N.10/2008, a qual regulamentou, em especial, o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de Educação Superior (PIAUÍ, 2008).

Em 2009, a Lei nº 2.139, que dispõe sobre o Sistema Estadual de Ensino de Tocantins, menciona em seu Art. 41 que compete ao CEE/TO manifestar-se sobre a autorização, avaliação, fiscalização, reconhecimento de cursos e programas e credenciamento de instituições de educação superior integrantes do Sistema Estadual de Ensino, assim como destaca em seu Art. 42 que os cursos oferecidos pelas IES devem tonar públicos, em seus processos seletivos, “o resultado da avaliação feita pelo Exame Nacional de Cursos” (TOCANTINS, 2009). Nesse caso, observa-se que a referida Lei manteve a nomenclatura do processo de avaliação de cursos extinto em 2003, quando da discussão e criação do SINAES.

No mesmo ano de 2009, o CEE/PA publicou a Resolução n° 482, que dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de Instituições e Cursos de Ensino Superior no Sistema Estadual de Ensino do Pará. O Art. 41 da Resolução aponta as formas de avaliação das IES e cursos que compõem o Sistema Estadual de Educação Paraense, destacando que as avaliações internas dessas instituições serão procedidas nos termos da legislação nacional vigente (inciso II) e que a avaliação do desempenho acadêmico dos estudantes será procedida pela União e/ou pelo Sistema Estadual (inciso III) (PARÁ, 2009).

Além de aderir ao CPC, o CEE/PR aprovou a Deliberação 04/2009 estabelecendo, no Art. 68, que a avaliação de cursos e desempenho acadêmico dos estudantes “será realizada no âmbito do SINAES, nos termos da legislação aplicável” (PARANÁ, 2009). A Deliberação sugere, ainda, a possibilidade de estabelecimento de convênios com a CONAES e INEP, aproveitando o Banco de Avaliadores deste último, bem como utilizando seus instrumentos de avaliação de cursos e IES.

Em 2010, o CEE paulista, por meio da Deliberação nº 99/2010, firmou posicionamento semelhante, ao estabelecer, no Art. 10, § 2º, que os “Cursos com avaliação igual ou superior a 4 (quatro) no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE), terão prorrogado o seu Reconhecimento enquanto perdurar esse desempenho” (SÃO PAULO, 2010)2.

Seguindo a mesma tendência dos sistemas paulista e paranaense, em 10 de dezembro de 2013, o CEE mineiro aprovou a Resolução CEE nº 459 que, comparada às legislações anteriores, ampliou a visibilidade dos processos avaliativos e regulatórios ao trazer um conteúdo mais detalhado (MINAS GERAIS, 2013). A lei apresenta capítulos específicos, com princípios e disposições gerais, a respeito da regulação, da avaliação e da supervisão. A leitura da lei permite constatar a incorporação de normas presentes no SINAES, como a necessidade de apresentação do PDI e de criação CPA para coordenação dos processos de autoavaliação. Considera-se, portanto, que a Resolução CEE/MG nº 459 representa, para o estado mineiro, um marco referente ao alinhamento dos princípios da avaliação e regulação da educação superior estadual, com os princípios nacionalmente estabelecidos pelo SINAES.

Em 29 de abril de 2016, o CEE/GO aprovou a Resolução 03/2016, atualmente em vigor, em que estabeleceu as normas para o Sistema Estadual de Educação Superior do Estado de Goiás. A leitura da resolução permite constatar a incorporação de diretrizes do SINAES, ao possibilitar a firmação de convênio com o MEC nos processos de avaliação. Todavia, a resolução estabelece que os instrumentos avaliativos do sistema estadual devem ser compatíveis com os do sistema federal, “respeitadas as especificidades regionais” (GOIÁS, 2016), e firma a inclusão dos resultados das avaliações externas (ENADE e IGC) como “balizadores dos indicadores da avaliação interna da instituição de educação superior e do Conselho Estadual de Educação” (GOIÁS, 2016).

Em 28 de fevereiro de 2019, o conselho mineiro aprovou a Resolução CEE/MG nº 469 que revogou a Resolução nº 459/2013 relativa à educação superior do Sistema Estadual de Ensino de Minas Gerais. Em termos gerais, no que diz respeito à avaliação e à regulação da educação superior, não foram observadas mudanças substanciais (MINAS GERAIS, 2019). No entanto, é explícita a tendência firmada na legislação anterior de incorporação dos princípios e diretrizes nacionais. A Resolução nº 469 incluiu novo parágrafo ao Art. 95 (§ 3º) em que “permite à Secretaria estabelecer convênio com outra instituição nacional de reconhecida capacidade na avaliação de instituições e cursos superiores para realização da avaliação externa” (MINAS GERAIS, 2019). Entretanto, no parágrafo anterior (§ 2º), esclarece que o “instrumento a ser adotado, no processo de avaliação externa, para uso, pela comissão verificadora, será elaborado sob a responsabilidade da Secretaria” (MINAS GERAIS, 2019), preservando-se a autonomia do sistema estadual no estabelecimento de instrumentos próprios (MINAS GERAIS, 2019).

Em 17 de junho de 2020, o CEE/TO publicou a Resolução nº 155, de 17 de junho de 2020, que dispõe sobre as funções de regulação, avaliação e supervisão de IES, e Cursos de Graduação e Pós-Graduação, no Sistema Estadual de Ensino do Tocantins. O parágrafo único do Art. 35 da Resolução ressalta que ao curso que obtiver conceito 4 ou 5 por duas vezes consecutivas, na Avaliação Externa in loco do CEE Tocantins e na avaliação do ENADE, o CEE/TO concederá mediante pedido e sem processo avaliativo in loco a Renovação de Reconhecimento no período de, no máximo, 5 (cinco) anos (TOCANTINS, 2020). A Resolução ainda prevê no parágrafo 4º do Art. 1º que as funções de regulação, avaliação e supervisão das IES serão exercidas pelo CEE/TO e naquilo que couber em regime de colaboração com o Sistema Federal de Ensino (TOCANTINS, 2020).

Em 08 de julho de 2021, publicou-se a Resolução CEE/MG nº 482, que revogou a Resolução 469/2019. A nova legislação, vigente no presente momento, não altera os princípios e diretrizes gerais firmadas na resolução anterior, porém, pela primeira vez, estabelece, no Art. 77, que, nos processos de reconhecimento e renovação de reconhecimento de curso, as informações necessárias à autorização deverão incluir os “relatórios da CPA e indicadores internos e externos de avaliação, incluindo o ENADE, dentre outros” (MINAS GERAIS, 2021).

Em 2021, a Resolução nº 194/2021 do CEE/MA, estabeleceu orientações complementares à implementação da avaliação externa de forma remota dos cursos de graduação das IES pertencentes ao Sistema Estadual de Ensino do Maranhão, enquanto permanecer o período de calamidade pública provocado pela pandemia do Coronavírus-COVID-19, de que trata a Resolução nº 048/2021 do CEE/MA (MARANHÃO, 2021a; MARANHÃO, 2021b).

A análise dos documentos norteadores dos processos de avaliação, regulação e supervisão do ensino superior dos estados pesquisados permite constatar que a incorporação das diretrizes gerais firmadas pelo SINAES por parte dos sistemas estaduais de educação, desde 2003, foi-se ampliando ao longo dos anos, apesar de preservada a autonomia dos sistemas estaduais na elaboração de normas próprias.

A RECONTEXTUALIZAÇÃO DOS PROCESSOS DE AVALIAÇÃO E REGULAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR PELOS CEE

Nesta seção, serão apresentados os dados referentes aos processos de avaliação e regulação de cada estado investigado. Os processos regulatórios foram analisados a partir das legislações vigentes, voltadas à normatização dos sistemas estaduais de educação e à regulamentação dos processos avaliativos para fins de autorização, reconhecimento, credenciamento e recredenciamento de IES pertencentes a cada sistema.3

Na análise, foram priorizados alguns elementos, tais como: procedimentos de atos legais, órgãos responsáveis, constituição de comissões avaliadoras, processos regulatórios e procedimentos avaliativos. O objetivo da análise, que resultou da leitura integral de cada uma das leis estaduais, foi compreender as particularidades de cada sistema quanto ao delineamento dos processos regulatórios, assim como os pontos em comum, tendo em vista a relação entre a autonomia dos estados e a influência das diretrizes formuladas em âmbito federal e discutidas na seção anterior.

Durante a leitura dos regulamentos de cada sistema, foi observado que a avaliação é firmada como parte integrante dos processos regulatórios que, tomando como referência os dados dos diferentes tipos de avaliação, resultam em pareceres e deliberações pertinentes às solicitações realizadas pelas IES. Tais documentos vão desde a autorização, o reconhecimento, o credenciamento e o recredenciamento institucional e de cursos até os pedidos relacionados à ampliação de vagas em cursos, local de oferta, alteração de número de turmas, alteração de projetos pedagógicos etc. Embora sejam processos integrados, com exceção da Deliberação CEE/SP nº 171/2019, que dispõe sobre os atos regulatórios do sistema estadual paulista, todas as normativas reservam títulos, seções ou capítulos próprios à “regulação” e “avaliação”, indicando princípios, diretrizes e requisitos gerais específicos de cada estado que serão apresentados a partir deste ponto do texto.

Quanto aos procedimentos e atos legais, em todos os estados analisados, cabe ao CEE, acolher e analisar as solicitações especificadas anteriormente – sobremaneira no que se refere à aprovação e autorização de cursos, ao reconhecimento e à renovação de reconhecimento, ao credenciamento e recredenciamento de instituições no âmbito de seus sistemas de ensino –, assim como exprimir os atos regulatórios necessários à conclusão dos processos que tornam legítimo o funcionamento das atividades de ensino nas organizações requisitantes. Entretanto, chamou-nos a atenção o fato de que, apesar de atribuir ao CEE a função regulatória, no estado do Piauí, a “iniciativa de criação de Instituições de Educação Superior é privativa do Governador do Estado ou Prefeito Municipal, conforme sua vinculação administrativa” (PIAUÍ, 2008) e os atos regulatórios chancelados pelo “poder executivo local”.

Nos demais estados, os atos autorizativos são homologados por órgãos administrativos do poder executivo – como as Secretarias Estaduais e, no caso do Paraná, a Superintendência-Geral de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI) – ou pelo próprio CEE. Com relação à iniciativa de criação de IES, não há especificações, possibilitando interpretar que se trata de atitude livre dos interessados, sendo função dos CEE acolher o pedido e dar andamento ao processo conforme as normas firmadas nas Resoluções e Deliberações.4

Os atos administrativos especificados seguem trâmites semelhantes que, de modo geral, incluem as análises da documentação, a designação de comissões avaliadoras, os relatórios da avaliação in loco, o encaminhamento do Parecer formulado no âmbito do CEE, a homologação e publicação do ato autorizativo. No entanto, há diferenças quanto aos procedimentos.

A primeira fase dos atos regulatórios compreende a solicitação das IES e o encaminhamento do processo pelos órgãos responsáveis.

No caso dos Conselhos paulista e maranhense, o processo se inicia com a verificação, por uma assessoria técnica do próprio CEE, da documentação apresentada pela instituição proponente e seguida de expedição à Câmara de Educação Superior, que constitui uma comissão de avaliação designada pelo CEE em Portaria (MARANHÃO, 2018; SÃO PAULO, 2019). No caso mineiro, o pedido é encaminhado à Secretaria, que submete o processo ao CEE/MG para aprovação da sistemática e dos instrumentos, e, após a aprovação, designa a comissão de verificação in loco (MINAS GERAIS, 2021).

No sistema paranaense, a SETI é o órgão responsável pelo recebimento e análise prévia dos documentos referentes à solicitação da IES interessada, que constitui uma comissão de avaliação in loco e encaminha o processo à Câmara da Educação Superior ou ao Conselho Pleno do CEE/PR para emissão do Parecer (PARANÁ, 2020). No caso goiano, o requerimento é protocolado junto ao CEE/ GO que, por meio de plataforma eletrônica, solicita parecer à Secretaria responsável pela Educação Superior e, após receber o pronunciamento, remete o processo à Câmara da Educação Superior, cujo presidente designa o conselheiro-relator do processo que, após análise documental, solicita à Câmara indicação da comissão de especialistas para verificação in loco (GOIÁS, 2016).

No sistema estadual do Piauí, a análise dos documentos é realizada por conselheiro designado ou comissão de conselheiros nomeada pelo próprio CEE/ PI. Confirmada a regularidade formal e o mérito, o CEE/PI remete à aprovação do plenário a comissão verificadora indicada pelo conselheiro-relator ou pela comissão relatora (PIAUÍ, 2008). O CEE/PA é o órgão responsável pelo recebimento das solicitações de atos regulatórios, assim como pela análise dos documentos e encaminhamento do processo, seguido de designação de comissão de avaliação externa (PARÁ, 2009).

No CEE/TO, os pedidos de credenciamento, recredenciamento e autorização são realizados via Sistema de Processamento Digital e encaminhados ao Conselho que remete a análise do processo a uma equipe técnica da Câmara de Educação Superior. A Comissão de Avaliação é designada por meio de Portaria do próprio CEE/TO ou da Secretaria Estadual de Educação do Estado (TOCANTINS, 2020).

A designação das comissões de avaliação, como se pode observar, é realizada por diferentes órgãos em cada estado, a maioria designada pelo próprio CEE, no âmbito das Câmaras de Educação Superior; em alguns casos, pelas Secretarias de Estado e, no caso do Paraná, por Superintendência. Quanto aos requisitos necessários à escolha dos avaliadores, também foram evidenciadas algumas diferenças.

O CEE/MA conta com um Banco de Avaliadores, instituído por Portaria, cujos membros são designados com base na “diretriz da avaliação por pares”. Entre outros requisitos, assim como o CEE paranaense, exige-se formação correspondente ao curso avaliado, no caso de avaliação de cursos, e experiência em gestão acadêmica de, no mínimo, dois anos, no caso de avaliação institucional. Na ausência de docentes como avaliadores, o CEE/MA admite composição por professores com formação afim (MARANHÃO, 2018; PARANÁ, 2020).

A comissão especial de avaliação externa paraense é composta por integrantes escolhidos “entre pessoas de notório e reconhecido saber no que se refere ao Ensino Superior brasileiro, detentores de, no mínimo, titulação de mestre e não pertencentes aos quadros funcionais da instituição interessada” (PARÁ, 2009). A Resolução CEE/GO nº 03/2016, que institui as normas de regulação do sistema estadual goiano, não especifica as regras de constituição das comissões, estas firmadas na Resolução nº 09/2019, que determina que as “Comissões de Especialistas, de verificação, sejam integradas por professores universitários de reconhecida experiências e qualificação acadêmica” (GOIÁS, 2019). Além dos requisitos de competência e qualificação acadêmica, a “Comissão de verificação no Conselho mineiro deve ser formada por docentes de Educação Superior de instituições sediadas em Minas Gerais”, preferencialmente, de especialistas que residam próximo à instituição a ser avaliada, sendo vedada a participação de docentes de instituição que solicitou o ato regulatório (MINAS GERAIS, 2021).

Os CEE do Piauí e de Tocantins, assim como o Conselho maranhense, contam com um banco de avaliadores. No caso do Piauí, os membros são escolhidos no Cadastro de Consultores do Ensino Superior, mantido pelo próprio Conselho. Já no caso do Tocantins, a composição do Banco de Avaliadores do CEE/TO é regulamentada em norma específica emitida pelo Conselho, exigindo-se que os avaliadores selecionados serão capacitados pela Assessoria de Educação Superior do CEE/TO (PIAUÍ, 2008; TOCANTINS, 2020).

Os processos avaliativos em todos os CEE pesquisados são desenvolvidos por meio de autoavaliação institucional ou avaliação interna e avaliação externa. De modo geral, os processos avaliativos têm o objetivo de verificar as condições de oferta de cursos de nível superior e a qualidade dos cursos e instituições com base em dados produzidos pelas próprias IES, nas autoavaliações, e dados produzidos em avaliações externas dos sistemas estaduais e federal.

A avaliação externa é um processo que engloba os processos de avaliação coordenados pelos CEE, por meio das comissões designadas para verificação in loco, sendo possível, por meio de convênio entre os Conselhos e o MEC, a realização da avaliação em regime de colaboração.

A autoavaliação institucional é realizada pela instituição sob supervisão da CPA formada por representantes de toda a comunidade acadêmica (direção, docentes, discentes, funcionários administrativos e membros externos). Somam-se a esses processos, as avaliações de desempenho acadêmico dos estudantes procedidas do SINAES, conhecidas nacionalmente como o ENADE, ou conduzidas pelos próprios sistemas estaduais em matéria específica.

Os procedimentos da autoavaliação institucional não foram especificados nos documentos analisados, apenas mencionadas, em alguns casos, a periodicidade, a representatividade e, sobretudo, a constituição de CPA citada em seis legislações dos oito CEE. Entretanto, em todas as legislações, reitera-se que os dados da autoavaliação institucional são indispensáveis aos demais processos avaliativos coordenados pelos CEE isoladamente ou por meio de parcerias e convênios.

No que diz respeito à avaliação externa, os procedimentos são igualmente semelhantes, compreendendo algumas etapas básicas e gerais, tais como: visita das comissões avaliadoras in loco; elaboração de relatórios de avaliação pelas comissões designadas; e encaminhamento dos relatórios para apreciação dos respectivos Conselhos. Os instrumentos de avaliação são elaborados pelas Secretarias Estaduais e aprovados pelos Conselhos, sendo possível, como são os casos dos Conselhos maranhense, paranaense e tocantinense, tomar como referência os instrumentos do SINAES, desde que respeitadas as especificidades de cada sistema. No caso dos CEE de Goiás, do Maranhão e do Tocantins, ao final do processo de avaliação externa, atribui-se um conceito de avaliação em cinco níveis (1 a 5), sendo 5 o conceito máximo e 2 ou 1 insatisfatórios, estabelecidos de acordo com os instrumentos e indicadores de cada sistema estadual.

Os prazos para envio dos relatórios e de manifestação dos Conselhos, assim como os prazos para envio de recursos e pedidos de reconsideração por parte das instituições variam de acordo com cada sistema. No caso de aprovação pelo Conselho Pleno, o parecer elaborado pelo Conselheiro Relator ou por membros do próprio Conselho é homologado pelas Secretarias de Estado, pela Superintendência, no caso do Paraná, ou pelo próprio CEE, seguindo o ato regulatório para publicação oficial. Os prazos de vigência dos credenciamentos e recredenciamento também variam de acordo com cada sistema e encontram-se firmados nas Resoluções e Deliberações analisadas na pesquisa.

A análise descritiva apresentada permite constatar que, apesar de identificados muitos pontos em comum quanto aos processos de regulação e avaliação, os procedimentos variam substancialmente, tendo em vista a preservação da autonomia de cada sistema em estabelecer normas próprias condizentes com as demandas e realidades locais e regionais. De modo semelhante, observou-se que, embora os Conselhos utilizem instrumentos do processo nacional de avaliação da educação superior previsto no SINAES, a trajetória e composição dos CEE pesquisados apresentam características distintas, revelando ações próprias em seus processos avaliativos e regulatórios.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise do processo de normatização das políticas de avaliação e regulação da educação superior das IES no âmbito dos CEE, em interface com a política nacional de avaliação da educação superior, definida pelo SINAES, foi o propósito deste artigo. A pesquisa envolvendo oito CEE de estados brasileiros - Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraná, Piauí, São Paulo e Tocantins, permitiu afirmar que a incorporação das diretrizes gerais do SINAES por parte dos sistemas estaduais de educação, desde 2003, foi se ampliando parcialmente ao longo dos anos, dada a autonomia deles na legislação de normas próprias para a educação superior no âmbito estadual de sua jurisdição, evidenciando a recontextualização da política de avaliação e regulação nacional pelos CEE.

De fato, foi possível constatar que os processos avaliativos e regulatórios apresentaram semelhanças quanto às análises da documentação, à designação de comissões avaliadoras, aos relatórios da avaliação in loco, ao encaminhamento do Parecer formulado no âmbito do CEE, à homologação e à publicação do ato autorizativo. No entanto, há diferenças quanto aos procedimentos que cada CEE estabelece para atendimento às especificidades locais e regionais de cada estado, devido à trajetória, a composição e às características distintas de cada um deles, que nos possibilitou (des)velar as ações próprias em seus processos avaliativos e regulatórios, ainda que alinhados ao SINAES.

REFERÊNCIAS

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1 As referências dos documentos normativos dos Conselhos podem ser encontradas no seguinte endereço eletrônico: https://docs.google.com/document/d/1VImnxlBR9H3MlZ_AwLtDi9Ei6kPWGDJD/edit?usp=sharing&ouid=110519731658080929559&rtpof=true&sd=true.

2 Em 2016, o CEE paulista aprovou a Deliberação nº 142/2016, revogando todas as deliberações anteriores referentes à regulação do ensino superior de seu sistema (SÃO PAULO, 2016). Em 10 de julho de 2019, aprovou-se a Deliberação nº 171, atualmente em vigor, que revogou a Deliberação nº 142, mantendo as especificações anteriores do SINAES como critério avaliativo (SÃO PAULO, 2019).

3 Resolução CEE/PI nº 10/2008; Resolução CEE/PA nº 482/2009; Resolução CEE/GO nº03/2016; Resolução CEE/MA nº 109/2018; Resolução CEE/SP nº 171/2019; Deliberação CEE/PR nº 06/2020; Resolução CEE/TO; nº 155/2020; Resolução CEE/MG nº 482/2021;

4 As instituições universitárias e os centros universitários têm asseguradas as atribuições de criação, organização e extinção de cursos e habilitações em sua sede, conforme disposto no Art. 53 da Lei 9.394/96, mediante comunicação ao CEE (BRASIL, 1996).

Recebido: 28 de Fevereiro de 2022; Aceito: 8 de Maio de 2022

Mary Ângela Teixeira Brandalise Doutora em Educação (Currículo) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Faz parte do Banco de Avaliadores do MEC/INEP. Coordena o Grupo de Estudos e Pesquisas em Política Educacional e Avaliação (GEPPEA). Dedica-se a estudos sobre Políticas Educacionais, Avaliação Educacional e Currículo. Professora Sênior da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e Professora nos Programas de Pós-graduação em Educação e Ensino de Ciências e Educação Matemática. Email: marybrandalise@uol.com.br

Regilson Maciel Borges Doutor em Educação pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), com Pós- Doutorado em Educação na Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Dedica-se a estudos relacionados as Políticas e Avaliação da Educação. Professor do Adjunto do Departamento de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Lavras (UFLA). Email: regilson.borges@ufla.br

Maria Eliza Nogueira Oliveira Doutora em Educação pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Dedica-se ao estudo dos temas Gestão Educacional, Gestão Escolar, Políticas Curriculares e Políticas de Avaliação. Professora Adjunta do Instituto de Ciência Humanas e Letras da Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL). Email:

Nadja Fonsêca da Silva Doutora em Educação em Ciências e Matemática pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Faz parte do Banco de Avaliadores do MEC/INEP. Coordena o Grupo de Pesquisa Formação de Professores e Políticas Educacionais (GEFOPPE). Dedica- se a estudos sobre Formação de Professores, Políticas educacionais, Avaliação Educacional, Matrizes de Referência, Metodologias Ativas e Educação em Ciências. Professora Adjunta II do Departamento de Educação e Filosofia (DEFIL) e Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA). E-mail: nadjamalu@gmail.com

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